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Carla Marshall Caroline Pinheiro Daniel Bucar Gabriel Habib Gabriel Sant’Anna Quintanilha Humberto E.C. Mota Filho Jéssica Acocella Coordenadores Rafael Carvalho Rezende Oliveira Jéssica Acocella 2019 Governança CORPORATIVA E COMPLIANCE Leandro de Matos Coutinho Mario Viola Morgana Ana Daler Casagrande Priscila Elise Alves Vasconcelos Rafael Carvalho Rezende Oliveira Tereza C. de A. M. Gorito Thaís Boia Marçal

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Carla Marshall

Caroline Pinheiro

Daniel Bucar

Gabriel Habib

Gabriel Sant’Anna Quintanilha

Humberto E.C. Mota Filho

Jéssica Acocella

Coordenadores

Rafael Carvalho Rezende OliveiraJéssica Acocella

2019

Governança

CORPORATIVA E COMPLIANCE

Leandro de Matos Coutinho

Mario Viola

Morgana Ana Daler Casagrande

Priscila Elise Alves Vasconcelos

Rafael Carvalho Rezende Oliveira

Tereza C. de A. M. Gorito

Thaís Boia Marçal

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3 a exigênCia de Programas de ComPlianCe e integridade nas ContrataÇões PúbliCas

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3A EXIGÊNCIA DE PROGRAMAS

DE COMPLIANCE E INTEGRIDADE NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS: O

PIONEIRISMO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO E DO DISTRITO FEDERAL

Rafael Carvalho Rezende Oliveira

Jéssica Acocella

1. INTRODUÇÃO

A ingerência estatal sobre a atuação dos agentes econômicos priva-dos é, tradicionalmente, justificada pelas ideias de poder de polícia, de império e da primazia, a priori, dos interesses da coletividade sobre os direitos meramente individuais, em benefício “dos mais variados setores da sociedade, tais como segurança, moral, saúde, meio ambiente, defesa do consumidor, patrimônio cultural, propriedade”.1

1 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2008. p. 108.

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Entretanto, essas concepções clássicas que, durante muito tempo, jus-tificaram as mais variadas e drásticas ingerências estatais sobre o particular vêm sendo paulatinamente superadas e substituídas por outras modernas noções voltadas à solidariedade, à cooperação e a uma relação mais hori-zontalizada entre Estado e sociedade, sem a imposição de instrumentos jurídicos repressivos ou coercitivos.2

Nesse sentido, apesar de a intervenção pública – notadamente por meio do sistema normativo – invocar até hoje um papel crucial no de-sempenho de atividades privadas e econômicas, em razão, por exemplo, da demanda por bem-estar social e por políticas distributivas3, as transfor-mações no modelo de Estado passaram a demandar um novo fundamen-to de legitimidade que possa embasar a previsão sobre onde, quando e em que intensidade a interferência estatal vai (e poderá) ocorrer.

Assim, se, de um lado, mudanças estruturais significativas no modo de governança coincidiram com a limitação do papel do Estado interven-cionista, de outro, as mesmas transformações resultaram no aumento do poder normativo e, com isso, na ascensão de um novo modelo de Estado regulador, que veio a demandar a adaptação de “estruturas tradicionais a novas estratégias regulatórias”, tendo em vista o surgimento de novos ato-res e arranjos institucionais, diferentes estilos de formulação de políticas públicas e de normas e padrões de legitimidade da atuação estatal, bem como métodos de responsabilização mais complexos4.

2 REICH, N. Mercado y Derecho. Trad. A. Font. Barcelona: Ariel, 1985.

3 SUNSTEIN, C. After the rights revolution: reconceiving the Regulatory State. Harvard: Har-vard University Press, 1990. p. 408.

4 MAJONE, G. Do Estado positivo ao Estado regulador: causas e consequências da mudança no modo de governança. In: MATTOS, P. T. L. (Coord.). Regulação econômica e democracia – o debate europeu. São Paulo: Singular, 2006.

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3 a exigênCia de Programas de ComPlianCe e integridade nas ContrataÇões PúbliCas

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No entanto, tem-se observado, com certa frequência, uma distorção do processo de implementação da regulação em determinadas atividades e setores, que demonstra ser (total ou parcialmente) incompatível com os defeitos e falhas de mercado que se quer, por meio das medidas im-plementadas, sanar. E isso acaba por resultar, sobretudo pela ausência de racionalidade da política regulatória, na impossibilidade de alcance dos objetivos a princípio pretendidos e, consequentemente, na crise de legiti-midade dos programas regulatórios e da confiança sobre eles depositados pelos agentes privados afetados.

Há, com isso, a necessidade de definir de que forma cada setor e atividade econômica são mais eficientemente regulados – isto é, em qual extensão e com qual intensidade –, bem como os programas adequados para tornar seus objetivos efetivos, de acordo com o contexto envolvido.5 Observa-se que, em determinadas atividades, o modelo de regulação que, em vez de impor determinados padrões, procura induzir o comportamen-to dos agentes envolvidos em direção a práticas socialmente desejáveis, lançando mão de mecanismos de coordenação estratégica de interesses, pode mostrar-se mais adequado para o alcance dos objetivos formula-dos. Em resumo, um modelo de indução, em substituição a um modelo rígido e coercitivo, ao incentivar o estabelecimento de um sistema de cooperação voluntária, pode melhor atender aos objetivos de eficiência e racionalidade da atividade estatal. Afinal, confere-se maior legitimidade ao processo regulatório resultante de uma relação consensual entre ente público e particular, voltado à orientação estatal – e não à imposição – das escolhas privadas e dos resultados daí decorrentes.

5 Nessa linha, vale destacar a relevante observação feita por Reich: “o que pode estar correto para um tipo de regulação pode não estar correto para outro tipo”. Isso porque, segundo ele, a análise econômica da regulação deve ser “cuidadosamente feita na avaliação de mercados específicos, das falhas de mercado originais que levaram à ação regulatória e das disfunções adicionais que a própria regulação gerou”. REICH, N. Op. cit., p. 21.

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E, justamente nesse cenário de ascensão de um novo modelo regu-latório e de incentivo, insere-se a utilização da licitação como instru-mento de fomento a determinadas atividades, bem como de indução a práticas e resultados social e economicamente desejáveis. Isso porque, em vez do mero arranjo convencional marcado pela imposição de de-veres e obrigações aos agentes privados que interagem com a Adminis-tração, a licitação vem sendo progressivamente incluída em um sistema mais complexo de coordenação entre a racionalidade individual (volta-da, em regra, para a satisfação de meros interesses individuais) e metas coletivas mais amplas.

2. A UTILIZAÇÃO DA LICITAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE FOMENTO E REGULAÇÃO DE MERCADO

Partindo-se da premissa de que a norma jurídica incide, ao menos de modo indireto, nas escolhas estratégicas formuladas pelos agentes privados (que adotarão, em geral, aquelas que lhes forem economica-mente mais vantajosas), cumpre verificar em que medida o sistema ju-rídico atual incentiva os indivíduos a reagirem conforme as preferências estatais.

No âmbito específico da atividade licitatória, tal esforço de adequa-ção das racionalidades individuais dos agentes de mercado tem crescen-temente conduzido à adoção dos processos de compra da administração pública com a finalidade de serem promovidos objetivos especialmente tutelados pela ordem jurídica, que vão além da seleção da proposta eco-nomicamente mais vantajosa.

Aproveitando-se, assim, de seu grande potencial de mobilização de diversos setores da economia – no Brasil, estima-se que as licitações pú-blicas movimentem o montante de cerca de 10% do Produto Interno

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processo de contratação da administração pública: sua vantajosidade e a obtenção eficiente do objeto pretendido.18

4.2. A Lei 7.753/2017 do Estado do Rio de Janeiro

Em outubro de 2017, o Governador do Estado do Rio de Janeiro sancionou a Lei nº 7.753, para estabelecer a exigência de Programa de Integridade às empresas que celebrarem contrato, consórcio, convênio, concessão ou parceria público-privado com o Estado, e cujo prazo de vigência seja igual ou superior a 180 dias.

Conforme disposto no próprio normativo, tal exigência tem como finalidade proteger a administração pública estadual dos atos lesivos que resultem em prejuízos financeiros causados por irregularidades, desvios de ética e de conduta e fraudes contratuais; garantir a execução dos con-tratos em conformidade com as normas aplicáveis; reduzir os riscos ine-rentes aos contratos, provendo maior segurança e transparência na sua consecução; e obter melhores desempenhos e garantir a qualidade nas relações contratuais (art. 2º).

Podemos debater, no entanto, se a exigência em questão efetivamente atende ao objetivo proposto, isto é, se se trata de instrumento adequado, razoável e necessário para resguardar a lisura nas contratações públicas.

18 “Em regra, a vantagem relaciona-se com a questão econômica. O Estado dispõe de recursos es-cassos para custeio de suas atividades e realização de investimento. Portanto, e sem qualquer exceção, a vantagem para o Estado se relaciona com a maior otimização na gestão de seus recursos econômico-financeiros. O Estado tem o dever de realizar a melhor contratação sob o ponto de vista da economicidade. Isso significa que a contratação comporta avaliação como modalidade de relação custo-benefício. A economicidade é o resultado da comparação entre encargos assumidos pelo Estado e direitos a ele atribuídos, em virtude da contratação administrativa. Quanto mais desproporcional em favor do Estado o resultado dessa relação, tanto melhor atendido estará o princípio da economicidade. A economicidade exige que o Estado desembolse o mínimo e obtenha o máximo e o melhor.” JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 64.

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4.3. A Lei 6.112/2018 do Distrito Federal

Apesar de, em grande parte, repetir o tratamento conferido pela lei do Estado do Rio de Janeiro à matéria, a lei do DF, editada um ano após, apresenta algumas outras questões polêmicas.

Estabelece, por exemplo, que, na avaliação dos parâmetros que a Contratada deve atender em seu programa de integridade, devem ser considerados o porte e as especificidades da empresa, tais como a quan-tidade de funcionários, empregados e colaboradores, a complexidade da hierarquia interna e a quantidade de departamentos, diretorias e setores e as regiões em que atua, direta ou indiretamente (art. 6º, § 1º).

Ou seja, a lei distrital impõe um ônus ainda maior ao gestor do con-trato, a quem caberá não apenas fiscalizar a implementação do programa de integridade, mas, ainda, avaliar se o mesmo é compatível com as espe-cificidades da pessoa jurídica, ao lado, claro, de suas demais funções ordi-nárias. Para tanto, pode, por exemplo, realizar entrevistas e solicitar novos documentos a fim de que seja demonstrado que o programa é eficaz para mitigar o risco de ocorrência de atos lesivos à Administração (art. 7º).

Mais uma vez, além da subjetividade que essa avaliação envolve, como não questionarmos as reais condições – tanto em termos de prepa-ro dos recursos humanos, como de disponibilidade de tempo – que tem a administração contratante para realizar tal grau de fiscalização. Quem quer que conheça a realidade dos órgãos administrativos e a rotina dos agentes responsáveis pela fiscalização contratual (seja a figura do gestor, seja do fiscal) facilmente conclui que a norma tende a virar ficção.

A CGU, com o objetivo de fomentar a adoção voluntária de medidas de integridade pelas empresas privadas, criou o selo pró-ética, que confe-re reconhecimento público às organizações que, independentemente do porte e do ramo de atuação, mostram-se comprometidas em implemen-tar medidas voltadas para a prevenção, detecção e remediação de atos de

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7 ComPlianCe e ProteÇÃo de dados

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7COMPLIANCE E PROTEÇÃO DE DADOS

Daniel Bucar

Mario Viola

1. INTRODUÇÃO

No dia 8 de julho de 2019, a Medida Provisória 869 de 27 de dezem-bro de 2018 foi convertida na Lei 13.853, que, definitivamente, criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados. A edição desta norma com-plementa o sistema brasileiro de proteção dados, almejado por sua Lei Geral (Lei 13.709/18 – LGPD), publicada em 15 de agosto de 2018. Du-rante o curso dos seis meses para análise e aprovação dos dispositivos da Medida Provisória, uma das principais discussões existentes dizia respeito à viabilidade de cumprimento das exigências legais por novos empreen-dedores que investem em tecnologia, notadamente as chamadas startups1.

1 Para a notícia completa: “Publicada com vetos lei que cria a Autoridade Nacional de Proteção de Da-dos” (disponível em https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI306038,51045-Publicada+

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Este foi o motivo, aliás, de veto ao art. 20, §3º da Lei 13.709/2018, o qual determinava que todo tratamento ou decisão baseada unicamente no tratamento automatizado fosse passível de revisão humana2.

A análise do debate deste tópico revela impacto que novas regras de proteção aos titulares de dados trazem ao atual cenário econômico. Embora se discuta a medida das exigências, é incontestável a necessidade de ativida-des empresárias, que incorporam ao seu cotidiano o tratamento de dados pessoais, ou sua transferência, certificarem-se de sua adequação ao novo marco legal. De fato, a referida constatação afeta sociedades empresárias dos mais diversos ramos, e entidades públicas, as quais necessitam de infor-mações de pessoa natural identificada ou identificável (definição de dado pessoal segundo o art. 5º, inciso I, LGPD) para operar seus serviços.

Encontram-se nesta categoria seguradoras, planos de saúde, sites de compra, os mais diversos aplicativos, sem contar os órgãos e demais en-tidades da Administração Pública. Assim, de modo a evitar que seus pro-cedimentos internos ofendam aos dispositivos legais, o momento atual caracteriza-se pela imprescindibilidade de verificação, e eventuais mudan-ças em sua estrutura, por sociedades empresárias, a fim de observar a Lei Geral de Proteção de Dados.

com+vetos+lei+que+cria+a+Autoridade+Nacional+de+Protecao+de) e também “Câmara aprova MP que cria Autoridade Nacional de Proteção de Dados” (Disponível em http://agen-ciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-05/camara-aprova-mp-que-cria-autoridade-na-cional-de-protecao-de-dados. Acesso em 20.07.19).

2 Conforme passagem do veto: “A propositura legislativa, ao dispor que toda e qualquer decisão baseada unicamente no tratamento automatizado seja suscetível de revisão humana, contraria o interesse público, tendo em vista que tal exigência inviabilizará os modelos atuais de planos de negócios de muitas empresas, notadamente das startups, bem como impacta na análise de risco de crédito e de novos modelos de negócios de instituições financeiras, gerando efeito negativo na oferta de crédito aos consumidores, tanto no que diz respeito à qualidade das garantias, ao volu-me de crédito contratado e à composição de preços, com reflexos, ainda, nos índices de inflação e na condução da política monetária.” (Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Msg/VEP/VEP-288.htm. Acesso em 15.07.19).

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7 ComPlianCe e ProteÇÃo de dados

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O presente trabalho busca expor apontamentos iniciais quanto ao assunto, mediando perspectivas teóricas e práticas. Em razão de inserir--se nesta coletânea de textos sobre compliance, objetiva-se demonstrar a possibilidade de administradores adaptarem suas atividades empresariais ao novo regulamento. Trata-se de conduta preventiva, inspirada pela au-to-regulamentação como melhor forma de obediência aos ditames legais.

De início, apresenta-se o fundamento da legislação nos valores e princípios constitucionais, mais especificamente em renovada visão da privacidade. Conforme esta diretriz, afirma-se a importância de a ativida-de empresária obedecer às limitações impostas pelo ordenamento jurídico ao seu exercício, bem como a essencialidade e vantagem do compliance como fim de otimização deste expediente.

No mesmo sentido, traça-se algumas linhas sobre as incumbências e atuação da Autoridade Nacional da Proteção de Dados, a qual deverá se responsabilizar por fiscalizar e regular as atividades de todos setores que façam o tratamento de dados pessoais. Diante disto, e da possibilidade concreta de aplicação de multas e sanções pelo órgão, ressalta-se a neces-sidade de conformação aqui defendida.

Por fim, detalham-se os procedimentos que compõem a avaliação referente à compatibilidade das práticas negociais com a Lei Geral de Pro-teção de Dados, detectando-se, também, mudanças essenciais ao alcance desta finalidade desejada.

2. COMPLIANCE E PROTEÇÃO DE DADOS

2.1. Privacidade na Sociedade de Informação e Mercado: uma adaptação necessária

Determinar a influência da Lei Geral de Proteção de Dados na ro-tina empresarial é, em verdade, reconhecer que o legislador inseriu no

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o Criminal ComPlianCe e a sua abrangênCia

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9O CRIMINAL COMPLIANCE E

A SUA ABRANGÊNCIA

Gabriel Habib

1. INTRODUÇÃO

O compliance é, atualmente, um dos temas mais destacados do Di-reito, refletindo a ideia de autorregulação regulada1 com a finalidade de adequação normativa e de nítido caráter preventivo em relação à práti-ca de ilícitos de qualquer natureza, sobretudo os ilícitos empresariais e tributários.

É consabido que a responsabilização por atos ilícitos praticados no âmbito tributário e no âmbito empresarial pode recair sobre a pessoa ju-rídica ou sobre a pessoa física. Em relação à responsabilidade empresa-rial ou administrativa da pessoa jurídica, não pairam maiores dúvidas.

1 Expressão utilizada por SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Com-pliance, Direito Penal e lei anticorrupção. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 113.

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Entretanto, o mesmo não se pode dizer em relação à responsabilização criminal da pessoa jurídica pelos ilícitos praticados, tema que ainda não encontrou um ponto de concordância entre a doutrina brasileira.

Seja como for, o compliance surge com o instrumento de prevenção para evitar a prática de ilícitos de qualquer natureza, com reflexos no Direito Penal. É dizer, o compliance tem por finalidade uma atuação pre-ventiva que visa a evitar a prática de um delito.

Mas será que existe realmente um Criminal Compliance? Será que o programa de compliance deve ocorrer dentro do Direito Penal? Ou os reflexos do Direito Penal seriam apenas uma consequência do não cum-primento do programa de compliance feito fora do âmbito criminal? De quem seria a reponsabilidade criminal pelos crimes contra a Ordem Tri-butária, da pessoa física ou da pessoa jurídica? Poderia um programa de compliance estabelecer a reponsabilidade penal?

O tema ganha especial relevância no campo dos crimes contra a Or-dem Tributária, onde há uma nítida interligação entre o Direito Tributá-rio e o Direito Penal, de forma que um gera reflexos no outro, em uma cadeia de causa e efeito. Em outras palavras, muitas vezes a sonegação de um tributo deixa de ser apenas um ilícito tributário para converter-se em um ilícito criminal, ao qual é cominada uma pena privativa de liberdade de dois a cinco anos de reclusão.

Este trabalho propõe-se a trazer uma reposta satisfatória para essas perguntas.

2. DIREITO TRIBUTÁRIO PENAL VERSUS DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO

O Direito Penal e o Direito Tributário têm muitos pontos de con-tato. Basta pensar que em ambos os ramos do Direito há o princípio

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ComPlianCe ambiental: a busCa Pela efetividade na aPliCaÇÃo das normas ambientais

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10COMPLIANCE AMBIENTAL: A BUSCA

PELA EFETIVIDADE NA APLICAÇÃO DAS NORMAS AMBIENTAIS

Priscila Elise Alves Vasconcelos

Rafael Carvalho Rezende Oliveira

1. INTRODUÇÃO

Ao abordar a temática compliance, é preciso trazer um conceito para depois adentrar a sua aplicabilidade. Compliance é uma expressão da lín-gua inglesa que advém da expressão to comply, ou seja, estar em confor-midade. Dessa definição se extrai a necessidade de adequação às normas e legislações vigentes1.

1 BREUS, Thiago Lima; GUIMARÃES, Fernando Vernalha; PETIAN, Angélica; MARCHE-SI, Bruna. Soluções Jurídicas em Compliance e Anticorrupção. Disponível em: https://www.vgplaw.com.br/compliance. Acesso em: 02 jul 2019.

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Em pleno ano 2019, a preocupação com o meio ambiente atingiu as mais diversas esferas. Trata-se de uma questão mundial onde o respeito às normas, princípios e tratados relacionados às questões ambientais passa-ram a ter prioridade nos debates.

Essa demanda por soluções de preservação e de recuperação ambien-tal trouxeram verdadeiros desafios aos estados e ao setor privado, princi-palmente acerca da responsabilização. Ou melhor, buscam-se formas de atingir o desenvolvimento sem que ocorram danos ambientais: objeti-va-se o desenvolvimento sustentável como uma maneira de impulsionar todos os setores.

Considerado o compliance como gestão estratégica, o instrumento foi trazido para a área ambiental como uma forma de fazer uma melhor adequação e efetivação das normas então vigentes.2

Inclusive, cumpre ressaltar que se trata de uma técnica multidiscipli-nar. É imprescindível que as mais diversas áreas trabalhem em conjunto para que o programa alcance um bom resultado.

Através da denominada “Lei Anticorrupção” – Lei nº 12.846/2013 – o instituto do compliance é trazido ao ordenamento brasileiro para apli-cação na gestão empresarial. Busca-se prevenir a corrupção nos negócios públicos e privados. Importante ressaltar que a corrupção é um termo

2 Nos Estados Unidos, por exemplo, a criação de programas eficazes de compliance foi inten-sificada a partir da década de 1990, em razão do fortalecimento da aplicação penal dos esta-tutos ambientais americanos e das consequências de violações potencialmente mais graves. SILECCHIA, Lucia Ann. Ounces of Prevention and Pounds of Cure: Developing Sound Policies for Environmental Compliance Programs. Fordham Environmental Law Journal, v. 7, n. 3, 1996, p. 583-590. Mencione-se, ainda, a importância da edição do The Clean Air Act Amendments of 1990 (“CAAA”) que estabeleceu critérios e regras para certificação de compliance. MAJUMDAR, Somendu B. Voluntary Environmental Compliance Auditing: A Primer. Fordham Environmental Law Journal, v. 7, n. 3, 1996, p. 817.

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10 ComPlianCe ambiental: a busCa Pela efetividade na aPliCaÇÃo das normas ambientais

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amplo que abrange qualquer situação capaz de gerar um desiquilíbrio capaz de prejudicar não apenas o setor público como o privado também.3

A aplicação principiológica e normativa se tornou a base do com-pliance para que atingisse o melhor resultado. Princípios constitucionais – implícitos e expressos – e aqueles trazidos por tratados internacionais são utilizados a todo momento.

Inclusive, acerca da aplicação principiológica no instituto do com-pliance, os inerentes à Administração Pública descritos no artigo 37, caput, da Constituição da República de 1988, são plenamente aplicáveis: legali-dade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Além desses, os dispostos no artigo 225 do texto constitucional – que trata da tutela ambiental – também são aqui aplicáveis. Destacam-se os princípios da prevenção, poluidor-pagador, precaução e desenvolvimento sustentável.

Com base nesses princípios descritos e nas principais normas relacio-nadas à tutela ambiental é que esse trabalho foi desenvolvido. A metodo-logia usada foi a bibliográfica, através de consulta à legislação brasileira vigente, doutrina e artigos científicos das principais bases de dados.

2. DA EFETIVIDADE DA APLICAÇÃO DAS NORMAS AMBIENTAIS

Desde a Política Nacional do Meio Ambiente (1981), houve não só um despertar na conscientização ambiental da população brasileira como

3 Conforme afirmamos em outra oportunidade, a expressão “corrupção” é um fenômeno pelo qual um agente estatal age fora dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em troca de recompensa. A corrupção é inimiga da República, uma vez que significa o uso privado da coisa pública, quando a característica básica do republicanismo é a busca pelo “bem comum”, com a distinção entre os espaços público e privado. NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de Improbidade administrativa, 7. ed. São Paulo: Método, 2019, p. 3-4.

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