Cigarra (Hemiptera: Cicadidae): emergência, comportamento ... · Cigarra (Hemiptera: Cicadidae):...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FFCLRP - DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENTOMOLOGIA
Cigarra (Hemiptera: Cicadidae): emergência, comportamento acústico e
desenvolvimento de armadilha sonora
Douglas Henrique Bottura Maccagnan
Tese apresentada à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP,
como parte das exigências para a obtenção do
título de Doutor em Ciências, Área:
Entomologia.
Ribeirão Preto – SP
2008
2
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FFCLRP - DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENTOMOLOGIA
Cigarra (Hemiptera: Cicadidae): emergência, comportamento acústico e desenvolvimento de
armadilha sonora
Douglas Henrique Bottura Maccagnan
Orientador: Prof. Dr. Fábio de Melo Sene
Co-orientadora: Profa. Dra. Nilza Maria Martinelli
Tese apresentada à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP,
como parte das exigências para a obtenção do
título de Doutor em Ciências, Área:
Entomologia.
Ribeirão Preto – SP
2008
3
Ao meu pai, Douglas, e minha mãe, Luci
POR TODO AMOR, INCENTIVO E LIBERDADE
Dedico
4
À minha família,
RAZÃO DA MINHA ALEGRIA
Ofereço
5
AGRADECIMENTOS
Em especial, a Profa. Dra. Nilza Maria Martinelli, pela orientação, incentivo, compreensão e
confiança.
Com gratidão, ao Prof. Dr. Fábio de Melo Sene, que gentilmente aceitou me orientar, permitindo a realização desse trabalho. Ao Prof. Dr. Tomomassa Matuo e ao Dr. Tomás Kanashiro Matuo, sem os quais não haveria o desenvolvimento da armadilha sonora. Ao analista de sistemas Dr. Pedro Roberto Rodrigues Prado, pela ajuda e conhecimento transmitido, me capacitando para realizar a análise do som. Ao Prof. Dr. Marcelo da Costa Ferreira, Prof. Dr. Sinval Silveira Neto e ao Técnico Agrícola
Gilson José Leite, pelo incentivo e sugestões, no decorrer do desenvolvimento desse trabalho.
Ao Eng. Agr. José Carlos Gonçalvez, pelas evidências fornecidas, que direcionaram para o
desenvolvimento da armadilha sonora, pelo fomento inicial da pesquisa e por disponibilizar a
área para os testes de campo.
Ao Programa de Pós-Graduação em Entomologia da FFCLRP/USP, pela oportunidade de
realizar o curso de doutorado.
À Renata Andrade Cavallari, pelo auxílio e informações prestadas durante a condução da tese.
À CAPES, pela concessão de bolsa de estudos.
À FAPESP, pela doação do sistema de análise de som.
À Janaína, pela companhia, carinho e paciência durante esses últimos meses.
À Raquel, Isabel, Naná, Dionísio, Reinaldo e aos demais amigos de laboratório, pelo convívio
agradável durante todos esses anos.
À todos, e foram muitos, que de alguma forma me ajudaram.
6
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................................................ 1
ABSTRACT ........................................................................................................................ 2
CAPÍTULO I ....................................................................................................................... 3
1. Introdução e Revisão de Literatura ......................................................................... 3
1.1 Biologia das Cigarras ............................................................................................ 3
1.2 Sazonalidade e Emergência .................................................................................. 4
1.3 Comportamento Acústico ..................................................................................... 5
1.4 Importância econômica ........................................................................................ 8
1.5 Referências ........................................................................................................... 10
CAPÍTULO II - Sazonalidade e padrão de emergência de cigarras (Hemiptera:
Cicadidae) ...........................................................................................................................
18
RESUMO .................................................................................................................... 18
ABSTRACT ..................................................................................................... 18
1 Introdução ..................................................................................................... 19
2 Material e Métodos .................................................................................................. 20
3 Resultados ..................................................................................................... 23
4 Discussão ...................................................................................................... 28
5 Referências .................................................................................................... 30
CAPÍTULO III - Comportamento acústico de cigarras (Hemiptera: Cicadidae) ............... 33
RESUMO .................................................................................................................... 33
ABSTRACT ..................................................................................................... 33
1 Introdução ..................................................................................................... 34
2 Material e Métodos ........................................................................................ 35
3 Resultados ............................................................................................................... 36
3.1 Sazonalidade ............................................................................................... 36
3.2 Descrição do som ........................................................................................ 37
3.2.1 Quesada gigas .......................................................................................... 37
3.2.2 Majeorona aper ........................................................................................ 40
3.2.3 Fidicina mannifera ................................................................................... 43
7
3.2.4 Dorisiana viridis ....................................................................................... 48
3.2.5 Dorisiana drewseni ................................................................................... 51
3.2.6 Dorisiana sp. ............................................................................................ 54
3.2.7 Guyalna sp. .............................................................................................. 56
4 Discussão ...................................................................................................... 59
5 Referências .................................................................................................... 62
CAPÍTULO IV – Desenvolvimento de armadilha sonora para o controle da cigarra
Quesada gigas (Olivier, 1790) (Hemiptera: Cicadidae). ...............................................
67
RESUMO .................................................................................................................... 67
ABSTRACT ..................................................................................................... 68
1 Introdução ................................................................................................................ 69
2 Material e métodos ......................................................................................... 70
2.1 Montagem do protótipo ......................................................................................... 70
2.2 Teste de eficiência do protótipo ............................................................................ 71
2.3 Regiões com potencial para uso da armadilha sonora .......................................... 72
3 Resultados ..................................................................................................... 72
3.1 Montagem do protótipo ......................................................................................... 72
3.2 Teste de eficiência do protótipo ............................................................................ 73
3.3 Regiões com potencial para uso da armadilha sonora .......................................... 73
4 Discussão ...................................................................................................... 77
5 Referências .................................................................................................... 79
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 83
1
Cigarra (Hemiptera: Cicadidae): emergência, comportamento acústico e
desenvolvimento de armadilha sonora
RESUMO – No presente trabalho, são apresentados o padrão de emergência e o
comportamento acústico de uma comunidade de cigarras. Ainda é proposto um protótipo de
armadilha sonora para o controle de Quesada gigas. Foi estudado o padrão de emergência
pela coleta semanal de exúvias de Quesada gigas, Fidicina mannifera, Dorisiana viridis,
Majeorona aper e Carineta spoliata. Cada espécie apresentou o início de emergência
constante nos anos de realizações das coletas e foram observados os seguintes padrões de
emergência: machos emergiram antes das fêmeas; machos e fêmeas emergiram nas mesmas
proporções; apenas fêmeas emergiram. Todas as espécies estudadas emergiram no período
chuvoso, porém não houve correlação entre o início e o final do período de emergência e o
período de chuva. Provavelmente o início da emergência das espécies ocorreu em resposta ao
fotoperíodo causada indiretamente por alterações fisiológicas das plantas hospedeiras. Foi
descrito o comportamento acústico de Q. gigas, F. mannifera, D. viridis, D. drewseni,
Dorisiana sp., Guyalna sp. e M. aper. Foram analisados e comparados a freqüência
dominante e a estrutura macrotemporal do som emitido; o estrato vertical onde os machos
estavam ativos; a sazonalidade e o comportamento gregário ou solitário. Cada espécie
apresenta um conjunto de características único. A competição interespecífica local não
justificou a diferença na freqüência dominante de Q. gigas com relação às registradas para
outras regiões. O protótipo da armadilha sonora desenvolvida era formado por um sistema que
emite som e um sistema de pulverização. As cigarras atraídas pelo som foram pulverizadas
pela calda inseticida, sendo a calda excedente coletada e redirecionada para o sistema de
pulverização. Em teste de campo, centenas de Q. gigas foram atraídas, e foi constatada
mortalidade de 85% das cigarras pulverizadas.
2
Cicada (Hemiptera: Cicadidae): emergence, acoustic behavior and development of
acoustic trap
ABSTRACT – In this work are shown the emergence pattern and the acoustic behavior of a
cicada community. Yet is proposed an acoustic trap prototype to control Quesada gigas. Was
studied the emergence pattern by weekly collect of exuviae from the species Q. gigas,
Fidicina mannifera, Dorisiana viridis, Majeorona aper e Carineta spoliata. The species
emergence time was constant along the years that collected. Were observed three patterns of
emergence: males emerged before females; males and females emerged in the same
proportion; and only females emerged. All species studied emerged in the rainy season, but
the correlation between the beginning and the end of cicada season was not significant with
the beginning and the end of rainy season. We suggest that the emergence beginning is trigger
by the photoperiod felt indirectly by changes in the host trees physiology. Was described the
acoustic behavior of Q. gigas, F. mannifera, D. viridis, D. drewseni, Dorisiana sp., Guyalna
sp. e M. aper. Were analyzed and compared the dominant frequency and the macrotemporal
structure of the song; vertical stratification where the males were in activity; the seasonality
and the gregarious or single behavior. Each species had a typical group of characteristic. The
local interespecific competition do not justify the difference among the Q. gigas frequency
dominant with records to others localities. The acoustic trap prototype developed was
composted by a sound emission system and a pulverization system. The cicadas that were
attracted to the sound crossed the insecticide that was been pulverized. In field experiment
hundreds of Q. gigas were attracted and was reported 85% of mortality of them.
3
CAPÍTULO I
1 Introdução e Revisão de Literatura
As cigarras são insetos robustos comumente encontradas nos trópicos e subtrópicos.
São caracterizadas por possuir um complexo órgão para a produção e recepção do som
(CARVER; GROSS; WOODWARD, 1991). O órgão produtor de som é de grande
importância na taxonomia, sendo que as classificações das famílias e subfamílias são baseadas
nas estruturas associadas a esse órgão. Pertencente à ordem Hemiptera, atualmente, a
superfamília Cicadoidea é dividida nas famílias Tettigarctidae e Cicadidae. Cicadidae é
dividida nas subfamílias Cicadinae, Cicadettinae e Tettigadinae (MOULDS, 2005).
1.1 Biologia das Cigarras
O período de vida adulta das cigarras, que pode durar de poucas semanas até dois a
três meses, é considerado efêmero quando comparado com sua fase ninfal, que é subterrânea e
de longa duração (BOULARD, 1965). Exemplo extremo são as cigarras Magicicada spp.,
cujo desenvolvimento para atingir o estágio adulto é de treze ou dezessete anos, dependendo
da espécie (WILLIAMS; SIMON, 1995).
A seiva do xilema é a única fonte de alimento durante toda a vida das cigarras. Devido
à escassez de açúcares no xilema, provavelmente os aminoácidos sejam a principal fonte de
energia para o crescimento das ninfas, e este fato é o que determina o longo período de
desenvolvimento (WHITE; STREHL, 1978).
A oviposição é feita endofiticamente em ramos, onde são colocadas massas de ovos,
que podem variar em número. A oviposição é realizada mais comumente em ramos secos,
porém existem exemplos de oviposição em ramos verdes (DEAN; MILTON, 1991).
Segundo Beamer (1928), as ninfas, ao eclodirem, apresentam comportamento
geotrópico positivo, penetrando em aberturas do solo à procura de raízes. Ainda segundo esse
autor, ao encontrar um local adequado, com as pernas anteriores, a ninfa retira pequenas
partículas de terra, que são prensadas contra seu corpo, formando uma pequena massa, que é
transportada a outra parte da galeria, onde é forçada contra a parede e comprimida com
repetidos movimentos de seus membros. O líquido anal secretado pela ninfa auxilia na
construção da galeria (BOULARD, 1965). O desenvolvimento pós-embrionário das cigarras
4
possui cinco instares (MACCAGNAN; MARTINELLI, 2004; MACCAGNAN, 2003;
HAYASHI, 1976).
Antes da emergência do adulto, as ninfas de cigarra de último instar saem das galerias
subterrâneas através de um orifício e sobem em troncos, permanecendo imóveis por um curto
período de tempo, para então sofrer metamorfose (COSTA LIMA, 1942), deixando presa ao
tronco, após a emergência do adulto, sua última exúvia.
1.2 Sazonalidade e Emergência
Para Wolda (1988), são considerados como sazonais os fenômenos que não ocorrem
durante todo o ano ou ainda fenômenos que ocorrem durante o ano, mas possua um ou mais
períodos bem definidos de maior ocorrência. Segundo esse autor, o período em que os adultos
ou imaturos de uma espécie de inseto aparece, ou na qual a reprodução ocorre, deve possuir
certas condições mínimas, como alimento adequado, as condições físicas devem ser toleradas,
e predadores, parasitóides e patógenos não devem prevalecer.
Em algumas espécies de cigarras tropicais, a emergência do adulto ocorre
sazonalmente, sendo essas cigarras chamadas de periódicas, enquanto outras podem ter sua
emergência durante o decorrer do ano (YOUNG, 1972). As cigarras periódicas ainda podem
ser divididas entre aquelas que emergem todos os anos e outras que emergem em intervalos de
muitos anos (WILLIAMS; SIMON, 1995).
Na Costa Rica, foi constatado que algumas espécies de cigarras emergiram em
resposta a períodos de chuva, e outras espécies, a períodos de seca (YOUNG, 1981). Assim,
cigarras periódicas de clima tropical têm sido caracterizadas como tendo o período de
emergência durante a estação mais seca, mais úmida, ou ainda de transição entre a seca e a
úmida (YOUNG, 1972; WOLDA, 1989; SUEUR, 2002).
Embora essa forma de classificação possa ser aplicada para muitas espécies de insetos
isto não prova que a chuva, o clima seco, ou a maior ou menor umidade atuem como o
principal motivo para que a espécie esteja ativa (WOLDA,1988). A competição por recursos
utilizados na reprodução pode determinar que espécies simpátricas alternem o ano da
emergência de cada população (YOUNG, 1972). Um fator que deve ser considerado como
influente na evolução dos padrões de emergência, é a interferência interespecífica na
comunição acústica (WOLDA, 1993; YOUNG, 1981).
A ocorrência de precipitação ou estiagem também não é o único fator do início da
emergência de uma espécie de cigarra. Para algumas espécies de cigarras do Panamá, Wolda
5
(1989) especula que mudanças na fisiologia da planta, influenciadas pelo fotoperíodo, devem
ser o principal agente que determina o início da emergência. Essa especulação condiz com o
fato de que as cigarras Magicicada spp. regulam seu tempo de desenvolvimento através do
número de ciclos sazonais de seu hospedeiro (KARBAN; BLACK; WEINBAUM, 2000).
Além da sazonalidade, outra característica no padrão de emergência é que em algumas
espécies, machos e fêmeas emergem ao mesmo tempo, enquanto em outras os machos
emergem antes que as fêmeas (YOUNG, 1972, 1975, 1980).
1.3 Comportamento Acústico
As cigarras são insetos que têm como característica a emissão de som (MYERS,
1929). Isto as faz notáveis e atrai a atenção do homem desde muito tempo, retratando-as e
destacando a sua capacidade acústica, em contos e poemas. O canto das cigarras ainda se faz
considerável no seu amplo uso nas pesquisas taxonômicas, ecológicas e comportamentais
desses insetos.
Entre as cigarras, a produção de som por estruturas especifica é uma característica
restrita aos machos, pois apenas eles possuem o órgão cimbálico (BOULARD, 1973). Este é
um sistema complexo, situado no primeiro segmento abdominal e é compreendido por dois
conjuntos simétricos em relação ao plano sagital do corpo. Uma descrição detalhada das
estruturas que compõem o órgão cimbálico é dada por Pringle (1954). Mas, de maneira geral,
a principal estrutura é uma membrana convexa, chamada de tímbalo, com propriedades
elásticas e faixas longitudinais esclerotizadas. Essas faixas apresentam número e forma
variável entre as espécies e são denominadas costelas e plaquetas.
Aderido ao tímbalo, encontra-se o músculo timbálico. O som é produzido devido à
contração dos músculos timbálicos que deprimem a superfície dos tímbalos, deformando as
costelas e plaquetas, o que, conseqüentemente, gera um ruído. A simples contração de um dos
músculos timbálicos faz com que sejam gerados dois “clicks”, um no momento da contração e
outro durante o relaxamento muscular (AIDLEY, 1969). Cada espécie produz som diferente
conforme a topografia timbalar e o ritmo das contrações (SUEUR; AUBIN, 2003). A sucessão
das impulsões sonoras produzidas pela vibração deformante dos tímbalos constitui o canto das
cigarras ou timbalização.
Dentro das características dos músculos timbálicos, destacam o fato de que, em
algumas cigarras, eles são ativados miogenicamente, enquanto em outras o ritmo de contração
é determinado de forma neurogênica e, ainda, os músculos timbálicos (direito e esquerdo)
6
podem contrair-se simultânea ou alternadamente (SUEUR; AUBIN, 2003). Em Fidicina, os
músculos timbálicos são neurogenicamente ativados e contraem-se alternadamente (AIDLEY,
1969). Em Platypleura, os músculos timbálicos são ativados miogenicamente (PRINGLE,
1954).
O órgão timbálico ainda é constituído por outras estruturas e músculos que podem
afetar o som emitido, como a cobertura timbálica, os opérculos, e os músculos tensores
(PRINGLE, 1954). Nas cigarras, o som ainda pode ser modificado por diferentes partes do
corpo, como o abdômen e as asas (BENNET-CLARK; YOUNG, 1992; DE SANTIS;
URTEAGA; BOLCATTO, 2008).
Bennet-Clark e Young (1994), comparando o som com as dimensões corpóreas de
dezesseis espécies, concluiram que a freqüência sonora produzida por cigarra de determinada
espécie é inversamente proporcional ao seu tamanho corpóreo.
Para algumas espécies, já foi relatada a capacidade de o macho produzir diferentes
modalidades de sinais acústico, utilizados em diferentes contextos, como: o canto de chamado
que tem como função atrair fêmeas e, em alguns casos, machos a longas distâncias; o som de
corte utilizado a curtas distâncias para a formação de casais; som de disputa entre machos
muito próximos; ou, ainda, o som produzido quando o macho é capturado por algum predador
(AIDLEY, 1969; COCROFT; POUGUE, 1996; SUEUR, 2003).
Porém, entre as várias funções comportamentais, a principal e comum a todas as
espécies é aquela com fins de atrair parceiros para a reprodução. O canto dos machos, a partir
de pontos fixos, atrai fêmeas até eles (COOLEY, 2001). As cigarras ainda podem apresentar
um comportamento de canto solitário ou de canto em coro, onde se agregam em grande
número, e os machos cantam juntos (BOULARD, 1990; SUEUR, 2002; SUEUR; AUBIN,
2002; SUEUR, 2003; VILLET; SANBORN; PHILLIPS, 2003).
As cigarras dispõem de um órgão auditivo particular, situado no segundo urômero e
cuja parte exterior visível compreende duas cápsulas auditivas. A cápsula auditiva contém
suas células sensorial compostas por escolópides, que são organelas mecanorreceptoras que
podem estar em número de 1.500 nas Cicadidae (MYERS, 1928). As escolópides que, de uma
parte, prendem sua origem na parede interna da cápsula, constituem, de outra parte, uma
estreita faixa fibrilosa, a crista, que une o centro do tímpano e capta as vibrações.
Devido a sua especificidade e sua similaridade entre localidades, o canto é uma ótima
característica para diagnosticar uma cigarra, e quando preservado em tape ou sonograma,
torna-se importante caráter sistemático (VILLET, 1988). Os sons produzidos por algumas
cigarras foram descritos foneticamente ou através de partituras musicais (BEARMER, 1928;
7
MYERS, 1929; PRINGLE, 1954), mas esses métodos não registram informações a respeito de
sua estrutura. Uma descrição qualitativa e quantitativa pode ser feita através de análise
espectrográfica de gravações, onde o som pode ser representado graficamente através de
oscilograma (amplitude X tempo), sonograma (freqüência X tempo) e pelo espectro
(amplitude X freqüência). A análise do som tem sido de grande valia para resolver problemas
taxonômicos (VILLET, 1989; GOGALA; TRILAR, 2004; SUEUR; PUISSANT, 2007).
O número de trabalhos relativos à descrição e análise do som de cigarras teve um
grande aumento a partir da década de oitenta, devido à facilidade provida pelo advento do uso
de softwares específicos para bioacústica (SUEUR, 2001). Porém, o número registros, em
torno de 300 (SUEUR, 2001, 2003), ainda é baixo levando em consideração a estimativa de
2.100 espécies descritas (MOORE, 1996).
Apesar da grande biodiversidade, a região neotropical é a que apresenta menor número
de espécies de cigarras que tiveram som analisado audioespectrograficamente (SUEUR, 2001)
(Tabela 1).
Tabela 1. Lista das espécies de cigarras neotropicais analisadas audioespectrograficamente. Espécie País Referência Dorisiana bicolor (Olivier, 1790) Brasil Boulard, 1996
D. sutuori Sueur, 2000 México
México
Sueur, 2000
Sueur, 2002
Fidicinoides pronoe (Walker, 1850) México
México
Moore, 1962
Sueur, 2002
F. pseudethelae Boulard & Martinelli, 1996 Guiana Francesa Boulard, 1996
F. picea (Walker, 1850) México Sueur, 2002
Fidicina mannifera (Fabricius, 1803) Brasil
Guiana Francesa
Peru
Aidley, 1969
Boulard, 1996
Cocroft; Pougue, 1996
Guyalna cuta (Walker, 1850) Guiana Francesa Boulard, 1999
G. nigra Boulard, 1999 Brasil Boulard, 1999
Pompanonia buziensis Boulard 1982 Brasil Boulard, 1999
Pacarina schumanni Distant, 1905 México Sueur, 2002
Quesada gigas (Olivier, 1790) Guiana
México
Argentina
Boulard, 1996
Sueur, 2002
De Santis, Urteaga; Bolcatto, 2008
Daza montezuma (Walker, 1850) México Sueur, 2002
Neocicada sp. México Sueur, 2002
Miranha imbellis (Walker, 1858) México Sueur, 2002
8
1.4 Importância econômica
A destruição de habitats nativos para a implantação de monoculturas causa sério
desequilíbrio na interação dos insetos com seus hospedeiros naturais. Esse desequilíbrio,
muitas vezes, contribui para que as espécies se associem às plantas cultivadas, podendo tornar
- se praga.
Os cicadídeos podem causar injúria às plantas no estágio de ninfa, através da sucção
da seiva na raiz, no estágio adulto, ao sugarem seiva na parte aérea da planta e no ato da
oviposição (BEAMER, 1928).
As cigarras são reconhecidas como praga em algumas culturas no mundo: Mogannia
minuta em cana-de-açúcar, no Japão (HAYASHI, 1976), Fidicina mannifera em erva – mate,
na Argentina (PACHAS, 1966), espécies do gênero Magicicada spp., que são consideradas
pragas na cultura da maçã e em algumas plantas de valor ornamental, nos Estados Unidos
(WHITE; STREHL, 1978; WHITE; LLOYD, 1979).
No Brasil, a cigarra é considerada praga na cultura do café, sendo que as espécies
Quesada gigas (Olivier, 1790), Q. sodalis (Walker, 1850), Fidicinoides pronoe (Walker,
1850), Fidicina mannifera (Fabricius, 1803), F. pullata (Berg, 1879), Dorisiana drewseni
(Stål, 1854), D. viridis (Olivier, 1790), Carineta fasciculata (Germar, 1821), C. matura
(Distant, 1892) e C.spoliata (Walker, 1858) foram citadas tendo o cafeeiro como hospedeiro
no Brasil (MARTINELLI; ZUCCHI, 1997).
Atualmente, a espécie mais prejudicial ao cafeeiro é Q. gigas, que infesta
principalmente os plantios de Minas Gerais e São Paulo, onde é predominante
(MARTINELLI; LUSVARGHI, 1998). Foram registradas, em ataques intensos, até 400
ninfas por cova de café, o que pode levar a planta à morte (GALLO et al., 2002). Ainda, Q.
gigas foi constatada causando dano na cultura florestal do paricá (Schizolobium amazonicum),
nos Estados do Maranhão e Pará, onde causou a morte do hospedeiro quando em alta
infestação (ZANUNCIO et al., 2004; ALBINO; ZANETTI, 2006).
A forma mais eficiente de controlar as cigarras é através do uso de inseticidas
sistêmicos aplicados no solo, visando a eliminar as ninfas que estão a sugar a seiva da raiz do
hospedeiro (MARTINELLI; LUSVARGHI, 1998). Esses inseticidas podem ser granulados,
com a aplicação em sulcos, na projeção da copa do cafeeiro, ou ainda os inseticidas
recomendados podem ser solúveis em água e aplicados como esguicho na base do tronco da
planta ou como um filete contínuo sob os cafeeiros (MARTINELLI; LIMA; MATUO, 2001;
MATUO et al., 2002; SOUZA; REIS; SILVA, 2007).
9
Além do custo onerado pelo controle à produção, o plantio do café é feito muitas vezes
em locais de extrema declividade, com tendência à erodibilidade do solo e conseqüente
carregamento dos produtos químicos, com a possibilidade de contaminação ambiental,
principalmente devido ao uso incorreto desses granulados sistêmicos (FORNAZIER;
ROCHA, 2000).
Para muitas pragas, existem técnicas de manejo com o uso de atraentes e armadilhas
de insetos. Estes são importantes ferramentas para o monitoramento e, em alguns casos, para
o controle de pragas, atuando diretamente na redução da população através da captura/morte
massal (GALLO et al., 2002).
Através de experimento comportamental, ficou constatada a atração de grande número
de Q. gigas adultas e de ambos os sexos através do seu próprio som reproduzido por playback
(MARTINELLI et al., 2006). Considerando esse comportamento, e sabendo que se
determinada espécie exibe fonotaxia positiva de longa distância para uma fonte emissora de
som, essa espécie é propícia a ser capturada por armadilha que use esse recurso como isca.
O uso do som como isca para a captura de insetos tem sido utilizado para um grupo
muito discreto de espécies. Em geral, tem sido utilizado para mosquitos (IKESHOJI; YAP,
1990), para mosca-das-frutas (MANKIN et al., 2004; MIZRACH et al., 2005), alguns
dípteros taquinídeos (WALKER, 1993) e, principalmente, para grilos (WALKER, 1988,
1996).
Embora em alguns casos grande número de insetos-alvo sejam capturados, o uso desse
método é dado principalmente para coleta com fins de pesquisa e não como forma de
supressão populacional de espécies-praga (WALKER, 1996). Ainda segundo esse autor, isso
se deve ao alto custo de obtenção e operação desses equipamentos, ao curto alcance efetivo,
ao fato de, em alguns casos, não atuar sobre o objeto-alvo da população, ou ainda devido ao
fato de o inseto atraído não chegar perto suficiente para a ação da armadilha.
10
1.5 Referências
AIDLEY, D. J. Sound production in a Brazilian cicada. Journal of Experimental Biology,
Cambridge, v. 51, n. 2, p. 325-337, 1969.
ALBINO, U.; ZANETTI, L. O cultivo do paricá. Dom Eliseu: Centro de Pesquisa do Paricá,
2006. p. 24. (Boletim Técnico).
BEAMER, R. H. Biology of Kansas Cicadidae. Kansas: Kansas University Science, 1928.
p. 155-263. (Bulletin, 18).
BENNET-CLARK, H. C.; YOUNG, D. A model of the mechanism of sound production in
cicadas. Journal of Experimental Biology, Cambridge, v. 173, n. 1, p. 123-153, 1992.
BENNET-CLARK, H. C.; YOUNG, D. The scaling of song frequency in cicadas. Journal of
Experimental Biology, Cambridge, v. 191, n. 1, p. 291-294, 1994.
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18
CAPÍTULO II
Sazonalidade e padrão de emergência de cigarras (Hemiptera: Cicadidae)
RESUMO – O presente trabalho teve por objetivo analisar o padrão de emergência das
cigarras através da coleta regular de exúvias e a correlação do período de emergência com o
de precipitação na região. A coleta foi realizada semanalmente, através da inspeção do tronco
de árvores, arbustos e próximo à base das plantas hospedeiras. Foram coletadas exúvias das
espécies Quesada gigas, Fidicina mannifera, Dorisiana viridis, Majeorona aper e Carineta
spoliata. Cada espécie teve a data de início de emergência constante de ano para ano. Foram
observados três padrões de emergência: machos emergiram antes das fêmeas; machos e
fêmeas emergiram nas mesmas proporções; apenas fêmeas emergiram. Todas as espécies
estudadas emergiram no período chuvoso, porém não houve correlação entre o início e o final
do período de emergência e de precipitação.
Seasonality and emergence patterns of cicadas (Hemiptera: Cicadidae)
ABSTRACT – The purpose of this work was to evaluate the emergence patterns of cicada by
regular collect of exuviae and the correlation of emergence period with rainy season. The
collect occurred weekly by the inspection in the trunk of trees, shrubs and near their bases.
The exuviaes were collected from these species: Quesada gigas, Fidicina mannifera,
Dorisiana viridis, Majeorona aper and Carineta spoliata. The emergence time was constant
from year to year within the species. Were observed three patterns of emergence: males
emerged before females; males and females emerged in the same proportion; and only
females emerged. All species studied emerged in rainy season, but there was not correlation
between the beginning and the end of cicada emergence with the beginning and the end of
rainy season.
19
1 Introdução
Além do som, a biologia das cigarras é uma característica marcante. As ninfas
constroem galerias no solo e alimentam-se sugando seiva no xilema das raízes da planta
hospedeira (WHITE; STREHL, 1978).
Durante a emergência do adulto, as ninfas do quinto instar vêm à superfície e fixam-se
em um substrato vertical, como troncos de árvores, para então sofrer metamorfose,
permanecendo a exúvia no local. Geralmente, essas exúvias são facilmente encontradas e
permanecem fixadas por longo período, podendo ser usadas como um indicador das espécies
recentemente emergidas em um dado habitat (MARTINELLI; ZUCCHI, 1997; YOUNG,
1980; YOUNG, 1981; DYBAS; LLOYD, 1962).
Em algumas espécies de cigarras tropicais, existe a sincronização da emergência do
adulto com um restrito período do ano, enquanto outras podem ter sua emergência durante o
decorrer do ano (YOUNG, 1972). O período em que os adultos ou imaturos de uma espécie
de inseto aparecem, ou na qual a reprodução ocorre, deve possuir certas condições mínimas,
como alimento adequado; condições físicas toleráveis; predadores, parasitóides e patógenos
não devem prevalecer (WOLDA, 1988).
Segundo Young (1981), algumas cigarras emergem em resposta tanto ao período de
chuva, como de seca. Assim, cigarras de clima tropical têm sido caracterizadas como tendo o
período de emergência durante a estação mais seca, mais chuvosa, ou de transição entre a seca
e a chuvosa (YOUNG, 1972; WOLDA, 1989; SUEUR, 2002).
Embora essa forma de classificação possa ser aplicada para muitas espécies de insetos,
isto não prova que a chuva, o clima seco, ou a maior ou menor umidade, atuem como o
principal motivo para que a espécie esteja ativa ou que sincronize seu aparecimento
(WOLDA,1988). Para algumas espécies de cigarras, Wolda (1989) especula que mudanças na
fisiologia da planta, influenciadas pelo fotoperíodo, devem ser o principal agente que
determina o início da emergência.
Com relação ao som das cigarras, a grande diversidade nas propriedades do canto das
espécies sugere que esse meio de comunicação deva ser visto como um recurso sobre o qual
há fortes pressões de seleção, inclusive para o desenvolvimento de alocrônia entre as espécies
simpátricas (WOLDA, 1993; YOUNG, 1981; YOUNG, 1972).
20
O presente trabalho teve por objetivo analisar o padrão de emergência das cigarras
através da coleta de exúvias e a correlação do início e o final desse período com o de
precipitação na região.
2 Material e Métodos
A coleta de dados ocorreu no período entre agosto de 2004 e maio de 2008, quando
foram coletadas exúvias através de catação manual. Para realizar os estudos foram escolhidas
áreas arborizadas do Câmpus da UNESP de Jaboticabal, em que havia o prévio conhecimento
da emergência de diferentes espécies de cigarras (MARTINELLI; ZUCCHI, 1997). Entre os
períodos de emergência de 2004 a 2006, as coletas foram realizadas em quatro áreas, e entre
2006 e 2008, foi adicionada uma quinta, devido à constatação, no respectivo local, da
emergência da espécie Majeorona aper, não registrada no Câmpus. Segue a descrição das
áreas:
Área 1. Jardim localizado em frente ao Centro de Convenções da UNESP/Jaboticabal,
é uma área estreita e longa, formada principalmente por sibipiruna (Caesalpinia
peltophonoide Benth) (Caesalpiniaceae) e Cassia sp. (Leguminosae) (Fig. 1A).
Área 2. Árvores localizadas ao redor do prédio do Departamento de Engenharia da
UNESP/Jaboticabal. A grande maioria das árvores é de sibipiruna (Fig. 1B), mas havia uma
Cassia sp. com histórico de alta infestação de Quesada gigas, a qual foi retirada em março de
2006.
Área 3. Árvores localizadas no estacionamento em frente ao Laboratório de
Acarologia – UNESP/Jaboticabal. Os exemplares arbóreos dessa área são, em sua maioria,
munguba (Pachira aquatica Aubl) (Bombacaceae) e jambolão (Eugenia jambolana (Lam.))
(Myrtaceae) (Fig. 1C).
Área 4. Composta por mangueiras (Mangifera indica L.) (Anacardiaceae) e
abacateiros (Persea americana Mill) (Lauraceae) de várias variedades com cerca de 20 anos.
A coleta das exúvias foi realizada na extremidade da área próxima ao Departamento de
21
Fitossanidade, da qual foram inspecionadas 43 mangueiras e 65 abacateiros, o que
representava, aproximadamente, metade da área total (Fig. 1D).
Área 5. Árvores localizadas ao lado da Biblioteca – UNESP/Jaboticabal, compostas
por diversas espécies de grande porte, sendo a grande maioria de diferentes espécies de angico
(Anadenanthera spp.) (Mimoraceae) (Fig. 1E).
Figura 1. Locais de coleta das exúvias. A. Área 1. B. Área 2. C. Área 3. D. Área 4. E. Área 5. UNESP/Jaboticabal, set/2006.
A B
C D
E
22
A coleta foi realizada semanalmente através da inspeção dos troncos de árvores e
arbustos, bem como no solo e na vegetação que os circundam. Cerca de um mês antes do
início do experimento, as áreas das coletas foram inspecionadas, e as exúvias referentes aos
anos anteriores, retiradas. Os exemplares coletados foram identificados, sexados e contados.
A identificação foi baseada em Maccagnan e Martinelli (2004), Maccagnan (2003) e Mota
(2003).
Para as análises de cada temporada as semanas foram contadas continuamente a partir
do início do ano até o final do período de emergência. Devido os dados referentes à
Majeorona aper serem apenas de duas temporadas de coleta, não foi possível realizar as
análises de correlação com o período de precipitação.
Amostras dos adultos e exúvias das espécies coletadas estão depositadas na Coleção
Entomológica do Departamento de Fitossanidade da UNESP/Jaboticabal, bem como foram
depositadas aos cuidados do Dr. Allen F. Sanborn (Barry University, School of Natural and
Health Sciences).
A região onde foi realizado o estudo, é caracterizada por cobertura vegetal semi-
decídua (OLIVEIRA-FILHO; FONTES, 2000) e por período chuvoso de outubro a março
(MINUZZI et al., 2007). Os elementos meteorológicos, utilizados neste trabalho, foram
extraídos de um conjunto de dados pertencentes ao acervo da área de Agrometeorologia do
Departamento de Ciências Exatas da UNESP/Jaboticabal. Esses dados foram obtidos na
Estação Agroclimatológica do referido Campus (lat. 21o14’05’’ S; lon. 48o17’09’’ W; alt.
615,01 m). As datas do início e final do período chuvoso foram determinadas conforme
critério proposto por Sansigolo (1996), onde consta como sendo a primeira data, após 1o de
setembro, que seja observada uma quantidade mínima de 20mm de chuva totalizada em um
ou dois dias seguidos, apresentando nos próximos 30 dias, pelo menos, um dia de chuva em
cada período de 10 dias. O fim do período chuvoso foi determinado pela primeira ocorrência
de uma seqüência de dez ou mais dias secos após 30 de janeiro.
3 Resultados
As espécies das quais se coletaram exúvias, foram: Quesada gigas (Olivier,1790),
Fidicina mannifera (Fabricius, 1803), Dorisiana viridis (Olivier, 1790), D. drewseni (Stål,
1854), Majeorona aper (Walker, 1850), Carineta spoliata (Walker, 1858), C. fasciculata
(Germar, 1821) e Taphura sp. (Figura 2).
23
Figura 3. Exúvias de cigarras coletadas. A. Quesada gigas. B. Fidicina mannifera. C. Dorisiana viridis. D. Carineta spoliata. E. Majeorona aper. F. Dorisiana drewseni. G. Carineta fasciculata. H. Taphura sp.
A B
C D
H G
F E
24
Devido ao reduzido número de exúvias de Dorisiana drewseni, Carineta fasciculata e
Taphura sp., não foi possível seu avaliar o padrão de emergência (Tabela 1). Isto
provavelmente deve-se ao pequeno tamanho e/ou à escassez dessas espécies nas áreas
amostradas.
Na soma de todas as exúvias coletadas, tiveram maior freqüência as espécies Quesada
gigas (48%) e a Fidicina mannifera (38%), cuja dominância alterou entre elas nas temporadas
de coleta. A terceira espécie mais coletada foi a Majeorona aper (7%), seguida pela
Dorisiana viridis (0,05%) e Carineta spoliata (2%). Para essas espécies, a razão sexual
apresentou-se proporcional, exceto para Carineta spoliata, em que foram coletadas apenas
fêmeas (Tabela 1). Tabela 1. Número total de exúvias coletadas de cada espécie por ano e respectiva razão sexual (RS). Jaboticabal-SP, agosto/2004 a maio/2008.
2004/2005 2005/2006 2006/2007 2007/2008 exúvias RS exúvias RS. exúvias RS exúvias RS Total % Q. gigas 2.650 0,51 4.129 0,54 3.646 0,56 4.260 0,55 14.685 0,48
F. mannifera 3.352 0,52 2.356 0,49 4.032 0,50 2.024 0,50 11.764 0,38
D. viridis 171 0,43 296 0,60 339 0,49 539 0,61 1.345 0,05
D. drewseni 5 0,20 1 ---- 2 ---- 1 ---- 9 < 0,01
M. aper 0 ---- 8 0,20 1.039 0,55 1.097 ---- 2.144 0,07
C. spoliata 267 1,00 153 1,00 144 1,00 160 1,00 724 0,02
C. fasciculata 1 ---- 0 ---- 11 0,45 0 ---- 12 < 0,01
Taphura sp. 0 ---- 0 ---- 20 0,85 10 0,80 30 < 0,01
Total 6.446 6.943 9.233 8.090 30.612
O maior número de exúvias de Quesada gigas foi coletado na Área 1, com 59%,
seguida pela Área 2 (21%). Fidicina mannifera foi coletada principalmente na Área 4 (66%),
seguida pela Área 3 (22%) Essa mesma seqüência correu para Dorisiana viridis com 71% e
16%, respectivamente. A espécie Majeorona aper ocorreu praticamente apenas na Área 5, e
Carineta spoliata ocorreu principalmente na Área 3 (83%), seguida pela Área 4 (16%).
Tabela 2. Porcentagem de emergência de espécie de cigarra em cada área de coleta. Jaboticabal-SP, agosto/2004 a maio/2008.
Q. gigas F. mannifera D. viridis M. aper C. spoliata exúvias % exúvias % exúvias % exúvias % exúvias % Área 1 8.624 0,59 385 0,03 58 0,04 31 0,01 4 0,01
Área 2 3.040 0,21 662 0,06 39 0,03 0 0,00 0 0,00
Área 3 905 0,06 2.584 0,22 217 0,16 0 0,00 598 0,83
Área 4 1.870 0,13 7.765 0,66 951 0,71 0 0,00 116 0,16
Área 5 246 0,02 368 0,03 80 0,06 2.113 0,99 6 0,01
Total 14.685 11.764 1.345 2.144 724
25
Das oito espécies de cigarras estudadas, Quesada gigas e Majeorona aper tiveram sua
emergência ocorrendo na transição do período seco e chuvoso (Figs. 3 e 4). Todas as demais
emergiram apenas no período chuvoso (Figs. 5; 6 e 7). As cigarras que apresentaram maior
período de emergência foram Carineta spoliata e Fidicina mannifera, com média de dezoito e
dezesseis semanas, respectivamente; Dorisiana viridis e Majeorona aper tiveram apenas doze
semanas de emergência, enquanto Quesada gigas emergiu durante nove semanas.
Observando a Figura 8, nota-se que a emergência da maior quantidade de cigarras
esteve concentrada no período entre a segunda quinzena de setembro até a primeira quinzena
de dezembro, sendo que, nesse período houve a coleta de mais que 95% do total de exúvias.
Com relação à razão sexual durante cada período de coleta, foram observados três
padrões, sendo: 1) quando um número maior de machos emerge antes que as fêmeas, ocorreu
em Quesada gigas, Majeorona aper e Dorisiana viridis (Figs. 3; 4 e 6); 2) quando machos e
fêmeas emergem na mesma proporção, como em Fidicina mannifera (Fig. 5); 3) apenas há a
emergência de fêmeas, como em Carineta spoliata (Fig. 7).
Majeorona aper
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
22ago
29ago
05s e t
12s et
19s e t
26s et
03o ut
10o ut
17o ut
23o ut
30o ut
06no v
13no v
20no v
27no v
núm
ero
de e
xúvi
as
macho
fêmea
Figura 4. Período e padrão de emergência de Majeorona aper determinados pela soma de exúvias coletadas semanalmente. Jaboticabal-SP, agosto de 2006 a maio de 2008.
Quesada gigas
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
22ago
29ago
05set
12set
19set
26set
03out
10out
17out
23out
30out
06nov
13nov
20nov
27nov
núm
ero
de e
xúvi
as machofêmea
Figura 3. Período e padrão de emergência de Quesada gigas determinados pela soma de exúvias coletadas semanalmente. Jaboticabal-SP, agosto de 2004 a maio de 2008.
26
Fidicina mannifera
0
200
400
600
800
1000
1200
05set
19set
03out
17out
30out
13nov
27nov
12dez
27dez
11jan
25jan
08fev
núm
ero
de e
xúvi
as
machofêmea
Figura 5. Período e padrão de emergência de Fidicina mannifera determinados pela soma de exúvias coletadas semanalmente. Jaboticabal-SP, agosto de 2004 a maio de 2008.
Dorisiana viridis
0
50
100
150
200
250
300
12set
19set
26set
03out
10out
17out
23out
30out
06nov
13nov
20nov
27nov
05dez
12dez
19dez
27dez
04jan
11jan
18jan
25jan
núm
ero
de e
xúvi
as
machofêmea
Figura 6. Período e padrão de emergência de Dorisiana viridis determinados pela soma de exúvias coletadas semanalmente. Jaboticabal-SP, agosto de 2004 a maio de 2008.
Carineta spoliata
0102030405060708090
10out
23out
06nov
20nov
05dez
19dez
04jan
18jan
01fev
15fev
01mar
15mar
29mar
núm
ero
de e
xúvi
as
fêmea
Figura 7. Período e padrão de emergência de Carineta spoliata determinados pela soma de exúvias coletadas semanalmente. Jaboticabal-SP, agosto de 2004 a maio de 2008.
27
27
0
5
10
15
20
25
30
35
22ago
29ago
05set
12set
19set
26set
03out
10out
17out
23out
30out
06nov
13nov
20nov
27nov
05dez
12dez
19dez
27dez
04jan
11jan
18jan
25jan
01fev
08fev
15fev
22fev
01mar
08mar
15mar
22mar
29mar
porc
enta
gem
de
exúv
ias
Q. gigas F. mannifera D. viridis M. aper C. spoliata
Figura 8. Porcentagem de emergência de cigarras determinada por coleta semanal de exúvias. Jaboticabal-SP, agosto de 2004 a maio de 2008.
28
Pelos dados incluídos na Tabela 3, notou-se a baixa variância da média da semana de
início de emergência de todas as espécies de cigarras, sugerindo que estas espécies possuem
uma data típica para o início da emergência. O final da emergência possui variância superior à
do início, porém ambas são bem inferiores às variâncias da média do início e do final do
período chuvoso. Caso o início ou o final da emergência estivesse vinculado ao início ou final
do período de chuva, era de esperar que os índices de variância fossem semelhantes
(WOLDA, 1989), que não é o caso observado. Esse resultado é confirmado com os baixos
coeficientes de correlação obtidos.
Tabela 3. Média e variância da semana do início e do final da emergência de cigarras e do período chuvoso de quatro temporadas. Coeficiente de Correlação de Pearson entre o início e o final da emergência com o do período chuvoso. Jaboticabal-SP, agosto/2004 a maio/2008.
Média do início
Variância do início
Correlação do início
Média do fim
Variância do fim
Correlação do fim
Q. gigas 36,5 0,33 0,47 46,3 0,92 - 0,47
F. mannifera 38,5 0,33 0,47 55,3 2,92 0,27
D. viridis 40,0 2,67 0,13 53,8 4,92 0,50
M. aper 1 37,0 0 -- 50,0 2,00 --
C. spoliata 44,0 1,33 - 0,24 62,0 7,33 - 0,04
Período de chuva 43,8 9,58 64,5 21,67
1 apenas duas temporadas (agosto de 2006 a agosto de 2008).
4 Discussão
Através da coleta regular de exúvias, podem-se analisar os padrões de emergência,
relacionando a quantidade no tempo de machos e fêmeas, além de fornecer um número
preciso a respeito da quantidade emergida de indivíduos. Porém esse não foi igualmente
eficiente para todas as espécies, pois permitiu analisar apenas cinco, quando foi constatada a
emissão de som e coletado um número maior de espécies. A distribuição das espécies pelas
áreas de coleta demonstra que existe divisão de recurso muito provavelmente associada ao
tipo de hospedeiro.
O surgimento de adultos macho antes das fêmeas, em determinada área, é comum em
muitas espécies de animais (MORBEY; YDENBERG, 2001). Para as cigarras, devido ao
restrito período da atividade do adulto de algumas espécies, a emergência do macho antes da
fêmea evita que as fêmeas estejam preparadas fisiologicamente para o acasalamento enquanto
os machos ainda não. Ao contrário, Fidicina mannifera tem a emergência de machos e fêmeas
29
nas mesmas proporções, e essa espécie apresenta período de emergência superior às demais,
como foi relatada por Young (1980, 1972), salientando a ocorrencia durante todo o ano na
Costa Rica. Assim, para essa espécie, a emergência antecipada do macho não teria valor
adaptativo. Ainda é possível supor que o restrito período de emergência de algumas espécies
seja uma característica intrínseca desta e não uma limitação imposta por condições ambientais
desfavoráveis. O fato de apenas exúvias de fêmeas de Carineta spoliata serem coletadas, pode
sugerir reprodução paternogenética, porém não foi encontrado nenhum registro desse tipo de
ocorrência para Cicadoidea. Os machos de Carineta spoliata são conhecidos (MARTINELLI;
ZUCCHI, 1989).
Young (1980) sugeriu que a interferência entre as espécies de cigarras é importante
para o padrão sazonal. Para as espécies aqui estudadas, notou-se que a emergência de várias
espécies ocorreu no período entre setembro e dezembro. Essa época corresponde ao início das
precipitações, podendo o fato da maior emergência estar associado com melhor
aproveitamento no recurso alimentar, devido ao estágio fenológico da planta (WOLDA,
1978). Outra vantagem poderia estar relacionada com a melhoria na transmissão do som em
ambiente com maior umidade relativa do ar (HENWOOD; FABRICK, 1979), o que
favoreceria a formação de casais. Ou, ainda, a concomitância da emergência de várias
espécies de cigarras pode estar correlacionada como uma forma de ofertar maior número de
presas a ponto de saciar possíveis predadores (KARBAN, 1982) e diluir a pressão sobre uma
única espécie. Outro fator que pode associar as cigarras ao período chuvoso, está nas
necessidades das ninfas iniciais, dado o fato de as ninfas de primeiro instar de Fidicinna
mannifera responderem à alta umidade para eclodirem (PACHAS, 1966).
Embora as espécies estudadas sejam todas associadas ao período chuvoso, as análises
demonstraram que o início da emergência não ocorre em função da precipitação. O tempo de
início da emergência foi constante para cada espécie, enquanto o início do período chuvoso
variou consideravelmente. Resultado semelhante foi descrito por Wolda (1989), sendo que
esse autor especula que o início da emergência estaria associado ao fotoperíodo, que seria
percebido pelas ninfas, indiretamente, via hospedeiro. Os resultados obtidos por Karban,
Black e Weinbaum (2000) indicaram que as cigarras Magicicada spp. não regulam seu tempo
de desenvolvimento de forma endógena ou acumulando graus-dia, mas, através do número de
ciclos sazonais de seu hospedeiro. Visto que as espécies estudadas são polifágicas
(MARTINELLI; ZUCCHI, 1997), e que há necessidade da sincronia de emergência
independente do hospedeiro, o fator fisiológico da planta a que as cigarras estão associadas,
deve ser referente ao metabolismo primário vegetal.
30
5 Referências
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cicadas (Homoptera:Cicadidae: Magicicada). Ecology, Tempe, v. 43, n. 3, p. 444-459, 1962.
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periodical cicadas. Ecology, Tempe, v. 63, n. 2, p. 321-328, 1982.
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cigarras (Hemiptera: Cicadidae; Tibicinidae) associadas ao cafeeiro. 2003. f. 68.
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Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal, 2003.
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31
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Cuesta Angel forest ravine of Northeastern Costa Rica. PSYCHE, Cambridge, v. 88, n. 1-2,
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33
CAPÍTULO III
Comportamento acústico de cigarras (Hemiptera: Cicadidae)
RESUMO – São descritos o som e o comportamento acústico de uma comunidade de cigarras
neotropicais composta pelas espécies: Quesada gigas, Fidicina mannifera, Dorisiana viridis,
D. drewseni, Dorisiana sp., Guyalna sp. e Majeorona aper. Das espécies, foram analisados e
comparados a freqüência dominante e a estrutura macrotemporal do som emitido; o estrato
vertical onde os machos estavam ativos; a sazonalidade e o comportamento gregário ou
solitário. De maneira geral, as espécies tiveram atividade de canto no período chuvoso da
região. Cada espécie apresentou um conjunto de características que possivelmente reduz a
interferência interespecífica na comunicação acústica. A competição interespecífica local não
justifica a diferença na freqüência dominante de Q. gigas com relação às registradas para
outras regiões.
Acoustic behavior of cicadas (Hemiptera: Cicadidae)
ABSTRACT – In this work are described the song and acoustic behavior of a neotropical
cicada community composed by the species: Quesada gigas, Fidicina mannifera, Dorisiana
viridis, D. drewseni, Dorisiana sp., Guyalna sp. and Majeorona aper. To this species were
analyzed and compared the dominant frequency and the macrotemporal structure of the song;
vertical stratification where the males were in activity; the seasonality and the gregarious or
single behavior. The species were listened in singing activity in the local rainy season. Each
species showed a group of characteristics that probably reduces interespecific interference in
the acoustic communication. The local interespecific competition do not justify the difference
mong the Q. gigas frequency dominant with the records to others localities.
34
1 Introdução
A emissão de ondas sonoras é uma forma de comunicação utilizada por diversos
grupos de insetos, em diferentes contextos (DROSOPOULOS; CLARIDGE, 2006). Esse
meio de comunicação é vantajoso por ter como características o longo alcance e a boa
habilidade de transpor obstáculos (KREBS; DAVIES, 1996). Devido esse tipo de onda
derivar de vibrações de partículas do meio, as condições abióticas do ambiente, como
temperatura e umidade, determinam períodos e micro habitat onde existe uma otimização da
transmissão sonora (HENWOOD; FABRICK, 1979), fazendo com que muitos organismos
utilizem esse recurso concomitantemente, havendo a sobreposição de sinais emitidos
(YOUNG, 1981b). Nessa situação, é de se esperar que haja interferência interespecífica
(RÖMER et al., 1989; RÖMER, 1993), determinando assim que os componentes contidos na
comunidade e que fazem uso da comunicação sonora, tratem a emissão do som como um
recurso a ser disputado (RIEDE, 2002). Durante a emissão de som as espécies de cigarras
podem apresentar diferentes comportamentos, como na sazonalidade (WOLDA, 1993,
SUEUR, 2002; SUEUR; PUISSANT, 2002), no período do dia em que são enfatizadaos a
emissão (WOLDA, 1993), estratificação vertical e horizontal (YOUNG, 1984; SUEUR, 2002;
SUEUR; PUISSANT, 2002; SUEUR; AUBIN, 2003a; DIWAKAR; BALAKRISHNAN,
2007), a freqüência dominante e os padrões temporais do som (SANBORN; PHILLIPS;
VILLET, 2003) e a emissão de som solitário ou em coro (BOULARD, 1990; SUEUR;
AUBIN, 2002).
Dentre os insetos emissores de som, as cigarras (Hemiptera: Cicadoidea) possuem
destaque. Nelas, a produção de som por estrutura específica é restrita aos machos
(BOULARD, 2006), tendo como principal função atrair fêmeas para fins de reprodução
(ALEXANDER; MOORE, 1958; COOLEY, 2001; SUEUR, 2003). Embora a região
Neotropical apresente alta diversidade de espécies de cigarras (METCALF, 1963; DUFFELS;
VAN DER LAAN, 1985; SANBORN, 2006, 2007a, 2007b), o número de trabalhos
publicados a respeito desse comportamento acústico é reduzido (SUEUR, 2001). Os trabalhos
mais recentes são os de Sueur (2002), com espécies mexicanas, e o de De Santis, Urteaga e
Bolcatto (2008) com uma espécie argentina, totalizando atualmente apenas quatorze espécies
estudadas. Destas espécies, Quesada gigas destaca-se não apenas por sua grande dimensão,
mas também por sua ampla distribuição, desde a América do Norte até as Antilhas
(MARTINELLI; ZUCCHI, 1997). Seu som foi descrito no México, na Guiana Francesa e na
Argentina (BOULARD, 1996; SUEUR, 2002; DE SANTIS; URTEAGA; BOLCATTO,
35
2008) onde, embora a estrutura macrotemporal seja semelhante entre as localidades, existe
considerável diferença na freqüência dominante.
Assim, o presente trabalho teve por objetivo avaliar as características envolvidas na
comunicação acústica de uma comunidade de cigarras e se o deslocamento de freqüência
dominante de Quesada gigas é devido à interferência interespecífica.
2 Material e Métodos
A coleta dos dados foi realizada em áreas arborizadas do Câmpus da UNESP, no
município de Jaboticabal-SP (lat. 21o 14’ S; lon. 48o 17’ W), no período de setembro de 2004
a abril de 2008. A região é caracterizada por período chuvoso de outubro a março (MINUZZI
et al.; 2007). Durante a coleta de dados, a temperatura variou de 27oC a 32oC.
Na primeira temporada (2004 – 2005) foi analisado o comportamento acústico das
espécies Quesada gigas, Fidicina mannifera, Dorisiana viridis, Dorisiana drewseni e
Dorisiana sp.. Nas demais temporadas (2005/2006, 2006/2007 e 2007/2008), além das
espécies citadas, foram analisadas as espécies Majeorona aper e Guyalna sp.. As espécies são
pertencentes à família Cicadidae, sendo Quesada gigas da tribo Hyantiini e todas as demais
da tribo Fidicinini. Amostra dos espécimes está depositada na Coleção Entomológica da
FCAV/UNESP e aos cuidados do Dr. Allen F. Sonborn (Barry University, School of Natural
and Health Sciences, Miami Shores, FL, USA).
Para o registro do som, foi utilizado o microfone unidirecional Le Son MP-68-PH
(respostas de freqüências 50 a 20.000 Hz, mono) ou o Sennheiser ME 66 (40 a 20.000Hz,
mono). Como gravador, foi utilizado o minidisc portátil Sony MDZ-R70 ou o gravador de
fitas DAT Sony TCD-D8, ambos com amostra de freqüência de 44.1 KHz, que permitiram
resposta de freqüência no campo de 20 a 20.000 Hz. Os sons foram transferidos para um
computador com o uso do programa Sony Sound Forge 7.0 (44.1 KHz, 16 bit, mono) e salvos
no formato .wav.
Amostras das gravações que foram consideradas adequadas, avaliando o tempo e a
ausência de interferência por ruídos externos, foram representadas graficamente através de
oscilograma (amplitude X tempo), sonograma (freqüência X tempo) e pelo espectro
(amplitude X freqüência). O oscilograma e o sonograma foram obtidos com o programa
Raven Lite 1.0, e o espectro de freqüência foi gerado através do programa Matlab 7.0.1,
através de transformação de Fourier com uma janela de 1.024.
36
A nomenclatura utilizada para a descrição do oscilograma foi baseada na seqüência
hierárquica apresentada em Sueur (2002), sendo: seqüências > partes > chamados > sílabas >
grupo de pulsos > pulsos > oscilações elementares.
O grupo de pulso foi nominado de tonal puro quando possuiu uma freqüência de onda
única e bem definida, e de som rouco, quando o som foi formado por uma combinação de
várias freqüências distintas e não-harmônicas.
Para determinar o período em que havia machos em atividade de canto, foram feitas
observações semanais em diferentes áreas em que era conhecida a presença das espécies. A
audição do som de apenas um macho foi suficiente para registrar a atividade da respectiva
espécie. Os resultados são apresentados como uma aproximação das quatro temporadas de
observação.
O horário em que os machos emitiram som foi determinado através de observações
realizadas nas mesmas áreas em que as gravações foram realizadas. Essa avaliação teve início
antes do sol nascer e perdurou até após o pôr-do-sol. Foram realizadas anotações em
intervalos de 10 minutos.
3 Resultados
3.1 Sazonalidade
Os períodos em que foram registrados os machos emitindo som, encontram-se na
Tabela 1. As espécies Quesada gigas, Majeorona aper, Guyalna sp., Fidicina mannifera,
Dorisiana viridis iniciaram a atividade de canto no mês de setembro. D. drewseni iniciou em
novembro, e Dorisiana sp., em janeiro. Dessas, Quesada gigas e Majeorona aper foram
registradas apenas por cerca de dois meses e meio, Guyalna sp., Fidicina mannifera e
Dorisiana viridis por cinco meses, Dorisiana drewseni por seis e Dorisiana sp por quatro
meses. Observa-se que, entre a segunda quinzena de setembro e a segunda quinzena de
novembro, as espécies Quesada gigas, Majeorona aper, Guyalna sp., Fidicina mannifera e
Dorisiana viridis emergiram concomitantemente. Após essa data até final de janeiro, ocorreu
Guyalna sp, Fidicina mannifera, Dorisiana viridis, Dorisiana drewseni, e apenas no último
mês a Dorisiana sp, entre fevereiro e abril coexistiram Dorisiana drewseni e Dorisiana sp.
Embora tenha havido o registro da emissão do som para algumas espécies em
setembro, a maior proporção do período de atividade acústica destas ocorreu no período
37
considerado chuvoso no local, não havendo nenhuma espécie que pudesse ser considerada
como associada à seca. Só não coexistem as espécies Quesada gigas e Majeorona aper com a
Dorisiana drewseni e Dorisiana sp. Esta última apresenta-se isolada das demais, menos da
Dorisiana drewseni.
Tabela 1. Registro semanal de machos de diferentes espécies de cigarra em atividade de canto. Jaboticabal-SP, 2004-2008.
mês setembro outubro novembro dezembro janeiro fevereiro março abril maio semana 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4
Q. gigas
M. aper
Guyalna sp ? ? ? ? ? ? ? ? ? ? ? ?
F. mannifera
D. viridis
D. drewseni
Dorisiana sp
O sinal “?” refere-se ao período em que foi ouvido som semelhante ao emitido pela espécie, porém a identificação não foi confirmada.
3.2 Descrição do som
3.2.1 Quesada gigas
Características do som:
Para essa espécie, foram analisados os sons gravados de dez espécimes, sendo apenas
um som de cada. O som emitido é composto por duas partes (Fig.1). A primeira tem um
tempo médio de 12,05s ± 6,70 (mínimo de 6,10 – máximo 25,08) e é formado por uma
sucessão de 60,93 ± 29,18 (27 – 123) chamados curtos. Cada chamado dura cerca de 0,05
segundo e é composto por uma sucessão contínua de 7 – 8 pulsos, que se iniciam baixos e vão
ampliando linearmente sua amplitude. À medida que se aproxima da segunda parte, outros
grupos de pulsos são produzidos nos intervalos, até que todo espaço seja ocupado. A segunda
parte dura 8,17s ± 1,67 (5,92 – 10,26) e consiste de um som contínuo, formado por um tonal
puro. A freqüência do som inteiro é de 1.705 Hz ± 32 (1.683 – 1.769) (Figs. 2 e 3). Um
mesmo indivíduo pode repetir as duas partes, sucessivamente, por inúmeras vezes.
38
Comportamento:
Essa espécie manteve-se nas partes altas das árvores sem incidência direta do sol,
formando agregados de vários indivíduos emitindo som ao mesmo tempo. Durante as
análises, havia grande quantidade dessa espécie, que emitiu som durante a alvorada (5h20)
por aproximadamente quinze minutos, reiniciando sua atividade próximo às 9h, emitindo som
em coro, de vários indivíduos, em intervalos irregulares e, algumas vezes distantes muitos
minutos um do outro. Essa seqüência de atividade de canto irregular ocorreu até o crepúsculo
(18h30), quando o coro se tornou contínuo e com maior número de indivíduos, perdurando até
após o pôr-do-sol.
A
D
C B
Figura 1. Oscilograma Quesada gigas. A. Canto inteiro (19,7s). B. Seqüência de chamados (5,40s). C. Quatro pulsos do som contínuo (0,015s). D. Único chamado com 7 pulsos (0,07s).
39
Figura 3. Quesada gigas. Sonograma do canto inteiro.
Figura 2. Quesada gigas. Espectro de freqüência de um canto inteiro.
Freqüência (Hz)
40
3.2.2 Majeorona aper Características do som:
Para essa espécie, foram analisados os sons gravados de dez espécimes, sendo apenas
um som de cada. O som emitido é composto por duas partes (Fig. 4). A primeira parte tem
duração média de 27,84s ± 7,30 (mínima de 18,23 – máxima de 40,40) e é formada por uma
sucessão de 107,36 ± 30,91 (65 – 148) chamados curtos. Cada chamado é formado por duas
sílabas. A primeira sílaba dura 0,05s ± 0,003 (0,05 – 0,06) e é formada por um tonal puro, e a
segunda dura 0,18s ± 0,021 (0,13 – 0,20) e trata-se de um som rouco. A segunda parte dura
7,10s ± 1,14 (5,02 – 8,73), possui modulações na amplitude, as quais formam 8,64 ± 1,20 (7 –
11) picos. Cada oscilação também é formada por duas sílabas. A primeira sílaba dura 0,46s ±
0,07 (0,36 – 0,65) e é formada por tonal puro, e a segunda dura 0,35s ± 0,09 (0,20 – 0,48) e é
um som rouco. A freqüência do som inteiro possui duas harmônicas de alta intensidade, sendo
a primeira 2.808 Hz ± 102 (2.718 – 3.021) e a segunda 3.000 Hz ± 50 (2.934 – 3.107) (Fig. 5)
Essas freqüências são características da primeira sílaba de ambas as partes da seqüência do
som emitido. Ainda há uma banda larga de freqüência ao redor dos 12.343 Hz ± 470 (11.425
– 13.419). Esta possui intensidade muito inferior que as citadas anteriormente e é
característica da segunda sílaba (Fig. 6).
Comportamento:
Permaneceram nas partes altas das árvores sem incidência direta do sol e formaram
coros de vários indivíduos, principalmente durante o crepúsculo. Quando isolado, o macho
canta repetidas vezes no mesmo local. Podendo emitir um canto curto similar à primeira
sílaba da segunda parte. Emitiu som desde a alvorada até o crepúsculo.
41
G F E
C B
A
D
Figura 4. Oscilograma Majeorona aper A. Aproximadamente metade da primeira parte junto com o total da segunda parte (17s). B. Seqüência de dois chamados (0,4s). C. Dois conjuntos de oscilações da segunda parte (2,0s). D. Quatro pulsos da primeira sílaba de um chamado (0,01s). E. Três pulsos da segunda sílaba de um chamado (0,02s). F. Quatro pulsos da primeira sílaba de uma oscilação (0,01s). G. Quatro pulsos da segunda sílaba de uma oscilação (0,01s).
42
Figura 6. Majeorona aper. Sonograma de um canto inteiro.
Figura 5. Majeorona aper. Espectro de freqüência de um canto inteiro.
Freqüência (Hz)
43
3.2.3 Fidicina mannifera
Característica do som
Foram observadas duas emissões distintas para essa espécie e para cada uma foram
analisados os sons gravados de dez espécimes, sendo apenas um som de cada indivíduo. Um
tipo de emissão trata-se de um chamado curto e contínuo que aumentou rapidamente de
intensidade e cessou abruptamente (Fig. 7). Esse som tem cerca de 0,59s ± 0,05 (0,48 – 0,68)
e possui freqüência predominante de 9.828 Hz ± 0,769 (8.803 – 11.478) (Figs. 8 e 9). O outro
é um som longo, formado por duas partes (Fig. 10). A primeira tem duração de 15,42s ± 4,24
(12,23 – 25,07) e é contínuo, com gradativo aumento de intensidade. Essa parte é formada por
uma seqüência de grupos compostos de seis pulsos. A segunda parte é formada por uma
regular modulação de amplitude, que totalizou 14,8 ± 1,7 (13 – 18) picos e tem o tempo de
7,91s ± 0,59 (7,05 – 8,73). A parte com menor amplitude (primeira sílaba) é formada por
tonal puro, e a parte de maior amplitude (segunda sílaba) é de som rouco. A freqüência
predominante do canto inteiro é de 4.250Hz ± 262 (3.754 – 4.574), seguida de uma banda
larga com freqüência dominante em 11.812 ± 641 (11.113 – 12.630) (Fig. 11). O pico da
freqüência predominante é definido pela primeira parte do canto e pela primeira sílaba da
segunda parte, a banda larga de freqüência é definida pela segunda sílaba (Fig. 12). A razão
de intensidade entre as duas partes do som pode variar.
Comportamento
Permaneceram no tronco, a poucos metros do solo, até a copa das árvores, às vezes
formando agregados de vários indivíduos em uma mesma árvore. No primeiro período de
coleta de dados (2004/2005), houve, no local de observação, maior densidade dessa espécie
que nos períodos subseqüentes (2005/2006, 2006/2007 e 2007/2008). No primeiro período,
houve um curto período de emissão de som entre 5h e 5h20, o que representou a alvorada.
Essa voltou a ocorrer às 8h e perdurou continuamente até às 15h. A emissão de som ocorreu
novamente no crepúsculo, que foi entre 18h30 e 19h10. Nos demais períodos, a emissão do
som na alvorada e no crepúsculo foi igual à que ocorreu no primeiro, mas a atividade no
decorrer do dia foi formada por irregulares períodos de atividade. Quando isolada, cantou uma
ou duas vezes e voou.
44
A
D
C B
E
Figura 7. Oscilograma de um chamado de Fidicina mannifera. A. Chamado inteiro (0,55s). B. Grupo de pulsos do início do chamado (0,05s). C. Grupo de pulsos do final do chamado (0,05s). D. Detalhe de três pulsos do início do canto (0,009s). E. Detalhe de dois pulsos do final do canto (0,007s).
45
Figura 9. Fidicina mannifera. Sonograma de um chamado.
Figura 8. Fidicina mannifera. Espectro de um chamado. Freqüência (Hz)
46
Figura 10. Oscilograma Fidicina mannifera. A. Seqüência inteira (24s). B. Grupos de pulsos da primeira parte (0,22s). C. Dois conjuntos de oscilações da segunda parte (1,18s). D. Único grupo de pulsos da primeira parte (0,025s). E. Seqüência de pulsos da primeira sílaba da segunda parte (0,05s). F. Seqüência de pulsos da segunda sílaba da segunda parte (0,05s). G. Dois pulsos da primeira parte (0,007s). H. Três pulsos da primeira sílaba da segunda parte (0,007s) I. Dois pulsos da segunda sílaba da segunda parte (0,003s).
A
F E D
C B
HG I
47
Figura 12. Fidicina mannifera. Sonograma da seqüência.
Figura 11. Fidicina mannifera. Espectro da seqüência inteira.
Freqüência (Hz)
48
3.2.4 Dorisiana viridis
Característica do som:
O som é formado por seqüência de chamados curtos (Fig. 13). Foram analisados os
sons gravados de dez machos, dos quais foram analisados dois chamados de cada um. Uma
seqüência é separada da outra por um intervalo de tempo de 14,03s ± 5,30 (5,51 – 33,29) e é
constituída por 26,2 ± 11,2 (7 – 86) chamados, com duração de 0,212s ± 0,036 (0,162 –
0,296) cada um. O tempo entre os chamados é de 0,225 ± 0,061 (0,094 – 0,382). O chamado é
formado por um som rouco. O espectro do som possui duas harmônicas de alta intensidade,
uma em 4.355 ± 557 (3.582 – 5.005) e outra na faixa dos 13.089 ± 826 (11.435 – 14.326)
(Figs. 14 e 15).
Comportamento:
Iniciou a emissão de som quando já havia grande incidência de sol, em torno das 8h30,
e seguiu sem intervalos até o final do crepúsculo, próximo às 19h10. Durante o crepúsculo,
apresentou maior intensidade de canto. Permaneceram em locais sombreados nos troncos, a
poucos metros do solo, até a copa das árvores. Foram observados pequenos agregados.
Aparentemente, o canto foi sincronizado entre indivíduos.
49
Figura 13. Oscilograma Dorisiana viridis. A. Duas seqüências de chamados (30s). B. Cinco chamados de uma seqüência (1,8s). C. Oito pulsos de um chamado (0,015s). D. Detalhe de dois pulsos (0,003s).
D
C
B
A
50
Figura 14. Dorisiana viridis. Espectro de uma seqüência de chamados.
Figura 15. Dorisiana viridis. Sonograma de uma seqüência de chamados.
Freqüência (Hz)
51
3.2.5 Dorisiana drewseni
Característica do som:
O som é formado por dois tipos de chamados curtos (Fig. 16). Um é emitido com
maior freqüência, tem duração de 0,114s ± 0,016 (0,086 – 0,149), separado do outro igual por
2,42s ± 2,52 (0,21 – 12,86) e possui freqüência de 14.009 Hz ± 692 (12.514 – 15.966). Esses
resultados foram obtidos através da análise do som gravado de sete indivíduos, totalizando 72
chamados. O outro, quando emitido, é sempre seguindo o primeiro e pode vir em seqüência
de até seis seguidos, tem duração de 0,063s ± 0,009 (0,049 – 0,083), é separado do outro por
0,15s ± 0,03 (0,10 – 0,22) e possui freqüência de 14.553 Hz ± 540 (13.075 – 15.534). Os
resultados obtidos para esse tipo de chamado foram a partir da análise do som gravado de
quatro indivíduos, totalizando 48 chamados. O espectro de freqüência de uma seqüência dos
dois chamados é apresentada na Figura 17. O primeiro chamado tem uma banda de baixa
freqüência que o segundo não apresenta (Fig. 18).
Comportamento:
Permaneceram nos ramos mais finos das árvores, geralmente com incidência de sol.
Algumas vezes, os machos cantaram próximos, porém não formam coro, mas um pode
responder ao chamado do outro. Geralmente, apenas uma seqüência do chamado mais forte,
sendo os outros chamados mais fracos comuns apenas em respostas a outros machos. Iniciou a
emissão quando já havia incidência de sol, por volta das 8h, perdurando durante o dia, mas foi
observado grande número de indivíduos em atividade durante o crepúsculo e o início da noite.
52
D C
B
A
F E
Figura 16. Oscilograma Dorisiana drewseni. A. Seqüência de chamados (10,8s). B. Seqüência de um chamado longo seguido por quatro curtos (0,78s). C. Chamado longo (0,09s). D. Chamado curto (0,06s). E. Seqüência de seis pulsos de um chamado longo (0,003s). F. Seqüência de sete pulsos de um chamado curto (0,004s)
53
Figura 18. Dorisiana drewseni. Sonograma de uma seqüência de um chamado longo e quatro curtos.
Figura 17. Dorisiana drewseni. Espectro de uma seqüência de um chamado longo e quatro curtos.
Freqüência (Hz)
54
3.2.6 Dorisiana sp.
Característica do som:
Formado por uma sucessão contínua de chamados curtos que pode durar alguns
minutos (Fig. 19). Foram analisados os sons gravados de cinco machos, dos quais se
utilizaram dez chamados de cada. Cada chamado dura 0,169s ± 0,041 (0,119 – 0,267) e é
distanciado do outro por 0,125 ± 0,024 (0,082 – 0,195). A freqüência predominante é em
6.890 Hz ± 0,159 (6.643 – 7.077) (Figs. 20 e 21). Comportamento:
Permaneceram nos ramos mais finos das árvores, geralmente com incidência de sol,
onde formam agregados de muitos indivíduos que emitem som ao mesmo tempo. Iniciou a
emissão de som quando já havia incidência de sol, por volta das 8h, sendo mais intensa com o
sol a pino, entre 11 e 13h, perdurando até o crepúsculo.
Figura 19. Oscilograma Dorisiana sp. A. Parte de uma seqüência de chamados
(12,3s). B. Seqüência de nove chamados (2,1s). C. Dois chamados (0,476s). D. Grupo de cinco pulsos (0,008s).
A
B
C
D
55
Figura 21. Dorisiana sp. Sonograma de uma seqüência de treze chamados.
Figura 20. Dorisiana sp. Espectro de uma seqüência de treze chamados.
Freqüência (Hz)
56
3.2.7 Guyalna sp.
Característica do som:
Formado por um som contínuo que pode durar vários minutos. O som é formado por
seqüências de dois grupos de pulsos, sendo um de maior amplitude que o outro (Fig. 22). A
análise de freqüência foi realizada a partir das gravações de sete machos, sendo que, de cada
um, foram analisados dois intervalos de dez segundos. O espectro de freqüência apresenta um
pico na faixa dos 7.576 Hz ± 193 (7.336 – 7.940) e outra banda muito larga e de menor
intensidade em torno dos 11.000 Hz (Fig. 23 e 24). O pico definido é determinado pelos
grupos de pulsos de maior amplitude, e a banda de freqüência mais larga e de menor
intensidade pelos pulsos de menor amplitude.
Comportamento:
Os sons foram gravados a partir de grupos de insetos que se encontravam no tronco de
pequenos arbustos e em mourões de cerca, sempre com incidência de sol. Alguns indivíduos
permaneciam na copa de árvores próximas a este local. No ato da emissão do som, os machos
permaneceram com a cabeça voltada para baixo.
Quanto ao período em que houve machos dessa espécie, emitindo som, ocorreu em
todos os dias de outubro, quando foi observado um grande número de indivíduos em atividade
pousada, em locais entre um e dois metros do solo. Nesses locais, foram realizadas as
gravações e as coletas de exemplares. Já no período de novembro e janeiro, foi ouvido um
som muito semelhante ao anteriormente registrado, porém os indivíduos permaneceram no
topo das árvores mais altas, inviabilizando as gravações que permitiriam comparações.
57
Figura 22. Oscilograma Guyalna sp. A. Parte do som emitido (13,6s). B. Seqüência de grupos de pulsos (0,11s). C. Seqüência de sete pulsos de menor amplitude e seis de maior (0,02s). D. Quatro pulsos de amplitude menor (0,005). E. Quatro pulsos de amplitude maior (0,006).
ED
C
B
A
58
Figura 24. Guyalna sp. Sonograma de treze segundos do som emitido.
Figura 23. Guyalna sp. Espectro de treze segundos do som emitido. Freqüência (Hz)
59
4 Discussão
As análises do comportamento acústico de cada espécie estudada são apresentadas na
Tabela 2. Nesta, nota-se que cada espécie possui um conjunto de características referentes ao
comportamento acústico único.
Tabela 2. Espécies de cigarras, período de emissão do som, localização dos machos, tipo de som e freqüências de maior intensidade.
A respeito da sazonalidade, Young (1981a) separa as cigarras como associadas ao
período seco, ao período chuvoso ou como sendo de transição entre a estação seca e a
chuvosa. As espécies Quesada gigas e Majeorona aper devem ser consideradas como
transicionais, pois estão presentes na estação seca, por um período considerável em relação ao
seu período total. Para a primeira espécie, essa constatação condiz com o registro em outras
localidades (YOUNG, 1981b; WOLDA, 1989; SUEUR, 2002). Todas as demais espécies são
consideradas como associadas à estação chuvosa. Essa constatação difere dos resultados
obtidos por Sueur (2002). Sendo a umidade do ar um fator relevante na transmissão sonora
(HENWOOD; FABRICK, 1979), talvez influencie na divergência da sazonalidade entre
regiões.
Uma alocronia interessante é observada entre as espécies Dorisiana viridis e
Dorisiana sp. Enquanto a primeira teve o som ouvido de outubro a janeiro, a segunda foi de
janeiro até abril. O som emitido por ambas é extremamente semelhante em estrutura, sendo
talvez a diferença na sazonalidade devido interferência na comunicação acústica. Um
resultado semelhante é apresentado por Wolda (1993) para duas espécies do Panamá. Young
Espécie Período (mês)
Posição na árvore
Tipo de som Freqüência (Hz)
Q. gigas set a nov copa Chamados + contínuo 1.705
M. aper set a nov copa Chamados + oscilações de amplitude
2.878
Guyalna sp set a jan copa + tronco Contínuo 7.576
F. mannifera set a fev copa + tronco Contínuo + oscilações de amplitude
4.250
D. viridis set a fev copa + tronco Chamados 4.355 e 13.089
D. drewseni nov a abr copa Chamados 14.553
Dorisiana sp jan a abr copa Chamados 6.890
60
(1981a) sugere que o fator determinante do período sazonal de uma cigarra é a interferência
acústica interespecífica.
A maior atividade das cigarras na alvorada e no crepúsculo é característico de diversas
espécies neotropicais (YOUNG 1972, 1975, 1981a, 1981b; WOLDA, 1993; SUEUR, 2002;).
Vantagens na transmissão sonora determinada pelas condições abióticas nesses períodos
(HENWOOD; FABRICK, 1979; YOUNG, 1981b) ou defesa contra predação (WOLDA,
1993) têm sido utilizadas como justificativa dessa atividade conjunta. Porém, o real valor
desse comportamento ainda continua incerto. Uma boa discussão a respeito é fornecida por
Sueur (2002).
Para as espécies Majeorona aper, Dorisiana viridis e Dorisiana drewseni, esta é a
primeira descrição do som emitido. O som da Dorisiana sp. não se identificou aos das
espécies, já descrito para o gênero (SUEUR, 2000, 2002; BOULARD, 1996); assim, este
também é o primeiro relato para a espécie. O som da Guyalna sp aqui registrada assemelha-se
à descrição do som da Guyalna cuta, gravado na Guiana Francesa (BOULARD, 1990).
Ambos são contínuos e apresentam as freqüências de maior intensidade próximas, porém
diferem nitidamente nas freqüências em que os pulsos ocorrem e nas bandas de freqüência.
Devido a essas diferenças, foram consideradas como espécies distintas.
Young (1981a) citou o som de Fidicina mannifera na Costa Rica, em uma área com
baixa densidade populacional, como sendo um intenso zumbido agudo e pulsante que ocorreu
por cerca de 15 – 20 minutos na alvorada e no crepúsculo. Cocroft e Pogue (1996) citaram o
comportamento social e a comunicação de Fidicina mannifera no sudeste do Peru. Esses
autores sugerem que o curto chamado tem um papel na interação de competição entre esses
machos. Essa informação corrobora o observado em campo, onde dois machos em um mesmo
ramo cantam alternadamente e atraem-se a um “corpo a corpo”, no qual, logo após, um dos
machos alça vôo. O outro som descrito por Cocroft e Pogue (1996) seria correspondente ao
som mais longo, porém, o descrito pelos autores corresponderia apenas à segunda parte do
aqui registrado, sendo a primeira parte praticamente inexistente. Com relação à freqüência,
para a Fidicina mannifera do Peru, a freqüência dominante está entre 4.6 – 5.6 KHz, que pode
ser considerado um pouco acima da registrada neste estudo. A descrição do som emitido por
Fidicina mannifera, apresentada neste trabalho, e a de Cocroft e Pogue (1996) são
extremamente semelhantes à apresentada por Boulard (1996) como pertencente a Fidicinoides
pseudethelae, havendo possivelmente um engano na atribuição da gravação a esta espécie.
61
A forma geral do som emitido por Quesada gigas é semelhante a todos os registrados.
Porém as freqüências predominantes diferem consideravelmente entre as localidades (Tabela
3).
Tabela 3. Localidades de registro do som emitido por Quesada gigas e respectivas
freqüências dominantes.
Localidade Freqüência (Hz) Referência
México 2.240 Sueur (2002)
Guiana Francesa 2.600 Boulard (1986)
Brasil 1.705 Presente trabalho
Argentina 1.290 De Santis et al., (2008)
A espécie cuja freqüência dominante está mais próxima de Quesada gigas, e assim
poderia ser uma competidora direta, é Majeorona aper. Porém, elas estão presentes ao mesmo
tempo e emitem som no mesmo estrato vertical. Dado o grau de complexidade da relação
intra-específica emissor-receptor (ENDLER, 1992), é mais plausível a sugestão de que, antes
da alteração na estrutura do som, outras formas de segregação interespecífica ocorram, como
diferenças sazonais ou no estrato vertical (WOLDA, 1993; SUEUR, 2002; SUEUR;
PUISSANT, 2002; SUEUR; AUBIN, 2003a, 2003b).
As diferenças nas freqüências de Quesada gigas não devem ser atribuídas a possíveis
diferenças nas temperaturas regionais, pois, segundo Sanborn et al. (1995), essa espécie é
endotérmica, sendo assim capaz de manter suas características acústicas em diferentes
condições de temperatura (VILLET; SANBORN; PHILLIPS, 2003). Existe correlação entre o
tamanho do cicadídeo e a freqüência do som emitido (BENNET-CLARK; YOUNG, 1994). O
tamanho pode variar consideravelmente devido à fonte alimentar (CUMBER, 1952; WHITE;
LLOYD, 1985). Assim, seria interessante uma análise morfométrica dessa espécie,
comparando as diferentes regiões.
62
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63
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67
CAPÍTULO IV
Desenvolvimento de armadilha sonora para o controle da cigarra Quesada gigas
(Olivier, 1790) (Hemiptera: Cicadidae)
RESUMO – A cigarra Quesada gigas (Hemiptera: Cicadidae) é considerada praga-chave na
cultura do café (Coffea arabica) e no reflorestamento de paricá (Schizolobium amazonicum).
O controle dessa espécie é dificultado devido ao hábito subterrâneo das ninfas e ao fato de os
adultos permanecerem nas partes altas das plantas. Já foi constatada para essa espécie a
fonotaxia positiva para alto-falantes transmitindo seu som. Assim, o presente trabalho teve
por objetivo desenvolver uma armadilha sonora específica para Q. gigas. A armadilha sonora
desenvolvida possuía um drive para CD, alto-falantes, base que sustentava uma haste vertical
com 2,2 metros de altura, no topo desta haste um divisor de onde, lateralmente, saíam quatro
tubos de alumínio com 0,5 metro de comprimento e, portando, na extremidade, o bico de
pulverização de inseticida. O divisor era conectado à bomba através de mangueira que
passava pelo interior da haste vertical. Na haste, abaixo do divisor, foram fixados dois alto-
falantes. O som transmitido foi gravado da Q. gigas em campo. O protótipo foi testado em
lavoura de café, no município de Cajuru-SP. Foram comparados dois tratamentos: aplicação
de água (testemunta) e aplicação de calda Karate Zeon 50 CS (Lambdacialotrina), na
concentração de 2%. Das cigarras pulverizadas, foram coletadas 40 para cada tratamento,
divididas em quatro repetições. Foram mantidas em sacos de voile com 20 cm de diâmetro
por 40 cm de altura. A calda pulverizada foi coletada por anteparos de tecido que a
direcionam novamente para a bomba, tratando-se assim de um sistema fechado de
pulverização. As cigarras foram atraídas em grande número e passaram pela calda pulverizada
normalmente. Após 1 hora, 85% das cigarras tratadas estavam mortas, na testemunha todas
permaneceram vivas.
68
Development of acoustic trap to control the cicada Quesada gigas (Olivier, 1790)
(Hemiptera: Cicadidae)
ABSTRACT – Cicada Quesada gigas (Hemiptera: Cicadidae) is considered key pest in the
coffee crop (Coffea arabica) and in paricá forest (Schizolobium amazonicum). The control of
this species is difficult because of the underground behavior of nymphs and the adults stay on
tree canopies. It has already established the positive phonotaxic behavior to speakers
broadcasting its own song. The purpose of this work was to develop a specific acoustic trap to
Q. gigas. The acoustic trap developed had a CD drive, speakers and a base that bore a vertical
mast with 2.2 meters high. At the top of this mast there was a divider where gone out laterally
four tubes with 0.5 meter long bearing in the other end an insecticide spray nozzle. The
divisor was connected with the pump by a hose that passed inside of the vertical mast. On the
mast, below the divisor, were fixed two speakers. The song broadcasted was recorded from
the Q. gigas in field. The prototype was tested in a coffee plantation, in Cajuru, SP. It was
compared two treatments: spray of water (control) and spray of a Karate Zeon 50 CS
(Lambdcyhalotrin) solution at 2%. From the cicadas that were sprayed, 40 were collected for
each treatment, and divided in four replications. They were maintained in nylon net bags with
20 cm of diameter by 40 cm of length. Spray system was a closed system where the sprayed
liquid was collected by stretched fabric and directed to the pump. The cicadas were attracted
in high number and they crossed the spray solution normally. After 1 hour 85% of cicadas that
were treated died, whereas in the control group, all of them were alive.
69
1 Introdução
A destruição de habitats nativos para a implantação de monoculturas causa sério
desequilíbrio na interação dos insetos com seus hospedeiros naturais. Esse desequilíbrio
muitas vezes contribui para que as espécies se associem às plantas cultivadas, podendo tornar-
se praga.
Os cicadídeos podem causar injúria às plantas no estágio de ninfa, através da sucção
da seiva na raiz, no estágio adulto, ao sugarem seiva na parte aérea da planta e no ato da
oviposição (BEAMER, 1928).
As cigarras são reconhecidas como praga em algumas culturas, Mogannia minuta em
cana-de-açúcar no Japão (HAYASHI, 1976), Fidicina mannifera em erva-mate na Argentina
(PACHAS, 1966), espécies do gênero Magicicada spp., que são consideradas pragas na
cultura da maçã e em algumas plantas de valor ornamental nos Estados Unidos (WHITE;
STREHL, 1978; WHITE; LLOYD, 1979).
No Brasil, várias espécies de cigarra foram consideradas praga na cultura do café
(MARTINELLI; ZUCCHI, 1997). A espécie mais prejudicial ao cafeeiro é Quesada gigas
(Olivier, 1790), que infesta principalmente os plantios de Minas Gerais e São Paulo, onde é
predominante e considerada praga-chave (MARTINELLI; LUSVARGHI, 1998). Foram
registradas, em ataques intensos, até 400 ninfas por cova de cafeeiro, o que pode levar a
planta à morte (SOUZA; REIS; SILVA, 2007; GALLO et al., 2002).
Ainda Q. gigas foi constatada causando dano na cultura florestal do paricá
(Schizolobium amazonicum) nos Estados do Maranhão e Pará, onde causou a morte do
hospedeiro quando em alta infestação (ZANUNCIO et al., 2004; ALBINO; ZANETTI, 2006).
Atualmente, o meio mais eficiente de controlar as cigarras é através do uso de
inseticidas sistêmicos aplicados no solo, visando a eliminar as ninfas que sugam a seiva da
raiz do hospedeiro (MARTINELLI; LUSVARGHI, 1998; SOUZA; REIS; SILVA, 2007).
A característica mais marcante no comportamento das cigarras é a emissão de som,
este principalmente com fins reprodutivos. O som dos machos, a partir de pontos fixos, atrai
fêmeas até eles (COOLEY, 2001). As cigarras ainda podem apresentar comportamento de
emissão de som em coro e nesse caso o som atrai ambos os sexos (ALEXANDER; MOORE,
1958; VILLET, 1992; SUEUR; AUBIN, 2002; SUEUR, 2003), como na espécie Q. gigas,
que se agrega em grande número, e os machos emitem som juntos (BOULARD, 1990;
SUEUR 2002). Através de experimento comportamental, ficou constatada a atração de grande
70
número de Q. gigas adultas e de ambos os sexos através do seu próprio som reproduzido por
playback (MARTINELLI et al., 2006).
Se determinada espécie exibe fonotaxia positiva de longa distância para uma fonte
emissora de som, essa espécie é propícia a ser capturada por armadilha que use esse recurso
como isca. O uso do som como isca para a captura de insetos é utilizado para um grupo muito
discreto de espécies. Em geral, tem sido utilizado para mosquitos (IKESHOJI; YAP, 1990),
mosca-das-frutas (MANKIN et al., 2004; MIZRACH, 2005), alguns dípteros taquinídeos
(WALKER, 1993) e, principalmente, para grilos (WALKER, 1988, 1996).
Embora em alguns casos grande número de insetos-alvo seja capturado, o uso desse
método é dado principalmente para coleta com fins de pesquisa e não como forma de
supressão populacional de espécies-praga (WALKER, 1996). Ainda segundo esse autor, isso
se deve ao alto custo de obtenção e operação desses equipamentos, ao curto alcance efetivo,
ao fato de, em alguns casos, não atuar sobre o objeto-alvo da população, ou ainda devido ao
inseto atraído não chegar perto suficiente para a ação da armadilha.
Assim, o objetivo do presente trabalho foi desenvolver um protótipo de armadilha
associado à isca sonora para o controle de Q. gigas.
2 Material e métodos
2.1 Montagem do protótipo
Para a montagem do sistema de pulverização, foi utilizada uma estrutura em metal,
fibra de vidro e tecido. O bombeamento da solução a ser pulverizada foi feito através de um
conjunto moto-bomba elétrica 12 volts tipo diafragma, marca Shurflo, modelo 2088-344-590,
com capacidade de vazão de 12,5 L/min. Para a pulverização, foram utilizados bicos modelo
TM IA 1.0 Magno. Ele propicia pulverização em jato plano defletido e com gotas de tamanho
grosso a extremamente grosso.
O som utilizado para a atração de Q. gigas foi escolhido a partir de gravações
ocorridas nos meses de setembro e outubro de 2005 e 2006, no Câmpus da
UNESP/Jaboticabal. Estas foram realizadas com o uso do gravador Sony MDZ-R70
conectado a um microfone Le Son MP-68-PH (mono; resposta de freqüência: 50 a 20.000
Hz). Os sons foram transferidos para um computador com o uso do programa Sony Sound
Forge 7.0 (44.1 KHz, 16 bit, mono) e salvos no formato .wav. Do som escolhido, foi separado
71
um trecho com cerca de três segundos, que foi editado, com o mesmo programa da
transferência, replicando o trecho até totalizar dois minutos. Posteriormente, a faixa editada
foi gravada em CD.
A transmissão do som foi feita através de um toca CD Sony modelo CDX-S 2007 XG
conectado a dois alto-falantes Selenium D250-X acrescidos de cornetas Selenium HL 14-25.
Esse conjunto permite resposta de freqüência entre 400 a 9.000 Hz. A faixa foi repetida
automaticamente durante todo o período do experimento.
Para o funcionamento do sistema de som e de pulverização, foi utilizada uma bateria
automotiva de 12 volts.
2.2 Teste de eficiência do protótipo
O experimento de campo para teste de eficiência do protótipo da armadilha sonora foi
realizado no dia 26 de outubro de 2006, na Fazenda Mundo Novo, Cajuru-SP. A armadilha
sonora foi colocada sobre uma carreta engatada em um trator, sendo estacionado em um
talhão de café com a infestação de cigarra constatada. O experimento teve início às 10h20,
com temperatura entre 26o – 29oC.
O experimento consistiu de dois tratamentos, com quatro repetições. Cada repetição
possuía dez cigarras, independentemente do sexo. Os tratamentos foram:
- Tratamento 1: pulverização de água sobre as cigarras, considerado testemunha;
- Tratamento 2: pulverização com Karate Zeon 50 CS (Lambdacialotrina) na
concentração de 2%.
Na área interna da armadilha, foram fixadas tiras de tecido de algodão branco, com
30cm de largura por 80cm de comprimento, para que as cigarras, após a pulverização,
pousassem, possibilitando assim sua coleta.
As cigarras coletadas foram mantidas em sacos de voile com 20 cm de diâmetro por 40
cm de comprimento. Cada saco foi fechado e conservado em locais sombreados (Figura 1).
As avaliações foram realizadas até a constatação da morte da maioria dos indivíduos
que receberam pulverização da calda, quando então foi feita a contagem final. Os resultados
foram analisados através da porcentagem de mortalidade, e as médias, comparadas pelo teste
de Tukey, a 5% probabilidade.
72
2.3 Regiões com potencial para uso da armadilha sonora
A fim de determinar algumas regiões cafeeiras onde o uso da armadilha pudesse ser
indicado, foi realizado, na primeira quinzena de outubro de 2007, teste de atração em
diferentes localidades produtoras de café. Para isto, foi utilizado o mesmo sistema de som da
armadilha. O teste consistiu em transmitir o som por alguns minutos, e, havendo a atração de
cigarras, a localidade foi considerada com potencial para o uso da armadilha.
3 Resultados
3.1 Montagem do protótipo
O protótipo desenvolvido possuía a base que sustentava uma haste vertical com 2,2
metros de altura. O topo dessa haste continha um divisor, com quatro tubos de alumínio de
0,5 metro de comprimento e, portando, na extremidade, bicos de pulverização. O divisor foi
conectado à bomba através de uma mangueira passada pelo interior da haste vertical. Também
nesta haste vertical, abaixo do divisor, foram presos os dois alto-falantes, um direcionado para
o lado oposto do outro (Figuras 2; 3 e 4).
Figura 1. Sacos contendo cigarras pulverizadas. Cajuru-SP. Outubro, 2006.
73
A calda pulverizada foi coletada por anteparos de tecido que direcionavam para a base
da armadilha. A base possuía uma declividade que conduzia a calda para um ralo central
coberto com uma tela, com abertura de 0,5 cm. Através desse ralo, a calda era redirecionada à
bomba, por mangueira, recomeçando o ciclo de pulverização.
3.2 Teste de eficiência do protótipo
O protótipo montado teve a capacidade de pulverizar o líquido, formando uma cortina
ao redor da fonte emissora de som. As cigarras atraídas passaram normalmente pela cortina
líquida, realizando vôo circular ao redor dos alto-falantes.
Através da avaliação das cigarras pulverizadas, constatou-se, após 1 hora da
pulverização, 85% de mortalidade dos indivíduos tratados com a calda inseticida, enquanto,
na testemunha, todas as cigarras permaneceram vivas após esse período (Tabela 1).
Tabela 1. Média da porcentagem de mortalidade de cigarras pulverizadas pelo protótipo.
3.3 Regiões com potencial para uso da armadilha sonora
O teste de atração foi realizado em vinte e quatro municípios do Estado de Minas
Gerais, compreendendo o Triângulo Mineiro e a região sul do Estado, e quatro municípios da
região nordeste do Estado de São Paulo (Tabela 2; Figura 5). Em todas as localidades, foi
constatada a atração.
Médias seguidas de mesmas letras nas colunas são semelhantes entre si, pelo teste de Tukey (P < 0,05).
Tratamentos Média da porcentagem de mortalidade
Karate 2% 851a
Testemunha 00b 1
74
Figura 2. Vista geral do protótipo da armadilha sonora. Cajuru-SP. Outubro, 2006.
Figura 3. Armadilha sonora em funcionamento. Cajuru-SP. Outubro, 2006.
75
75
Figura 4. Desenho esquemático do protótipo da armadilha sonora.
76
Tabela 2. Municípios com potencialidade para uso da armadilha sonora e respectivos números de plantas de café.
Localidade Número de plantas de café *
Minas Gerais Alfenas 20.988.954 Araguarí 21.028.315 Araxá 1.537.000 Arceburgo 1.220.500 Campo Belo 2.950.400 Campos Gerais 20.026.401 Cana Verde 2.096.793 Capitólio 1.651.810 Cascalho Rico 1.843.329 Estrela do Sul 2.483.595 Guaxupé 7.430.313 Ibiá 2.032.000 Iraí de Minas 1.794.015 Monte Belo 3.983.002 Monte Carmelo 21.724.580 Nepomuceno 14.471.789 Patrocínio 34.657.421 Perdizes 5.634.739 Pimenta 2.861.669 Piumhi 5.821.442 Santana da Vargem 8.697.716 São Sebastião do Paraíso 7.878.563 São Tomás de Aquino 3.543.630 Três Pontas 23.682.489 São Paulo Cajuru 2.033.178 Altinópolis 7.630.056 Santo Antônio da Alegria 949.400 Jaboticabal ** Total SP+MG 230.461.580
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77
4 Discussão
O único método de controle da Q. gigas até o momento é através de inseticidas
sistêmicos aplicados geralmente no solo. Esses inseticidas podem ser granulados, com a
aplicação em sulcos na projeção da copa do cafeeiro, ou ainda os inseticidas podem ser
solúveis em água e aplicados em sistema “drench” na base do tronco da planta ou como um
filete contínuo sob os cafeeiros (MARTINELLI; LIMA; MATUO, 2001; MATUO et al.,
2002; SOUZA; REIS; SILVA, 2007). Além do custo onerado pelo controle à produção, o
plantio do café é feito muitas vezes em locais de extrema declividade, com tendência à
erodibilidade do solo e conseqüente carregamento dos produtos fitossanitários, com a
possibilidade de contaminação ambiental, principalmente devido ao uso incorreto dos
granulados (FORNAZIER; ROCHA, 2000).
Atraentes associadas a armadilhas de insetos são importantes ferramentas para o
monitoramento e, em alguns casos, para o controle de pragas, atuando diretamente na redução
da população através da captura/morte massal (GALLO et al., 2002).
Figura 5. Localidades com potencial para uso da armadilha sonora.
78
As dificuldades citadas por WALKER (1996), que limitam o uso do som na supressão
da população de insetos-praga, não foram notadas no protótipo desenvolvido. As Q. gigas,
tanto machos como fêmeas, chegaram muito próximas à fonte emissora de som. A escolha do
sistema de pulverização como estratégia de ação contra as cigarras é adequada, pois basta o
inseto passar através da calda, não sendo necessário procurar uma passagem, como no caso de
outros modelos de armadilha sonora (WALKER, 1988, 1996).
Com a porcentagem de mortalidade alcançada, o protótipo mostrou-se com potencial
para o controle de Q. gigas. Apresenta vantagens com relação aos métodos convencionais de
controle, pois atua apenas sobre a espécie-alvo, e a calda utilizada não é pulverizada sobre as
plantas, não afetando diretamente outros organismos e não deixando resíduo. Ainda, por
tratar-se de um sistema de pulverização fechado, ou seja, onde a calda é continuamente
reciclada no processo de pulverização, este reduz consideravelmente o impacto ambiental e os
custos com o inseticida.
Nas localidades onde a atração foi comprovada, a armadilha sonora desenvolvida pode
ser recomendada para o controle da Q. gigas. Isso compreende uma região de grande
representatividade à cafeicultura nacional, sendo que, apenas a soma do número de plantas de
café nos municípios, onde foi realizado o teste de atração, corresponde a 12% do total de
plantas no Brasil (IBGE, 2008).
Diante das observações realizadas, tornam-se necessários estudos relativos aos
inseticidas a serem utilizados, inclusive os de origem natural e entomopatógenos, bem como
outros que sejam compatíveis com o sistema de cultivo de café orgânico.
Embora o protótipo tenha sido desenvolvido apenas para a espécie Q. gigas, o uso
poderá ser expandido para outras espécies, desde que elas também possuam o comportamento
de serem atraídas para o seu respectivo som.
79
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
De maneira geral, pesquisas sobre cigarras têm sido negligenciados na região
Neotropical, visto que, para a grande maioria das espécies estudadas, este é o primeiro relato
ecológico.
Todas as espécies que tiveram o período de emergência estudado, estão, de certa
forma, associadas ao período chuvoso, embora algumas iniciem a emergência um pouco
antes. Porém, o período de emergência de cada espécie é bem definido, havendo pouca
variação na data de início, sugerindo que a emergência esteja associada a algum fator
ambiental de ciclo mais constante que o das chuvas, muito provavelmente o fotoperíodo. Essa
característica é interessante, principalmente para as espécies associadas a plantas de valor
econômico, pois, através da previsão da revoada dos adultos, é possível antecipar medidas
para seu manejo. Seria importante a realização de estudos que correlacionassem a influência
do fotoperíodo na fisiologia das plantas hospedeiras e a conseqüência sobre a biologia das
cigarras.
A descrição do som de uma espécie é uma importante característica taxonômica,
podendo ser útil para resolver problemas com espécies crípticas ou, ainda, em inventários de
biodiversidade. O comportamento das cigarras estudas demonstrou que cada espécie possui
um nicho acústico que possivelmente reduz a interferência interespecífica na utilização do
som para fins reprodutivos. Embora, muito provavelmente, o principal fator de isolamento
sejam as diferenças na freqüência do som emitido, a competição interespecífica, por si só, não
justifica que uma mesma espécie tenha diferentes freqüências em diferentes localidades.
Outros fatores, como morfológicos, fisiológicos ou ainda outras formas de interações
ecológicas, devem possuir influência nas características do som emitido por uma espécie.
A possibilidade do uso da fonotaxia de determinados grupos de insetos pode tornar-se
uma importante ferramenta no manejo de pragas. O desenvolvimento da armadilha sonora
para Quesada gigas será de grande benefício para a cafeicultura brasileira. Pretende-se, com
sua implantação, reduzir os custos no controle dessa praga e, ainda, diminuir o impacto
ambiental causado pelo uso de agrotóxicos aplicados no solo. Para se determinar o real
potencial da armadilha sonora, são necessários estudos no campo visando a avaliar a redução
da população da praga em culturas afetadas e, também, testes de produtos que otimizem a
eficácia no controle, inclusive, entomopatógenos e inseticidas naturais.