Mente Zen, Mente de Principiante - Shunryu Suzuki.pdf
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MENTE ZEN,
MENTE DE PRINCIPIANTE
SHUNRYU SUZUKI
Editado por TRUDY DIXON com prefcio de HUSTON SMITH e introduo de RICHARD BAKER
Traduo de ODETE LARA
PALAS ATHENA
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NDICE
Prefcio, de Huston Smith 3 Prefcio edio brasileira, de Odete Lara Introduo, de Richard Baker 12 Prlogo: Mente de Principiante 19
PARTE I PRTICA CORRETA Postura 23 Respirao 27 Controle 30 As Ondas Mentais 32 As Ervas Daninhas da Mente 34 O Cerne do Zen 36 No Dualismo 39 Reverncia 42 Nada Especial 45
PARTE II ATITUDE CORRETA
O Caminho-Uno 51 Repetio 53 Zen e Empolgao 55 Esforo Correto 57 Sem Deixar Rastros 60 O Dar de Deus 63 Erros na Prtica 67 Limitando sua Atividade 70
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Estudar a Si Mesmo 72 Polir uma Telha 75 Constncia 79 Comunicao 82 Negativo e Positivo 86 Nirvana, a Queda D'gua 88
PARTE III COMPREENSO CORRETA O Esprito Tradicional 95 Impermanncia 98 A Qualidade do Ser 101 Naturalidade 104 Vacuidade 106 Estar Alerta - Estar Consciente Acreditando no Nada 112 Apego e No-Apego 115 Quietude 118 Experincia, no Filosofia 120 Budismo Original 122 Alm da Conscincia 124 Iluminao do Buda 128
Eplogo: Mente Zen 131
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Prefcio
Dois Suzukis. Meio sculo atrs, num transplante equiva-lente em importncia histrica s tradues latinas de Aristte-les no sculo XVIII, e s de Plato no sculo XV, Daisetz Suzuki trouxe o Zen para o Ocidente. Cinqenta anos mais tarde, Shun-ryu Suzuki realizou algo de quase igual importncia. Neste seu nico livro, ele tocou aquela nota seqente que os americanos interessados no Zen necessitavam ouvir.
Enquanto o estilo Zen de Daisetz Suzuki era dramtico, o de Shunryu Suzuki simples. O ponto axial de Daisetz era o satori * e em grande parte foi o fascnio por esse extraordinrio estado mental que tornou seus livros to atraentes. No livro de Shunryu Suzuki as palavras satori e kensho (estado mental apro-ximado ao do satori) nunca aparecem.
Quando, quatro anos antes de sua morte, tive oportuni-dade de perguntar-lhe por que o satori no figurava em seu livro, sua esposa, inclinando-se para mim, cochichou com ar travesso: " que ele nunca o experimentou"; Roshi, ento, fingindo consternao, cutucou-a com o leque e colocando o indicador sobre os lbios, sussurrou-lhe: "Shhhhh! No con-te a ele!". Quando nossos risos se apagaram, ele disse: "No que o satori carea de importncia, mas no a parte do Zen que necessita ser acentuada".
Suzuki-roshi esteve conosco na Amrica por apenas 12 anos - um nico ciclo, segundo o modo oriental de contar os anos por dzias - mas foram o suficiente. Graas ao empenho deste
* Satori: a experincia da iluminao.
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homem mido e silencioso, existe hoje uma organizao do Soto Zen em pleno florescimento em nosso continente. Sua vida re-presentou to perfeitamente o Caminho Soto que o homem e o Caminho se fundiram. "Sua atitude isenta de ego no deu mar-gem a excentricidades nem fantasias. Ainda que como persona-lidade, no sentido mundano, ele no tenha provocado ondas nem deixado traos, a marca de suas pegadas segue uma linha reta no invisvel caminho da histria".* Seus monumentos so o pri-meiro mosteiro Soto Zen no Ocidente, o Zen Mountain Center em Tassajara, seu anexo na cidade, o Zen Center de San Francis-co, e, para o pblico em geral, este livro.
Sem deixar nada ao acaso, ele preparou seus estudantes para o momento mais difcil, quando sua presena visvel desapare-cesse no vazio: "Se, na hora de morrer, eu sofrer, est tudo bem. Vocs sabem; sofrimento de Buda. Nada mais que isso. Qui, nesse momento, todos nos debatamos por causa da agonia fsi-ca ou tambm da espiritual. Mas tudo isso est correto, no um problema. Devemos ser gratos por ter um corpo limitado... como o meu ou como o de vocs. Se tivssemos uma vida ilimi-tada, isso sim seria um verdadeiro problema".
E assegurou a continuidade de sua obra. Na cerimnia do Assento da Montanha, em 21 de novembro de 1971, ele desig-nou Richard Baker como seu herdeiro no Darma. O cncer j estava avanado e ele s pde acompanhar a procisso sustenta-do por seu filho. Mesmo assim, a cada passo, seu basto golpea-va o solo com o ao da determinao Zen refletida na serenida-de de sua pessoa. Baker aceitou o manto com um poema:
Este incenso Que guardei por longo, longo tempo, Eu ofereo com mo-nenhuma Ao meu Mestre, meu amigo, Shunryu Suzuki Daiosho, Fundador destes templos.
* De um tributo de Mary Farkas, in Zen Notes, Primeiro Instituto Zen da Amrica, janeiro, 1972.
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
Huston Smith Professor de Filosofia do Massachusetts Institute of Technology
No h medida para o que haveis feito. Andando convosco na branda chuva de Buda Nossos mantos se molham, Mas nas folhas de ltus Nenhuma gota permanece.
Duas semanas depois, o Mestre tinha se ido, e em seu fune-ral em 4 de dezembro, Baker-roshi falou multido ali congre-gada para render tributo:
"No h caminho fcil para ser um mestre ou um discpulo, embora seja a maior alegria desta vida. No h caminho fcil para quem vem a uma terra sem budismo e a deixa depois de trazer luz muitos discpulos, monges e leigos bem adiantados no caminho, e de mudar a vida de milhares de pessoas neste pas; no h caminho fcil para iniciar e nutrir um mosteiro, uma comunidade na cidade e centros de prtica na Califrnia e muitos outros lugares dos Estados Unidos. Mas este 'caminho no-fcil', esta obra extraordinria, era facilmente levada por ele que, da sua verdadeira natureza, deu-nos a nossa verdadeira na-tureza. Ele nos deixou tudo quanto um ser humano pode deixar, todo o essencial, a mente e o corao de Buda, o ensinamento e a vida de Buda. Ele est aqui em cada um de ns, se assim o quisermos."
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Prefcio Edio Brasileira
Longa e acidentada foi a histria desta traduo. Depois de ter vivido trs anos no Zen Center de San Francis-
co, fui fazer um estgio em seu mosteiro, o Zen Mountain Cen-ter, em Tassajara, nas montanhas de Carmel Valley.
A rigidez de horrios e disciplina consegui me adaptar de-pois de algumas semanas no mosteiro. Forem, o trabalho dema-siado duro e rude - devido ao primitivismo da regio - pesava alm da conta sobre minha compleio fsica frgil, se comparada robustez comum das mulheres e homens norte-americanos.
Para superar esse impasse tive a idia, depois de algum tem-po, de propor a Richard Baker, ento Roshi do Zen Mountain Center, que meu horrio de trabalho fosse preenchido com a tarefa de traduzir para o portugus o livro Miracle of Mindfulness do mestre Zen Thich Nhat Hanh. Sua leitura havia sido muito proveitosa para mim e acreditava que tambm o seria para meus compatriotas.
De mente bastante aberta, Baker-roshi compreendeu minha situao e, cauteloso em no abrir precedente, conseguiu uma forma de atender a minha solicitao sem contrariar as regras de trabalho do mosteiro: designou-me para a funo de recepcio-nista na cabine de entrada do mosteiro que, por estar num pero-do de treinamento intensivo, raramente recebia visitantes.
Antes de oficializar esse acordo, no entanto, Baker-roshi le-vantou uma questo: "Est certo que queira traduzir esse livro de indiscutvel valor mas, por que no o de Suzuki-roshi que foi o fundador deste mosteiro e seu nico livro, Zen Mind Beginner's Mind, est entre as mais procuradas obras budistas neste pas assim como nos pases em que j foi publicado?
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
Sua pergunta no me apanhou desprevenida, pois eu mes-ma j tinha acalentado essa idia, da qual desistira, e expliquei sinceramente a Baker-roshi a razo: "Ainda no estou preparada para traduzir Zen Mind Beginner's Mind e creio que, de certa for-ma, tampouco o leitor brasileiro o est para receb-lo. Minha intuio diz que um texto mais simples e de mais fcil assimila-o, alm de ser mais prprio para o momento atual, preparar o terreno para Zen Mind Beginner's Mind". Baker-roshi, bastante generoso e ele prprio ardoroso admirador de Thich Nhat Hanh, concordou.
Quando a traduo ficou pronta, depois de alguns meses, enviei-a Editora Vozes, no Brasil, que a publicou com o ttulo Para Viver em Paz (atualmente na \5- edio).
Depois de completar meio ano de estgio em Tassajara vol-tei comunidade do Zen Center de San Francisco, onde preten-dia continuar meu treinamento. Para poder pagar minha estada ali, como anteriormente, faria uma troca, em forma de servios prestados comunidade - no escritrio, na cozinha ou onde quer que se fizesse necessrio. Assim, aproveitava as poucas horas livres da noite para me dedicar, desta vez, traduo de Zen Mind Beginner's Mind. Sendo uma obra bastante complexa, achei que estava caminhando a passos demasiado lentos. Propus en-to, como fizera em Tassajara, preencher meu horrio de traba-lho com a traduo. Mas Reb Anderson, na poca responsvel pelo treinamento ali, no achou conveniente abrir tal exceo, mesmo porque esse centro urbano no oferecia uma condio propcia como acontecera em Tassajara.
Quis conformar-me com a situao mas, depois de algumas semanas, fui acometida por terrvel e permanente insnia, como acontece sempre que deixo de seguir a pista indicada pelo meu radar interior.
Procurei falar ento com Yvone Rand para ouvir sua opi-nio. Monja ordenada pelo prprio Suzuki-roshi, de quem fora uma das primeiras discpulas, Yvone vivia agora com o marido e a filha numa casa de campo prxima a Green Gulch Farm - co-munidade rural adjunta ao Zen Center, a apenas 50 quilmetros,
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
na regio de Mill Valley. Alm de pertencer diretoria do Green Gulch Farm, onde atuava como mestra e palestrante, Yvonc trabalhava junto a hospices dando assistncia espiritual a doen-tes terminais e orientando as famlias para que lhes dessem aten-dimento consciencioso e humano em lugar de releg-los aos ridos cuidados hospitalares. Isso aliviava o sofrimento de quem partia e, ao mesmo tempo, propiciava aos que ficavam maior entendimento da vida por haverem presenciado o processo da morte.
Depois de alguns dias de esclarecedora e amistosa conversa, Yvone chamou-me para uma grata notcia. Seu marido, o advo-gado William W Sterling, era fundador de uma instituio sem fins lucrativos - a Callipeplon Society - destinada preservao da cultura tibetana e, por estar a divulgao do budismo no Ocidente enquadrada em seus propsitos, a da Fundao se dis-punha, pelo menos por alguns meses, a custear minha estadia no Zen Center, desde que me dedicasse traduo de Zen Mind Beginne]s Mind em tempo integral. Foi o que de bom grado pas-sei a fazer.
Alguns meses mais tarde, no incio de 1984, tive que retor-nar ao Brasil. Presa a inmeras obrigaes, inevitveis aps uma ausncia de quatro anos no exterior, e sem contar mais com a ajuda da Callipeplon Society, dei continuidade traduo ape-nas esporadicamente, na medida em que a luta pela sobrevivn-cia o permitia.
Tempos depois, quando estava prestes a termin-la, soube que um praticante brasileiro, pertencente ao grupo Zen de Belo Horizonte, Sr. Fernando de Mello Guedes, por conta prpria tam-bm havia traduzido o livro sem saber de meu comprometimento com a mesma tarefa. Como proceder eticamente diante da situao?
Entrei em contato telefnico com o Sr. Mello Guedes, que ainda no conhecia, e depois de vrias conversaes chegamos a um comum acordo: ele enviaria seus originais e eu os compara-ria aos meus, o que propiciaria uma lapidao do texto, alm de eu fazer uso da ltima parte de sua traduo - o eplogo - j que
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eu mesma ainda no o havia terminado. Dessa forma, seu nome seria includo no trabalho desta traduo, o que ora fao ainda que ele prprio no o tenha requerido.
Mas as complicaes no cessaram por a. Conforme o combinado com Richard Baker, uma vez finda
a traduo, deveria ser-lhe enviada para devido exame e aprova-o. Foi o que fiz ao termin-la, por volta de 1987.
Um ano j havia transcorrido at receber notcias. Em sua carta, Richard Baker explicava a demora informando que de in-cio submetera o texto reviso do Sr. Antnio Feij, professor de Filosofia e Literatura Portuguesa e Inglesa na Universidade de Lisboa e, por acaso, seu genro. Mas que este, depois de exa-minar o texto achou por bem pass-lo ao Sr. Vitor Pomar, que julgava mais apto para esse trabalho visto ser o Sr. Pomar um reconhecido entendedor de budismo em Portugal, alm de fa-moso pintor e conhecedor do idioma ingls. Em anexo sua carta, Baker devolvia os originais que eu lhe havia enviado com todas as anotaes feitas pelo Sr. Vitor Pomar.
Ao examinar as correes verifiquei que algumas se deviam ao fato de eu, em minha ignorncia, ter me arvorado a fazer ligeiras adaptaes em certos trechos mais complexos para faci-litar o entendimento do leitor - o que, s ento fiquei sabendo, uma atitude permitida apenas com prvia autorizao do au-tor ou do responsvel pelos direitos autorais. De maneira que as correspondentes correes foram efetuadas ao p da letra. Veri-tiquei, entretanto, que a maior parte das outras correes se de-via no a falha interpretativa mas to somente diferente for-ma de expresso ou de redao. De qualquer modo, desde que beneficiassem a clareza e fidelidade ao original, as sugestes fo-ram acatadas.
Passada a limpo pela gentil colaborao datilogrfica de Maj Perez, essa segunda verso foi enviada a Richard Baker que, em viagem de ensino pela Europa, s se manifestou aps seu retor-no aos Estados Unidos, muitos meses depois. Comunicava-me que o Sr. Vitor Pomar, impedido de fazer essa segunda reviso por ter de se ausentar de Portugal, lhe sugerira que fosse feita
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por outro acadmico portugus, de sua confiana, cujo nome lhe recomendara. Acrescentava Baker em sua missiva que esta-va em vias de tomar tal providncia aps a qual, acreditava, o livro estaria em vias de ser publicado.
Escrevi a Richard Baker opondo-me idia de submeter a nova reviso a outro portugus pois que isso resultaria em pro-cesso infindvel, uma vez que, embora usem o mesmo idioma, brasileiros e portugueses expressam-se de diferentes formas tanto na linguagem falada quanto na escrita. Portanto, se outra revi-so era necessria, que ela fosse feita desta vez por algum brasi-leiro categorizado. Acrescentei que Lia Diskin, co-fundadora e presidente da Associao Palas Athena, formada em jornalismo com especializao em Crtica Literria, alm de estudiosa de budismo, teria condies de indicar algum para essa nova revi-so. Portanto, da em diante, eu deixava o destino da traduo entregue ao direto entendimento dele, Richard Baker, com Lia Diskin, adiantando que poderiam contar com minha anuncia caso julgassem conveniente optar por uma nova traduo, feita por outra pessoa.
Numa comunicao telefnica algum tempo depois, Baker solicitou prpria Lia que fizesse a reviso tcnica, tarefa que felizmente foi aceita por ela mas, devido ao acmulo de suas atividades, teve de esperar vrios meses para ser executada.
Acreditando-me j isenta de qualquer responsabilidade so-bre a traduo, transcorriam os ltimos meses de 1992, quando fui surpreendida pelo chamado de Lia solicitando que fosse a seu encontro para acompanh-la na reviso. Viajei para So Paulo.
Nos trs primeiros dias de trabalho achei que no me seria possvel prosseguir. Parecia-me uma tortura ter que repassar de novo linha por linha aquelas frases tantas vezes remodas, o que se somatizou numa permanente e insuportvel enxaqueca.
Mas a situao inverteu-se no momento em que me dei conta de que o trabalho com Lia estava me proporcionando um valio-so aprendizado. O esmero, o rigor, a responsabilidade com que ela punha em discusso qualquer mincia conceituai ou
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interpretativa, sua inesgotvel disposio e pacincia de pesqui-sar em diferentes fontes at chegar ao termo preciso para qual-quer nuance, sem jamais perder a leveza, o humor e a alegria, faziam-me entender, de uma vez por todas, que estas trs lti-mas qualidades, tanto quanto as primeiras, tm que estar pre-sentes para que qualquer atividade flua sem peso e a excelncia aflore.
Evidentemente este apurado trabalho, que teve um ms de durao, recebeu a total aprovao de Richard Baker.
Enfim, aqui est a traduo que, ao todo, levou onze anos para chegar publicao.
Espero que a convergncia de tantas energias individuais tra-fegando pelo tempo e distncias geogrficas, tenha resultado num aprimoramento que faa jus ao valor desta obra.
Odete Lara Nova Friburgo, Rio de Janeiro, 1994
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Introduo
Para um discpulo de Suzuki-roshi, este livro representa a mente de Suzuki-roshi - no sua mente comum ou pessoal, mas sua mente Zen, a mente de seu mestre Gyokujun So-on-daio-sho, do mestre Dogen, de toda a sucesso, interrompida ou no, histrica ou mtica, de mestres, patriarcas, monges e leigos des-de o Buda at os dias de hoje: a mente do prprio Buda, a mente da prtica Zen. Mas, para a maioria dos leitores, este livro ser um exemplo de como um mestre Zen fala e ensina. Ser um livro de instruo sobre como praticar o Zen, sobre a vida Zen e sobre as atitudes e a compreenso que tornam possvel a prtica Zen. Atravs dele, todo leitor ser estimulado a perceber sua prpria natureza, sua prpria mente Zen.
"Mente Zen" uma dessas frases enigmticas que os mes-tres Zen usam para fazer voc se auto-observar, ir alm das pa-lavras e querer descobrir o que so a sua mente e o seu ser. Este o propsito de todo ensinamento Zen - faz-lo indagar e res-ponder a esse questionamento com a mais profunda expresso de sua verdadeira natureza. A caligrafia na capa significa nyorai, em japons, ou tathagata em snscrito. Estes so nomes dados ao Buda e significam "aquele que seguiu o caminho", "que retor-nou daquilo que ", ou "que o que ", "a vacuidade", "o total-mente completo". o princpio bsico que torna possvel o apa-recimento de um Buda. a mente Zen. Quando Suzuki-roshi traou essa caligrafia - usando como pincel a ponta desfiada de uma folha de ica semelhante a uma espada, que cresce nas montanhas em torno do Zen Mountain Center -, disse: "Isto significa que o corpo da terra toda tathagata".
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
A prtica da mente Zen a mente de principiante. A ino-cncia da primeira pergunta - o que sou eu? - necessria em toda a prtica Zen. A mente do principiante vazia, livre dos hbitos do experiente, pronta para aceitar, para duvidar e aber-ta a todas as possibilidades. um tipo de mente que pode ver as coisas como elas so, que passo a passo e num lampejo capaz de perceber a natureza original de tudo. Esta prtica da mente Zen est presente ao longo de todo o livro. Diretamente ou, algumas vezes, por deduo, cada seo do livro faz referncia questo de como manter tal atitude durante a meditao e na vida diria. Este um modo antigo de ensinar, que usa uma linguagem simples e as situaes da vida cotidiana. Isto signifi-ca que o estudante deve ensinar a si prprio.
Mente de principiante uma das expresses favoritas do mestre Dogen. A caligrafia do frontispcio, tambm de Suzuki-roshi, significa shoshin, "mente de principiante". A forma Zen de caligrafia escrever de modo direto e simples, com se voc fosse um principiante, sem tentar fazer algo habilidoso ou boni-to, mas apenas escrever com ateno, como se estivesse desco-brindo o que est escrevendo pela primeira vez; ento, a sua natureza inteira estar na escrita. Esta a maneira de praticar, momento aps momento.
Este livro foi concebido e iniciado por Marian Derby, uma dis-cpula muito prxima de Suzuki-roshi e organizadora do grupo Zen de Los Altos. Suzuki-roshi participava das prticas de zazen * deste grupo uma ou duas vezes por semana, e, aps cada perodo de meditao, falava aos participantes encorajando-os em sua pr-tica e auxiliando-os a resolver seus problemas. Marian gravou es-tas palestras e logo viu que, com o desenvolvimento do grupo, as falas adquiriam uma continuidade e desenvolvimento que po-deriam funcionar tambm como livro e constituir um registro mais do que necessrio do notvel esprito e ensinamento de Suzuki-roshi. A partir das transcries das palestras feitas no de-correr de vrios anos, ela montou o primeiro rascunho deste livro.
'Zazen: prtica de meditao. (N. da 1)
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
Foi ento que Trudy Dixon, outra discpula muito achegada a Suzuki-roshi, com grande experincia na edio da revista Wind Bell, publicada periodicamente pelo Zen Center, editou e organi-zou o manuscrito para ser publicado. Explicar por que no tarefa fcil editar este tipo de livro, ajudar o leitor a entend-lo melhor. Suzuki-roshi emprega o mtodo mais difcil, porm per-suasivo, para falar sobre budismo - em termos da vida cotidia-na das pessoas - procurando espremer todo o ensinamento em afirmaes to simples quanto "tome uma xcara de ch". O editor deve perceber as implicaes contidas em tais afirmaes para que, em nome da clareza ou da gramtica, no seja prejudi-cado o real significado das lies. Alm disto, sem conhecer bem Suzuki-roshi e ter estudado com ele, fcil mutilar, pelas mes-mas razes, a compreenso bsica representada pela sua perso-nalidade, energia ou vontade. O editor tambm corre o perigo de no levar em conta a mente mais profunda do leitor que, para se conhecer, precisa da repetio, da lgica aparentemente obscura e da poesia. Passagens que primeira vista resultam obscuras ou bvias so com freqncia iluminadoras quando lidas com cuidado, e levam-nos a indagar por que este homem diria tal coisa.
Alm do mais, a edio se complica pelo fato de o idioma ingls ser profundamente dualstico em seus pressupostos bsi-cos e no ter tido a oportunidade, por sculos, de desenvolver uma forma de expressar as idias no-dualistas do budismo, como o fez o japons. Suzuki-roshi emprega livremente estes vocabulrios culturais diferentes, expressando-se num estilo que combina o modo japons de pensar - atributivo de sentimentos - com o modo ocidental - de idias especficas - o que faz per-feito sentido potico e filosfico para os ouvintes. Porm, nas transcries perdem-se as pausas, o ritmo e a nfase que do s palavras seu significado mais profundo e mantm os pensamen-tos unidos. Por isso, Trudy teve que trabalhar muitos meses sozinha e com Suzuki-roshi para preservar os termos e o sa-bor originais, e ainda assim produzir um manuscrito em in-gls compreensvel.
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
Trudy dividiu o livro, conforme a nfase, em trs sees -Prtica Correta, Atitude Correta e Compreenso Correta - que correspondem, grosso modo, a corpo, sentimento e mente. Tam-bm escolheu os ttulos das palestras e as epgrafes que os acom-panham, extraindo-os do prprio texto das palestras. A escolha um tanto arbitrria, mas ela o fez para estabelecer certa tenso entre as diversas sees, ttulos, epgrafes e as prprias pales-tras. A relao entre as palestras e esses elementos adicionais ajudar o leitor a explorar mais a fundo a lio. A nica palestra que no foi originalmente dada ao grupo de Los Altos o Eplo-go, condensao de duas palestras pronunciadas quando o Zen Center se mudou para sua nova sede em San Francisco.
Pouco depois de terminar a reviso deste livro, Trudy mor-reu de cncer aos 30 anos. Deixou dois filhos, Annie e Will, e o marido Mike, pintor. Mike contribuiu com o desenho da mosca (pgina 48 ). Estudioso do Zen por muitos anos, quando lhe foi solicitado desenhar algo para o livro, ele disse: "No posso fazer um desenho Zen. No posso fazer um desenho por qualquer outra razo que no a de meramente desenhar. No consigo me ver desenhando um zafu (almofada para meditao), um ltus ou algo semelhante. Entretanto, posso visualizar esta idia". Nas pinturas de Mike aparece amide uma mosca realista. Suzuki-roshi gosta muito da r que se senta to imvel que parece estar dormindo, mas na verdade est bastante alerta para perceber todo inseto que se aproxima. Talvez a mosca esteja espera da r.
Trudy e eu trabalhamos juntos em vrias fases do livro, e ela pediu-me para completar a reviso, escrever a introduo e pro-videnciar a publicao. Aps considerar vrios editores, achei que John Weatherhill, Inc., atravs da Meredith Weatherby e Audie Bock, era capaz de aprimorar, projetar e publicar este li-vro exatamente como deveria s-lo. Antes da publicao, o ma-nuscrito foi lido pelo professor Kogen Mizuno, chefe do Depar-tamento de Estudos Budistas da Universidade de Komazawa, eminente estudioso do budismo indiano e a quem devemos um generoso auxlio na transliterao dos termos snscritos e japo-neses budistas.
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Suzuki-roshi nunca fala de seu passado, mas consegui saber que foi discpulo de Gyokujun So-on-daiosho, um dos princi-pais mestres do Soto Zen da poca. E claro que teve tambm outros mestres, um dos quais enfatizava a compreenso pro-funda e cuidadosa dos sutras. O pai de Suzuki-roshi era tam-bm um mestre Zen e, ainda menino, Suzuki comeou seu apren-dizado sob a orientao de Gyokujun, discpulo de seu pai. Su-zuki foi reconhecido como mestre Zen ainda bem jovem, penso que por volta dos 30 anos. No Japo era responsvel por muitos templos e um mosteiro, tendo o encargo de reconstruir vrios outros templos. Durante a Segunda Guerra Mundial foi lder de um grupo pacifista do Japo. Quando jovem quis vir para os Estados Unidos; mas j tinha desistido da idia quando um amigo o convidou a ir a San Francisco por dois ou trs anos para dirigir a congregao japonesa do budismo Soto.
Em 1958, aos 53 anos, veio para os Estados Unidos. Depois de adiar seu retorno repetidas vezes, decidiu permanecer nos Estados Unidos. Ficou porque descobriu que os americanos tm mente de principiante, tm poucas idias preconcebidas sobre o Zen, so bastante receptivos a ele e confiam em que possa aju-d-los a viver. Achou que questionam o Zen de uma forma que d vida ao Zen. Logo aps sua chegada, diversas pessoas se acer-caram perguntando-lhe se podiam estudar Zen com ele. Suzuki-roshi disse que praticava zazen toda manh bem cedo e que po-diam reunir-se a ele se quisessem. A partir de ento, um grupo Zen bastante grande se formou ao seu redor - agora em seis localidades da Califrnia. No momento ele passa a maior parte do tempo no San Francisco Zen Center, em Page Street nQ 300, onde residem cerca de sessenta estudantes e onde muitos mais praticam zazen regularmente, e no Zen Mountain Center, em Tassajara Springs, acima de Carmel Valley. Este ltimo o pri-meiro mosteiro Zen nos Estados Unidos e ali vivem e praticam por perodos de trs meses ou mais, aproximadamente outros sessenta estudantes.
Trudy achou que compreender os sentimentos dos estudan-tes Zen em relao a seu mestre contribuiria mais do que
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qualquer coisa para ajudar o leitor a entender estas palestras. O que o mestre realmente oferece ao estudante literalmente a prova viva de que todos esses propsitos e metas, que parecem impossveis, podem ser realizados ainda nesta vida. Quanto mais voc aprofunda sua prtica, mais se apercebe do que a mente de seu mestre , at ver finalmente que a sua mente e a do seu mestre so a mente de Buda. E descobre que o zazen a mais perfeita expresso de sua verdadeira natureza.
O seguinte tributo de Trudy ao seu mestre descreve muito bem a relao entre o mestre Zen e o estudante Zen:
"Um Roshi (abade mor) algum que realizou aquela perfei-ta liberdade que existe em potencial em todo ser humano. Ele existe livre na plenitude de todo seu ser. O que flui na sua cons-cincia no so os padres repetitivos de nossa conscincia co-mum egocentrada, mas sim o que emerge espontnea e natural-mente das circunstncias reais do presente. Os resultados disto, em termos de qualidade de vida, so extraordinrios - leveza, vigor, retido, simplicidade, humildade, serenidade, alegria, sa-gaz perspiccia e imensa compaixo. Todo seu ser d testemu-nho do que significa viver a realidade do presente. Sem que nada seja dito ou seja feito, o simples impacto de encontrar uma per-sonalidade to desenvolvida basta para mudar toda a vida de outra pessoa. Mas, no fim, no a excepcionalidade do mestre que deixa perplexo, intriga e torna profundo o estudante, e sim sua total simplicidade. Por ser apenas ele mesmo que se torna um espelho para o estudante. Em sua presena percebemos nos-sas prprias foras e fraquezas sem que haja qualquer elogio ou crtica de sua parte. Diante dele vemos nossa face original, e o que de extraordinrio vemos apenas nossa verdadeira nature-za^ Quando aprendemos a deixar livre nossa prpria natureza, as fronteiras entre mestre e discpulo desaparecem num pro-fundo fluxo de ser e alegria no desabrochar da mente Buda".
Richard Baker Kyoto, 1970
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Prlogo
Mente de Principiante
"H muitas possibilidades na mente do principiante, mas poucas na do perito."
As pessoas dizem que difcil praticar Zen, mas h um mal-entendido quanto ao "porqu". No difcil porque seja rduo sentar-se de pernas cruzadas ou atingir a iluminao. difcil porque rduo manter a mente pura ou a prtica pura em seu sentido fundamental. A escola Zen desenvolveu-se de muitas maneiras depois de estabelecida na China mas, ao mesmo tem-po, tornou-se cada vez mais impura. Contudo, no sobre o Zen chins ou sobre a histria do Zen que eu quero falar. O que me interessa ajudar voc a manter sua prtica livre da impureza.
No Japo, dispomos do termo shoshin, que significa "mente de principiante". O objetivo da prtica conservar nossa "men-te de principiante". Suponhamos que voc recite o Prajna Para-mita Sutra uma s vez. Poderia ser uma boa recitao. Mas o que lhe acontecer se o recitar duas, trs, quatro ou mais vezes? Voc poderia facilmente perder sua atitude original em relao a ele. O mesmo acontecer com suas outras prticas Zen. Por algum tempo voc manter sua mente de principiante, porm, se continuar a prtica um, dois, trs anos ou mais, embora voc possa melhorar em alguns aspectos, possvel que perca o sentido ilimitado da "mente original".
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MENTE ZEN, MENTE DE PRINCIPIANTE
Para os estudantes do Zen, o mais importante no serem dualistas. Nossa "mente original" inclui em si todas as coisas. Ela sempre rica e auto-suficiente. Voc no deve perder esse estado mental auto-suficiente. Isto no significa uma mente fechada e sim, na verdade, uma mente vazia e alerta. Se sua mente est vazia, est pronta para qualquer coisa; ela est aber-ta a tudo. H muitas possibilidades na mente do principiante, mas poucas na do perito.
Se voc discrimina demais, voc se limita. Se exigente ou ambicioso em excesso, sua mente no rica nem auto-suficien-te. Se nossa mente perder sua auto-suficincia original, todos os preceitos se perdero. Quando sua mente se torna exigente, quan-do voc anseia por algo, voc acaba por violar os preceitos: no mentir, no roubar, no matar, no ser imoral e assim por dian-te. Se voc conservar sua mente original, os preceitos se mante-ro por si prprios.
Na mente do principiante no h pensamentos do tipo "eu alcancei algo". Todos os pensamentos egocentrados limitam a vastido da mente. Quando no alimentamos pensamento ne-nhum de conquista, nem pensamentos egocentrados, somos verdadeiros principiantes e podemos ento aprender alguma coisa de fato. A mente do principiante mente de compaixo. Quan-do nossa mente compassiva, torna-se ilimitada. O mestre Do-gen, fundador da nossa escola, sempre enfatizou a importncia de preservar nossa mente original ilimitada. Com ela somos ver-dadeiros conosco, estamos em comunho com todos os seres e podemos, de fato, praticar.
Assim, a coisa mais importante manter sua "mente de prin-cipiante". No h necessidade de ter uma profunda compreen-so do Zen. Mesmo que voc leia muita literatura Zen, deve ler cada frase com uma mente virgem. Nunca deve dizer: "Eu sei o que Zen" ou "eu atingi a iluminao". O real segredo das artes tambm esse: ser sempre um principiante. Seja muito cuida-doso nesta questo. Se comear a praticar zazen, voc comear a valorizar sua mente de principiante. Este o segredo da prti-ca do Zen.
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PRIMEIRA PARTE
PRTICA CORRETA
"A prtica do zazen a expresso direta de nossa verdadeira natureza. A rigor, para um ser humano no h outra prtica alm desta, nem outra maneira de viver a no ser esta."
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Postura
"A postura no um meio de obter o estado mental correto. Colocar-se na postura j o estado mental correto. No h necessidade de buscar um estado especial da mente."
Hoje, eu gostaria de falar sobre a postura zazen. Quando voc se senta na posio de ltus completo, seu p esquerdo fica sobre sua coxa direita, seu p direito, sobre a coxa esquer-da. Ao cruzarmos as pernas desse jeito, embora tenhamos uma perna esquerda e outra direita, elas se tomam uma s. A postu-ra expressa a unidade da dualidade: nem dois, nem um. Este o ensinamento mais importante: nem dois, nem um. Nosso cor-po e mente no so dois, nem um. Se voc pensa que seu corpo e mente so dois, est errado. Se pensa que so um, tambm est errado. Nosso corpo e mente so dois e um ao mesmo tem-po. Habitualmente, pensamos que se algo no um, mais do q^e um; que se algo no singular, plural. Mas, na prtica, nossa vida no s plural, tambm singular. Cada um de ns duas coisas ao mesmo tempo: dependente e independente.
Depois de viver certo nmero de anos, morremos. E errado pensar que isto seja o fim de nossa vida. Mas, por outro lado, achar que no morremos tambm est errado. Morremos e no morremos. Este o entendimento correto. Alguns podem dizer que nossa mente, ou alma, existe para sempre e que apenas nosso corpo fsico que morre. Isso no bem assim porque am-bos, corpo e mente, tm fim. Mas, tambm verdade que am-bos existem eternamente. Embora se diga corpo e mente, eles so de fato dois lados da mesma moeda. Este o entendimento
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correto. Assim, a postura zazen simboliza essa verdade. Quan-do meu p esquerdo est sobre o lado direito de meu corpo e o p direito sobre o lado esquerdo, eu no sei qual qual. Tanto pode ser um como outro.
A coisa mais importante na postura zazen manter a coluna reta. Orelhas e ombros devem ficar alinhados. Relaxe os ombros e estique a parte superior da cabea em direo ao teto. O quei-xo deve ficar ligeiramente recuado para dentro. Quando o quei-xo est erguido, voc no tem firmeza na postura, com o que provvel que sua mente se ponha a vaguear. Assim, para refor-ar sua postura, pressione o diafragma para baixo, em direo ao seu hara* ou parte baixa do abdome. Isso o ajudar a manter o equilbrio fsico e mental. Ao tentar manter essa postura, po-der encontrar alguma dificuldade inicial em respirar de manei-ra natural, mas quando se acostumar a ela ser capaz de respirar normal e profundamente.
Suas mos devem formar o mudra** csmico. Se puser o dorso da mo esquerda sobre a palma da direita, as juntas dos dedos mdios encostadas umas sobre as outras, as pontas dos polegares tocando-se levemente (como se estivessem segurando uma folha de papel), suas mos formaro um belo oval. Mante-nha esse mudra csmico, com todo cuidado, como que seguran-do algo precioso. Suas mos devem estar junto ao corpo, de for-ma que os polegares fiquem altura do umbigo. Mantenha os braos livres e relaxados, ligeiramente afastados do tronco, como se estivessem segurando um ovo em cada axila, sem quebr-lo.
No deve inclinar-se para os lados, nem para a frente, nem para trs. Deve ficar sentado bem reto, como se estivesse sus-tentando o cu sobre a cabea. Isto no apenas postura ou respirao. Isto expressa o ponto chave do budismo. uma ex-presso perfeita da sua prpria natureza bdica. Se voc busca a verdadeira compreenso do budismo, tem de praticar deste modo. Estas formas no so meios para obter um estado mental
* Hara: parte do abdome logo abaixo do umbigo. (N. da T.) ** Mudra: postura de mos. (N. da T.)
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correto/Assumir a postura j , em si, o propsito da nossa pr-tica. Ao se colocar nessa postura, sua mente fica naturalmente em estado correto; portanto, no h necessidade de buscar um estado especial da mente. Quando voc tenta obter algo, sua mente comea a divagar por outros lugares. Quando voc no se ocupa em obter algo, seu corpo e sua mente permanecem juntos, presentes onde voc est. Um mestre Zen diria: "Mate o Buda". Isto , mate o Buda se ele existe em algum outro lugar. Mate o Buda porque voc que deve reaver sua prpria nature-za bdica.
Fazer algo expressar nossa natureza. No existimos por nenhuma outra razo seno a de sermos ns mesmos. Esse o ensinamento fundamental, expresso nas formas que observa-mos. Por exemplo, quando nos sentamos ou ficamos em p no zend, * seguimos certas regras. O propsito dessas regras no fazer com que todos sejam iguais e sim permitir que cada um expresse o seu prprio eu mais livremente. Por exemplo: cada um de ns tem sua prpria maneira de ficar em p - nossa pos-tura em p baseada na proporo do nosso corpo. Quando es-tiver em p, seus calcanhares devem ficar separados um do ou-tro a uma distncia que corresponda medida de seu punho: os dedes dos ps devem ficar alinhados com os mamilos. Assim como no zazen, temos que pr alguma fora no abdome. Aqui tambm suas mos devem expressar o que voc . Ponha a mo esquerda contra o peito, com os dedos circundando o polegar, e a mo direita sobre ela. Colocando o polegar esquerdo aponta-do para baixo e os antebraos em linha paralela ao cho, voc se sentir firme como se estivesse seguro a uma grande colu-na de um templo, sem possibilidade de encolher-se ou pen-der para os lados.
O mais importante estar de posse do prprio corpo fsico. Se voc se encolhe, est se perdendo de si mesmo. Sua mente estar divagando alhures; voc no estar presente em seu cor-po. No assim que deve ser. Ns temos que existir no aqui e
* Zend: recinto onde se realizam os ntuais e as prticas de zazen. (N. da T)
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agora. Este o ponto chave. Voc tem que estar de posse de seu corpo e mente. Tudo deve existir no lugar certo e de maneira certa. Ento no h problemas. Se o microfone que eu uso quan-do falo estiver colocado em outro lugar, ele no estar servindo ao seu propsito. Quando nosso corpo e mente esto em ordem, tudo o mais est no seu devido lugar, de forma certa.
Usualmente, sem que tenhamos conscincia disso, tenta-mos mudar as coisas em vez de mudar a ns mesmos; tentamos arrumar as coisas que esto fora de ns. Mas impossvel orde-nar as coisas se voc mesmo no est em ordem. Quando voc faz as coisas de forma certa, no momento oportuno, tudo o mais se organiza. Voc o chefe. Quando o chefe est dormindo, to-dos dormem. Quando ele faz algo bem feito, todos os demais o fazem igualmente bem e no tempo certo. Este o segredo do budismo. Portanto, procure manter a postura correta, no ape-nas quando pratica zazen mas em todas as suas atividades. Ado-te a postura certa quando estiver dirigindo um carro ou quando estiver lendo. Se voc l numa posio displicente, no pode fi-car lcido por muito tempo. Experimente. Voc descobrir como importante manter a postura correta. Este o ensinamento verdadeiro. Ensinamentos escritos no papel no so verdadeiros ensinamentos, so alimento para o crebro. Claro que preciso alimentar o crebro; porm, o mais importante ser voc mes-mo praticando a forma correta de viver.
Eis por que o Buda no pde aceitar as religies que existiam na sua poca. Ele estudou vrias religies mas no ficou satisfei-to com suas prticas. No encontrou respostas no ascetismo ou nas filosofias. Ele no estava interessado nos aspectos metafsi-cos da existncia, e sim em seu prprio corpo e sua prpria men-te no aqui e agora. E quando encontrou a si mesmo, descobriu que tudo quanto existe tem natureza bdica. Essa foi sua ilumi-nao. Iluminao no uma sensao agradvel ou algum es-tado particular da mente. O estado da mente que existe quan-do voc se senta em postura correta , por si s, iluminao. Se voc no est satisfeito com o estado da mente que tem no zazen, significa que sua mente est divagando por a afora.
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E nosso corpo e nossa mente no devem oscilar nem vaguear. Nessa postura, no h por que falar em estado correto da men-te. Voc j o possui. Esta a concluso do budismo.
Respirao "Aquilo que chamamos 'eu' no mais do que uma porta
de vaivm, que se move quando inalamos e quando exalamos."
Quando praticamos zazen, nossa mente sempre segue a res-pirao. Quando inalamos, o ar entra em nosso mundo interior. Quando exalamos, o ar sai para o mundo exterior. O mundo interior no tem limites e o mundo exterior tambm ilimita-do. Ns dizemos "mundo interior" e "mundo exterior", mas, na verdade, s h um nico mundo. Nesse mundo sem limites, a garganta uma espcie de porta de vaivm. O ar entra e sai como algum passando por uma porta de vaivm. Se voc pensa "eu respiro", o "eu" est a mais. No h um voc para dizer "eu". O que chamamos "eu" apenas uma porta de vaivm que se move quando inalamos e exalamos. Ela simplesmente se move, eis tudo. Quando sua mente est pura e calma o suficiente para seguir esse movimento, no h nada: nem "eu", nem mundo, nem mente, nem corpo. S uma porta que vai e vem.
Assim, quando praticamos zazen, tudo o que existe o mo-vimento da respirao e, no entanto, estamos cnscios desse mo-vimento. No devemos nunca nos distrair. Mas estar consciente do movimento no significa estar consciente do eu pequeno, e sim da nossa natureza universal, ou natureza de Buda. Esta cons-cincia muito importante porque em geral somos unilaterais. Nossa compreenso habitual da vida dualista: voc e eu, isto e aquilo, bom e mau. Na realidade, tais discriminaes so, elas prprias, a conscincia da existncia universal! "Voc" signi-fica estar consciente do universo na forma de voc, e "eu"
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significa estar consciente do universo na forma de eu. Voc e eu somos portas de vaivm. necessrio este tipo de compre-enso; porm, nem sequer deveria chamar-se compreenso j que , isto sim, a verdadeira experincia da vida atravs da pr-tica do Zen.
Assim, quando voc pratica zazen, no h idia de tempo e espao. Voc pode dizer: "Comeamos o zazen neste recinto s quinze para as seis". Portanto, voc tem alguma idia de tempo (quinze para as seis) e alguma idia de espao (neste recinto). Na verdade, o que voc est fazendo apenas sentar-se cnscio da atividade do universo. tudo. Neste momento, a porta de vaivm se abre numa direo, e no momento seguinte ela se abrir na direo oposta. Momento a momento, cada um de ns repete essa atividade. A no h idia nem de tempo nem de espao. Tempo e espao so um. Voc pode dizer: "Preciso fazer algo hoje tarde". Mas, na realidade, no h "hoje tarde". Fa-zemos uma coisa depois da outra. Eis tudo. No existe um tem-po como "hoje tarde" ou "uma hora" ou "duas horas". A uma hora voc vai almoar. O prprio ato de almoar uma hora. Voc estar em algum lugar, mas esse lugar no pode ser separa-do de " uma hora". Para quem realmente aprecia sua vida, eles so a mesma coisa. Mas quando ficamos aborrecidos com a vida, podemos dizer: "Eu no devia ter vindo a este lugar. Teria sido melhor ir a outra parte para almoar. Este lugar no muito bom". Na sua mente, voc criou uma idia de lugar desvincula-da do seu tempo presente.
Ou voc pode dizer: "Isto mau, eu no devo fazer isto". Na verdade, quando diz "eu no devo fazer isto", voc est fazendo um no-fazer nesse preciso momento. Portanto, no h escolha para voc. Quando voc separa a idia de tempo e de espao, parece que h alguma escolha; mas, na realidade, voc tem de fazer algo ou tem de fazer um no-fazer. No fazer algo tam-bm fazer alguma coisa. Bom e mau existem s na sua mente. Por isso voc no deve dizer: "Isto bom", ou "isto mau". Em vez de "mau", voc deve dizer "no-fazer". Se voc pensa "isto mau", estar criando confuso para si mesmo. Assim, pois, na
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esfera da religio pura no h confuso de tempo e espao, de bom ou mau. Tudo o que se tem a fazer simplesmente execu-tar as coisas tal como se apresentam. Faa alguma coisa! Seja o que for, devemos faz-lo, mesmo que se trate de um no-fazer. Devemos viver neste momento. Assim, quando nos sentamos, concentramo-nos em nossa respirao, nos tornamos uma por-ta de vaivm e fazemos o que deve ser feito, algo que temos de fazer. Isto prtica do Zen. Nesta prtica no h confuso. Se voc estabelecer este modo de vida, no haver confuso de ne-nhuma espcie.
Tozan, um famoso mestre Zen, disse: A montanha azul o pai da nuvem branca. A nuvem branca o filho da montanha azul. O dia todo eles dependem um do outro, sem que um seja dependente do outro. A nuvem branca sempre a nuvem bran-ca. A montanha azul sempre a montanha azul". Eis uma pura e clara interpretao da vida. Pode haver muitas coisas como a nuvem branca e a montanha azul: homem e mulher, mestre e discpulo. Dependem um do outro. Mas a nuvem branca no deve ser importunada pela montanha azul. A montanha azul no deve ser importunada pela nuvem branca. Elas so total-mente independentes e, no obstante, dependentes. E assim que vivemos e assim que praticamos zazen. Quando nos tornamos verdadeiramente ns mesmos, nos tornamos somente uma por-ta de vaivm: somos inteiramente independentes e, ao mesmo tempo, dependentes de todas as coisas. Sem ar no podemos respirar. Cada um de ns est no centro de mirades de mundos. Estamos no centro do mundo, sempre, momento a momento. Assim, somos completamente dependentes e independentes. Se voc tem este tipo de experincia, este modo de existncia, voc tem absoluta independncia; no ser importunado por coisa alguma. Portanto, quando voc pratica zazen, sua mente deve estar concentrada na respirao. Este tipo de atividade a ativi-dade bsica do ser universal. Sem esta experincia, sem esta pr-tica, impossvel atingir a plena liberdade.
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Controle "Dar um pasto amplo a sua ovelha e a sua vaca,
a maneira de control-las."
Viver no reino da natureza de Buda significa morrer como ser inferior, momento aps momento. Quando perdemos o equilbrio, morremos; mas ao mesmo tempo evolumos, cres-cemos. Tudo o que vemos est constantemente mudando, perdendo seu equilbrio. Por estarem fora de equilbrio que as coisas se mostram belas, mas o fundo em que se inserem est sempre em perfeito equilbrio. Esta a forma como as coisas existem na natureza de Buda: perdendo o equilbrio sobre um fundo em perfeito equilbrio. Assim, se voc v as coisas sem se dar conta da natureza bdica que lhes serve de fundo, tudo se apresenta em forma de sofrimento. Mas, se compreende o fundamento da existncia, voc se d conta de que o sofrimento reside na maneira como levamos a vida. Assim, no Zen algumas vezes se d nfase ao desequilbrio, desordem da vida.
Hoje em dia, a pintura tradicional japonesa tornou-se um tanto formal e destituda de vida; por essa razo que a arte moderna se desenvolveu. Os pintores antigos tinham uma pr-tica que consistia em colocar no papel pontos em desordem de modo artstico. Isso bastante difcil. Mesmo que voc tente, acabar fazendo-o de alguma forma ordenada. Voc pensa que a coisa est sob seu controle, mas no est; quase impossvel colocar os pontos fora de alguma ordem. O mesmo se d na sua vida diria. Embora voc tente, impossvel ter as pessoas sob controle. A melhor forma de controlar as pessoas encoraj-las a ficarem vontade. Ento elas estaro sob controle no mais amplo sentido. Dar a sua ovelha ou vaca um pasto grande a melhor forma de t-las sob controle. O mesmo acontece com relao s pessoas; primeiro deixe que faam o que bem enten-derem e observe. Esta a melhor poltica. Ignor-las no funciona;
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a pior estratgia. A segunda pior ttica tentar control-las. A melhor de todas apenas observ-las.
O mesmo acontece quando se trata de voc mesmo. Se qui-ser obter perfeita calma durante seu zazen, no deve se aborre-cer com as diversas imagens que aparecem em sua mente. Deixe que elas surjam e desapaream. Assim elas estaro sob controle. Mas no fcil fazer isso. Parece fcil, mas na verdade requer algum esforo especial. Como realizar esse esforo o segredo da prtica. Suponhamos que voc esteja sentado em circunstn-cias extraordinrias. Se tentar acalmar sua mente, no conse-guir meditar e, se tentar no se perturbar com isso, seu esforo no ser o correto. O nico esforo que o ajudar ser contar sua respirao ou concentrar-se no movimento de inspirar e expirar. Ns dizemos concentrao, mas concentrar a mente em algo no o verdadeiro propsito do Zen. Seu verdadeiro propsito ver as coisas como elas so e deixar que tudo siga seu curso. Isso ter as coisas sob controle, no mais amplo sentido. Praticar o Zen abrir nossa mente pequena. Assim, a concentrao ape-nas um recurso para auxili-lo a se aperceber da "mente grande" - da mente que o todo. Se quer descobrir o verdadeiro sentido do Zen na sua vida diria, voc tem que entender o sentido de manter sua mente na respirao e o corpo na postura correta do zazen. Voc deve seguir as regras da prtica, e seu treino tem de tornar-se gradativamente mais cuidadoso e sutil. S dessa ma-neira poder experimentar a vital liberdade do Zen.
O mestre Dogen disse: "O tempo caminha do presente para o passado". Isto absurdo, mas na nossa prtica, s vezes, verdadeiro. Ao invs de o tempo progredir do passado para o presente, ele volta do presente para o passado. Yoshitsune foi um famoso guerreiro que viveu no Japo medieval. Por causa da situao em que o pas se encontrava naquela poca, ele foi en-viado para as provncias do Norte, onde foi morto. Antes de partir, despediu-se de sua esposa e logo depois ela escreveu um poema: Assim como tu desenrolas o fio de um carretei, eu que-ro que o passado se torne presente". Ao dizer isso ela de fato fez do passado, presente. Na sua mente, o passado tornou-se vivido
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e portanto estava presente. Dogen disse: "O tempo vai do pre-sente para o passado". Isto no verdade para a nossa mente lgica, mas o na experincia prtica de tornar presente o tem-po passado. A est a poesia e a est a experincia humana.
Quando experimentamos essa verdade, significa que encon-tramos o verdadeiro sentido do tempo. O tempo caminha cons-tantemente do passado para o presente e do presente para o fu-turo. Isso verdade, mas tambm verdade que ele caminha do futuro para o presente e do presente para o passado. Um mestre Zen disse em certa ocasio: "Caminhar uma milha para o leste caminhar uma milha para o oeste". Isso liberdade vital.
essa liberdade perfeita que temos de alcanar. Mas essa perfeita liberdade no encontrada sem algumas
regras. As pessoas, principalmente entre os jovens, pensam que liberdade fazer somente o que querem, e que o Zen prescinde de regras. Mas absolutamente necessrio termos algumas re-gras. Isso, no entanto, no quer dizer que estejamos sempre sob controle. Desde que voc tem regras, voc tem chance de liber-dade. Querer obter liberdade sem estar consciente das regras no significa nada. para obter essa perfeita liberdade que pratica-mos zazen.
As Ondas Mentais "Uma vez que desfrutamos todos os aspectos
da vida como um desdobramento da mente grande, no precisamos ir em busca de uma alegria excessiva. Assim, nossa serenidade imperturbvel."
Quando estiver praticando zazen, no tente deter seu pensa-mento. Deixe que ele pare por si mesmo. Se alguma coisa lhe vier mente, deixe que entre e deixe que saia. Ela no permane-cer por muito tempo. Tentar parar o pensamento significa que
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voc est sendo incomodado por ele. No se deixe incomodar por coisa alguma. Pode parecer que essa coisa vem de fora mas, na verdade, so apenas as ondas de sua mente e se voc no se deixar incomodar por elas, gradualmente se tornaro mais e mais calmas. Em cinco ou dez minutos, no mximo, sua mente esta-r calma, serena. Sua respirao ento se tornar mais lenta e a pulsao, um pouco mais acelerada.
Leva um certo tempo at que a mente se acalme durante sua prtica. Surgem muitas sensaes, muitos pensamentos ou imagens, mas so apenas ondas da prpria mente. Nada vem de fora dela. Em geral, pensamos que nossa mente recebe impres-ses e experincias do exterior, mas isso no uma compreen-so correta da nossa mente. A verdade que a mente inclui tudo; quando pensamos que algo surge de fora, isso quer dizer somen-te que algo surge na nossa prpria mente. Nada exterior a si mesmo pode perturb-lo. E voc mesmo que cria as ondas da mente. Se deixar a mente como ela , ela se tornar calma. Esta a chamada mente grande^
Quando a mente est vinculada a algo fora dela prpria, tra-ta-se da pequena mente, uma mente limitada. Se sua mente no estiver vinculada a nada, ento no haver mais compreenso dualista na atividade de sua mente. Compreender que a ativi-dade no mais do que ondas da sua mente. A mente grande experimenta tudo dentro de si prpria. Percebe a diferena en-tre ambas? A mente que tudo inclui e a mente ligada a algu-ma coisa em particular? Na verdade, elas so a mesma coisa, a compreenso que diferente, e sua atitude perante a vida ser diferente de acordo com a compreenso que voc tiver.
Que tudo esteja includo na mente a essncia da mente; e a experincia disto a posse do sentimento religioso. Embora as ondas surjam, a essncia da sua mente pura, como gua clara com poucas ondas. Na verdade, a gua tem sempre ondas. Elas so a prtica da gua. Falar de ondas separadas da gua, ou da gua separada das ondas, uma iluso. gua e ondas so uma s coisa. A grande e a pequena mente so uma s. Quando voc entender sua mente desta maneira, ter alguma segurana em
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seus sentimentos. Como sua mente nada espera de fora, ela est sempre completa. Uma mente com ondas no uma mente per-turbada e sim ampliada. Qualquer coisa que voc experimente uma expresso da mente grande.
A atividade da mente grande ampliar a si mesma atravs das diversas experincias. Em certo sentido nossas experincias, ocorrendo uma a uma, so sempre frescas e novas, mas em ou-tro sentido no passam de um contnuo e repetitivo desdobra-mento da mente grande. Por exemplo, se h algo bom para o desjejum, voc dir "isto bom". O "bom" provm de alguma coisa experimentada h tempos, ainda que voc no lembre quan-do. Com a mente grande, ns aceitamos cada experincia do mesmo modo que reconhecemos a face que vemos no espelho como a nossa prpria face. Para ns, praticantes, no existe o medo de perder essa mente. No h qualquer lugar, nem para onde ir, nem de onde voltar; no existe medo da morte, do sofri-mento da velhice ou da doena. Uma vez que desfrutamos to-dos os aspectos da vida como um desdobramento da mente gran-de, no precisamos ir em busca de uma alegria excessiva. Assim, nossa serenidade imperturbvel, e com essa imperturbvel serenidade da mente grande que praticamos zazen.
As Ervas Daninhas da Mente "Voc deve ser grato s ervas daninhas que crescem
em sua mente, porque elas afinal vo enriquecer sua prtica."
No creio que lhe agrade quando o despertador toca pela manh cedinho e voc tem que se levantar. No fcil sair da cama e ir se sentar para meditar. E mesmo depois de chegar ao zend e comear o zazen, voc tem que encorajar a si prprio para se sentar corretamente. Isto so apenas ondas da sua men-te. Ho zazen puro no deve haver nenhuma onda em sua mente.
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Contudo, medida que voc permanece sentado, essas ondas se tornam cada vez menores e seu esforo se transforma em sentimento sutil.
Costuma-se dizer que "arrancando as ervas daninhas alimen-tamos as plantas". Ns arrancamos as ervas daninhas e as enter-ramos junto s plantas para nutri-las. Portanto, mesmo que voc tenha dificuldade em sua prtica, mesmo que haja algumas on-das enquanto est sentado, essas mesmas ondas serviro para ajud-lo. Assim, no deve aborrecer-se por causa de sua mente. Ao contrrio, fique grato s ervas daninhas porque elas vo, afi-nal, enriquecer sua prtica. Se voc tiver alguma experincia de como as ervas daninhas se transformam em alimento mental, sua prtica far progressos notveis. Voc vai sentir o progresso. Sentir como que elas se transformam em auto-alimentao. Claro que no difcil fazer interpretaes filosficas ou psico-lgicas acerca de nossa prtica, mas isso no basta. O que preci-samos ter a experincia prtica de como as nossas ervas dani-nhas se transformam em alimento.
A rigor, nenhum esforo que faamos beneficia nossa prti-ca, porque ele cria ondas em nossa mente. Contudo, imposs-vel obter completa serenidade mental sem algum tipo de esfor-o. Temos que nos esforar, mas temos que nos esquecer de ns mesmos no esforo que fazemos. Nesse mbito no existe obje-tividade nem subjetividade. Nossa mente est simplesmente ca,ma, sem mesmo termos conscincia disso. Nessa ausncia de conscincia, qualquer esforo, idia ou pensamento se dissipa. Portanto, necessrio encorajar a ns mesmos e esforar-nos at o ltimo momento, quando todo esforo desaparece. Voc deve pr sua mente na respirao at deixar de estar consciente da prpria respirao.
Devemos persistir em nosso esforo sempre, mas nem por isso almejar atingir algum estgio onde nos esqueamos dele. Devemos apenas tentar manter nossa mente na respirao. Essa a nossa verdadeira prtica. A medida que voc praticar, esse esforo se tornar mais e mais refinado. No incio, o esforo resultar um tanto grosseiro e impuro mas, pelo poder da prtica,
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tornar-se- cada vez mais puro. Quando seu esforo se torna puro, seu corpo e sua mente se tornam puros. essa a forma como praticamos o Zen. Uma vez que voc compreender o po-der inato que temos de purificar a ns mesmos e aquilo que nos circunda, voc poder agir apropriadamente, aprender com to-dos os que o rodeiam e ser amvel com os outros. Esse o mrito da prtica do Zen. E o caminho da prtica apenas con-centrar-se na respirao. Com postura correta e com grande e puro esforo. E assim que praticamos o Zen.
O Cerne do Zen "Na postura zazen, nosso corpo t nossa mente
tm o grande poder de aceitar as coisas como elas so, sejam agradveis ou desagradveis."
Consta em nossas escrituras (Samyuktagama Sutra, v. 33) que existem quatro tipos de cavalos: os excelentes, os bons, os fracos e os maus. O melhor cavalo corre tanto devagar quanto velozmente, para a direita e para a esquerda, atendendo von-tade do cavaleiro, antes mesmo de enxergar a sombra do chico-te; o segundo corre to bem quanto o primeiro, antes mesmo que o chicote atinja sua pele; o terceiro corre quando sente a dor do chicote em seu corpo; o quarto s corre quando a dor j pene-trou at a medula de seus ossos. Imagine como difcil, para este ltimo, aprender a correr!
Ao escutar esta histria, quase todos queremos ser o melhor cavalo. Se for impossvel, queremos pelo menos ser o segundo. Eu acho que, em geral, esse o entendimento que temos da his-tria e do Zen. Voc poder pensar que, sentando em zazen, des-cobrir se um dos melhores ou um dos piores. Isso, porm, um entendimento errneo do Zen. Se voc pensa que o objetivo da prtica Zen trein-lo para se tornar um dos melhores cavalos,
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ter um grande problema. No este o entendimento correto. Se praticar Zen de maneira certa, no importar se voc for o melhor ou o pior cavalo. Se voc considerar a compaixo de Buda, como acha que ele se sentiria em relao aos quatro tipos de cavalo? Ele teria mais simpatia pelo pior do que pelo melhor.
CQuando voc estiver determinado a praticar zazen com a mente grande de Buda, perceber que o pior cavalo o mais valioso. nas prprias imperfeies que voc encontra as bases para sua mente resoluta que busca o caminho. Aqueles que se sentam com perfeio fsica, geralmente levam mais tempo para alcanar o caminho verdadeiro do Zen, o senti-mento real do Zen, o cerne do Zen. Mas aqueles que tm grandes dificuldades encontraro nele mais sentido. Por isso, penso s vezes que o melhor cavalo pode ser o pior, e o pior, o melhor/
Se voc estudar caligrafia, poder verificar que aqueles que no so muito talentosos, por via de regra, acabam sendo os melhores calgrafos. Os que so muito hbeis com as mos ge-ralmente deparam com grandes dificuldades depois de terem atingido certo estgio. Isto verdade para as artes e para o Zen. E na vida tambm. Portanto, quando falamos de Zen no pode-mos afirmar "ele bom" ou "ele mau", no sentido comum dessas palavras. A postura assumida no zazen no a mesma para cada um de ns. Para alguns, pode ser impossvel cruzar as pernas em ltus completo. Mas, mesmo sem conseguir adotar a postura de forma correta, quando voc desperta sua verdadeira mente buscadora do caminho, ento pode praticar o Zen no seu sentido genuno. De fato, despertar a verdadeira mente busca-dora do caminho mais fcil para aqueles que tm dificuldade em sentar-se do que para os que podem sentar-se facilmente.
Quando refletimos sobre o que estamos fazendo na vida di-ria, sempre nos envergonhamos de ns mesmos. Um dos meus estudantes uma vez me escreveu dizendo: "Voc me mandou
' um calendrio e estou tentando seguir as boas mximas que aparecem em cada pgina. Mas o ano comeou h pouco e eu j falhei". O mestre Dogen disse: "Shoshaku jushaku". Shaku
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geralmente significa "erro" ou "engano". Shoshaku jushaku sig-nifica "suceder um erro ao outro", ou seja, um engano contnuo. Segundo Dogen, um engano contnuo tambm pode ser Zen. A vida de um mestre Zen, poder-se-ia dizer, feita de muitos anos de shoshaku jushaku. Isso quer dizer muitos anos de es-foro decidido.
Ns dizemos: "Um bom pai no um bom pai". Voc en-tende? Aquele que pensa que um bom pai no o ; aquele que se acha um bom marido no o . Aquele que pensa ser um dos piores maridos pode ser um bom marido, se estiver sempre ten-tando ser um bom marido com um esforo sincero. Se voc est achando impossvel sentar-se por causa de alguma dor ou de alguma dificuldade fsica, ainda assim deveria continuar, usan-do uma almofada grossa ou uma cadeira. Mesmo que voc seja o pior cavalo, voc chegar ao cerne do Zen.
Suponha que seu filho esteja sofrendo de uma doena incu-rvel. Voc no sabe o que fazer, mas mesmo assim no fica deitado na cama. Normalmente, a cama seria o lugar mais con-fortvel para voc ficar. Mas agora, por causa da sua aflio mental, voc no consegue descansar. Voc pode andar para bai-xo e para cima, entrar e sair, que no adianta. Na verdade, o melhor meio de atenuar seu sofrimento mental sentar-se em zazen, mesmo estando em tamanha aflio e em postura incor-reta. Se voc no passou pela experincia de sentar-se em uma situao difcil como essa, voc no um praticante Zen. Ne-nhuma outra atividade ir apaziguar seu sofrimento. Qualquer outra atitude resultar inquietante, e voc no ter poder para aceitar as suas dificuldades; mas na postura zazen, que voc ad-quiriu atravs de longa e dura prtica, sua mente e corpo tm o poder de aceitar as coisas como elas so, sejam elas agradveis ou desagradveis.
Quando voc se sente contrariado, o melhor que tem a fazer sentar-se. No h outro jeito de voc aceitar seu problema e trabalhar sobre ele. Se voc o melhor ou o pior cavalo, se sua postura boa ou m, no vem ao caso. Todos podem praticar zazen e, dessa forma, trabalhar seus problemas e aceit-los.
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Quando voc se senta no meio de seu problema o que mais real para voc? O seu problema ou voc mesmo? A conscincia de que voc existe aqui e agora o fato supremo. Isso o que voc vai perceber com a prtica do zazen. Na continuidade de sua prtica, sob a sucesso de situaes agradveis ou desagradveis, voc realizar o cerne do Zen e adquirir sua fora verdadeira.
No Dualismo "Deter sua mente no quer dizer parar as atividades
da mente. Quer dizer que sua mente impregna todo seu corpo. Com essa mente plena voc forma o mudra com as mos."
Ns dizemos que nossa prtica deve ser feita sem idia de ganho, sem nenhuma expectativa, nem sequer de iluminao. Todavia, isso no significa sentar-se sem propsito algum. Essa forma de praticar, isenta de idia de ganho, baseada no Prajna Paramita Sutra . No entanto, se voc no tomar cuidado, o pr-prio Sutra lhe dar uma idia de ganho. Ele diz: "Forma vazio e vazio forma". Mas se voc se apegar a tal afirmao, estar sujeito a se envolver em idias dualistas: em um lado est voc, forma; em outro, o vazio que voc est procurando perceber atravs de sua prpria forma. Logo, "forma vazio e vazio forma", ainda dualismo. Felizmente, nosso ensinamento pros-segue afirmando: "Forma forma e vazio vazio". Aqui no h dualismo.
Durante o zazen, quando voc tem dificuldade em deter a mente e, apesar disso, continua tentando par-la, significa que voc est no estgio de "forma vazio e vazio forma". Contu-do, essa forma dualista de prtica o conduzir a uma progressi-va unidade com seu objetivo. E quando sua prtica se realizar sem nenhum esforo, voc poder deter sua mente. Essa a fase de "forma forma e vazio vazio".
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Deter sua mente no quer dizer parar as atividades da men-te. Quer dizer que sua mente impregna todo seu corpo. Sua mente segue a respirao. Com essa mente plena voc forma o mudra com as mos. Com essa mente total voc se senta com as pernas doloridas, sem se deixar perturbar por elas. Isso sentar-se sem nenhuma idia de ganho. No incio, pode se sentir tolhi-do em sua postura, mas quando no se deixar perturbar por essa limitao, voc ter encontrado o significado de "vazio vazio e forma forma". Portanto, encontrar seu prprio caminho em meio s restries o caminho da prtica.
Prtica no quer dizer que qualquer coisa que voc faa, at mesmo ficar deitado, seja zazen. Prtica quando as restries no o limitam. Se voc diz "qualquer coisa que eu faa de na-tureza bdica, portanto, no importa o que eu faa e, assim, no h necessidade de praticar zazen", isto j um entendimen-to dualista da nossa vida diria. Se de fato no importasse, nem sequer haveria necessidade de o dizer. Enquanto importar aqui-lo que se faz, haver dualismo. Se voc no estivesse realmente se importando com aquilo que est fazendo, no o mencionaria. Ao sentar-se estar simplesmente sentando-se, nada mais. Ao comer estar apenas comendo. s isso. Se voc diz "no tem importncia", significa que est se justificando por fazer uma coisa maneira da mente pequena. Significa que voc est ape-gado a alguma idia ou coisa em particular. No isso o que queremos dizer com "basta apenas sentar-se" ou "qualquer coi-sa que voc faa zazen". Certamente, qualquer coisa que faa-mos zazen, mas, se de fato , no h necessidade de o dizer.
Ao sentar-se voc deve simplesmente sentar-se, sem se dei-xar perturbar pela dor nas pernas ou pelo sono. Isso zazen. Mas no comeo muito difcil aceitar as coisas como elas so. Voc fica incomodado com o que sente durante sua prtica. "Forma forma e vazio vazio" quer dizer ser capaz de fazer todas as coisas, sejam boas ou ms, sem se perturbar ou aborrecer com seu sentir.
Quando algum sofre de uma doena como o cncer e se d conta de que no viver mais do que dois ou trs anos, e passa a
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procurar algo em que se apoiar, pode comear a praticar. Uma pessoa poder se apoiar na ajuda de Deus. Outra, comear a pra-ticar zazen. Neste caso, a prtica se concentrar em obter o vazio da mente. O que significa que a pessoa estar tentando se livrar do sofrimento da dualidade. Essa a prtica de "forma vazio e vazio forma". Por causa da realidade do vazio que a pessoa quer ter essa experincia em sua vida. Praticar dessa maneira, acreditando e esforando-se, a ajudar, mas no a prtica perfeita.
Sabendo que a vida curta, aproveit-la cada dia, cada hora, cada minuto a vida de "forma forma e vazio vazio". Quan-do o Buda aparecer, voc o receber. Quando o diabo aparecer, voc o receber. O famoso mestre Zen chins Ummon dizia: "Buda com cara de sol" e "Buda com cara de lua". Quando esta-va doente e algum lhe perguntava "como est voc?", ele res-pondia: "Buda com cara de sol e Buda com cara de lua". Essa a vida de "forma forma e vazio vazio". No h problema. Um ano de vida bom. Cem anos de vida tambm so. Se persistir na sua prtica, voc alcanar esse estgio.
No incio ter alguns problemas e precisar de esforo para continuar a prtica. Para o principiante, prtica sem esforo no verdadeira prtica. Para ele, a prtica requer um grande esfor-o. Principalmente para os jovens, necessrio muito esforo para conseguir alguma coisa. Voc deve esticar pernas e braos o mximo possvel. Forma forma. Voc tem de ser fiel ao seu prprio caminho at, por fim, chegar ao ponto de ver que ne-cessrio esquecer tudo sobre voc mesmo. At chegar a esse pon-to, errado pensar que tudo o que fizer Zen ou que no impor-ta se voc pratica ou no. Mas, se voc puser seu melhor esforo em continuar a prtica, com todo seu corpo e sua mente, sem nenhuma idia de ganho, ento, seja o que for que esteja fazen-do, ser prtica verdadeira. Seu propsito deve ser o de manter a continuidade. Ao fazer algo, apenas faz-lo deve ser seu nico propsito. Forma forma e voc voc, e a realidade do vazio ser alcanada em sua prtica.
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Reverencia
"A reverncia uma prtica muito sria. Voc deve estar preparado para faz-la, mesmo no seu ltimo momento. Ainda que seja impossvel livrar-nos de nossos desejos egocntricos, temos que reverenciar. Nossa verdadeira natureza o exige."
Aps o zazen ns fazemos nove prostraes. Ao reveren-ciar, estamos abrindo mo de ns mesmos. E abrir mo de ns mesmos quer dizer abandonar nossas idias dualistas. Assim, no h diferena entre a prtica do zazen e a prtica da revern-cia. Usualmente, a reverncia expressa nosso respeito por algo que merece mais respeito que ns mesmos. Mas, ao reveren-ciar o Buda, voc no deve ter em mente uma idia acerca do Buda; voc simplesmente se torna um com o Buda, voc j o prprio Buda. Quando se torna um com o Buda, um com tudo o que existe, voc encontra o verdadeiro significado de ser. Quando voc abandona as idias dualistas, tudo se torna seu mestre e tudo pode ser objeto de culto.
Quando tudo existe dentro de sua mente grande, todas as relaes dualistas desaparecem. No h mais distino entre cu e terra, homem e mulher, mestre e discpulo. As vezes o homem se curva em reverncia mulher; s vezes a mulher, em reverncia ao homem. s vezes o discpulo reverencia o mes-tre, outras vezes o mestre reverencia o discpulo. Um mestre que no pode curvar-se em reverncia a um discpulo, tampou-co pode curvar-se em reverncia ao Buda. s vezes mestre e discpulo, juntos, curvam-se em reverncia ao Buda. s vezes podemos reverenciar gatos e cachorros.
Na sua mente grande tudo tem igual valor. Tudo o prprio Buda. Voc v ou ouve alguma coisa e a voc tem todas as coi-sas exatamente como elas so. Em sua prtica, voc deve acei-tar as coisas como so, dedicando a cada uma delas o mesmo respeito que dedicado ao Buda. Aqui h estado de Buda. Desta
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forma, o Buda curva-se ante o Buda, e voc curva-se ante voc. Esta a verdadeira reverncia.
Se voc no tiver esta firme convico da mente grande em sua prtica, sua reverncia ser dualista. Quando estiver sendo apenas voc mesmo, estar reverenciando a si prprio no seu verdadeiro sentido e ser um com tudo o que existe. S quando estiver sendo voc mesmo que poder reverenciar tudo, no mais verdadeiro sentido. Reverncia uma prtica muito sria. Voc deve estar preparado para faz-la, mesmo no seu ltimo momento; quando no puder fazer mais nada, exceto reve-renciar, voc deve faz-lo. necessrio esse tipo de convico. Reverencie com esse esprito e ento todos os preceitos, todos os ensinamentos sero seus e possuir todas as coisas dentro de sua mente grande.
Sen-no-Rikyu, o fundador da cerimnia japonesa do ch, cometeu haraquiri em 1591, por ordem de Hideyoshi, seu amo. Momentos antes de pr termo vida, ele disse: "De posse desta espada no h Budas nem patriarcas". Com isso, ele quis dizer que quando possumos a "espada" da mente grande, o mundo dualista no existe. A nica coisa que existe esse esprito. Essa espcie de esprito imperturbvel estava sempre presente nas cerimnias do ch de Rikyu. Ele nunca fazia nada de forma dualista, estava pronto para morrer a cada momento. Cerim-nia aps cerimnia ele morria e tornava a se renovar. Esse o esprito da cerimnia do ch. assim que ns reverenciamos.
Meu mestre tinha um calo na testa de tanto se prostrar. Ele sabia que era um obstinado, um teimoso, e por isso prostrava-se sem parar. O que o fazia prostrar-se tanto era ouvir em seu inte-rior a voz repreensiva de seu mestre. Ele entrou na Ordem Soto (uma das linhagens do Zen) quando j tinha trinta anos, o que, para um sacerdote japons, um tanto tardio. Quando jovens somos menos teimosos e mais fcil nos livrarmos do egocen-trismo. Assim, era desta maneira que seu mestre sempre se diri-gia a ele: "Voc, companheiro-retardatrio", repreendendo-o por ter ingressado to tarde. Na verdade, o mestre apreciava-o pelo seu carter teimoso. Quando meu mestre tinha setenta anos
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disse: "Quando jovem eu era como um tigre, agora sou como um gato". Agradava-lhe ser como um gato.
Curvar-nos em reverncia ajuda a eliminar nossas idias ego-centradas. difcil libertar-nos dessas idias e a reverncia uma prtica muito preciosa. O resultado no o que importa; o esforo para melhorarmos que precioso. E esta prtica no aca-ba nunca.
Cada reverncia expressa um dos quatro votos budistas: "Embora os seres vivos sejam inumerveis, eu me comprometo a salv-los. Embora meus desejos sejam inesgotveis, eu me com-prometo a libertar-me deles. Embora os ensinamentos sejam ili-mitados, eu me comprometo a aprend-los todos. Embora o budismo seja inalcanvel, eu me comprometo a atingi-lo". Se inalcanvel, como possvel alcan-lo? E, no entanto, deve-mos faz-lo. Isso o budismo.
Pensar "porque possvel ns o faremos" no budismo. Ns temos que fazer mesmo o impossvel, porque nossa verda-deira natureza o exige. A questo de ser ou no possvel no vem ao caso. Se almejamos nos livrar das idias egocentradas, ns temos de faz-lo. Quando realizamos esse esforo, nossos desejos mais profundos so apaziguados e nisso consiste o nir-vana. Antes de se decidir a faz-lo ter dificuldade, porm, uma vez que comear, ela desaparecer. O seu esforo apazigua seu desejo profundo. No h outro caminho para se obter tranqili-dade. Mente tranqila no significa que voc deva parar suas atividades. A verdadeira calma deve ser encontrada dentro da prpria atividade. Ns dizemos: " fcil ter calma na inativida-de, mas calma dentro da atividade que a verdadeira calma".
Depois de ter praticado por algum tempo, voc se apercebe-r de que no possvel progredir de modo rpido e extraordin-rio. Mesmo que voc se esforce bastante, o progresso ocorrer pouco a pouco. No como quando voc entra no chuveiro e sabe quando fica molhado. Num nevoeiro voc no percebe que est se molhando mas, medida que segue andando, fica mais e mais molhado. Se voc tiver uma idia formada de progresso, poder dizer: "Oh! essa lentido terrvel". Mas de fato no .
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Quando voc se molha num nevoeiro muito mais difcil vol-tar a secar-se. Portanto, no h por que preocupar-se com o pro-gresso. como estudar uma lngua estrangeira; voc no pode aprender de repente, mas pela constante repetio acaba domi-nando-a. Esse o caminho Soto da prtica. Podemos dizer que progredimos pouco a pouco ou que nem sequer temos expecta-tiva de progredir. O que preciso sermos sinceros e pr todo nosso esforo em cada instante. quanto basta. No existe nir-vana fora da nossa prtica.
Nada Especial "Se voc continuar esta simples prtica todos os dias,
obter um poder maravilhoso. Maravilhoso antes de ser atingido, mas nada especial uma vez obtido."
Depois ozazen no tenho vontade de falar. Sinto que a pr-tica do zazen o bastante. Mas j que tenho que falar, gostaria de discorrer sobre como maravilhoso praticar zazen. Nosso nico propsito manter essa prtica para sempre. Ela comeou no tempo sem incio e continuar pelo futuro sem fim. A rigor, para o ser humano, no h outra prtica a no ser esta. No h outra maneira de viver a no ser esta. A prtica do Zen a ex-presso direta de nossa verdadeira natureza.
Claro, qualquer coisa que faamos expresso de nossa na-tureza, mas sem essa prtica difcil aperceber-se disso. Ser ati-vo prprio da natureza humana, assim como de todas as for-mas de existncia. Enquanto vivos, estamos sempre fazendo al-guma coisa. Mas to logo voc pense: "Estou fazendo isto" ou "tenho que fazer isso" ou "preciso conseguir aquilo", voc, na verdade, no est fazendo nada. Quando voc renuncia, quando no deseja mais coisa nenhuma, quando no tenta nada de es-pecial, ento voc est fazendo alguma coisa. Quando no h
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nenhuma idia de ganho naquilo que faz, ento est fazendo algo. Em zazen, voc no faz o que faz objetivando algo. Voc pode sentir-se como que fazendo algo especial mas, na verdade, simplesmente est expressando sua verdadeira natureza; a ati-vidade que aplaca seu mais profundo desejo. Praticar zazen com algum objetivo no verdadeira prtica.
Se voc continuar esta simples prtica todos os dias, obter um poder maravilhoso. Uma coisa maravilhosa antes de ser atin-gido, mas nada de especial uma vez obtido. simplesmente voc mesmo, nada especial. Como diz um poema chins: "Eu fui e voltei. No era nada especial. Rozan famosa por suas monta-nhas; Sekko por suas guas". As pessoas pensam que deve ser maravilhoso ver a famosa cadeia de montanhas abraada pela bruma e a gua que se diz cobrir toda a terra. Mas se voc for l, ver apenas gua e montanhas. Nada especial.
intrigante o fato de que a iluminao seja uma coisa mara-vilhosa para aqueles que no tm experincia dela e, contudo, no seja nada para aqueles que a atingiram. E, no entanto, no apenas nada. Voc entende? Para uma mulher com filhos, ter filhos no nada especial. Zazen assim. Portanto, se voc per-severar nessa prtica, mais e mais voc obter alguma coisa -nada especial, porm alguma coisa. Voc pode chamar essa coisa de "natureza universal" ou "natureza de Buda" ou "iluminao". Muitos nomes podem lhe ser conferidos, mas para a pessoa que a possui, nada, e ao mesmo tempo, algo.
Quando expressamos nossa verdadeira natureza, ns somos seres humanos. Quando no, ns no sabemos o que somos. No somos animais porque caminhamos sobre duas pernas. Somos diferentes dos animais, mas, o que somos? Podemos ser um fantasma. No sabemos como denominar a ns mesmos. Tal criatura na verdade no existe. E uma iluso. Ainda no so-mos humanos, contudo existimos. Quando o Zen no Zen, nada existe. O que estou falando no faz sentido para o intelec-to mas, se voc j experimentou a verdadeira prtica, entender o que estou dizendo. Se alguma coisa existe, porque ela possui sua verdadeira natureza, sua prpria natureza bdica. No Sutra
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Pari-nirvana, o Buda diz: "Tudo tem natureza de Buda". Todavia, Dogen interpreta isto da seguinte maneira: "Tudo natureza de Buda". Aqui h uma diferena. Se voc diz: "Tudo tem natureza de Buda", significa que a natureza bdica est em cada existn-cia, portanto, natureza bdica e cada existncia so diferentes. Mas quando voc diz "tudo natureza de Buda", significa que todas as coisas so a prpria natureza de Buda. Quando no h natureza de Buda, nada existe. Qualquer coisa que no seja na-tureza bdica apenas iluso. Pode existir em sua mente, mas tal coisa de fato no existe.
Ser um ser humano portanto ser um Buda. Natureza bdi-ca apenas outro nome para nossa verdadeira natureza huma-na. Assim, mesmo que voc no faa nada, j est fazendo algu-ma coisa. Voc est expressando a si prprio, est expressando sua verdadeira natureza. Seus olhos, sua voz, sua conduta a ex-pressam. A coisa mais importante expressar sua verdadeira natureza na forma mais simples e adequada e apreci-la, mes-mo na mais insignificante das existncias.
Com a continuidade desta prtica, semana aps semana, ano aps ano, sua experincia se tornar mais e mais profunda e abraar todas as coisas que fizer em sua vida diria. O mais importante deixar de lado toda e qualquer idia de ganho, toda e qualquer idia dualista. Em outras palavras, pratique zazen somente na postura correta. No pense nada. Apenas permane-a sentado na sua almofada, sem expectativa alguma. Ento voc reassumir finalmente sua verdadeira natureza. Ou seja, sua prpria natureza se reassumir.
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SEGUNDA PARTE
ATITUDE CORRETA
"O ponto que enfatizamos a firme confiana em nossa natureza original."
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O Caminho-Uno
"Mesmo que o sol viesse a nascer no Ocidente, o bodhisattva tem um s caminho."
O propsito da minha palestra no propiciar conhecimen-to intelectual, mas expressar meu apreo pela prtica Zen. Poder sentar-me em zazen com vocs incomum. Qualquer coisa que faamos, alis, incomum porque a prpria vida incomum. O Buda disse: 'Apreciar nossa existncia humana to raro como o p grudar sobre a superfcie das unhas". Vocs sabem, a super-fcie da unha lisa e o p dificilmente adere a ela. A vida huma-na extraordinria e maravilhosa. Quando eu me sento em za-zen minha vontade continuar sentado para sempre, mas est-mulo a mim mesmo a fazer outras prticas, como recitar sutras ou fazer reverncias. E quando reverencio, eu penso "isto ma-ravilhoso". Mas, tenho de mudar de prtica outra vez, ento recito um sutra. Como podem ver, minha palestra apenas para expressar meu apreo. Isso tudo.
Se voc quer expressar sua verdadeira natureza, deve faz-lo de forma natural e apropriada. Mesmo o balanar do corpo para a direita e esquerda quando voc se senta e se levanta do zazen uma expresso de voc. Isso no uma preparao para a prti-ca nem um relaxamento aps a prtica; , isso sim, parte da prpria prtica. Portanto, no devemos faz-lo como uma pre-parao para alguma outra coisa. O mesmo se aplica sua vida diria. Cozinhar ou improvisar algo para comer, segundo Do-gen, no uma preparao, a prpria prtica. Cozinhar no apenas preparar comida para algum ou para voc mesmo, expressar-se com inteireza. Assim, ao cozinhar, voc deve
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expressar a si mesmo na atividade da cozinha. Voc deve conce-der-se um bom tempo e fazer seu trabalho sem ter nada na men-te, sem nenhuma expectativa. Deve apenas cozinhar, nada mais. Isso tambm expresso da nossa inteireza, uma parte da nossa prtica. Sentar em zazen necessrio, mas no a nica via. O que quer que voc faa deve ser a expresso da mesma atividade profunda. Ns devemos apreciar o que estamos fazendo. No h preparao para outra coisa.
O caminho do bodhisattva chamado "o caminho-uno" ou "um trilho com milhares de quilmetros de extenso". O trilho do trem sempre igual. Se ele se tornasse mais estreito ou mais largo seria desastroso. Para qualquer direo que voc v, o tri-lho sempre o mesmo. Esse o caminho do bodhisattva. Assim, mesmo que o sol viesse a nascer no Ocidente, o bodhisattva tem um s caminho. Seu caminho expressar a cada momento sua natureza, sua inteireza.
Ns dizemos trilho, mas na verdade no existe tal coisa. A prpria inteireza o trilho. A paisagem que avistamos do trem muda, mas ns estamos seguindo sobre o mesmo trilho. E para o trilho no h comeo e no h fim. No tem ponto de partida nem de chegada. Nada a ser alcanado. Nosso caminho sim-plesmente seguir sobre o trilho. Essa a natureza da nossa prti-ca Zen. Mas quando voc fica curioso a respeito do trilho, ento h perigo. Voc no deve olhar para o trilho. Se o fizer, ficar tonto. Apenas aprecie a paisagem que avista do trem. Este nosso caminho. No h por que ter curiosidade a respeito do trilho. Algum tomar conta disso; o Buda tomar conta disso. No entanto, s vezes tentamos explicar o trilho porque o fato de uma coisa ser sempre a mesma nos desperta a curiosidade. En-to nos perguntamos: "Como possvel para o bodhisattva ser sempre o mesmo? Qual o seu segredo?" Mas no h segredo. Todos temos a mesma natureza que o trilho do trem.
Havia dois bons amigos, Chokei e Hofuku. Eles estavam conversando sobre o caminho dos bodhisattvas e Chokei disse: "Mesmo que o arhat (um iluminado) tivesse desejos nocivos, ainda assim o Thatagata (o Buda) no tem dois tipos de palavras.
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Eu digo que o Thatagata tem palavras, mas no palavras dualis-tas". Hofuku ento disse: "Embora voc diga isso, seu coment-rio no perfeito". Chokei perguntou: "Qual seu entendimen-to das palavras do Thatagata?" Hofuku respondeu: "J discuti-mos bastante, tomemos uma xcara de ch". Hofuku no deu resposta ao seu amigo porque impossvel fazer interpretao verbal do nosso caminho. Contudo, como parte da prtica, es-ses dois amigos discutiram o caminho do bodhisattva, mesmo sem esperarem encontrar uma interpretao nova. Da a respos-ta do Hofuku: "Nossa discusso acabou. Tomemos um ch".
Essa uma boa resposta, no ? O mesmo acontece com a minha palestra. Quando ela termina, vocs param de ouvi-la. No h necessidade de lembrar o que eu disse; no h necessida-de de entender o que eu disse; vocs j tm todo o entendimen-to dentro de vocs. No existe problema.
Repetio "Se voc perde o esprito de repetio, sua prtica
se torna bastante difcil."
O pensamento e a prtica da ndia, com os quais o Buda se defrontou, estavam baseados na idia de que os seres humanos so uma combinao de elementos fsicos e espirituais. Achava-se que o lado fsico do homem limita o espiritual; por isso, na prtica religiosa os indianos procuravam enfraquecer o elemen-to fsico para libertar e fortalecer o esprito. Assim, a prtica encontrada pelo Buda na ndia dava nfase ao ascetismo. Mas, enquanto praticava o ascetismo, o Buda descobriu que no ha-via limites para a purificao fsica e que isso tornava a prtica religiosa muito pouco realista. Esse tipo de conflito com nosso corpo s termina quando morremos. De acordo com o pensa-mento indiano, no entanto, ns retornamos em outra vida e em
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mais outra e outra, repetindo a luta mais e mais vezes, sem nun-ca alcanar a iluminao perfeita. E ainda que voc pense ser possvel debilitar a fora fsica o bastante para libertar o poder espiritual, isso s funcionaria enquanto continuasse a praticar o ascetismo. Pois, se voc retoma sua vida costumeira, ter que fortalecer seu corpo, mas depois enfraquec-lo novamente de modo a recuperar seu poder espiritual. E, assim, teria que repetir esse processo indefinidamente. Esta pode ser uma simplificao exagerada a respeito da prtica indiana com a qual deparou o Buda, e pode chegar a nos causar riso; contudo, h pessoas que realizam esse tipo de prtica at hoje. As vezes, essa idia de ascetismo continua enraizada na mente da pessoa sem que ela se aperceba disso. Mas essa forma de prtica no resulta em nenhum progresso.
O caminho do Buda foi completamente diferente. No in-cio, ele estudou o mtodo hindu vigente em sua poca e regio e praticou o ascetismo. Mas o Buda no estava interessado nos elementos que constituam o ser humano, nem tampouco nas teorias metafsicas da existncia. O que, sim, o interessava era saber como ele prprio existia naquele exato momento. Essa era a questo. O po feito de farinha. A coisa mais importante para o Buda era saber como a farinha vira po ao ser colocada no forno. Seu maior interesse era saber como podemos nos tornar iluminados. A pessoa iluminada algum perfeito, cuja condu-ta desejvel tanto para si mesma como para os outros. O Buda queria descobrir como os seres humanos desenvolvem esse esta-do ideal - como os sbios do passado tinham se tornado sbios. Para descobrir como a massa se transforma em po perfeito, ele fez o po repetidas vezes at que obteve xito.
Talvez se possa achar pouco interessante cozinhar repetidas vezes a mesma coisa, dia aps dia. Pode parecer tedioso. De fato, se voc perde o esprito de repetio, sua prtica se torna bas-tante difcil, mas no ser difcil se voc estiver cheio de fora e vitalidade. De qualquer modo, no h como ficar inativo; ne-cessrio fazer alguma coisa. Portanto, quando fizer alguma coi-sa, seja atento, cuidadoso e alerta. Nosso caminho colocar a
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massa no forno e observ-la com cuidado. Uma vez que voc souber como a massa se transforma em po, v