Algebra Completo

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  • 1

    1

    Livro: Introduo lgebra LinearAutores: Abramo Hefez

    Ceclia de Souza Fernandez

    Captulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes

    Sumrio

    1 O que lgebra Linear? . . . . . . . . . . . . . . . 2

    1.1 Corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

    1.2 Espaos Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

    1.3 Sistemas de Equaes Lineares . . . . . . . . . . . 9

    2 Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

    2.1 A Denio de Matriz . . . . . . . . . . . . . . . . 14

    2.2 Operaes com Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . 16

    2.3 Matriz Inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

  • 2 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    1 O que lgebra Linear?

    Os espaos em que trabalharemos so os Rn, com n 2, isto , o produtocartesiano de n cpias da reta real R. Para n 4, este espao generalizao espao R2 dos vetores do plano e o espao R3 dos vetores no espao. Adiferena crucial entre os casos n = 2 e n = 3 e os casos em que n 4 que, para estes ltimos, no se dispe de uma representao geomtrica.

    O fato no diminui a importncia desses espaos, pois basta pensar que o

    R4 o espao-tempo da Fsica, em que os pontos so quaternos (x, y, z, t),com as trs primeiras coordenadas representando a posio no espao de uma

    partcula ideal e a ltima representando o instante t em que esta partcula

    ocupa tal posio. Por no existir uma representao geomtrica para os

    pontos de Rn com n 4, seremos obrigados a trat-los algebricamente, semo recurso da visualizao geomtrica, to fundamental em R2 e R3.

    Portanto, trataremos os elementos de Rn como vetores, onde a soma dedois vetores (x1, x2, . . . , xn) e (y1, y2, . . . , yn) dada por

    (x1, x2, . . . , xn) + (y1, y2, . . . , yn) = (x1 + y1, x2 + y2, . . . , xn + yn),

    e a multiplicao do vetor (x1, x2, . . . , xn) pelo nmero real a, chamado de

    escalar, denida por

    a(x1, x2, . . . , xn) = (ax1, ax2, . . . , axn).

    Os espaos Rn so utilizados de modo essencial em quase todos os ramosdo conhecimento e, por este motivo, so estudados em Matemtica sob os

    mais variados pontos de vista e com as mais diversas estruturas. Por exem-

    plo, no Clculo Diferencial, so considerados como espaos normados; em

    Geometria, como espaos com produto interno.

    A estrutura de Rn estudada em lgebra Linear a induzida pela estruturade corpo da reta real R. Essa a estrutura mnima apropriada para se estudarsistemas de equaes lineares com vrias incgnitas. Alm disso, aquela

    sobre a qual se constroem o Clculo Diferencial e a Geometria Diferencial,

    entre outros.

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 3

    Como a estrutura de corpo de R desempenhar papel fundamental, vamosdenir formalmente este conceito.

    1.1 Corpos

    Um conjunto K ser chamado de corpo se for munido de uma operao

    de adio (+) e uma operao de multiplicao (), vericando as condiesa seguir.

    A1 A adio associativa:

    (a+ b) + c = a+ (b+ c), para todos a, b, c K.A2 A adio comutativa:

    a+ b = b+ a, para todos a, b K.A3 A adio possui elemento neutro:

    existe 0 K, tal que a+ 0 = a, para todo a K.A4 A adio possui simtricos:

    para todo a K, existe a K tal que a+ (a) = 0.M1 A multiplicao associativa:

    (a b) c = a (b c), para todos a, b, c K.M2 A multiplicao comutativa:

    a b = b a, para todos a, b K.M3 A multiplicao possui elemento neutro:

    existe 1 K \ {0}, tal que a 1 = a, para todo a K.M4 A multiplicao possui inversos:

    para todo a K \ {0}, existe a1 K tal que a a1 = 1.AM A multiplicao distributiva com relao adio:

    a (b+ c) = a b+ a c, para todos a, b, c K.

    Portanto, so corpos os conjuntos Q, R e C, com as suas respectivasadies e multiplicaes.

    A operao de multiplicao em um corpo muitas vezes denotada por

    (), escrevendo a b, ou mesmo ab, no lugar de a b, notao que adotaremosao longo deste livro.

  • 4 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    Existem exemplos de corpos que primeira vista parecem exticos, como

    o corpo de Galois1 F2, que consiste dos dois elementos 0 e 1 com as seguintesoperaes:

    + 0 1

    0 0 1

    1 1 0

    0 10 0 0

    1 0 1

    Note que este o corpo com o menor nmero possvel de elementos,

    pois todo corpo deve possuir os dois elementos distintos 0 e 1. Apesar de

    parecerem apenas curiosidades, os corpos com um nmero nito de elementos

    tm as mais variadas aplicaes em quase toda a Matemtica e so essenciais

    na tecnologia e na computao.

    1.2 Espaos Vetoriais

    Os espaos Rn, por serem constitudos por vetores que podem ser soma-dos e multiplicados por escalares, como vimos antes, so chamados espaos

    vetoriais.

    Como os espaos vetoriais so os objetos principais de estudo da lgebra

    Linear, vamos deni-los formalmente a seguir.

    Um conjunto V ser dito um espao vetorial sobre um corpo K, se possui

    uma adio (+) com as mesmas propriedades da adio em um corpo; ou

    seja,

    A1 A adio associativa:

    (u+ v) + w = u+ (v + w), para todos u, v, w V .A2 A adio comutativa:

    u+ v = v + u, para todos u, v V .A3 A adio possui elemento neutro (elemento zero):

    existe 0 V , tal que v + 0 = v, para todo v V .1Em homenagem a variste Galois (Frana, 1811-1832), considerado um dos grandes

    gnios da Matemtica.

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 5

    A4 A adio possui simtricos:

    para todo v V , existe v V tal que v + (v) = 0.

    E alm disso, existe uma operao chamada de multiplicao por escalar, que

    associa a um elemento a K e a um elemento v V , um elemento av V ,tal que

    ME1 a(u+ v) = au+ av, para todos a K e u, v V .ME2 (a1 + a2)v = a1v + a2v, para todos a1, a2 K e v V .ME3 (a1a2)v = a1(a2v), para todos a1, a2 K e v V .ME4 1v = v, para todo v V .

    Os elementos de V sero chamados de vetores e os elementos de K de

    escalares. Assim, o elemento 0 de V ser chamado de vetor nulo e o elemento

    v de vetor oposto de v.

    O primeiro matemtico a dar uma denio abstrata para um espao

    vetorial foi Giuseppe Peano (Itlia, 1858 - 1932) em seu livro Calcolo Geo-

    metrico, de 1888. No Captulo IX, Peano d uma denio do que ele chama

    de um sistema linear. Para Peano, um sistema linear consistia de quantidades

    com operaes de adio e multiplicao por escalar. A adio deveria satis-

    fazer as leis comutativa e associativa, enquanto a multiplicao por escalar

    deveria satisfazer duas leis distributivas, uma lei associativa e a lei de que

    1 v = v para toda quantidade v. Alm disso, Peano incluiu como parte deseu sistema de axiomas a existncia de uma quantidade 0 (zero) satisfazendo

    v + 0 = v, para todo v, assim como v + (1)v = 0 para todo v. Peanotambm deniu a dimenso de um sistema linear como o mximo nmero de

    quantidades linearmente independentes do sistema (veja esta noo na Seo

    2 do Captulo 3). Peano vericou que o conjunto das funes polinomiais em

    uma varivel forma um sistema linear, mas no existia um tal nmero m-

    ximo de quantidades linearmente independentes, portanto, a dimenso deste

    sistema deveria ser innito.

    O fato a seguir decorre da denio de espao vetorial. Para a K e

  • 6 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    v V , tem-se que

    a = 0 ou v = 0 av = 0.

    De fato, sejam a K e 0 V . Como 0 + 0 = 0, pela propriedade ME1,segue-se que

    a 0 = a(0 + 0) = a 0 + a 0.

    Somando o simtrico a 0 de a 0 a ambos os lados da igualdade acima eutilizando as propriedades A4, A1 e A3, temos que

    0 = a 0 + (a 0) = (a 0 + a 0) + (a 0) = a 0 + [a 0 + (a 0)] = a 0 + 0 = a 0.

    De modo semelhante, mostra-se (faa-o) que para 0 K e v V tem-se0 v = 0, onde o elemento 0 da direita o elemento zero de V .

    Reciprocamente, suponhamos que av = 0 e a 6= 0, ento, multiplicandoambos os lados da igualdade acima pelo escalar a1, temos que

    0 = a10 = a1(av) = (a1a)v = 1v = v.

    Dois vetores u e v em um espao vetorial V sero ditos colineares, se

    existir um elemento a em K tal que v = au. Portanto, so colineares os

    vetores u e au, para todo a K. Note que o vetor 0 colinear com qualquervetor v, pois 0 = 0v.

    um exerccio fcil mostrar que Rn um espao vetorial sobre o corpoR, com as operaes de adio de vetores e a multiplicao por escalaresque denimos anteriormente, onde o elemento zero o vetor (0, 0, . . . , 0) e o

    simtrico de (x1, x2, . . . , xn) o vetor

    (x1, x2, . . . , xn) = (x1,x2, . . . ,xn).

    Observe que no h nada de especial sobre os reais, alm de sua estrutura

    de corpo para que Rn seja um espao vetorial sobre R. Mais geralmente,dado um corpo qualquer K, o espao Kn um espao vetorial sobre K, com

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 7

    operaes semelhantes s de adio de vetores e de multiplicao de vetores

    por escalares que denimos no caso em que K = R.Por exemplo, os espaos vetoriais Fn2 sobre F2, por mais incuos que

    possam parecer, so de extrema utilidade em vrias aplicaes, dentre elas

    na construo de cdigos corretores de erros (veja a referncia [3] para maiores

    detalhes sobre esta teoria).

    Outros exemplos importantes de espaos vetoriais so os espaos R e Csobre o corpo Q e o espao C sobre o corpo R.

    Como sucede com frequncia em Matemtica, ao introduzir um conceito

    para lidar com determinado problema, cria-se um instrumento que muitas

    vezes transcende o problema inicial e se constitui em um conceito central em

    vrios outros contextos. Isto ocorreu com a noo de espao vetorial, que

    inicialmente foi introduzida para tratar de alguns tipos de problemas em Rn,como a resoluo de sistemas de equaes lineares cuja discusso iniciaremos

    na prxima subseo, e se desenvolveu em uma teoria com vida prpria.

    Pode-se sinteticamente dizer que a lgebra Linear a parte da Matemtica

    que se dedica ao estudo dos espaos vetoriais e de certas funes entre esses

    espaos, chamadas de transformaes lineares.

    Embora muitas das ferramentas bsicas da lgebra Linear, particular-

    mente as que esto relacionadas com sistemas lineares, datem da antigui-

    dade, o assunto comeou a tomar sua forma atual em meados dos sculo

    XIX. A partir desta poca, muitas noes estudadas em sculos anteriores

    foram abstradas e muitos mtodos generalizados.

    A lgebra Linear tem vrias aplicaes fora da Matemtica. Por exemplo,

    citamos a teoria da relatividade e a mecnica quntica na Fsica e a teoria

    de anlise de regresso na Estatstica.

    A seguir, daremos alguns exemplos diferentes de Rn para ilustrar situaesonde aparecem os espaos vetoriais e que, muitas vezes, quando tratadas

    dessa forma ganham clareza.

    Exemplo 1 O conjunto das funes de um conjunto no vazio A em Rforma um espao vetorial sobre R, onde a soma a soma usual de funes

  • 8 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    com valores reais

    (f + g)(x) = f(x) + g(x), para todo x A,

    e a multiplicao de uma funo f por um escalar a R denida comosendo

    (a f)(x) = a f(x), para todo x A.

    Em particular, se I = [a, b] um intervalo em R, sabe-se do Clculo Dife-rencial e Integral que o conjunto das funes contnuas, bem como o conjunto

    das funes integrveis, de I em R, so espaos vetoriais sobre R.

    Exemplo 2 De acordo com o Exemplo 1, o conjunto S das sequncias denmeros reais, isto , o conjunto das funes de N \ {0} em R um espaovetorial sobre R. fcil vericar (leitor, faa-o) que o conjunto R(a, b) dassequncias (un) em S que satisfazem a recorrncia

    un+1 = aun + bun1, n 2,

    onde a e b so dois nmeros reais xados, um espao vetorial sobre R. Emparticular, o conjunto R(1, 1), que contm a sequncia de Fibonacci2 (aquelapara a qual u1 = u2 = 1), um espao vetorial. Veremos no Captulo 5

    como esta informao nos ajudar a achar todas as sequncias em R(1, 1),determinando suas frmulas fechadas.

    Exemplo 3 (Peano) O conjunto K[x] dos polinmios com coecientes em

    um corpo K forma um espao vetorial sobre K. Para n N, os conjuntos

    K[x]n = {p(x) K[x] ; grau(p(x)) n} {0}

    tambm so espaos vetoriais sobre K. Em particular, o conjunto

    R[x]2 = {a0 + a1x+ a2x2; a0, a1, a2 R}

    um espao vetorial sobre R.2Apelido de Leonardo de Pisa (Itlia, 1170 - 1250). Foi o primeiro grande mate-

    mtico europeu da Idade Mdia.

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 9

    1.3 Sistemas de Equaes Lineares

    Desde a antiguidade, em diversas reas do conhecimento, muitos pro-

    blemas so modelados matematicamente por sistemas de equaes lineares.

    Damos a seguir um exemplo de sistema de equaes lineares:{x+ y = 36

    x y = 2,(1)

    onde se subentende que estamos buscando dois nmeros reais cuja soma

    vale 36 e cuja diferena vale 2. Portanto, as solues procuradas podem ser

    representadas por pares de nmeros reais (a, b) tais que, se substiturmos x

    por a e y por b, nas equaes, elas se tornam igualdades de fato. Por exemplo,

    o par (x, y) = (19, 17) uma soluo, pois obtemos as igualdades:{19 + 17 = 36

    19 17 = 2.

    Os sistemas com duas equaes lineares, como o acima, j eram consi-

    derados pelos babilnios por volta de 1800 a.C. e resolvidos por um mtodo

    que chamamos hoje de mtodo de eliminao gaussiana3.

    Por exemplo, para resolver o sistema de equaes (1), ao somarmos a

    segunda equao primeira, o transformamos no sistema equivalente,{2x = 38

    x y = 2,

    que seguimos transformando at obtermos um sistema onde as solues so

    trivialmente encontradas:{2x = 38

    x y = 2

    {x = 19

    x y = 2

    {x = 19

    x y x = 2 19

    {x = 19

    y = 17.

    3Em homenagem a Carl Friedrich Gauss (Alemanha, 1777 - 1855), considerado um dos

    maiores matemticos de todos os tempos.

  • 10 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    Esse mtodo ser generalizado e sistematizado para sistemas de equaes

    lineares com m equaes e n incgnitas do tipoa11x1 + a12x2 + + a1nxn = b1a21x1 + a22x2 + + a2nxn = b2...

    am1x1 + am2x2 + + amnxn = bm ,

    (2)

    onde os aij's e os bi's, para 1 i m e 1 j n, so nmeros reais dados,ou, mais geralmente, elementos de um corpo K dado.

    Seja

    S = {(c1, c2, . . . , cn) Rn ; ai1c1 + ai2c2 + + aincn = bi, 1 i m}.

    Esse subconjunto de Rn chamado de conjunto soluo do sistema (2). precisamente este conjunto que queremos determinar ou descrever o mais

    explicitamente possvel.

    Note que para resolver o sistema (1), do exemplo acima, o modicamos

    gradativamente, por meio de uma sequncia de transformaes elementares,

    em um sistema mais simples de resolver, onde por transformao elementar

    de um sistema entendemos uma das seguintes transformaes:

    1) Trocar a posio relativa de duas equaes do sistema;

    2) Trocar uma equao pela soma membro a membro da prpria equao

    com um mltiplo de outra;

    3) Trocar uma equao dada por um de seus mltiplos (i.e., a equao obtida

    multiplicando ambos os membros da equao dada por um nmero real no

    nulo).

    Diremos que dois sistemas de equaes lineares so sistemas equivalentes,

    se pudermos obter um sistema do outro a partir de uma sequncia nita de

    transformaes elementares.

    Esta relao entre sistemas efetivamente uma relao de equivalncia.

    De fato, ela claramente reexiva, pois basta multiplicar uma das equaes

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 11

    do sistema por 1; transitiva, pois basta concatenar uma sequncia de trans-

    formaes elementares com uma outra; e simtrica, pois podemos desfazer

    uma transformao elementar com outra.

    Assim, imediato vericar que:

    Sistemas de equaes lineares equivalentes possuem mesmo conjunto soluo.

    Dentre os sistemas de equaes lineares, ocupam lugar de destaque os

    sistemas homogneos, ou seja, aqueles sistemas como em (2), porm com os

    bi's todos nulos: a11x1 + a12x2 + + a1nxn = 0a21x1 + a22x2 + + a2nxn = 0...

    am1x1 + am2x2 + + amnxn = 0.

    (3)

    Esses sistemas possuem peculiaridades no compartilhadas pelos sistemas

    mais gerais. Por exemplo, o vetor (0, 0, . . . , 0) pertence ao conjunto Sh de

    solues do sistema. Alm disso, se os vetores u = (c1, c2, . . . , cn) e u =

    (c1, c2, . . . , c

    n) so solues do sistema, e se a R, ento os vetores

    u+ u = (c1 + c1, c2 + c

    2, . . . , cn + c

    n) e au = (ac1, ac2, . . . , acn)

    tambm so solues do sistema (3) (leitor, verique).

    Assim, resulta que o espao Sh das solues do sistema (3) um espao

    vetorial sobre R De fato, as propriedades A1 e A2 da denio so satisfeitaspara todos os vetores de Rn e em particular para os de Sh. Por outro lado,(0, 0, . . . , 0) Sh e se (c1, c2, . . . , cn) Sh, ento

    1(c1, c2, . . . , cn) = (c1,c2, . . . ,cn) Sh,

    o que mostra que a adio em Sh possui tambm as propriedades A3 e A4.

    Alm disso, as propriedades ME1ME4 da multiplicao por escalar so fa-

    cilmente vericadas para Sh.

    Note que o que h de essencial em um sistema de equaes lineares

    (2) so os coecientes das equaes que o formam alm dos nmeros que

  • 12 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    compem os segundos membros das equaes. Consideremos os vetores

    (ai1, ai2, . . . , ain, bi) de Rn+1 que representam os coecientes das equaes dosistema (2) acrescidos dos segundos membros e os organizemos como linhas

    de uma tabela, chamada de matriz ampliada do sistema (2), como segue:a11 a12 a1n b1a21 a22 . . . a2n b2...

    ......

    ...

    am1 am2 amn bm

    . (4)Quando o sistema de equaes homogneo, a ele associamos a matriz

    a11 a12 a1na21 a22 . . . a2n...

    ......

    am1 am2 amn

    ,eliminando a coluna de zeros da direita na matriz (4).

    As matrizes surgiram por volta do ano 200 a.C. com os chineses, motiva-

    dos pelo interesse em calcular solues de sistemas com mais de quatro equa-

    es lineares. De fato, no Captulo 8 do texto intitulado Jiuzhang suanshu, de

    autor desconhecido, que signica Nove captulos sobre a Arte Matemtica" ,

    ca claro que o procedimento de resoluo de sistemas lineares usado pelos

    chineses semelhante ao mtodo de escalonamento, que discutiremos ainda

    neste captulo, e apresentado na forma de matrizes. Cabe observar que os

    chineses s consideravam sistemas lineares com o mesmo nmero de equa-

    es e incgnitas, no constando em seus escritos o motivo desses sistemas

    produzirem sempre uma nica soluo e como o algoritmo chins funcionava.

    Problemas

    1.1 Verique que o conjunto das funes de um conjunto no vazio A nos

    reais um espao vetorial sobre R, com as operaes denidas no Exemplo

  • 1. O QUE LGEBRA LINEAR? 13

    1. Verique tambm que, para cada par de nmeros reais (a, b), o conjunto

    das recorrncias R(a, b), denido no Exemplo 2, um espao vetorial sobreR.

    1.2 Seja v um elemento no nulo de um espao vetorial V sobre R. Mostreque injetora a funo

    R Vt 7 tv.

    1.3 Sejam v1 e v2 elementos de um espao vetorial V sobre R. Mostre que afuno

    R2 V(a1, a2) 7 a1v1 + a2v2

    injetora se, e somente se, v1 e v2 no so colineares.

    1.4 Diga, em cada caso, por que o conjunto com as operaes indicadas no

    satisfaz denio de espao vetorial, onde a R.

    a) R2, com as operaes:(x, y) + (x, y) = (x+ x, y + y) e a(x, y) = (3ax, 3ay).

    b) R2, com as operaes:(x, y) + (x, y) = (xx, yy) e a(x, y) = (ax, 0).

    c) R3, com as operaes:(x, y, z) + (x, y, z) = (0, 0, 0) e a(x, y, z) = (ax, ay, az).

    1.5 Sejam U e W dois espaos vetoriais sobre um corpo K. Considere o

    produto cartesiano V = U W desses dois conjuntos. Dena as seguintesoperaes em V :

    (u1, w1) + (u2, w2) = (u1 + u2, w1 + w2) e a(u1, w1) = (au1, aw1),

    onde u1, u2 U , w1, w2 W e a K. Mostre que V com as operaes deadio e de mutiplicao por escalar, acima denidas, um espao vetorial

    sobre K. Este espao vetorial chamado de espao produto de U por W .

  • 14 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    2 Matrizes

    As matrizes so ferramentas bsicas da lgebra Linear, pois alm de for-

    necerem meios para a resoluo dos sistemas de equaes lineares, elas tam-

    bm representaro as transformaes lineares entre espaos vetoriais, como

    veremos no Captulo 6.

    2.1 A Denio de Matriz

    Dados m e n em N \ {0}, denimos uma matriz real de ordem m por n,ou simplesmente uma matriz m por n (escreve-se m n), como uma tabelaformada por elementos de R distribudos em m linhas e n colunas. Esteselementos de R so chamados entradas da matriz4. Por exemplo, a matriz[3] uma matriz 1 1, ao passo que[

    2 1 0

    1 2 4

    ]

    uma matriz 23. As entradas da primeira linha da matriz so dadas pelosnmeros reais 2, 1 e 0 e as entradas da segunda linha da matriz so dadas

    pelos nmeros reais 1, 2 e 4. usual indicarmos as entradas de uma matriz arbitrria A pelos sm-

    bolos Aij, ou ainda aij , onde os ndices indicam, nessa ordem, a linha e a

    coluna onde o elemento se encontra. Assim, uma matriz mn usualmenterepresentada por

    A =

    a11 a12 . . . a1n

    a21 a22 . . . a2n...

    ......

    am1 am2 . . . amn

    ,4As entradas de uma matriz no precisam ser necessariamente nmeros reais, podem

    ser nmeros complexos ou, mais geralmente, elementos de um corpo K.

  • 2. MATRIZES 15

    ou por A = [aij]mn , ou simplesmente por A = [aij], quando a ordem da

    matriz estiver subentendida. O smbolo M(m,n) denota o conjunto dasmatrizes m n.

    Dependendo dos valores de m e n, uma matriz m n recebe um nomeespecial. De fato, toda matriz 1 n chamada de uma matriz linha e todamatriz m1 chamada de uma matriz coluna. Uma matriz nn chamadade matriz quadrada de ordem n. Por exemplo, a matriz[

    1 3 1 0 4]

    uma matriz linha de ordem 1 5 e a matriz2 1 00 1 23 1 4

    uma matriz quadrada de ordem 3.

    Se A = [aij] uma matriz quadrada de ordem n, as entradas aii , com

    1 i n, formam a diagonal principal de A.Uma matriz diagonal de ordem n uma matriz quadrada de ordem n em

    que os elementos que no pertencem diagonal principal so iguais a zero:a11 0 . . . 0

    0 a22 . . . 0...

    ......

    0 0 . . . ann

    .A matriz diagonal de ordem n cujas entradas da diagonal principal so

    iguais ao nmero real 1, 1 0 . . . 0

    0 1 . . . 0...

    ......

    0 0 . . . 1

    , chamada matriz identidade de ordem n e denotada usualmente por In. Em

    alguns casos, representaremos por simplicidade In apenas por I.

  • 16 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    Uma matriz triangular superior de ordem n uma matriz quadrada de

    ordem n em que todos os elementos abaixo da diagonal principal so iguais

    a zero: a11 a12 . . . a1n

    0 a22 . . . a2n...

    ......

    0 0 . . . ann

    .Portanto, uma matriz quadrada A = [aij] de ordem n triangular superior

    se aij = 0 sempre que i > j.

    Analogamente, uma matriz triangular inferior de ordem n uma matriz

    quadrada de ordem n em que todos os elementos acima da diagonal principal

    so iguais a zero: a11 0 . . . 0

    a21 a22 . . . 0...

    ......

    an1 an2 . . . ann

    .Portanto, uma matriz quadrada A = [aij] de ordem n triangular inferior se

    aij = 0 sempre que i < j.

    Uma matriz m n cujas entradas so todas iguais a zero chamada deuma matriz nula. Por exemplo, a matriz[

    0 0 0

    0 0 0

    ]

    uma matriz nula de ordem 2 3.

    2.2 Operaes com Matrizes

    Dizemos que duas matrizes A = [aij]mn e B = [bij]mn, de mesma ordem,

    so iguais, escrevendo A = B, quando aij = bij para todo 1 i m e paratodo 1 j n.

  • 2. MATRIZES 17

    Por exemplo, se x e y denotam nmeros reais, temos que as matrizes[x 0

    1 y

    ]e

    [1 01 2

    ]so iguais quando x = 1 e y = 2.

    Denimos a seguir uma operao de adio no conjunto M(m,n) dasmatrizes m n.

    Se A = [aij] e B = [bij] so duas matrizes de mesma ordem m n, asoma de A e B, denotada A + B, a matriz C = [cij] de ordem m n talque cij = aij + bij para todo 1 i m e para todo 1 j n.

    Por exemplo,[2 3 10 2 1

    ]+

    [2 3 10 2 1

    ]=

    [0 0 0

    0 0 0

    ].

    Dada uma matriz A = [aij], dene-se a matriz oposta de A, como a matriz

    A = [aij].A adio de matrizes tem propriedades semelhantes adio nos nmeros

    reais, ou adio de elementos em espaos vetoriais, como mostra o resultado

    a seguir.

    Proposio 1.2.1. Se A, B e C so matrizes de mesma ordem, ento :

    (i) A+ (B + C) = (A+B) + C (associatividade da adio);

    (ii) A+B = B + A (comutatividade da adio);

    (iii) A+ 0 = A, onde 0 denota a matriz nula m n (elemento neutro);(iv) A+ (A) = 0.

    Demonstrao As propriedades acima decorrem diretamente das deni-

    es de igualdade e adio de matrizes. Por esta razo, provaremos apenas

    o item (i) e deixaremos (ii), (iii) e (iv) como exerccio (veja Problema 2.5).

    (i): Se A = [aij], B = [bij] e C = [cij], ento

    A+ (B + C) = [aij] + [bij + cij] = [aij + (bij + cij)] =

    [(aij + bij) + cij] = [aij + bij] + [cij] = (A+B) + C,

  • 18 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    onde usamos a associatividade da adio de nmeros reais.

    Uma outra operao importante com matrizes a multiplicao por es-

    calar. Dada a matriz A = [aij]mn, denimos o produto de A pelo nmero

    real a, como aA = [aaij]mn.

    Por exemplo,

    3

    2 01 10 1

    =6 03 3

    0 3

    .Tendo denido as operaes de adio e multiplicao por escalar em

    M(m,n), denimos a operao de subtrao da maneira usual: dada asmatrizes A e B emM(m,n),

    AB = A+ (B).

    Proposio 1.2.2. As seguintes propriedades se vericam para quaisquer A

    e B M(m,n), e a, a R:

    (i) a(A+B) = aA+ aB;

    (ii) (a+ a)A = aA+ aA;

    (iii) a(aA) = (aa)A;

    (iv) 1A = A.

    Demonstrao Provaremos apenas (i) e deixaremos a demonstrao das

    demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).

    (i): De fato, sejam A = [aij], B = [bij] elementos deM(m,n) e a um elementode R, ento

    a(A+B) = a[aij + bij] = [a(aij + bij)] = [aaij + abij] =

    [aaij] + [abij] = a[aij] + a[bij] = aA+ aB,

    onde usamos a distributividade da multiplicao em relao adio de n-

    meros reais.

  • 2. MATRIZES 19

    Assim, com as Proposies 1.2.1 e 1.2.2, provamos que o conjuntoM(m,n) um espao vetorial sobre R.

    O conjunto das matrizes tem uma estrutura muito mais rica do que a de

    simples espao vetorial, obtida com a noo de produto de matrizes, noo

    esta, fundamental para a resoluo de sistemas de equaes lineares com o

    uso de matrizes.

    Nosso prximo objetivo , portanto, denir a multiplicao de matrizes e

    mostrar algumas de suas propriedades. A denio de produto de matrizes

    foi apresentada por Arthur Cayley (Inglaterra, 1821-1895), no trabalho inti-

    tulado A Memoir on the Theory of Matrices, publicado em 1858 na revista

    Philosophical Transactions of the Royal Society of London . Neste trabalho,

    Cayley notou que a multiplicao de matrizes, como foi denida, simplica

    em muito o estudo de sistemas de equaes lineares. Tambm observou que

    esta multiplicao deixava de apresentar propriedades importantes, como a

    comutatividade e a lei do corte, e que uma matriz no nula no necessaria-

    mente invertvel.

    Sejam A = [aij]mn e B = [bij]np duas matrizes. Denimos o produto

    AB de A por B, denotado por AB, como a matriz C = [cij]mp tal que

    cij =n

    k=1

    aik bkj = ai1 b1j + + ain bnj

    para todo 1 i m e para todo 1 j p.

    Vamos explicar esta frmula para obter o elemento da matriz AB que se

    encontra na i-sima linha e j-sima coluna:

    Na matriz A, destaque a i-sima linha, e na matriz B, a j-sima coluna.

    Feito isto, multiplique ordenadamente o primeiro elemento da linha com o

    primeiro elemento da coluna, o segundo elemento da linha com o segundo

    elemento da coluna, etc., o ltimo elemento da linha com o ltimo elemento

    da coluna e nalmente some esses nmeros todos.

  • 20 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    Por exemplo, 2 40 01 3

    [1 11 1

    ]=

    2(1) + 4(1) 2(1) + 4(1)0(1) + 0(1) 0(1) + 0(1)1(1) + 3(1) 1(1) + 3(1)

    =2 20 04 4

    .Note que para o produto de A por B estar denido, o nmero de colunas

    de A deve ser igual ao nmero de linhas de B. Assim, se A e B so matrizes

    2 3 e 3 1, respectivamente, o produto AB est denido e uma matriz2 1. Porm, o produto BA no est denido. Uma condio necessriapara que AB = BA que A e B sejam matrizes quadradas de mesma ordem.

    Contudo, esta condio no suciente. Por exemplo, as matrizes

    A =

    [0 1

    2 0

    ]e B =

    [0 1

    1 0

    ]so matrizes quadradas de ordem 2, mas AB 6= BA. Assim, vemos que amultiplicao de matrizes no possui a propriedade comutativa.

    Observe que [1 1

    1 1

    ] [1 1

    1 1

    ]= 0,

    sem que nenhuma das duas matrizes seja nula. Portanto, na multiplicao de

    matrizes, podemos ter AB = 0 sem que necessariamente A ou B seja nula.

    Lembremos que isto no ocorre com a multiplicao de nmeros reais, pois

    dados dois nmeros reais x e y tais que xy = 0, tem-se obrigatoriamente que

    x = 0 ou y = 0.

    Os sistemas lineares como em (2) da Seo 1 se expressam de modo per-

    feito pela equao matricial

    AX = B,

    onde

    A =

    a11 a12 . . . a1n

    a21 a22 . . . a2n...

    ......

    am1 am2 . . . amn

    , X =x1

    x2...

    xn

    e B =b1

    b2...

    bm

    .

  • 2. MATRIZES 21

    As matrizes A, X e B so chamadas, respectivamente, de matriz dos

    coecientes do sistema, matriz das incgnitas e matriz dos termos indepen-

    dentes.

    Na seguinte proposio apresentamos algumas propriedades da multipli-

    cao de matrizes.

    Proposio 1.2.3. Desde que as operaes sejam possveis, temos:

    (i) A(B + C) = AB + AC (distributividade esquerda da multiplicao

    em relao adio);

    (ii) (A+B)C = AC +BC (distributividade direita da multiplicao em

    relao adio);

    (iii) (AB)C = A(BC) (associatividade);

    (iv) A I = IA = A (existncia de elemento identidade).

    Demonstrao Provaremos a propriedade (iii) e deixaremos a demons-

    trao das demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).

    (iii): Suponhamos que as matrizes A, B e C sejam de ordens n r, r s esm, respectivamente. Temos que(

    (AB)C)ij=s

    k=1(AB)ikckj =s

    k=1

    (rl=1 ailblk

    )ckj =

    rl=1 ail

    (sk=1 blkckj

    )=r

    l=1 ail(BC)lj =(A(BC))ij.

    Isto mostra que a propriedade (iii) vlida.

    Tendo denido a multiplicao de matrizes, denimos a potenciao da

    maneira usual: dados A emM(n, n) e k N \ {0},

    A0 = In e Ak = A A A

    k fatores

    .

    Dada uma matriz A = [aij]mn, chamamos de transposta de A, e denota-

    mos por At, a matriz [bij]nm, onde

    bij = aji,

  • 22 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    para todo 1 i n e para todo 1 j m.Por exemplo, 4 01 2

    0 3

    t

    =

    [4 1 00 2 3

    ].

    Uma matriz quadrada A chamada simtrica se At = A e antissimtrica

    se At = A.Por exemplo, dadas as matrizes

    A =

    2 1 31 1 03 0 5

    e B = 0 1 31 0 2

    3 2 0

    ,a matriz A simtrica e B antissimtrica.

    Terminamos esta seo apresentando o conceito de matriz em blocos.

    Uma matriz A dita ser uma matriz em blocos se A est subdividida em ma-

    trizes menores, chamadas blocos. Esta subdiviso , geralmente, apresentada

    por linhas horizontais e/ou linhas verticais, como mostra o seguinte exemplo:[2 1 1 0

    6 4 0 1

    ]=

    [2 1 | 1 06 4 | 0 1

    ].

    Uma matriz pode ser subdividida em blocos de vrias maneiras. Porexemplo,

    0 1 0 21 4 2 10 0 5 3

    =

    0 1 | 0 21 4 | 2 1 0 0 | 5 3

    =

    0 | 1 | 0 2 1 | 4 | 2 10 | 0 | 5 3

    .Uma propriedade interessante da partio em blocos que os resultados

    das operaes de adio e multiplicao com matrizes em blocos podem ser

    obtidos efetuando o clculo com os blocos, como se eles fossem simplesmente

    elementos das matrizes.

  • 2. MATRIZES 23

    2.3 Matriz Inversa

    Dada uma matriz quadrada A de ordem n, chamamos de inversa de A a

    uma matriz quadrada B de ordem n tal que

    AB = BA = In .

    Por exemplo, dada a matriz

    A =

    [2 5

    1 3

    ],

    temos que a matriz

    B =

    [3 51 2

    ] uma inversa de A, j que AB = BA = I2 .

    Note que uma matriz quadrada no possui necessariamente uma inversa.

    Por exemplo, seja A =

    [0 0

    0 0

    ]. Dada qualquer matriz B =

    [a b

    c d

    ], temos

    que

    AB =

    [0 0

    0 0

    ] [a b

    c d

    ]=

    [0 0

    0 0

    ]6= I2 .

    Logo, A no tem inversa.

    Mesmo que uma matriz no seja nula, ela pode no ter inversa. Por

    exemplo, a matriz A =

    [1 1

    1 1

    ]no possui inversa, j que no existe uma

    matriz quadrada B de ordem 2 tal que AB = I2 (verique).

    Uma matriz quadrada A dita invertvel se A admite uma matriz inversa.

    Se uma matriz A possui uma inversa, ento essa inversa nica. De fato,

    suponhamos que B e C so duas inversas de uma matriz A de ordem n n.Ento AB = In e CA = In . Assim, por (iii) e (iv) da Proposio 1.2.3,

    C = C In = C(AB) = (CA)B = InB = B.

  • 24 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    J que a inversa, no caso de existir, nica, escrevemos A1 para denotar a

    inversa de A. Se k N\{0} e A uma matriz invertvel, denimos Ak por:

    Ak = A1A1 A1 k fatores

    .

    Vejamos algumas propriedades das matrizes inversas.

    Proposio 1.2.4. Sejam A e B matrizes quadradas de ordem n.

    (i) Se A invertvel, ento A1 tambm invertvel e (A1)1 = A.

    (ii) Se A e B so invertveis, ento AB tambm invertvel e

    (AB)1 = B1A1.

    Deixamos a demonstrao desta proposio ao leitor (veja Problema 2.12),

    bem como a generalizao do item (ii) para um nmero arbitrrio de fatores.

    O interesse das matrizes invertveis reside no fato de que dado um sistema

    linear de equaes com n equaes e n incgnitas, AX = B, se soubermos

    que a matriz A invertvel e soubermos como calcular sua inversa, ento o

    sistema se resolve efetuando apenas a multiplicao da matriz A1 com B,

    pois

    AX = B = X = (A1A)X = A1(AX) = A1B.

    Vimos que uma matriz quadrada no nula no possui necessariamente

    inversa. Uma pergunta natural se podemos caracterizar as matrizes qua-

    dradas invertveis, ou seja, se podemos apresentar uma condio necessria

    e suciente para que uma matriz quadrada seja invertvel. Tambm esta-

    mos interessados em obter um mtodo para o clculo da inversa de uma

    matriz invertvel. No prximo captulo, apresentaremos uma caracterizao

    de matrizes invertveis e um mtodo para inverso de matrizes que utiliza as

    transformaes elementares nas linhas de uma matriz e a forma escalonada.

    No Captulo 8, Proposio 8.3.1(iii), veremos um outro modo bem diferente

    de atacar este problema pelo uso dos determinantes.

    Problemas

  • 2. MATRIZES 25

    2.1* Sejam A=

    [1 2 34 1 0

    ]e B=

    [1 2 01 2 0

    ].

    Calcule 2A, 3B e 2A3B.

    2.2 Determine os valores de x, y e z em R para que as matrizes A e B dadassejam iguais:

    A =

    [x+ y 0

    z x 2y

    ]e B =

    [13 0

    1 4

    ].

    2.3 Dadas as matrizes

    A =

    [1 4 22 0 1

    ], B =

    [0 1 20 1 1

    ], C =

    113

    e D = [1 1],determine:

    (a) A+B; (b) 2C; (c) AC; (d) CD; (e) BC; (f) DA.

    2.4* Considere as matrizes

    A = [aij]45 com aij = i j,B = [bij]59 com bij = j e

    C = [cij] com C = AB.

    (a) possvel determinar c63? Justique a resposta.

    (b) Determine c36.

    2.5 Conclua as demonstraes das Proposies 1.2.1, 1.2.2 e 1.2.3.

    2.6* Dada uma matriz A, dizemos que uma matriz X comuta com A se

    AX = XA. Determine todas as matrizes que comutam com

    A =

    [1 0

    0 3

    ].

    2.7 a) Mostre que a matriz c In, onde c R, comuta com toda matriz X M(n, n).

  • 26 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    b) Ache todas as matrizes M =

    [x y

    z t

    ]que comutam com a matriz

    [1 1

    0 1

    ].

    2.8 Verdadeiro ou falso? Justique.

    (a) Se A e B so matrizes quadradas de mesma ordem, ento

    (AB)(A+B) = A2 B2.

    (b) Se A, B e C so matrizes quadradas de mesma ordem tais que AB = AC,

    ento B = C.

    2.9 Mostre que se A uma matriz triangular superior, ento A2 tambm

    uma matriz triangular superior.

    2.10* (a) Obtenha At, onde A =

    [1 2 3

    0 1 4

    ].

    (b) Verique que a transposta de uma matriz triangular superior uma

    matriz triangular inferior.

    (c) Mostre que (A+B)t = At +Bt e (kA)t = kAt, onde A e B so matrizes

    de mesma ordem e k R.

    (d) Se A uma matriz m n e B uma matriz n p, prove que(AB)t = BtAt.

    (e) Mostre que (At)t = A para toda matriz A de ordem m n.

    2.11* Mostre que se B uma matriz quadrada, ento:

    (a) B +Bt e BBt so simtricas;

    (b) B Bt antissimtrica.

    (c) Observando que

    B =B +Bt

    2+

    B Bt

    2,

    conclua que toda matriz quadrada se escreve como soma de uma matriz

    simtrica e de uma matriz antissimtrica.

  • 2. MATRIZES 27

    (d) Mostre que a escrita em (c) o nico modo possvel de escrever uma

    matriz quadrada como soma de uma matriz simtrica e de uma matriz an-

    tissimtrica.

    2.12 Prove a Proposio 1.2.4.

    2.13 Demonstre que:

    (a) se A tem uma linha nula, ento AB tem uma linha nula;

    (b) se B tem uma coluna nula, ento AB tem uma coluna nula;

    (c) qualquer matriz quadrada com uma linha ou uma coluna nula no

    invertvel.

    2.14 Mostre que uma matriz A invertvel se, e somente se, At invertvel.

    Conclua que as operaes de inverso e de transposio comutam; isto ,

    (At)1 = (A1)t, quando A invertvel.

    2.15 Sejam a = (a1, . . . , an), b = (b1, . . . , bn) Rn. Denamos

    Diag(a) =

    a1 0 00 a2 0...

    .... . .

    ...

    0 0 an

    .Mostre que:

    (a) Diag(a) + cDiag(b) = Diag(a+ cb) onde c R;(b) Diag(a) Diag(b) = Diag(b) Diag(a) = Diag(a1b1, . . . , anbn);(c) Diag(a)m = Diag(am1 , . . . , a

    mn ), onde m N \ {0};

    (d) Em que condies a matriz Diag(a) invertvel e qual a sua inversa?

    Este problema mostra que somar, multiplicar, calcular potncias e inver-

    ter matrizes diagonais muito simples.

    2.16 Supondo que as matrizes A,B e C so matrizes quadradas de mesma

    ordem e invertveis, resolva as seguintes equaes matriciais nas quais X a

    incgnita:

  • 28 CAPTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES

    (a) CX + 2B = 3B; (b) CAX t = C; (c) ABX = C.

    2.17 Dada uma matriz A =

    [a b

    c d

    ], mostre que :

    a) se ad bc 6= 0, ento A invertvel e

    A1 =1

    ad bc

    [d bc a

    ];

    b) se ad bc = 0, ento A no invertvel.

  • Bibliograa

    [1] H. P. Bueno, lgebra Linear, um segundo curso , Coleo Textos Univer-

    sitrios, SBM, 2006.

    [2] P. Halmos, Teoria Ingnua dos Conjuntos , Editora Cincia Moderna,

    2001.

    [3] A. Hefez e M. L. T. Villela, Cdigos Corretores de Erros , Coleo Mate-

    mtica e Aplicaes, IMPA, 2008.

    [4] A. Hefez e M. L. T. Villela, Nmeros Complexos e Polinmios , Coleo

    PROFMAT, SBM, 2012.

    [5] V. J. Katz, A History of Mathematics - an Introduction , HarperCollins

    College Publishers, 1993.

    [6] S. Lang, Introduction to Linear Algebra , 2nd edition, Undergraduate Texts

    in Mathematics, Springer, 1986.

    [7] E.L. Lima, lgebra Linear , 3a edio, Coleo Matemtica Universitria,

    IMPA, 1998.

    [8] E.L. Lima, Geometria Analtica e lgebra Linear , 2a edio, Coleo

    Matemtica Universitria, IMPA, 2010.

    300

  • 2

    29

    Livro: Introduo lgebra LinearAutores: Abramo Hefez

    Ceclia de Souza Fernandez

    Captulo 2: Transformao de Matrizese Resoluo de Sistemas

    Sumrio

    1 Transformao de Matrizes . . . . . . . . . . . . . . 30

    1.1 Transformaes Elementares de Matrizes . . . . . . 30

    1.2 Forma Escalonada de uma Matriz . . . . . . . . . . 32

    1.3 Matrizes Elementares e Aplicaes . . . . . . . . . 35

    2 Resoluo de Sistemas Lineares . . . . . . . . . . . 42

  • 30CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    O mtodo de eliminao em sistemas de equaes lineares consiste em e-

    fetuar repetidamente transformaes elementares sobre um sistema de equa-

    es lineares, de modo a ir obtendo sistemas equivalentes, at reduzir o sis-

    tema original a um sistema de fcil resoluo. Neste captulo, reinterpreta-

    remos na matriz ampliada associada a um sistema de equaes lineares as

    transformaes que se efetuam nos sistemas de equaes ao longo do processo

    de eliminao, explicitando seu carter algortmico, ou seja, de procedimento

    sistemtico e efetivo. Esse mtodo essencialmente devido a Gauss e foi

    aperfeioado por Camille Jordan (Frana, 1838 - 1922) e, por este motivo,

    chamado de eliminao de Gauss-Jordan.

    1 Transformao de Matrizes

    1.1 Transformaes Elementares de Matrizes

    Seja A uma matriz m n. Para cada 1 i m, denotemos por Li ai-sima linha de A. Denimos as transformaes elementares nas linhas da

    matriz A como se segue:

    1) Permutao das linhas Li e Lj, indicada por Li Lj .

    2) Substituio de uma linha Li pela adio desta mesma linha com c

    vezes uma outra linha Lj, indicada por Li Li + cLj .

    3) Multiplicao de uma linha Li por um nmero real c no nulo, indicada

    por Li cLi .

    Por exemplo, vamos efetuar algumas transformaes elementares nas li-

    nhas da matriz 2 1 2 32 1 4 00 1 2 3

    .

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 31

    Temos 2 1 2 32 1 4 00 1 2 3

    L1 L3

    0 1 2 32 1 4 02 1 2 3

    ,2 1 2 32 1 4 00 1 2 3

    L2 12 L2

    2 1 2 31 1/2 2 00 1 2 3

    e 2 1 2 32 1 4 0

    0 1 2 3

    L2 L2 L1

    2 1 2 30 0 2 30 1 2 3

    .Sejam A e B matrizes de ordem mn. A matriz A dita ser equivalente

    por linhas matriz B se B pode ser obtida de A pela aplicao sucessiva de

    um nmero nito de transformaes elementares sobre linhas.

    Por exemplo, as matrizes 1 02 12 3

    e1 00 10 0

    so equivalentes por linhas j que 1 02 12 3

    L2 L2 2L1

    1 00 12 3

    L3 L3 + 2L1

    1 00 10 3

    L3 L3 3L2

    1 00 10 0

    .Observe que a noo de equivalncia de matrizes por linhas corresponde

    noo de equivalncia de sistemas lineares quando se efetuam as respec-

    tivas transformaes sobre as equaes. De fato, a sistemas equivalentes,

    correspondem matrizes associadas equivalentes, e vice-versa.

  • 32CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    Note que se A equivalente por linhas a uma matriz B, ento B equiva-

    lente por linhas matriz A, j que toda transformao elementar sobre linhas

    reversvel. Mais precisamente, se e representa uma das transformaes

    elementares nas linhas de uma matriz A de ordem mn, denotando por e(A)a matriz obtida de A aplicando-lhe a transformao e, temos o resultado a

    seguir.

    Proposio 2.1.1. Toda transformao elementar e nas linhas de matri-

    zes em M(m,n) reversvel, no sentido de que existe uma transformaoelementar e tal que e(e(A)) = A e e(e(A)) = A, para todo A M(m,n).Demonstrao Se e uma transformao elementar do tipo Li Lj , tomee = e. Se e uma transformao elementar do tipo Li cLi , tome e comoa tranformao Li 1c Li . Finalmente, se e uma transformao elementardo tipo Li Li + cLj , tome e como a tranformao Li Li cLj .

    No difcil o leitor se convencer de que, em cada caso na demonstra-

    o anterior, e a nica transformao elementar com a propriedade que

    e(e(A)) = A para toda matriz A M(m,n).

    Se A uma matriz equivalente por linhas a uma matriz B (e, ento, B

    equivalente por linhas a A), dizemos simplesmente que A e B so matrizes

    equivalentes.

    1.2 Forma Escalonada de uma Matriz

    Nesta subseo mostraremos que toda matriz pode ser transformada por

    meio de uma sequncia de transformaes elementares sobre linhas numa

    matriz em uma forma muito especial, a forma escalonada, que ser utilizada

    na prxima seo para resolver sistemas de equaes lineares.

    Uma matriz mn ser dita estar na forma escalonada se for nula, ou se:

    1) o primeiro elemento no nulo de cada linha no nula 1;

    2) cada coluna que contm o primeiro elemento no nulo de alguma linha

    tem todos os seus outros elementos iguais a zero;

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 33

    3) toda linha nula ocorre abaixo de todas as linhas no nulas;

    4) se L1, . . . , Lp so as linhas no nulas, e se o primeiro elemento no nulo

    da linha Li ocorre na coluna ki , ento k1 < k2 < < kp .

    Por exemplo, a matriz 0 1 2 0 10 0 0 1 30 0 0 0 0

    est na forma escalonada, pois todas as condies da denio anterior so

    satisfeitas, mas as matrizes1 0 0 00 1 2 00 0 1 0

    e0 3 11 0 10 0 0

    no esto na forma escalonada, pois a primeira no satisfaz a condio 2,

    enquanto a segunda no satisfaz a condio 1 (observe que ela tambm no

    satisfaz a condio 4).

    Cabe aqui uma observao acerca da terminologia que utilizamos. Usu-

    almente, na literatura, o termo forma escalonada de uma matriz refere-se

    a uma forma menos especial do que a nossa, a qual vrios autores chamam

    de forma escalonada reduzida. A nossa justicativa para o uso dessa ter-

    minologia que no h razo para adjetivarmos a forma escalonada, pois

    utilizaremos apenas uma dessas noes.

    O resultado que apresentaremos a seguir nos garantir que toda matriz

    equivalente por linhas a uma matriz na forma escalonada. O interesse desse

    resultado reside no fato que ao reduzir a matriz ampliada associada a um

    dado sistema de equaes lineares forma escalonada, encontramos um outro

    sistema equivalente ao sistema dado que se encontra em sua expresso mais

    simples. Quando aplicado aos sistemas de equaes lineares, este resultado

    chamado de processo de eliminao de Gauss-Jordan.

  • 34CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    Vejamos agora um algoritmo que reduz por linhas uma matriz dada no

    nula qualquer a uma matriz na forma escalonada. O termo reduzir por linhas

    signica transformar uma matriz usando as transformaes elementares sobre

    linhas. Este processo tambm chamado de escalonamento de matrizes.

    Passo 1. Seja k1 a primeira coluna da matriz dada com algum elemento no

    nulo. Troque as linhas entre si de modo que esse elemento no nulo aparea

    na primeira linha, isto , de modo que na nova matriz a1k1 6= 0.

    Passo 2. Para cada i > 1, realize a transformao

    Li Li aik1a1k1

    L1 .

    Repita os Passos 1 e 2 na matriz assim obtida, ignorando a primeira linha.

    Novamente, repita os Passos 1 e 2 nessa nova matriz, ignorando as duas

    primeiras linhas etc., at alcanar a ltima linha no nula.

    Passo 3. Se L1, . . . , Lp so as linhas no nulas da matriz obtida aps termi-

    nar o processo acima e se ki a coluna na qual aparece o primeiro elemento

    no nulo aiki da linha Li, aplique as transformaes

    Li 1

    aikiLi para todo 1 i p.

    Passo 4. Realize na matriz obtida at ento as transformaes

    L` L` a`ki Li , ` = 1, . . . , i 1,

    para i = 2. Depois para i = 3, e assim por diante, at i = p. Dessa forma,

    obteremos uma matriz na forma escalonada que equivalente por linhas

    matriz dada.

    Estabelecemos assim o seguinte resultado:

    Teorema 2.1.2. Toda matriz equivalente a uma matriz na forma escalo-

    nada.

    Por exemplo, a matriz 1 2 3 00 0 4 20 0 0 1/2

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 35

    transformada numa matriz na forma escalonada com a seguinte sequncia

    de transformaes sobre suas linhas:1 2 3 00 0 4 20 0 0 1/2

    L2 14 L2

    1 2 3 00 0 1 1/20 0 0 1/2

    L3 2L3

    1 2 3 00 0 1 1/20 0 0 1

    L1 L1 + 3L2

    1 2 0 3/20 0 1 1/20 0 0 1

    L1 L1 32 L3L2 L2 12 L3

    1 2 0 00 0 1 00 0 0 1

    .Pelo algoritmo acima, deduzimos que qualquer matriz equivalente a pelo

    menos uma matriz na forma escalonada. Como em cada passo do algoritmo

    temos certa margem de escolhas de transformaes elementares sobre as li-

    nhas da matriz, no h aparentemente nenhum motivo para poder armar

    que a forma escalonada de uma dada matriz seja nica. Fato que, no

    importando qual a sequncia de transformaes elementares que efetuemos

    nas linhas de uma dada matriz, no nal do processo chegamos a uma mesma

    matriz na forma escalonada que equivalente matriz dada. Este resultado

    ser provado na ltima seo do captulo

    1.3 Matrizes Elementares e Aplicaes

    Uma matriz elementar de ordem n uma matriz quadrada de ordem n

    obtida da matriz identidade In a parir da aplicao de uma transformao

    elementar, isto , trata-se de uma matriz da forma

    E = e(In),

    onde e uma transformao elementar. Por exemplo, a matriz identidade

    uma matriz elementar e as matrizes

    e(I2) =

    [0 1

    1 0

    ], onde e : L1 L2,

  • 36CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    e

    e(I3) =

    1 1 00 1 00 0 1

    , onde e : L1 L1 + L2,so matrizes elementares de ordem 2 e de ordem 3, respectivamente.

    Sejam A M(m,n) e e uma transformao elementar. O prximo re-sultado, cuja demonstrao ca como exerccio para o leitor (veja Problema

    1.3), nos diz que a matriz e(A) pode ser obtida como o produto da matriz

    elementar e(Im) pela matriz A. Por exemplo, consideremos

    A =

    1 20 12 1

    .Se e1 : L1 L2 , e2 : L1 2L1 e e3 : L1 L1 + 2L2 , uma rpida vericaonos mostra que e1(A) = e1(I3)A, e2(A) = e2(I3)A e e3(A) = e3(I3)A.

    Teorema 2.1.3. Seja e uma transformao elementar sobre matrizes de

    M(m,n). Considere a matriz elementar E = e(Im). Entoe(A) = EA, para todo A M(m,n).

    Como consequncia do Teorema 2.1.3, temos

    Corolrio 2.1.4. Sejam A e B em M(m,n). Ento, A equivalente a Bse, e somente se, existem matrizes elementares E1, . . . , Es de ordem m tais

    que

    Es E2 E1 A = B.

    Demonstrao Por denio, A equivalente a B quando existem trans-

    formaes elementares e1, . . . , es tais que

    es(. . . (e2(e1(A))) . . . ) = B.

    Mas, pelo teorema anterior, a igualdade acima equivale a

    Es E2 E1 A = B,

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 37

    onde Ei = ei(Im), para cada 1 i s.

    Corolrio 2.1.5. Toda matriz elementar invertvel e sua inversa tambm

    uma matriz elementar.

    Demonstrao Seja E uma matriz elementar. Seja e a transformao

    elementar tal que E = e(I). Se e a transformao elementar inversa de e e

    se E = e(I), pelo Teorema 2.1.3 temos

    I = e(e(I)) = e(E) = e(I)E = E E

    e

    I = e(e(I)) = e(E ) = e(I)E = E E .

    Logo, E invertvel e E1 = E .

    Pelo Corolrio 2.1.5 sabemos como inverter uma matriz elementar. Por

    exemplo, se considerarmos as matrizes

    A =

    0 1 01 0 00 0 1

    e B =1 2 00 1 00 0 1

    ,podemos concluir que A e B so invertveis, j que A e B so matrizes

    elementares. De fato, A = e1(I3) com e1 : L1 L2 e B = e2(I3) come2 : L1 L1 + 2L2 . Pelo Corolrio 2.1.5, A1 = e1(I3), onde e1 a trans-formao elementar inversa de e1 e B1 = e2(I3), onde e

    2 a transformao

    elementar inversa de e2 . Mais precisamente,

    A1 =

    0 1 01 0 00 0 1

    e B1 =1 2 00 1 00 0 1

    .A seguir, apresentamos o resultado central desta seo que caracteriza as

    matrizes invertveis.

    Teorema 2.1.6. Para uma matriz quadrada A de ordem n, so equivalentes

    as seguintes armaes:

    (i) A invertvel;

  • 38CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    (ii) Se B uma matriz na forma escalonada equivalente a A, ento B = In;

    (iii) A uma matriz elementar ou um produto de matrizes elementares.

    Demonstrao Vamos comear provando a implicao (i) (ii). Comefeito, como B equivalente a A, pelo Corolrio 2.1.4, existem matrizes

    elementares E1, E2, . . . , Es tais que

    Es E2 E1 A = B.

    Como, pelo Corolrio 2.1.5, cada Ei invertvel e A, por hiptese, inver-

    tvel, temos que B invertvel (cf. Proposio 1.2.4). Por outro lado, pelo

    Problema 1.7, temos que B = In.

    A implicao (ii) (iii) evidente, j que A = E11 E12 E1s B, ondeB = In e cada E

    1i uma matriz elementar (cf. Corolrio 2.1.5).

    A implicao (iii) (i) evidente, pois matrizes elementares so invertveise produtos de matrizes invertveis so invertveis (cf. Proposio 1.2.4).

    Observe, como decorrncia do resultado acima, que uma matriz quadrada

    invertvel equivalente a uma nica matriz na forma escalonada (a matriz

    identidade), cando estabelecida, neste caso, a unicidade da forma escalo-

    nada.

    Finalizamos esta seo apresentando um mtodo para inverso de matri-

    zes por meio de transformaes elementares.

    Proposio 2.1.7. Sejam A uma matriz invertvel e e1, . . . , es uma sequn-

    cia de transformaes elementares tais que es(. . . (e2(e1(A))) . . . ) = I, onde

    I a matriz identidade. Ento essa mesma sequncia de transformaes

    elementares aplicada a I produz A1; isto , es(. . . (e2(e1(I))) . . . ) = A1.

    Demonstrao Para cada 1 i s, seja Ei a matriz elementar corres-pondente transformao ei . Ento

    Es E2 E1 A = I .

    Assim,

    (Es E2 E1 I)A A1 = I A1,

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 39

    donde

    Es E2 E1 I = A1.

    Para ilustrarmos o uso do Teorema 2.1.6 e da Proposio 2.1.7, conside-

    remos a matriz

    A =

    1 0 22 1 34 1 8

    .Se aplicarmos uma sequncia de transformaes elementares em A at obter-

    mos uma matriz B na forma escalonada, pelo Teorema 2.1.6, A invertvel

    se, e somente se, B = I3 . Se B = I3 , pela Proposio 2.1.7, essa mesma

    sequncia de transformaes elementares aplicada a I3 resultar em A1. As-

    sim, vamos formar a matriz em blocos[A | I3

    ]e vamos reduzir esta matriz

    3 6 a uma matriz na forma escalonada. De fato,

    [A | I3

    ]=

    1 0 2 | 1 0 02 1 3 | 0 1 04 1 8 | 0 0 1

    L2 L2 2L1L3 L3 4L1

    1 0 2 | 1 0 00 1 1 | 2 1 00 1 0 | 4 0 1

    L2 L2

    1 0 2 | 1 0 00 1 1 | 2 1 00 1 0 | 4 0 1

    L3 L3 L2

    1 0 2 | 1 0 00 1 1 | 2 1 00 0 1 | 6 1 1

    L3 L3

    1 0 2 | 1 0 00 1 1 | 2 1 00 0 1 | 6 1 1

    L1 L1 2L3L2 L2 L3

    1 0 0 | 11 2 20 1 0 | 4 0 10 0 1 | 6 1 1

    .Como obtemos uma matriz na forma

    [I3 |C

    ], temos que A invertvel e

    C = A1. Assim,

    A1 =

    11 2 24 0 16 1 1

    .

  • 40CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    Consideremos agora a matriz

    A =

    1 0 10 2 13 0 3

    .Ao reduzirmos a matriz em blocos

    [A | I3

    ]a uma matriz na forma esca-

    lonada, obtemos a matriz[B | C

    ], onde B =

    1 0 10 1 1/20 0 0

    e, portanto,diferente de I3 . Logo, A no invertvel por ser equivalente a uma matriz

    com uma linha nula (cf. Problema 1.7).

    Problemas

    1.1* Seja A =

    [2 1

    1 3

    ].

    (a) Obtenha a forma escalonada de A.

    (b) A invertvel? Justique.

    (c) Se A for invertvel, escreva a matriz A1 como um produto de matrizes

    elementares.

    1.2 Determine a matriz inversa de cada uma das matrizes dadas:

    (a) A =

    [12 7

    5 3

    ];

    (b) B =

    2 3 11 3 11 2 1

    ;

    (c) C =

    2 1 0 23 1 2 24 1 2 33 1 1 2

    .1.3 Demonstre o Teorema 2.1.3.

  • 1. TRANSFORMAO DE MATRIZES 41

    1.4 Determine a forma escalonada das matrizes:

    (a) A =

    0 1 3 22 1 4 32 3 2 1

    ; (b) B =1 2 1 2 12 4 1 2 33 6 2 6 5

    ;

    (c) C =

    1 3 1 20 11 5 32 5 3 14 1 1 5

    .1.5 Uma certa sequncia de transformaes elementares aplicadas a uma

    matriz A produz uma matriz B. A mesma sequncia aplicada a AB produzir

    que matriz? Justique sua resposta.

    1.6 Descreva todas as possveis matrizes 22 que esto na forma escalonada.

    1.7 Seja A uma matriz quadrada na forma escalonada. Mostre que so

    equivalentes as seguintes asseres:

    (a) A matriz A no tem linhas nulas.

    (b) A a matriz identidade.

    (c) A invertvel.

    Sugesto Use o Problema 2.13(c), do Captulo 1.

    1.8* Sejam A e B matrizes quadradas de mesma ordem.

    (a) Mostre que, se AB = I, ento A invertvel e A1 = B. Assim AB = I

    se, e somente se, BA = I.

    (b) Mostre que AB invertvel se, e somente se A e B so invertveis.

    Por denio, uma matriz quadrada A invertvel quando existe uma

    matriz quadrada B tal que AB = I e BA = I. No entanto, pelo problema

    acima, no contexto das matrizes quadradas, basta encontrar B tal que AB = I

    ou tal que BA = I para que A seja invertvel. Ou seja, se uma das duas

    igualdades satisfeita, ento a outra automaticamente satisfeita .

    1.9 Sejam E1, E2 e E3 as matrizes elementares de ordem n obtidas da identi-

    dade pelas transformaes elementares Li Lj, Li Li + kLj e Li cLi,

  • 42CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    onde j 6= i, respectivamente. Mostre que Et1 = E1, Et2 = E 2 e Et3 = E3,onde E 2 a matriz elementar obtida da identidade mediante a transforma-

    o Lj Lj + kLi.

    2 Resoluo de Sistemas Lineares

    Finalmente, nesta seo, poremos em funcionamento a maquinria desen-

    volvida com as matrizes para a resoluo de sistemas de equaes lineares,

    culminando com o Teorema do Posto. Trata-se de um resultado central

    dessa teoria que descreve a resolubidade dos sistemas de equaes lineares

    gerais. Este teorema tambm conhecido no Ensino Mdio como Teorema de

    Rouch-Capelli, em homenagem aos matemticos Eugne Rouch (Frana,

    18321919) e Alfredo Capelli (Itlia, 18551910).

    Quanto a suas solues, um sistema linear se classica como imposs-

    vel, ou possvel e determinado, ou possvel e indeterminado. Um sistema

    linear chamado impossvel , quando no tem soluo, possvel e determi-

    nado, quando tem uma nica soluo e possvel e indeterminado , quando

    tem mais de uma soluo. .

    J foi observado anteriormente que um sistema linear homogneo com n

    incgnitas sempre possvel, pois admite como soluo a n-upla (0, 0, . . . , 0),

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 43

    chamada soluo trivial . Qualquer outra soluo, se existir, dita soluo

    no trivial do sistema.

    Dado um sistema linear AX = B, o sistema linear AX = 0 chamado

    de sistema linear homogneo associado . A relao fundamental entre um

    sistema linear e seu sistema linear homogneo associado apresentada na

    proposio a seguir.

    Proposio 2.2.1. Seja AX = B um sistema linear. Suponhamos que X1seja uma soluo do sistema AX = B e que Sh seja o conjunto soluo do

    sistema linear homogneo associado AX = 0. Ento

    S = {X1 + Z ; Z Sh} (1)

    o conjunto soluo do sistema AX = B.

    Demonstrao Para demonstrarmos (1), usaremos algumas propriedades

    j vistas da adio e da multiplicao por escalar de matrizes.

    De fato, se X2 S, podemos escrever X2 = X1 + Z com Z Sh. ComoX1 uma soluo particular de AX = B e Z Sh, segue que AX1 = B eAZ = 0. Logo,

    AX2 = A(X1 + Z) = AX1 + AZ = B + 0 = B,

    mostrando que X2 uma soluo do sistema AX = B.

    Por outro lado, tomemos uma soluo X2 do sistema AX = B e dena-

    mos Z = X2 X1. Temos, ento, que

    AZ = A(X2 X1) = AX2 AX1 = B B = 0;

    logo Z = X2 X1 Sh. Portanto, X2 = X1 + Z S.

    Observamos que o resultado acima apenas de interesse terico, pois no

    nos ajuda a obter o conjunto soluo de um sistema linear. Um mtodo bem

    ecaz para se resolver um sistema linear o mtodo do escalonamento . Este

    consiste em se tomar a matriz ampliada de um sistema linear e aplicar uma

    sequncia de transformaes elementares a esta matriz, de modo a obtermos

  • 44CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    uma matriz equivalente que seja a matriz ampliada de um sistema linear

    fcil de se resolver.

    Exemplo 1. Resolvamos o sistema linearx+ y 2z + 3w = 4

    2x+ 3y + 3z w = 3

    5x+ 7y + 4z + w = 5 .

    (2)

    Observemos que1 1 2 3 | 42 3 3 1 | 35 7 4 1 | 5

    L2 L2 2L1L3 L3 5L1

    1 1 2 3 | 40 1 7 7 | 50 2 14 14 | 15

    L3 L3 2L2

    1 1 2 3 | 40 1 7 7 | 50 0 0 0 | 5

    ,(3)

    sendo que esta ltima matriz a matriz ampliada do sistema linearx+ y 2z + 3w = 4

    y + 7z 7w = 5

    0x+ 0y + 0z + 0w = 5 .

    (4)

    Note que o sistema (4) impossvel. A pergunta que fazemos : qual

    a relao do sistema (4) com o originalmente proposto? A resposta que

    eles tm o mesmo conjunto soluo, j que (2) e (4) tm matrizes ampliadas

    equivalentes. Mais precisamente, temos o resultado a seguir.

    Proposio 2.2.2. Dois sistemas lineares com matrizes ampliadas equiva-

    lentes tm o mesmo conjunto soluo .

    Demonstrao s lembrar que efetuar transformaes elementares sobre

    as linhas da matriz ampliada do sistema, equivale a efetuar transformaes

    elementares no sistema de equaes, obtendo um sistema equivalente.

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 45

    A matriz ampliada do sistema linear (2) poderia ter sido reduzida por

    linhas a uma matriz na forma escalonada. Porm, a equao

    0x+ 0y + 0z + 0w = 5obtida da ltima linha da matriz nal em (3) j garante, pela Proposio

    2.2.2, que o sistema (2) impossvel. De fato, dado um sistema linear nas in-

    cgnitas x1, x2, . . . , xn, se aps uma sequncia de transformaes elementares

    ocorrer uma equao da forma

    0x1 + 0x2 + + 0xn = b, com b 6= 0,ento o sistema impossvel; ou seja, no tem soluo.

    Quando aplicarmos a Proposio 2.2.2 a um sistema homogneo no ne-

    cessrio tomar a matriz ampliada, basta considerar a matriz dos coecientes

    do sistema.

    Exemplo 2. Determinemos o conjunto soluo do sistema linear homogneox+ 2y + 3z 5w = 02x+ 4y + z + 2w = 0

    x+ 3y + 4z = 0

    3x+ 5y + 8z 10w = 0.

    Ora, basta considerarmos a matriz dos coecientes do sistema. Assim,

    1 2 3 52 4 1 2

    1 3 4 0

    3 5 8 10

    L2 L2 2L1L3 L3 L1L4 L4 3L1

    1 2 3 50 0 5 120 1 1 5

    0 1 1 5

    L4 L4 + L31 2 3 50 0 5 120 1 1 5

    0 0 0 10

    ,sendo esta ltima matriz, a matriz dos coecientes do sistema linear homo-

    gneo x+ 2y + 3z 5w = 05z + 12w = 0y + z + 5w = 0

    10w = 0,

  • 46CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    que admite apenas a soluo (0, 0, 0, 0). Assim, o conjunto soluo do sistema

    originalmente dado S = {(0, 0, 0, 0)}.

    Para apresentarmos o resultado central deste captulo, necessitaremos de

    alguns resultados que estabeleceremos a seguir.

    Lema 2.2.3. Seja dada uma matriz A = [A | A] na forma escalonada, ondeA uma matriz m (n 1) e A uma matriz m 1. Sejam k1, . . . , kp asposies das colunas de A onde ocorrem os primeiros elementos no nulos das

    linhas no nulas L1, . . . , Lp, respectivamente. O sistema AX = A admite

    soluo se, e somente se, kp 6= n.Demonstrao Observe que como A est na forma escalonada, a matriz

    A tambm est na forma escalonada.

    Se kp = n, ento a p-sima linha da matriz A (0 0 0 1). Assim,o sistema AX = A tem uma equao da forma 0x1 + + 0xn1 = 1, queno tem soluo.

    Se kp 6= n, temos que p kp < n. Assim, se os ai's so as entradas deA, temos que ap+1 = = am = 0. Se denotarmos por Ai a i-sima colunada matriz A, temos que

    Ak1 = Ak1 =

    1

    0...

    0...

    0

    , Ak2 = Ak2 =

    0

    1...

    0...

    0

    , . . . , Akp = Akp =

    0

    0...

    1...

    0

    ,

    onde cada matriz acima tem as ltimas m r entradas nulas. O sistemaAX = A se escreve, em blocos, da seguinte forma:

    a = [A1 | A2 | . . . | An1]X = A1x1 + A2x2 + + An1xn1.

    Para achar uma soluo do sistema basta tomar xki = ai e xj = 0, se j 6= ki,para todo i = 1, . . . , p.

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 47

    A seguir, daremos a prova da unicidade da forma escalonada de uma

    matriz.

    Teorema 2.2.4. (Unicidade da forma escalonada) Existe uma nica

    matriz na forma escalonada equivalente por linhas a uma dada matriz.

    Demonstrao Basta mostrar que dadas duas matrizes A e B na forma

    escalonada e equivalentes por linhas, ento A = B (justique). O resultado

    ser provado por induo sobre o nmero n de colunas da matriz. Para n = 1,

    as nicas matrizes na forma escalonada so0

    0...

    0

    e1

    0...

    0

    .Como qualquer transformao aplicada s linhas da primeira matriz no a

    altera, as duas matrizes acima no so equivalentes, da decorre a unicidade,

    nesse caso.

    Admitamos o resultado verdadeiro para matrizes com n1 colunas, onden 2. Sejam A e B duas matrizes m n, ambas na forma escalonada eequivalentes. Escrevamos A = [A | A] e B = [B | B], onde A e B so osblocos formados com as n 1 colunas de A e de B, e A e B so as ltimascolunas de A e de B, respectivamente. imediato vericar pela denio

    que A e B esto na forma escalonada; e que A equivalente a B, pois as

    mesmas operaes elementares que transformam A em B, transformam A

    em B. Portanto, pela hiptese de induo, temos que A = B. Estamos

    ento reduzidos a duas matrizes A = [A | A] e B = [A | B] na formaescalonada e equivalentes. Vamos desdobrar a nossa anlise em dois casos.

    Caso 1) A matriz A tal que kp = n. Assim, a matriz A tem as primeiras

    p 1 linhas no nulas e a p-sima linha nula e as entradas ai de A sotais que ai = 0, se i 6= p e ap = 1. Pelo Lema 2.2.3, o sistema AX = A

    no tem soluo. Como as matrizes A = [A | A] e B = [A | B] soequivalentes, pela Proposio 2.2.2, os sistemas AX = A e AX = B

  • 48CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    so tambm equivalentes, o que implica que o segundo sistema tambm no

    admite soluo. Aplicando novamente o Lema 2.2.3 ao sistema AX = B,

    temos que bp = 1 e bi = 0, se i 6= p, o que nos diz que A = B.Caso 2) A matriz A tal que kp 6= n. Pelo Lema 2.2.3 tem-se que o sistemaAX = A tem uma soluo X0. Como os sistemas so equivalentes, temos

    que X0 soluo do sistema AX = B, logo A = AX0 = B.

    A demonstrao do Teorema 2.2.4, acima, foi inspirada em [1], o qual

    recomendamos para estudos mais avanados de lgebra Linear.

    Seja A uma matriz de ordem mn. Pelo Teorema 2.2.4, A equivalentea uma nica matriz A, de ordem mn, na forma escalonada. Dizemos que A a forma escalonada de A. Portanto, faz sentido denir o posto p da matriz

    A como o nmero de linhas no nulas de sua forma escalonada A.

    Por exemplo, se

    A =

    1 2 1 01 0 3 51 2 1 1

    ,sua forma escalonada a matriz

    A =

    1 0 0 7/80 1 0 1/40 0 1 11/8

    .Portanto, o posto p de A igual a 3, pois o nmero de linhas no nulas de

    A 3.

    Para matrizes quadradas temos o seguinte resultado:

    Corolrio 2.2.5. Uma matriz quadrada de ordem n invertvel se, e so-

    mente se, ela tem posto n.

    Demonstrao Se a matriz invertvel, ento pelo Teorema 2.1.6, sua

    forma escalonada In, logo tem posto n.

    Reciprocamente, seja dada uma matriz quadrada de ordem n e seja A sua

    forma escalonada. Se A tem posto n, ento A no tem linhas nulas, logo,

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 49

    pelo Problema 1.7, A = In. Pelo Corolrio 2.1.4, temos que

    A = Es . . . E1A = Es . . . E1,

    onde E1, . . . , Es so matrizes elementares, logo invertveis (cf. Corolrio

    2.1.5). Da decorre que A invertvel por ser produto de matrizes inver-

    tveis (cf. Proposio 1.2.4(ii)).

    Observe que o Lema 2.2.3 pode ser reinterpretado com a noo de posto

    do seguinte modo:

    Um sistema de equaes lineares AX = B admite soluo se, e somente

    se, o posto da matriz aumentada [A | B] do sistema tiver posto igual ao damatriz A do sistema.

    De fato, o que mostramos foi que o sistema possui soluo se, e somente se,

    a ltima linha no nula da forma escalonada da matriz ampliada do sistema

    no for da forma (0 0 . . . 0 1).

    Isto parte do Teorema de Rouch-Capelli, resultado central deste cap-

    tulo e que apresentamos na ntegra a seguir.

    Teorema 2.2.6. (Teorema do Posto) Consideremos um sistema linear

    com m equaes e n incgnitas AX = B. Sejam pAB o posto da matriz

    ampliada do sistema e pA o posto da matriz dos coecientes do sistema.

    Ento

    (i) O sistema possvel se, e somente se, pAB = pA.

    (ii) O sistema possvel e determinado se pAB = pA = n.

    (iii) O sistema possvel e indeterminado se pAB = pA < n. Neste caso,

    n pA o nmero de incgnitas livres do sistema, ou seja, incgnitasque podem assumir qualquer valor real.

    Demonstrao Seja AX = B um sistema linear com n incgnitas. Seja

    C = [A | B] a matriz ampliada do sistema e seja C = [A | B] a formaescalonada de C. Denotaremos A = [aij] e B = [bi].

  • 50CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    Claramente A a forma escalonada de A e como A um bloco de C,

    temos que

    pA = pA < pC = pAB ou pA = pA = pC = pAB.

    Vamos considerar os dois casos anteriores separadamente.

    Caso 1. Se pA < pAB, ento C tem uma linha do tipo

    (0 0 0 1).

    Portanto, o sistema AX = B impossvel e, ento, pela Proposio 2.2.2,

    AX = B impossvel.

    Caso 2. Se pA = pAB, ento C e A tm o mesmo nmero de linhas no

    nulas.

    Dividiremos este caso em dois subcasos.

    Subcaso 2.1. pAB = pA = n.

    Sendo A uma matriz com n colunas, com pA = pA = n, e estando A na

    forma escalonada, ela uma matriz em blocos da forma

    A =

    [In

    0

    ].

    Como pA = pAB = n, segue que B tal que bn+1 = = bm = 0.Portanto, AX = B possvel e determinado com a nica soluo x1 =

    b1, . . . , xn = bn. Consequentemente, AX = B tambm determinado com

    mesma soluo.

    Subcaso 2.2. pA = pAB < n.

    Ponhamos p = pA = pAB. Neste caso, A (assim como C) tem p linhas

    no nulas L1, . . . , Lp, tais que o primeiro elemento no nulo de Li est na

    coluna ki e k1 < < kp. Alm disso, temos bp+1 = = bm = 0.

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 51

    Temos ento que a equao AX = B se escreve como

    xk1 + a1k1+1xk1+1 + + a1nxnxk2 + a2k2+1xk2+1 + + a2nxn

    ...

    xkp + apkp+1xkp+1 + + apnxn0...

    0

    =

    b1

    b2...

    bp

    0...

    0

    .

    A igualdade matricial acima, juntamente com o fato da matriz A estar na

    forma escalonada, nos fornece o sistema de equaes

    xk1 =

    j>k1a1jxj + b1, onde a1ki = 0, se i > 1,

    xk2 =

    j>k2a2jxj + b2, onde a2ki = 0, se i > 2,

    . . .

    xkp1 =

    j>kp1ap1,jxj + bp1, onde ap1,ki = 0, se i = kp,

    xkp =

    j>kpapjxj + bp.

    Isto mostra que podemos escolher arbitrariamente valores para as inc-

    gnitas no conjunto

    {x1, . . . , xn} \ {xk1 , . . . , xkp} (5)

    e com esses determinar valores para xk1 , . . . , xkp .

    Como o conjunto em (5) tem n p elementos, o sistema AX = B temn p incgnitas livres e, consequentemente, o mesmo ocorre para o sistemaAX = B.

    Particularizando o Teorema do Posto para os sistemas homogneos, ob-

    temos o corolrio a seguir.

    Corolrio 2.2.7. Seja dado um sistema linear homogneo com m equaes

    e n incgnitas AX = 0.

    (i) Se A tem posto n, ento o sistema possui apenas a soluo nula. Em

    particular, isto ocorre quando m = n e A invertvel.

  • 52CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    (ii) Se A tem posto p < n, ento o sistema possui innitas solues. Em

    particular, isto sempre ocorre quando m < n.

    A seguir, daremos um exemplo da aplicao do Teorema do Posto.

    Exemplo 3. Com o auxlio do Teorema do Posto, resolvamos o sistema

    linear x+ 2y 2z + 3w = 2

    2x+ 4y 3z + 4w = 5

    5x+ 10y 8z + 11w = 12 .

    Ora, 1 2 2 3 | 22 4 3 4 | 55 10 8 11 | 12

    L2 L2 2L1L3 L3 5L1

    1 2 2 3 | 20 0 1 2 | 10 0 2 4 | 2

    L1 L1 + 2L2L3 L3 2L2

    1 2 0 1 | 40 0 1 2 | 10 0 0 0 | 0

    .Como pAB = pA = 2 < 4 = n, onde n o nmero de incgnitas do sistema,

    o sistema linear possvel e indeterminado. Existem ento duas incgnitas

    livres, digamos y e w, s quais podemos atribuir quaisquer valores reais a e

    b, respectivamente. Assim, temos y = a e w = b. Substituindo w = b na

    segunda equao obtemos z = 1 + 2b. Pondo y = a, z = 1 + 2b e w = b

    na primeira equao, segue-se que x = 4 2a + b. Portanto, as solues dosistema so os elementos do conjunto

    {(4 2a+ b, a, 1 + 2b, b) ; a, b R}.

    Observamos que, pelo Teorema do Posto, o nmero de incgnitas livres

    est bem determinado. Porm, as incgnitas livres podem ser escolhidas com

    alguma liberdade. No exemplo anterior, escolhemos y e w como incgnitas

    livres, mas, poderamos ter escolhido x e t como incgnitas livres.

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 53

    Problemas

    2.1* Resolva o sistema linear homogneoy + 3z 2t = 0

    2x+ y 4z + 3t = 0

    2x+ 3y + 2z t = 0

    4x 3y + 5z 4t = 0 .

    2.2* Que condies devem ser impostas a m,n e p para que o sistema linearx+ 2y 3z = m

    2x+ 6y 11z = n

    x 2y + 7z = p

    tenha soluo?

    2.3 Determine X tal que AX B = C, onde

    A =

    [1 3

    1 4

    ], B =

    [2 2 13 0 1

    ]e C =

    [8 4 3

    10 8 2

    ].

    2.4 Resolva o sistema linear1 2 1

    3 1 24 3 12 4 2

    xyz

    =2

    1

    3

    4

    .

    2.5 Dadas as matrizes

    A =

    1 2 1 01 0 3 51 2 1 1

    , B1 =210

    e B2 =121

    ,resolva:

  • 54CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    (a) os sistemas AX = B1 e AX = B2;

    (b) o sistema AX = 3B1B2, utilizando solues particulares j encontradasno item (a).

    2.6 Dada uma matriz A de ordem m n, raciocine com a forma escalonadapara mostrar que:

    (a) a equao AC = I pode ser resolvida o sistema linear AX = B temsoluo para qualquer B posto de A m;(b) a equao CA = I pode ser resolvida o sistema linear AX = 0 temsoluo nica posto de A n.

    2.7 Na matriz A de ordem 5 5 temos a seguinte relao entre as linhas:

    L1 + L2 2L4 + 3L5 = 0.

    Encontre uma matriz C, de posto 3, tal que CA tenha linhas L1, L4, 0.

    2.8 Como devem ser escolhidos os coecientes a, b e c para que o sistemaax+ by 3z = 3

    2x by + cz = 1

    ax+ 3y cz = 3

    tenha a soluo x = 1, y = 1 e z = 2?

    2.9 Determine os valores de k R para que os sistemas abaixo

    (a)

    x+ y + kz = 2

    3x+ 4y + 2z = k

    2x+ 3y z = 1

    , (b)

    kx+ y + z = 1

    x+ ky + z = 1

    x+ y + kz = 1

    , (c)

    x+ kz = 0

    y = 0

    kx+ z = 0

    tenham:

    (i) soluo nica;

    (ii) nenhuma soluo;

    (iii) mais de uma soluo.

    Determine a soluo do sistema quando esta existir.

  • 2. RESOLUO DE SISTEMAS LINEARES 55

    2.10 Que condies devem ser impostas a a, b e c para que o sistema abaixo

    nas incgnitas x, y e z tenha soluo?x+ 2y 3z = a

    2x+ 6y 11z = b

    x 2y + 7z = c .

    2.11 Determine os valores de a, de modo que o seguinte sistema nas incgni-

    tas x, y e z tenha: (a) nenhuma soluo, (b) mais de uma soluo, (c) uma

    nica soluo: x+ y z = 1

    2x+ 3y + az = 3

    x+ ay + 3z = 2 .

    2.12 Considere o sistema linear 2 2 nas incgnitas x e y:ax+ by = ecx+ dy = f.Mostre que:

    (a) sea

    c6= b

    d, isto , se ad bc 6= 0, ento o sistema tem soluo nica

    x =de bfad bc

    e y =af cead bc

    ;

    (b) sea

    c=

    b

    d6= e

    f, ento o sistema no tem soluo;

    (c) sea

    c=

    b

    d=

    e

    f, ento o sistema tem mais de uma soluo.

    2.13 Suponha que, num sistema linear homogneo, os coecientes de uma

    das incgnitas so todos iguais a zero. Mostre que o sistema tem soluo no

    nula.

  • 56CAPTULO 2. TRANSFORMAODEMATRIZES E RESOLUODE SISTEMAS

    2.14 Seja A uma matriz quadrada de ordem n. Prove que as seguintes

    armaes so equivalentes:

    (a) A invertvel;

    (b) O sistema linear homogneo AX = 0 s admite a soluo trivial;

    (c) Para toda matriz B de ordem n 1, o sistema linear AX = B possvele determinado.

  • Bibliograa

    [1] H. P. Bueno, lgebra Linear, um segundo curso , Coleo Textos Univer-

    sitrios, SBM, 2006.

    [2] P. Halmos, Teoria Ingnua dos Conjuntos , Editora Cincia Moderna,

    2001.

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    mtica e Aplicaes, IMPA, 2008.

    [4] A. Hefez e M. L. T. Villela, Nmeros Complexos e Polinmios , Coleo

    PROFMAT, SBM, 2012.

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    College Publishers, 1993.

    [6] S. Lang, Introduction to Linear Algebra , 2nd edition, Undergraduate Texts

    in Mathematics, Springer, 1986.

    [7] E.L. Lima, lgebra Linear , 3a edio, Coleo Matemtica Universitria,

    IMPA, 1998.

    [8] E.L. Lima, Geometria Analtica e lgebra Linear , 2a edio, Coleo

    Matemtica Universitria, IMPA, 2010.

    300

  • 3

    57

    Livro: Introduo lgebra LinearAutores: Abramo Hefez

    Ceclia de Souza Fernandez

    Captulo 3: Espaos Vetoriais

    Sumrio

    1 Subespaos Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

    1.1 Caracterizao dos Subespaos Vetoriais . . . . . . 58

    1.2 Operaes com Subespaos . . . . . . . . . . . . . 61

    1.3 Subespaos Gerados . . . . . . . . . . . . . . . . . 63

    2 Dependncia e Independncia Linear . . . . . . . . 69

    3 Bases e Dimenso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75

    3.1 Bases . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75

    3.2 Dimenso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

    4 Espao Linha de uma Matriz . . . . . . . . . . . . 86

  • 58 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    Neste captulo, desenvolveremos o conceito de espao vetorial que intro-

    duzimos no Captulo 1. Intimamente associadas noo de espao vetorial

    esto as noes de subespao vetorial, de base e de dimenso, conceitos esses

    fundamentais que introduziremos neste captulo e que nos permitiro enten-

    der melhor a estrututa desses espaos. A estrutura de espao vetorial est

    presente em espaos importantes da Anlise Matemtica e da Geometria Di-

    ferencial, como os espaos de Banach e os espaos de Hilbert, que possuem

    muitas aplicaes na Fsica moderna, entre outros.

    Neste texto enfatizaremos os espaos vetoriais sobre o corpo R dos n-meros reais. Apesar do fato de muitos dos resultados que obteremos serem

    vlidos no contexto mais geral dos espaos vetoriais sobre corpos abitrrios,

    nos restringiremos aos espaos vetoriais reais.

    1 Subespaos Vetoriais

    Na Subseo 1.3 do Captulo 1, vimos que o conjunto soluo Sh de

    um sistema de equaes lineares homogneo com n incgnitas forma um

    espao vetorial contido no espao Rn. Esta uma situao tpica da noode subespao de um espao vetorial, que deniremos a seguir com maior

    generalidade.

    1.1 Caracterizao dos Subespaos Vetoriais

    Sejam V um espao vetorial e W um subconjunto no vazio de V . Dize-

    mos que W um subespao vetorial de V , ou simplesmente um subespao de

    V , se W , com as operaes de adio em V e de multiplicao de vetores de

    V por escalares, um espao vetorial.

    Para mostrar que um subconjunto no vazio W de V um subespao

    de V preciso inicialmente vericar se as operaes de adio de vetores e

    de multiplicao de vetores por escalares em V esto denidas em W . Em

    seguida, seria necessrio vericar as propriedades A1A4 e ME1ME4 da

    denio de espao vetorial que demos na Subseo 1.2 do Captulo 1. No

  • 1. SUBESPAOS VETORIAIS 59

    entanto, como W parte de V , que j sabemos ser um espao vetorial, ento

    algumas das propriedades anteriores no precisam ser testadas em W . Por

    exemplo, no precisamos testar se a adio em W associativa nem se

    comutativa, pois essas propriedades so satisfeitas por todos os elementos de

    V e, consequentemente, por todos os elementos de W . Pelo mesmo motivo, as

    condies ME1ME4 no precisam ser testadas em W . Assim, para mostrar

    que um subconjunto no vazio W de V um subespao de um espao vetorial

    V , precisaremos somente vericar se A3 e A4 so satisfeitas. O resultado

    a seguir mostra que, de fato, basta mostrar que as operaes de V esto

    denidas em W .

    Proposio 3.1.1. Sejam V um espao vetorial e W um subconjunto no

    vazio de V . Ento, W um subespao de V se, e somente se, as seguintes

    condies so satisfeitas:

    (i) se u, v W , ento u+ v W ;(ii) se a R e u W , ento au W .

    Demonstrao Se W um subespao de V , ento claramente as condies

    (i) e (ii) so vericadas.

    Reciprocamente, suponhamos que W possua as propriedades (i) e (ii).

    Para mostrar que W subespao de V , precisamos somente vericar que

    os elementos de W possuem as propriedades A3 e A4. Tome um elemento

    qualquer u de W , o que possvel pois W 6= . Pela condio (ii), au Wpara todo a R. Tomando a = 0, segue-se que 0u = 0 W e, tomandoa = 1, segue-se que (1)u = u W .

    A Proposio 3.1.1 arma que um subconjunto no vazio de um espao

    vetorial V um subespao de V se, e somente se, a adio e a multiplicao

    por escalar so fechadas em W . A Proposio 3.1.1 pode ser reescrita da

    seguinte forma:

    Corolrio 3.1.2. Sejam V um espao vetorial e W um subconjunto no

    vazio de V . Temos que W um subespao vetorial de V se, e somente se,

    u+ av W , para todo a R e para todos u, v W .

  • 60 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    A demonstrao do resultado anterior deixada para o leitor (veja Pro-

    blema 1.1). Vejamos agora alguns exemplos de subespaos vetoriais.

    Exemplo 1. Seja V um espao vetorial. Ento o conjunto {0}, constitudoapenas do vetor nulo, e tambm todo o espao V so subespaos de V . O

    conjunto {0} chamado de espao vetorial nulo .

    Exemplo 2. Seja V = Rn e sejam i1, i2, . . . , ir nmeros naturais tais que0 < i1 < i2 < < ir n. O conjunto

    W = {(x1, x2, . . . , xn) ; xi1 = xi2 = = xir = 0}

    um subespao vetorial de Rn. Em particular, W1 = {(0, y, z) ; y, z R} eW2 = {(0, y, 0) ; y R} so subespaos vetoriais de R3.

    Exemplo 3. Na Subseo 1.3 do Captulo 1, vimos que o conjunto soluo

    Sh de um sistema de equaes lineares homogneas em n incgnitas forma

    um subespao vetorial de Rn. Os subespaos do Exemplo 2 podem ser vistossob esta tica, pois o subespao W , do referido exemplo, pode ser descrito

    como o espao soluo do sistema de equaes lineares homogneas

    xi1 = xi2 = = xir = 0.

    Exemplo 4. No espao vetorial das matrizesM(n, n), os conjuntos das ma-trizes triangulares superiores, triangulares inferiores e das matrizes diagonais,

    so subespaos vetoriais.

    Exemplo 5. No espao vetorial S das sequncias reais, as recorrncias line-ares do tipo R(a, b) (cf. Exemplo 2, Seo 1, Captulo 1) formam subespaosvetoriais. Mais geralmente, o conjunto R(a1, a2, . . . , ar) das sequncias queso solues da recorrncia linear

    un = a1un1 + a2un2 + + arunr

    um subespao vetorial de S (verique).

  • 1. SUBESPAOS VETORIAIS 61

    1.2 Operaes com Subespaos

    Como, antes de mais nada, espaos vetoriais so conjuntos, bastante

    natural perguntar-se se a unio e a interseo de conjuntos preservam a

    propriedade de espao vetorial.

    Dados U = {(x, y) R2 ; x + y = 0} e W = {(x, y) R2 ; x y = 0},subespaos de R2, o conjunto U W no um subespao de R2. De fato,temos que u = (1, 1) U W e w = (1,1) U W , mas u+w = (2, 0) /U W .

    Este exemplo mostra que a unio de dois subespaos de um espao vetorial

    V no necessariamente um subespao de V . A prxima proposio mostra

    que a interseo de subespaos sempre um subespao.

    Proposio 3.1.3. A interseo de dois subespaos de um espao vetorial

    V um subespao de V .

    Demonstrao Sejam U e W subespaos de V . Para vericarmos que

    U W tambm um subespao de V , vamos fazer uso do Corolrio 3.1.2Para isto, primeiramente note que U W um subconjunto no vazio deV , pois 0 U e 0 W , j que ambos U e W so subespaos de V . Agora,tomemos a R e u, v U W . Como u, v U e u, v W , segue doCorolrio 3.1.2 que u + av U e u + av W , ou seja, u + av U W .Novamente, pelo Corolrio 3.1.2, segue que U W um subespao de V .

    Observemos que o principal problema quando consideramos a unio de

    subespaos que se tomamos um vetor em cada subespao, a soma deles

    pode no pertencer unio. Seria, ento, natural considerarmos o conjunto

    soma denido a seguir.

    Dados U e W subespaos de um espao vetorial V , denimos a soma de

    U e W , denotada por U +W , como o conjunto

    U +W = {u+ w ; u U e w W}.

    Com isto, quando somamos um elemento de um subespao com um elemento

    do outro, automaticamente, a soma destes elementos est na soma dos sub-

    espaos.

  • 62 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    Como exemplo, consideremos U = {(x, y) R2 ; x + y = 0} e W ={(x, y) R2 ; x y = 0}. Temos que U +W = R2, e, consequentemente,U +W um subespao de R2. De fato, se (x, y) R2 ento

    (x, y) =

    (x y2

    ,y x2

    )+

    (x+ y

    2,x+ y

    2

    ),

    o que mostra que todo elemento de R2 se escreve como a soma de um elementode U e um elemento de W . Este exemplo ilustra o resultado a seguir.

    Proposio 3.1.4. A soma de dois subespaos U e W de um espao vetorial

    V um subespao de V . Este o menor subespao de V que contm cada

    um dos subespaos, no sentido que se um subespao vetorial L de V tal que

    U L e W L, ento U +W L.Demonstrao Sejam U e W subespaos de V . Tomemos a R e v1, v2 U +W . Como v1, v2 U +W , existem u1 e u2 elementos de U e existem w1e w2 elementos de W tais que

    v1 = u1 + w1 e v2 = u2 + w2 .

    Ento,

    v1 + av2 = (u1 + w1) + a(u2 + w2) = (u1 + au2) + (w1 + aw2) U +W .

    Assim, provamos que U +W um subespao de V .

    Para mostrar que U +W o menor subespao vetorial de V que contm

    U e W , seja L um subespao de V que contm U e W . Para todos u U ew W , temos que u,w L, logo u + w L. Isto mostra que U +W L.

    Sejam U e W subespaos de um espao vetorial V . O espao vetorial

    V dito ser a soma direta de U e W , e representado por V = U W , seV = U +W e U W = {0}.

    Como exemplo de uma soma direta, consideremos novamente os subespa-

    os U = {(x, y) R2 ; x + y = 0} e W = {(x, y) R2 ; x y = 0}. Vimosanteriormente que R2 = U+W . Como U W = {0}, segue que R2 = UW .

    O prximo resultado mostra uma importante propriedade das somas di-

    retas.

  • 1. SUBESPAOS VETORIAIS 63

    Teorema 3.1.5. Sejam U e W subespaos de um espao vetorial V . Temos

    que V = U W se, e somente se, todo vetor v em V se escreve de modonico como v = u+ w, onde u U e w W .Demonstrao Suponhamos V = U W . Tomemos v V . Como V =U +W , pela denio de soma de subespaos, existem u U e w W taisque

    v = u+ w.

    Vejamos que a decomposio acima nica no sentido de que se

    v = u + w,

    com u U e w W , ento u = u e w = w. Ora, como v = u + w ev = u + w, ento

    u u = (w w).

    Como o lado esquerdo pertence a U e o lado direito a W , da igualdade

    anterior decorre que uu U W e ww U W . Como U W = {0},segue ento que u = u e w = w. Reciprocamente, suponhamos que todo

    vetor de V se escreve de modo nico como a soma de um vetor de U e de

    um vetor de W . Claramente, ento, V = U +W . Se U W 6= {0}, existiriaum vetor no nulo v em U W . Como v W e W um subespao, entov W tambm. Consequentemente, teramos 0 = 0 + 0, com 0 U e0 W , e 0 = v + (v), com v U e v W . Como v 6= 0, teramos duasescritas distintas para um mesmo vetor de V . Como isto no ocorre, temos

    de fato que U W = {0}.

    1.3 Subespaos Gerados

    Seja V um espa