Ensino de Astronomia na UFABC Sistema Terra-Lua-Sol...Eratóstenes de Cirene (276 a.C. - 194 a.C.)...
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Ensino de Astronomia na UFABC Sistema Terra-Lua-Sol
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC
Beatriz Yordaky [email protected]
1a edição - Abr/2020
Conteúdo
Conteúdo 1
Introdução 2
O planeta Terra 4
O experimento de Eratóstenes 4
A esfera celeste 6
Movimentos da Terra 8
Rotação 8
Translação 10
O verdadeiro formato da Terra 11
Sol 18
Estações do ano 18
Lua 26
Eclipses e ocultações 32
Referências 40
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Introdução
“Olhem de novo esse ponto. É aqui, é a nossa casa, somos nós. Nele, todos a quem
ama, todos a quem conhece, qualquer um sobre quem você ouviu falar, cada ser
humano que já existiu, viveram as suas vidas. [...] A Terra é um cenário muito
pequeno numa vasta arena cósmica.” [1] - Carl Sagan (1934-1996)
No ano de 1990, a 6 bilhões de km de distância da Terra e deixando as vizinhanças do Sistema
Solar, a sonda espacial Voyager 1 dá uma última olhada para o planeta azul e captura uma
imagem que se tornaria histórica. Esta imagem não traria nenhuma contribuição científica, mas
mesmo assim o cientista Carl Sagan insistiu em sua importância. Como ficou conhecido, o “pálido
ponto azul” da foto aparece como um grão de poeira beirando a imensidão do espaço. É o
planeta onde vivemos, é a Terra.
Figura 1: A Terra como o “pálido ponto azul”. Crédito: NASA/JPL
A importância da imagem do pálido ponto azul vai além de qualquer alcance científico. É uma
forma de termos uma perspectiva verdadeira sobre a nossa localização marginal no universo, em
contraposição à perspectiva histórica de nos colocarmos como o centro e a medida de tudo. A
Astronomia é uma ciência que nos faz entender não somente o universo e os corpos celestes,
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mas também nos provoca reflexões sobre nosso lugar no cosmos e nos instiga sobre o quanto
ainda temos a descobrir. Nossa jornada para compreendermos um pouco sobre o universo deve,
antes de mais nada, começar aqui mesmo na Terra.
O Planeta Terra
A Terra é o terceiro planeta do Sistema Solar, com uma distância de cerca de 150 milhões de km
ao Sol, definida como 1 UA (Unidade Astronômica). A Terra tem cerca de 4,5 bilhões de anos e,
assim como os demais planetas, tem formato esférico.
A primeira fotografia integral do globo terrestre foi feita em 1972 durante a missão Apollo 17 [2] e
se tornou uma das imagens mais famosas da história, conhecida mundialmente como “The Blue
Marble”.
Figura 2: “The Blue Marble”, A Bolinha Azul em tradução livre. Crédito: NASA
Embora a imagem acima tenha sido tirada a quase 50 anos atrás, o formato da Terra já era
conhecido há muito tempo.
O experimento de Eratóstenes
Eratóstenes de Cirene (276 a.C. - 194 a.C.) foi um grande estudioso que viveu no Egito Antigo e
produziu um dos experimentos mais belos da física e astronomia. Ele viveu em Alexandria, uma
das mais importantes cidades do mundo na época, e foi bibliotecário-chefe da histórica
biblioteca de Alexandria.
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Eratóstenes descobriu através de um pergaminho da biblioteca que durante o dia mais longo do
ano, na cidade de Siena (atual Assuão), a luz do Sol ficava a pino ao meio-dia e iluminava o fundo
de um poço, de forma que suas paredes não projetavam sombra alguma no chão. No mesmo
instante ele sabia que em sua cidade, Alexandria, observava-se sombra nos objetos. Um graveto
fincado perpendicularmente ao solo projetava uma sombra com um ângulo que poderia ser
medido: precisamente 7,2ο. Eratóstenes sabia que uma situação dessa não poderia ser possível
numa Terra plana, mas sim numa Terra com curvatura. Ele então contratou um viajante para
medir a distância entre as cidades, sabendo que com essa última informação poderia calcular a
circunferência da Terra, uma esfera [3].
Figura 3: Experimento conduzido por Eratóstenes para a determinação da circunferência terrestre.
Se pudéssemos desenhar linhas que partissem do poço em Siena e do graveto em Alexandria e
fossem em direção do centro da Terra, veríamos que formam o mesmo ângulo de 7,2ο entre si.
Tendo em mãos esse ângulo e a distância de Siena a Alexandria, por uma simples regra de três
descobrimos a circunferência total da Terra.
● Distância Siena-Alexandria: d
● Ângulo da distância Siena-Alexandria: 7,2ο
● Circunferência terrestre: D
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● Ângulo da circunferência completa: 360ο
D ― 360 d ― 7,2
Assim,
D=(360/7,2)d
Com o valor de d que Eratóstenes conseguiu na época, hoje cerca de 800 km, ele conseguiu
estimar a circunferência da Terra em aproximadamente 40.000 km. Esse foi um grande exemplo
de como a experimentação, unida da observação e engenhosidade nos levou a descobertas tão
reveladoras, e tudo isso há mais de 2200 anos atrás.
A esfera celeste
A Esfera Celeste (EC) é uma abstração que leva em consideração a perspectiva de um
observador na Terra, a partir da qual os fenômenos no céu serão observados. Imagine uma
esfera que envolva o planeta, na qual todas as estrelas, cada uma a uma distância diferente de
nós, são projetadas. As estrelas historicamente foram agrupadas em conjuntos chamados de
constelações, associadas a desenhos imaginários que unem as estrelas e representam figuras,
animais ou até mesmo divindades [7]. Isso é possível, de nossa perspectiva, graças às posições
relativas entre as estrelas permanecerem fixas ao longo do tempo.
Figura: 4: Esfera celeste
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Nessa mesma esfera projetamos o equador, o qual será chamado de equador celeste. Ele corta
a esfera em duas porções: hemisfério norte celeste e hemisfério sul celeste. Não só temos a
impressão de que o Sol se movimenta no céu ao longo do dia, mas também ao longo do ano,
descrevendo uma trajetória circular sobre a EC, a eclíptica. Ela tem uma inclinação de 23,4o em
relação ao equador celeste. Existe uma faixa que se estende a 8o acima e 8o abaixo da linha da
eclíptica e é denominada de Zodíaco, onde estão localizadas as constelações de Áries, Touro,
Gêmeos, Caranguejo, Leão, Virgem, Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário, Peixes e do
Ofiúco. Ao longo do tempo temos a impressão de que o Sol vai caminhando por essas
constelações.
Figura 5: Equador celeste e Eclíptica sobre a esfera celeste
Um observador na Terra vê a EC girar de “leste para oeste” ao redor de um eixo que vai do polo
norte celeste ao polo sul celeste. Esta perspectiva, na verdade, é resultado do movimento de
rotação terrestre, que veremos no próximo tópico. Enquanto as estrelas se movimentam no céu
ao longo das horas, aparentemente suas posições relativas permanecem fixas, de forma que a
EC aparenta se movimentar como um todo. Exceções à regra, os planetas (astros errantes, em
grego) descrevem movimentos próprios, mas sempre dentro da faixa do zodíaco. Outros corpos
do sistema solar, como os cometas, também têm trajetórias diferenciadas.
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Figura 6: O movimento aparente anual do Sol pelas constelações zodiacais.
Crédito: Irineu Gomes Varella
Movimentos da Terra
Sabemos que a Terra se movimenta no espaço e podemos simplificar o entendimento desse
movimento dividindo-o em dois: o de rotação em torno de um eixo próprio e o de translação ao
redor do Sol. Saiba mais sobre eles a seguir.
Rotação
A Terra faz um movimento de rotação em torno de um eixo imaginário que vai de norte a sul e é
perpendicular ao plano equatorial, aquele que corta a Terra exatamente no equador. O
movimento acontece de oeste para leste e demora cerca de 24 horas para completar um ciclo.
Assim é definido o dia terrestre. O movimento obedece a regra da mão direita: posicione sua
mão aberta com o polegar apontado para cima, de forma a definir a direção do polo norte. Agora
faça o movimento de fechar os demais dedos. Eles farão o papel da direção de rotação da Terra.
De nossa perspectiva é como se a esfera celeste se movimentasse de leste para oeste, na
direção contrária à nossa rotação, um efeito de perspectiva.
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Figura 7: Ilustração do movimento de rotação
Conforme a Terra gira não sentimentos seu movimento porque por inércia o acompanhamos. A
impressão que podemos ter é a de que o Sol e as estrelas se movimentam no céu ao decorrer
das horas, quando na verdade nós que estamos nos movimentando. Muitos astrofotógrafos
fazem imagens chamadas de star trail, onde deixam a câmera fotográfica captando a luz do céu
noturno por horas. O resultado, como pode ver na imagem abaixo, são os rastros das estrelas,
que parecem percorrer círculos concêntricos no céu.
Figura 8: Star trail sobre o Deserto do Atacama, Chile. Crédito: Yuri Belestky
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Esse fenômeno, na verdade, é resultado do movimento de rotação da Terra. O centro destes
círculos concêntricos pode ser tanto o polo sul como o polo norte celestes, a depender do
hemisfério onde a imagem foi feita. São exatamente os pontos onde o eixo de rotação “corta” o
céu, nas duas direções. Nesta imagem feita no Chile, em especial vemos o polo sul celeste.
Translação
Além do movimento de rotação, a Terra assim como os demais planetas do Sistema Solar orbita
o Sol em uma trajetória elíptica (de forma simplificada, uma elipse pode ser vista como um círculo
“achatado”). Por isso, a distância da Terra ao Sol não é a mesma ao longo da órbita. Definimos
como periélio o ponto mais próximo ao Sol e afélio o ponto mais distante ao Sol nessa órbita. O
Sol encontra-se em um dos focos da elipse. Embora seja importante pontuar o correto formato
da órbita terrestre, vale também ressaltar que a trajetória elíptica da Terra tem uma baixa
excentricidade. A distância entre a Terra e o Sol no afélio é de aproximadamente 152 milhões de
quilômetros e no periélio é de aproximadamente 147 milhões de quilômetros, correspondendo a
uma variação de cerca de 3%.
Figura 9: Movimento de translação da Terra ao redor do Sol. Adaptação de imagem da
Encyclopaedia Brittannica, Inc.
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Observe na figura acima como o eixo terrestre permanece apontado para a mesma direção do
espaço ao longo do movimento em torno do Sol. O plano onde a trajetória acontece é
denominado Eclíptica, o mesmo nome da trajetória aparente percorrida pelo Sol da perspectiva
da esfera celeste. Como nos movemos ao redor do astro, temos a impressão de que ele se
movimenta com relação a nós. O período do movimento é de cerca de 365 dias terrestres, assim
definimos a duração do ano. A regra da mão direita também é válida para o movimento de
translação.
Ao traçarmos uma reta perpendicular à eclíptica vemos que ela faz um ângulo de 23,4o com o
eixo terrestre. De forma complementar, uma vez que o eixo terrestre é perpendicular ao plano
do equador, este faz o mesmo ângulo de 23,4o, mas com o próprio plano da eclíptica. Essas
características são essenciais no entendimento das estações do ano.
Figura 10: Relações entre os eixos e planos pertinentes aos movimentos terrestres. Crédito:
timeanddate.com
O verdadeiro formato da Terra
O formato esférico da Terra não foi nenhuma novidade para a humanidade nos últimos dois
milênios ao menos. No século XVIII houve o desenvolvimento da Mecânica Newtoniana, que não
só revolucionou a Física e a nossa visão de mundo, como também previu diversos fenômenos,
dentre eles o achatamento polar da Terra. Esse fenômeno descreve um achatamento das
regiões polares ao mesmo tempo em que a região equatorial é centrifugada por conta da
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rotação terrestre. Isso é observado em qualquer corpo extenso em rotação. Dessa forma,
podemos dizer que a Terra é uma esfera achatada, ou geóide, embora na prática essa
característica não seja muito pronunciada: o achatamento é de apenas 0,3%.
Figura 11: Diferença entre o raio equatorial e o raio polar da Terra
Força gravitacional, forças diferenciais e marés
Antes das contribuições de Isaac Newton (1643-1727) o mundo não tinha uma ideia muito clara
do conceito de gravidade, embora seus efeitos sejam tão presentes no dia a dia. Sabia-se que
objetos caiam a serem soltos e que os planetas orbitavam o Sol, mas não se fazia a menor ideia
de que esses fenômenos estavam fundamentalmente conectados. A clássica lei da gravitação
universal de Newton postula que dois corpos de massas m1 e m2 sentem uma força mútua F que
é proporcional às massas, mas inversamente proporcional ao quadrado da distância d entre os
corpos:
F = G d2m m1 2
G: constante universal da gravitação
Essa lei, por ser universal, é válida tanto para descrever a força que faz com que uma maçã caia
no chão como a força responsável por colocar os planetas em órbita.
Quanto menor a distância entre os corpos mais intensa é a força gravitacional. Essa propriedade
gera efeitos que podem ser observados em corpos extensos como o nosso planeta, nos quais há
uma variação do efeito gravitacional ao longo do corpo, gerando as chamadas forças
gravitacionais diferenciais, ou forças de maré. O fenômeno das marés consiste na variação do
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nível do mar, gerando as famosas marés altas e baixas, efeito ocasionado pela atração
gravitacional que a Lua exerce em nosso planeta e as forças diferenciais/de maré que surgem
nessa interação.
Figura 12: Forças diferenciais e marés. Crédito: Maria de Fátima Oliveira Saraiva, Kepler de
Oliveira Filho e Alexei Machado Müller
O lado da Terra que está mais próximo à Lua sofre uma atração gravitacional mais intensa do
que o meio e o lado oposto do planeta. As forças diferenciais/de maré surgem das diferenças
entre as forças gravitacionais em cada ponto do planeta e a força gravitacional de seu centro de
massa. O efeito médio que sentimos tem a ver com esse efeito gravitacional sobre o planeta
como um todo, pois é comparativo com a força que nós mesmos estamos sofrendo. Na prática é
como se a massa do lado da lua sofresse uma força em sua direção e a do lado oposto sofresse
uma força na direção oposta à Lua. Assim, temos maré alta tanto quando estamos de frente para
a Lua como quando estamos diametralmente opostos a ela, resultando em duas marés por dia
[5].
O Sol também provoca forças de maré na Terra de maneira análoga à Lua, porém com menor
intensidade. Uma expressão qualitativa para a força diferencial ΔF pode ser encontrada a partir
da lei de gravitação universal:
F ∝ RΔd3M
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A expressão acima nos diz que a força diferencial é proporcional ao raio R do corpo que sofre a
maré e à massa M do corpo que provoca a maré [6]. É importante notarmos também que a força
cai com o cubo da distância d entre os centros de massa dos dois corpos, de forma que embora
o Sol tenha uma massa muito grande, sua grande distância até nós é tal que as forças
diferenciais causadas por ele na Terra são cerca de 2 vezes menos intensas do que aquelas
causadas pela Lua. Isso significa que o Sol também provoca marés, chamadas marés solares,
mas elas são mais fracas do que as marés lunares.
Figura 13: Configuração entre Terra, Lua e Sol e o surgimento de marés. Crédito: Maria de
Fátima Oliveira Saraiva, Kepler de Oliveira Filho e Alexei Machado Müller
A depender da posição relativa entre Terra, Lua e Sol, as marés solares e lunares podem se
somar originando as marés vivas, ou não, originando as marés mortas. Na parte desta apostila
sobre a Lua entenderemos melhor qual é a relação das marés com as fases da Lua.
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Precessão do eixo da Terra
Foi afirmado anteriormente que a direção do eixo de rotação terrestre não muda. Para o
entendimento dos movimentos da Terra e suas consequências num contexto de tempo que
envolva meses e até anos essa afirmação sobre o eixo terrestre é verdadeira. Entretanto, para
sermos mais precisos devemos levar em consideração mais um movimento: o de precessão do
eixo terrestre.
No geral para simplificarmos algumas explicações dizemos que a Terra é redonda, mas, como
visto anteriormente, o movimento de rotação provoca um achatamento dos polos e um equador
bojudo. Se envolvêssemos a Terra com um barbante que partisse do polo norte, passando pelo
polo sul e depois voltando à origem, veríamos que ele teria cerca de 40 km a menos do que um
barbante que envolvesse a Terra através do círculo equatorial. As mesmas forças diferenciais
que provocam as marés tendem a achatar ainda mais o formato da Terra e a “endireitar” o eixo
de rotação de forma a alinhá-lo ao eixo da eclíptica [6].
Figura 14: Forças que agem sobre os bojos equatoriais. Crédito: Maria de Fátima Oliveira
Saraiva, Kepler de Oliveira Filho e Alexei Machado Müller
A Figura 14 traz uma ilustração que mostra as forças diferenciais (setas pequenas) que agem
sobre os bojos equatoriais. Como já vimos no tópico de forças de maré, as forças diferenciais
sobre o bojo equatorial são mais intensas. A inclinação do plano equatorial com o plano da
eclíptica é de 23,5o, que por sua vez está inclinado 5o em relação ao plano da órbita lunar [6].
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Essas inclinações fazem com que a direção das forças aplicadas não seja perpendicular ao plano
equatorial, mas também inclinadas com relação a ele. As forças diferenciais resultantes são na
direção de alinhar o eixo de rotação. Como a Terra continua em rotação esse alinhamento não é
concretizado. Em contrapartida, o eixo terrestre realiza um movimento circular em torno do eixo
da eclíptica, como um peão. A esse fenômeno damos o nome de Precessão do Eixo da Terra.
Figura 15: Precessão do Eixo da Terra. Crédito: Maria de Fátima Oliveira Saraiva, Kepler de
Oliveira Filho e Alexei Machado Müller
A razão de não ser relevante considerar a precessão do eixo da Terra para a explicação dos
movimentos terrestre e seus efeitos ao longo de dias e até mesmo alguns anos se deve ao fato
de que o período para a conclusão de uma volta em torno do eixo da eclíptica é de 25.770 anos
[6]. Ou seja, é um movimento lento e que não conseguimos perceber durante um tempo de vida
humano. Entretanto, é curioso saber que embora hoje o eixo terrestre esteja apontado no norte
para a estrela Polar, daqui a cerca de 13.000 anos isso não será mais verdade: ele estará
apontando para a estrela Vega.
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Figura 16: Movimento de precessão e as estrelas. Crédito: Encyclopaedia Britannica, Inc
Como o eixo terrestre vai mudando paulatinamente sua direção, também muda a posição relativa
do Sol com relação às estrelas de fundo de um ano para o outro, o que significa que com o
tempo o Sol estará “em cima” de diferentes constelações zodiacais em um mesmo dia do ano.
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Sol
O Sol, a figura central do Sistema Solar, é uma estrela de cerca de 4,57 bilhões de anos e
corresponde a 99,85% da massa total do Sistema Solar. Não é a toa que os planetas o orbitam!
Energia gerada pelo Sol é emitida para o espaço e incide nos corpos ao seu redor. A incidência
de luz solar foi fundamental para o surgimento e manutenção da vida sobre a Terra e, entre
outros fenômenos, é também essencial no entendimento das estações do ano.
Estações do ano
Incidência solar sobre a Terra
Vamos estudar como acontece a incidência de luz solar sobre a Terra. Recordemos o
experimento de Eratóstenes e como que os raios solares descreviam ângulos diferentes de
incidência num momento instante, mas em lugares diferentes do globo. O fenômeno nada mais é
do que resultado da curvatura da superfície terrestre e o fato de os raios solares incidem
paralelos entre si. Embora o Sol seja uma fonte esférica de luz que a emite em todas as direções,
para pontos muito distantes da fonte os raios são praticamente paralelos, como está ilustrado na
Figura 13. Como a Terra está muito longe do Sol, os raios incidem paralelos entre si no planeta.
Figura 17: Raios solares. Crédito: Memorie Yasuda
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Embora os raios incidam paralelos entre si, eles não incidem sobre a superfície terrestre da
mesma maneira, como foi descrito por Eratóstenes. Observe a seguinte situação abaixo:
Figura 18: Incidência dos raios solares no equinócio
Ela mostra como o ângulo de incidência dos raios do sol são diferentes ao longo da superfície,
embora eles sejam paralelos entre si. Na Figura 18 temos um equinócio, um ponto especial da
órbita terrestre que será explicado no próximo tópico da apostila.
Figura 19: Incidência de raios solares e densidade de energia em locais diferentes
Na Figura 19 temos a ilustração de três regiões diferentes sobre as quais, no mesmo instante, os
raios solares incidem com ângulos distintos (90o, 45o e 30o). Quanto menor o ângulo com a
superfície teremos menos raios de luz por área da superfície. Isso significa que a densidade de
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energia solar é menor, pois ela está mais espalhada. Essas regiões, portanto, se encontram mais
frias.
Variação da incidência solar ao longo do ano e as estações do ano
Estações do ano são fenômenos experienciados por qualquer um que viva sobre a Terra. Verão,
Outono, Inverno e Primavera são os nomes que damos a quatro épocas nas quais o ano pode
ser dividido, cada uma com suas características, mais ou menos acentuadas de acordo com a
região da Terra. Podemos nos perguntar: qual é a causa das estações do ano e, além disso,
porque elas têm intensidades diferentes a depender da região em que vivemos? Afinal, se você
mora no Brasil já deve ter percebido que o Inverno por aqui não vem acompanhado de neve.
Como já abordado anteriormente, a Terra pode ter o seu movimento dividido em dois: o de
rotação em torno de um eixo próprio e o de translação ao redor do Sol. Se o eixo terrestre fosse
perpendicular ao plano da órbita os raios solares incidiriam em cada região do planeta da mesma
maneira ao longo do ano. Teríamos, mesmo assim, uma diferença de temperatura entre as
regiões, mas o clima seria constante e não haveria estações do ano. As regiões mais próximas
aos polos seriam mais frias e a região do equador seria a mais quente, com o raios solares
incidindo perpendicularmente ao solo.
Entretanto, sabemos que o eixo terrestre não faz 90o com o plano da órbita, mas sim um ângulo
de 66,6o. Esta inclinação é fundamental para o entendimento do fenômeno das estações do ano.
Um aspecto também muito importante é o de que podemos considerar para fins práticos que a
direção na qual o eixo terrestre aponta não muda ao longo do ano, como já discutido no tópico
de precessão do eixo terrestre. Observe isso na figura a seguir, onde estão destacados quatro
pontos notáveis da órbita da Terra em torno do Sol.
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Figura 20: Configuração sazonal da Terra e do Sol. Adaptação de imagem da Encyclopaedia
Britannica, Inc.
O primeiro ponto notável acontece próximo a 21 de Junho e é conhecido como Solstício de
Verão para o hemisfério norte e Solstício de Inverno para o hemisfério sul. É o momento da
órbita no qual o polo norte terrestre está apontado o mais próximo possível ao Sol, e o polo sul
terrestre o mais longe possível. Nessa situação os raios solares incidem perpendicularmente ao
Trópico de Câncer e as regiões ao norte experienciam a maior fração de tempo do dia
iluminadas. Em contrapartida, as regiões ao sul passam a maior parte do tempo do dia no escuro.
É o dia mais longo para o hemisfério norte, marcando o início do verão para ele, e a noite mais
longa para o hemisfério sul, marcando o início do inverno para ele [8].
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Figura 21: Solstício de verão para o hemisfério norte e de inverno para o hemisfério sul. Crédito:
Wikipedia commons
Seis meses depois, no terceiro ponto notável da Figura 20, a situação se inverte. O polo sul
terrestre está apontado o mais próximo possível ao Sol, e o polo norte terrestre o mais longe
possível. Próximo ao dia 21 de Dezembro acontece o Solstício de Verão para o hemisfério sul,
com a máxima duração do dia, e o Solstício de Inverno para o hemisfério norte, com a máxima
duração da noite [8]. Nessa situação os raios solares incidem perpendicularmente ao Trópico de
Capricórnio.
Figura 22: Solstício de verão para o hemisfério sul e de inverno para o hemisfério norte. Crédito:
Wikipedia commons
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Nos dias de solstício e em alguns que antecedem e sucedem eles ocorre um fenômeno muito
interessante. Observe na Figura 22 as regiões próximas ao polo norte e aquelas próximas ao
polo sul. Imagine, agora, a Terra rotacionando em torno de seu eixo e completando uma volta
(um dia). Você deverá constatar que as regiões próximas ao polo norte permanecem na
escuridão ao longo de toda a volta, não sendo iluminadas pelo Sol em nenhum instante do dia.
Chamamos o fenômeno de noite polar. Ao mesmo tempo, as regiões próximas ao polo sul são
iluminadas ininterruptamente ao longo do dia. Chamamos o fenômeno de sol da meia-noite. O
fenômeno ocorre de forma inversa entre os polos no outro solstício do ano, Figura 21. Regiões
dentro do Círculo Polar Ártico (norte) ou do Círculo Polar Antártico (sul) experienciam ao menos
um dia de sol da meia-noite e um dia de noite polar no ano. É o caso, por exemplo, da Noruega.
Existem outros dois pontos notáveis e intermediários, entre um solstício e outro, chamados de
Equinócios. Nesses pontos há o cruzamento do plano equatorial com a eclíptica e ambos os
hemisférios recebem a mesma quantidade de luz, com os raios solares incidindo
perpendicularmente ao equador. Nos equinócios temos a mesma duração do dia e da noite, 12
horas para cada. Próximo a 21 de março temos o Equinócio de Outono para o hemisfério sul e o
Equinócio de Primavera para o hemisfério norte, dando início às respectivas estações em cada
região. Já em 21 de setembro temos o Equinócio de Outono para o hemisfério norte e o
Equinócio de Primavera para o hemisfério sul. Como o Equinócio de Primavera no hemisfério
norte, também chamado de Equinócio Vernal, marca o fim do inverno e o início da estação de
colheita, ele teve uma importância muito grande para os antigos astrônomos. O tempo entre dois
equinócios vernais é definido como o ano tropical, cerca de 365,242 dias solares [8].
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Figura 23: Equinócio. Crédito: Wikipedia commons
A sucessão desses eventos é: Solstício de Verão, Equinócio de Outono, Solstício de Inverno e
Equinócio de Primavera.
No equador as estações do ano são bem parecidas e o dia tem sempre a mesma duração da
noite, 12 horas. Conforme nos distanciamos do equador, tanto para o sul como para o norte, os
efeitos de mudança da duração do dia e da noite ao longo do ano passam a ser mais
pronunciados e, consequentemente, as estações passam a ser mais acentuadas, já que a
quantidade de energia recebida varia não somente em termos do ângulo de incidência dos raios
solares, como também depende do tempo por dia em que a região recebe luz [9].
Em resumo, a incidência dos raios solares depende da latitude da região por conta da curvatura
da Terra e, além disso, essa incidência muda para cada região ao longo da órbita terrestre em
virtude do ângulo entre o eixo terrestre e a eclíptica, resultando também em dias e noites de
durações distintas e estações diferentes ao longo do ano.
No Simulador de Estações do Ano da Universidade de Nebraska [4] é possível escolher tanto a
posição de um observador sobre a Terra como o dia do ano. Fixando a posição e variando os
meses, observamos como o ângulo de incidência da luz solar varia.
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Figura 24: Incidência dos raios solares em São Paulo em Janeiro e em Julho
Em uma latitude próxima à de São Paulo em Janeiro, quando é época de verão na região, os
raios solares incidem quase perpendicularmente ao solo próximo ao meio-dia. Já em Julho,
período de inverno, os raios incidem mais obliquamente no mesmo horário.
Um mito muitas vezes erroneamente difundido é o de que as estações do ano são resultado da
maior ou menor aproximação da Terra ao Sol. Se isso fosse verdade, a Primavera e o Outono
deveriam ser iguais e não poderia acontecer Verão em um hemisfério e Inverno no outro
simultaneamente, como sabemos que acontece. A variação de aproximadamente 3% da
distância Terra-Sol entre o periélio e o afélio não seria também suficiente para ocasionar
mudanças significativas na temperatura terrestre.
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Lua
Um satélite natural é um objeto que orbita um planeta, e a Lua é o único satélite natural da Terra.
Ela tem formato esférico, não possui luz própria e sua distância à Terra é de cerca de 384.400
km, além de poder ser observada no céu tanto de dia como de noite, com aspectos diferentes.
Assim como o Sol, temos a impressão de que a Lua se move com relação às estrelas de fundo,
mas, ao contrário do Sol, ela realmente se move ao redor da Terra.
Figura 25: Foto da Lua em fase cheia. Crédito: NASA
Movimentos, a Face Oculta da Lua e Fases
De forma semelhante ao nosso planeta, a Lua tem tanto um movimento de rotação em torno de
um eixo próprio, como também um movimento de órbita ao redor da Terra. Ambos têm o mesmo
período, ou seja, demoram a mesma quantidade de tempo para completar um ciclo. Esse
sincronismo tem como resultado um fenômeno bem curioso: a Lua aponta sempre a mesma face
para nós, de forma que quando a olhamos observamos sempre uma única metade sua.
Chamamos a porção que não é visível para um observador na Terra de lado oculto da Lua.
Ao observar a Lua ao longo do tempo nota-se que ela cruza o céu em uma taxa de
aproximadamente 12o por dia. Sua aparência também muda com o tempo, obedecendo um ciclo
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de mudanças, ou fases, que demora um pouco mais de 29 dias para se completar [8]. A Lua não
muda seu formato com o tempo, mas o seu movimento ao redor da Terra faz com que sua
porção virada para o Sol e iluminada por ele mude. A todo momento alguma metade da Lua é
iluminada pelo Sol, mas nem sempre essa metade é vista integralmente da Terra, já que a Lua
aponta sempre a mesma face para nós. O que vemos de nossa perspectiva é uma sucessão de
fases lunares. A começar com a lua nova, quando a Lua está completamente invisível no céu,
temos que ela está entre a Terra e o Sol, de forma que o seu lado iluminado é o lado oculto. Ao
longo dos próximos dias ela passa a ser visível aos poucos, até que atinge a sua fase quarto
crescente, estando iluminada metade da face visível e metade da face oculta. Quando a Terra
está entre a Lua e o Sol é o momento no qual toda a face lunar virada para nós é iluminada,
também chamado de lua cheia. Depois de atingir a máxima iluminação na face visível, ela passa
a diminuir até atingir o chamado quarto minguante, onde estão iluminadas metade da face visível
e metade da face oculta, ambas metades complementares às iluminadas na fase quarto
crescente. Depois a Lua tem sua aparência modificada progressivamente até atingir novamente
a fase de lua nova, completando um ciclo. Perceba na figura a seguir a relação entre as fases da
lua e as posições relativas entre a Terra, a Lua e o Sol.
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Figura 25: Fases da Lua. Crédito: MoonConnection.com
Como pudemos ver todos os lados da lua são iluminados em algum momento da órbita lunar.
Sendo assim, não existe um “lado escuro” da lua, mas tão somente um “lado oculto”.
As quatro fases abordadas (lua nova, quarto crescente, lua cheia e quarto minguante) são as
mais notáveis, entretanto podemos dizer que a Lua tem infinitas fases, pois ela muda o seu
aspecto a cada instante do tempo e de forma progressiva.
Estudamos as forças de maré, assim como seus efeitos sobre a Terra. Agora entenderemos
melhor qual é a relação das marés com as fases da Lua. A depender da posição relativa entre a
Terra, a Lua e o Sol, as marés solares e lunares podem se somar originando as marés vivas, ou
não, originando as marés mortas. No primeiro caso a Lua está do mesmo lado ou do lado oposto
ao Sol, de formas que as marés se somam. Nesse caso temos ou lua nova ou lua cheia. Já na
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situação de marés mortas a Lua está posicionada de tal forma que sua fase é ou quarto
crescente ou quarto minguante. Observe isso na figura a seguir.
Figura 26: Configuração entre Terra, Lua e Sol e o surgimento de marés. Crédito: Maria de
Fátima Oliveira Saraiva, Kepler de Oliveira Filho e Alexei Machado Müller
Superlua, Lua rosa e Lua azul: mitos e verdades
De tempos em tempos surgem algumas manchetes em jornais que convidam o leitor a observar
no céu a Superlua, a Lua Rosa ou Azul, e até mesmo uma Superlua Rosa. Essas manchetes são
verídicas ou sensacionalistas?
Comecemos com a Superlua. Como qualquer objeto que realiza uma órbita fechada, a Lua tem
uma trajetória elíptica. Isso significa que existem pontos da órbita nos quais ela está mais
próxima da Terra e pontos nos quais está mais distante. O ponto de máxima aproximação é
chamado de perigeu, alcançado pela Lua uma vez a cada volta ao redor da Terra, ou seja, uma
vez a cada 29 dias aproximadamente. A depender da posição relativa entre ela, a Terra e o Sol,
a Lua estará em uma determinada fase, conforme estudamos. Quando a fase é de lua cheia e ela
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está próxima ao perigeu ocorre o fenômeno da Superlua: podemos observar o nosso satélite
natural completamente brilhante e em sua maior aproximação. Em média ocorre um aumento no
diâmetro aparente da Lua de cerca de 5,5%, algo difícil de notar a olho nu, mas muito
interessante para realizar astrofotografias e fazer a comparação da dimensão Lua com outras
fotos suas.
Figura 27: Comparação do disco lunar aparente entre uma Lua média de dez/2010 e uma
Superlua de mar/2011. Crédito: Marco Langbroek
A denominação Lua Rosa historicamente é dada à primeira lua cheia depois do início da
primavera no hemisfério norte, quando nascem as flores phlox com pétalas cor de rosa.
Entretanto, a Lua não fica cor de rosa. A Lua Azul, de forma similar, não passa de uma
denominação. No caso, refere-se à segunda lua cheia do mês. Como a Lua tem um ciclo de um
pouco mais de 29 dias, caso haja uma lua cheia no começo de meses com duração de 30 ou 31
dias, teremos outra logo antes do mês terminar. O aspecto da lua, entretanto, não muda em
absolutamente nada.
No fenômeno a que chamaram de “Superlua Rosa”, ocorrido em 7 de Abril de 2020,
presenciou-se uma superlua que, coincidentemente, era a primeira lua cheia depois do início da
primavera no hemisfério norte. O nome e as chamadas sensacionalistas, entretanto, frustraram
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muitos observadores que buscaram uma lua gigante e rosa no céu. O espetáculo, mesmo assim,
não deixa de ser belo como todas as luas cheias são.
Acoplamento de maré
Falamos sobre forças diferenciais ao abordarmos o fenômeno das marés. Essas forças se
aplicam em qualquer contexto gravitacional que envolva objetos extensos, como é o caso do
sistema Terra-Lua. Elas se atraem mutuamente e a força de maré na Lua provocada pela Terra é
aproximadamente 20 vezes a força de maré na Terra provocada pela Lua [6]. Na Terra o efeito
mais notável é a elevação dos mares por serem fluidos, mas há também a elevação da crosta
terrestre, embora pouco perceptível. Na Lua, entretanto, a crosta lunar pode sofrer uma elevação
de cerca de 20 metros nas marés altas. Esse efeito que a Terra gera sobre a Lua é mais intenso
porque nosso planeta tem uma massa consideravelmente maior do que o nosso satélite natural.
No passado a Lua não tinha seu movimento sincronizado. Na verdade, o seu período de rotação
era menor do que o de translação ao redor da Terra. Os bojos formados pela interação de maré,
alinhados na direção da Terra, tinham que ser arrastados pela rotação lunar, gerando atrito entre
as diferentes partes da Lua e freando a rotação, forçando com que os bojos permanecessem
alinhados com o planeta [6]. Dessa forma, aos poucos a Lua foi sincronizando o seu movimento,
de forma a manter a mesma face virada para a Terra.
O chamado acoplamento de maré é o resultado desse tipo de efeito ao longo de bilhões de
anos, quando ambos os corpos atingem uma rotação síncrona: a mesma face de um está sempre
apontada para a mesma face do outro. Esse efeito foi parcialmente atingido no sistema
Terra-Lua, pois a Lua está sempre com a mesma face virada para nós, mas o contrário não é
verdade. Para o efeito completo ser atingido devemos esperar mais alguns bilhões de anos. Ele
é uma tendência em sistemas binários compostos de corpos com massas similares, como é o
caso do planeta Plutão e seu satélite natural Caronte, hoje com o movimento relativo
completamente alinhado.
Embora a rotação síncrona completa ainda não tenha se concretizado para o sistema Terra-Lua,
a Terra permanece a girar sob os bojos de maré e o efeito de “freamento” de sua rotação
acontece paulatinamente por meio do atrito do giro. Estima-se que no início do sistema
Terra-Lua o dia em nosso planeta durava cerca de 12 horas.
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Existe uma quantidade física denominada momentum angular que deve ser conservada em
sistemas fechados, ou seja, ela deve ter o seu valor mantido constante para sistemas como o
formado pela Terra e a Lua, por exemplo. O momentum angular total pode ser obtido a partir da
soma de suas três componentes: a de rotação da Terra, a de rotação da Lua e a de órbita da Lua
ao redor da Terra. Sendo o valor total constante, é possível que uma das componentes tenha o
seu valor modificado, contanto que as outras compensem essa diferença.
O lento porém existente freamento da rotação da Terra gera uma diminuição da componente do
momentum angular associada ao movimento. Para compensar esse efeito a Lua aumenta seu
momentum angular orbital L, dado pela seguinte expressão:
mL = × r × v
Onde m é a massa da Lua, v sua velocidade e r o raio da órbita. Em especial, com o tempo há um
aumento do raio da órbita lunar, de forma a aumentar o momentum angular orbital e compensar
a perda de momentum angular de rotação da terra. Na prática a Lua se afasta de nós cerca de 3
a 4 cm por ano.
Eclipses e ocultações
Eclipses e ocultações são extraordinários fenômenos naturais que podem ser vistos no céu de
tempos em tempos, mas somente em lua cheia ou lua nova [8]. Um eclipse acontece quando um
corpo atravessa a sombra de outro corpo, como é o caso do eclipse lunar quando a Lua
atravessa a sombra da Terra. Os eclipses lunares são visíveis em qualquer lugar da Terra desde
que a Lua esteja acima do horizonte. Ocultações, por sua vez, acontecem quando um objeto
ocultante se posiciona na frente de outro, como é o caso da ocultação do Sol pela Lua. Por ser
um fenômeno que depende de perspectiva, a ocultação do Sol, comumente chamada de eclipse
solar, só é observável em regiões específicas da Terra [10]. Os fenômenos de eclipses lunar e
solar dependem das posições relativas entre a Terra, a Lua e o Sol. A seguir veremos mais sobre
eles.
Eclipse lunar
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O eclipse lunar é o fenômeno no qual a Lua atravessa a sombra da Terra, que bloqueia
temporariamente a luz solar que incidiria sobre o disco lunar. Na Figura 28 temos uma ilustração
fora de escala que mostra a Lua posicionada no meio da sombra da Terra. A configuração
espacial entre os corpos é similar à da situação de lua cheia, não seja um importante detalhe: no
caso do eclipse temos a Lua, além de na fase cheia, também posicionada (ou praticamente) no
cruzamento entre o plano da eclíptica e o seu próprio plano orbital. Em situações corriqueiras
esse alinhamento não acontece, pois a Lua consegue evitar a sombra terrestre estando acima ou
abaixo do plano da eclíptica. Não fosse a inclinação de 5o do plano de órbita lunar, teríamos pelo
menos um eclipse lunar por mês.
Figura 28: Lua posicionada na sombra terrestre, ocasionando o fenômeno de eclipse lunar
Durante o eclipse a Lua não aparece absolutamente escura, pois alguns raios de sol chegam
indiretamente nela. As frequências da luz na faixa do vermelho conseguem passar pela
atmosfera do nosso planeta sem sofrer espalhamento e, com a refração, atingem o astro
eclipsado, dando a ele uma leve aparência avermelhada, efeito que é popularmente chamado de
“lua de sangue”. O mecanismo físico que explica o tom avermelhado da lua durante um eclipse é
o mesmo que explica as tonalidades avermelhadas de um pôr do sol.
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Figura 29: Foto do eclipse lunar de 27/07/2018. Crédito: ESA/CESAR–M.Castillo
O evento se inicia no instante em que a sombra curvada da Terra começa a se projetar sobre o
disco lunar e vai aumentando progressivamente. Na maioria dos casos a sombra não consegue
cobrir completamente o disco lunar, situações nas quais o alinhamento Sol-Terra-Lua não é
perfeito. Nesses casos temos eclipses lunares parciais. O eclipse lunar penumbral acontece
quando a Lua entra na penumbra da Terra, região da sombra com um pouco de iluminação.
Acontece uma diminuição no brilho da Lua difícil de ser notada a olho nu.
Figura 30: Mosaico de fotos de etapas do eclipse lunar total de 27/07/2018. Crédito: Beatriz
Yordaky
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Figura 31: Diferentes tipos de eclipse lunar. Crédito: Kepler de Souza Oliveira Filho & Maria de
Fátima Oliveira Saraiva
Eclipse solar
Quando a sombra da Lua é projetada sobre a Terra ocorre um eclipse solar. As regiões da Terra
atingidas pela umbra, região da sombra que não recebe nenhuma luz, observam o Sol
completamente ocultado, de forma que algumas estrelas e até mesmo planetas se tornam
visíveis em “pleno dia”. Nessa situação é também possível observar a chamada corona solar,
envoltório luminoso do Sol.
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Figura 32: Corona solar durante um eclipse solar total visto das Ilhas Marshall. Crédito: Miloslav
Druckmuller
Já as regiões atingidas pela penumbra, região da sombra que recebe um pouco de luz,
experienciam um eclipse solar parcial, onde somente parte do disco solar é ocultado pela Lua.
Durante um eclipse solar somente algumas regiões da Terra são atingidas pela sombra lunar, e
portanto somente elas observam o fenômeno, que por consequência é bem mais raro do que o
eclipse lunar. Como a Lua continua a percorrer sua trajetória ao redor da Terra, a sombra vai
caminhando sobre a superfície terrestre. Por isso o tempo máximo que uma região fica sob a
umbra lunar é de 7,5 minutos, duração máxima de um eclipse solar total. A largura da umbra
sobre a Terra é sempre menor do que 270 km, ao ponto que a penumbra de estende por um
raio de cerca de 3000 km ao redor da umbra [11].
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Figura 33: Ilustração do eclipse solar, com a projeção da sombra da Lua sobre a Terra
Figura 34: Eclipse solar total de 2019 observado no Observatório de La Silla do ESO no Chile.
Crédito: ESO
O nome eclíptica dado ao plano da trajetória da Terra ao redor do Sol provém da razão de que
os eclipses só são possíveis quando a Lua está sobre ou muito próxima à linha da eclíptica no
céu. Além disso, é necessário que ela esteja na fase de nova (eclipse solar) ou na fase de cheia
(eclipse lunar), conforme ilustrado na figura a seguir.
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Figura 35: Ocorrência de eclipses e a inclinação do plano de órbita lunar com relação ao plano
da eclíptica
No dia 29 de maio de 1919, sobre a cidade de Sobral no Ceará cientistas ansiavam por um
eclipse solar total que, além de gerar uma grande expectativa por ser um majestoso e raro
fenômeno, também seria crucial para o teste da Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein.
Muitas fotos foram feitas nos poucos minutos do dia nos quais a noite se revelou junto às
estrelas. O que os cientistas estavam tentando medir era os raios de luz de uma estrela que, ao
passarem próximos ao Sol, deveriam sofrer uma deflexão pelo campo gravitacional prevista pela
teoria.
Figura 36: Foto do eclipse solar total de Sobral de 1919. Crédito: F. W. Dyson, A. S. Eddington, e
C. Davidson
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Figura 37: Deflexão dos raios de luz prevista pela Relatividade Geral. Crédito: NASA/BBC
A previsão da teoria de Einstein de que a luz sofre influência de campos gravitacionais já foi
confirmado por diversos experimentos e tem consequências interessantes, como o fenômeno
das lentes gravitacionais.
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Referências
[1] SAGAN, CARL. Pálido ponto azul: uma visão do futuro da humanidade no espaço.
Companhia das Letras. 2a Edição, 2019.
[2] Grandes Marcos da Fotografia no Espaço. National Geographic. Disponível em:
<https://www.natgeo.pt/photography/2018/02/grandes-marcos-da-fotografia-no-espaco?image=6
428>. Acesso em 19/04/2020.
[3] SAGAN, CARL. Cosmos: uma viagem pessoal. Episódio 1: Os Limites do Oceano Cósmico.
[4] Simulador de Estações do Ano da Universidade de Nebraska. Disponível em:
<http://astro.unl.edu/naap/motion1/animations/seasons_ecliptic.html>. Acesso em 19/04/2020.
[5] Mecânica Clássica: A física das marés. Jorge Sá Martins, Universidade Federal Fluminense.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7xGDM45XOyo>. Acesso em 19/04/2020.
[6] SARAIVA, MARIA F. O., OLIVEIRA, K., MULLER, A. M. Aula 8: Forças gravitacionais
diferenciais - Marés e precessão. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Disponível em:
<http://www.if.ufrgs.br/fis02001/aulas/Aula8-132.pdf>. Acesso em 19/04/2020.
[7] PICAZZIO, ENOS. Introdução à Astronomia: A Esfera Celeste. Disponível em:
<http://www.astro.iag.usp.br/~picazzio/aga210/apostilas/cap02.pdf>. Acesso em 19/04/2020.
[8] MCMILLAN, S., CHAINSSON, E. Astronomy Today. Pearson, 9a edição, 2017.
[9] SARAIVA, MARIA F. O., OLIVEIRA, K. Movimento Anual do Sol e as Estações do Ano.
Disponível em: <http://astro.if.ufrgs.br/tempo/mas.htm>. Acesso em 19/04/2020.
[10] KARTTUNEN, H., KRÖGER, P. et al. Fundamental Astronomy. Springer, 6a edição, 2016.
[11] SARAIVA, MARIA F. O., OLIVEIRA, K. Eclipses. Disponível em:
<http://astro.if.ufrgs.br/eclipses/eclipse.htm>. Acesso em 19/04/2020.
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