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    A FALSA CRISE OU POR QU A GEOGRAFIA NO ENTRA EM CRISE?

    EIXO TEMTICO:ENFOQUES TERICO-METODOLGICOS DE LA GEOGRAFA

    PROF. GIOVANE MOTAUNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR

    FACULDADE DE GEOGRAFIA E CARTOGRAFIABELM - PAR - BRASIL

    EMAIL: [email protected]

    A clssica leitura econmica e a funcional leitura espacial no tm sido suficientes para

    explicar as novas dinmicas do mundo das mercadorias, porque no estamos falando

    simplesmente de mercadorias e objetos espaciais, mas de subjetividades incorporadas

    a estes, de relaes de trocas subjetivas criadas a partir da assimilao dos objetos

    pelo mundo. Para alm do valor de uso preciso tambm apagar o valor simblico que

    aos objetos e lugares so assimilados. Entramos em discusses profundas que

    envolvem outros conhecimentos sempre pela porta dos fundos, e reforamos uma idia

    que nos tem sido muito cara, a idia de sntese, por isso outras cincias nos buscam

    para que processemos a nova sntese do mundo, nosso eterno papel, pois sem elacomo podero pensar esse mundo que se apresenta. Sabem que temos os

    instrumentos, mais que suficientes para a construo do novo imago mundi, mas

    sabem tambm que poderamos, se tivssemos clareza disso, oferecer alm de uma

    imagem ordenada, oferecer tambm uma autntica explicao sobre as mutaes

    espaciais. Por isso a geografia no entra em crise e quando entra gera falsas crises ou

    falsos dilemas, como o mundo versus lugar, cotidiano versus histria, fragmentao

    versus globalizao, dentre outros nossos conhecidos.

    Palavras-Chaves: flexibilizao; cosmizao; crtica epistemolgica; espacialidades

    transferidas.

    EIXO TEMTICO:ENFOQUES TERICO-METODOLGICOS DE LA GEOGRAFA

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    Prof. Giovane Mota

    Departamento de Geografia de UFPa.

    "Porque o esprito dos homens armados sempre flutua

    incerto, os antigos gregos concediam o benefcio de um

    certo cegamento aos aedos encarregados de lhes ensinar,

    atravs de seus cantos itinerantes, sobre as aparncias de

    um mundo em que o que se passa, a surpresa, o acidente, a

    irrupo do intempestivo, tudo o que no invisvel

    movimento do tempo no pode ser imediatamente

    percebido".

    A Ilada

    Um dos grandes debates da atualidade geogrfica passa pelo tema da

    globalizao, com todas as suas contradies e explicaes, este tema exerce fascnio

    pela sua atualidade e pela multiplicidade de conflitos que eclodem nesse mundo de fim

    de sculo.

    Ligados a este momento histrico especfico coloca-se para as cincias e

    para a geografia, tambm um debate de magnitude, uma suposta e algumas vezes

    proposta crise de paradigmas. como se a atualidade puxasse a veracidade dos

    paradigmas de roldo, nisso questionam-se as construes tericas que se fazem no

    meio desse turbilho histrico-espacial.

    As alternativas de explicao do real multiplicam-se a mesma velocidade

    da acelerao contempornea, rompe-se a extensividade do espao e a narrativa

    temporal da histria. Reivindicam os novos discursos, o fragmento e o lugar como

    explicao do novo mundo, em alguns casos, como se a simples inverso dos plos de

    observao reconstrusse o real em toda sua dinmica, em todo seu movimento.

    Para ns gegrafos alguns dos problemas epistemolgicos comeam a

    aparecer, como resultado da cobrana exercida pelas outras cincias que at certo

    ponto exigem uma imagem organizada e sistematizada desse novo mundo, para

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    poderem sobre ela estender seus conflitos e crises particulares. Uma imagem que

    reconfigure o caos, "uma cosmizao do caos"1.

    A geografia ento, diante desse movimento crescente corre contra o

    tempo, tentando tardiamente dar um salto que agora se torna duplo, aprofundar-se emsi mesma em busca de sua epistemologia ao mesmo tempo em que tenta absorver

    novos ares tericos j h muito assimilados pelas humanidades. Corremos agora atrs

    do prejuzo, pagando pelo desprezo a teoria que marcou grande parte do pensamento

    geogrfico.

    Nesse ponto se apresenta uma autntica crise da geografia e da derivam

    a fragilidade de algumas explicaes sobre as mutaes espaciais atuais, bem como a

    incapacidade de responder originalmente necessidade da construo de uma nova

    imagem do mundo, ou como diz GOMES2 (1996) do novo "imago mundi".

    As duas ltimas dcadas so, (...) marcadas por um discurso que procura uma

    explicao geral na idia de crise crise econmica, poltica, social e, a que

    nos interessa de mais perto, crise da cincia. O recurso a esta idia faz

    intervirem implicitamente diversas outras noes: falncia, esgotamento e

    incapacidade. Nessa via, este discurso se obriga a anunciar algo de novo, uma

    soluo substitutiva que, em princpio, poder preencher as lacunas associadas

    ao diagnstico mesmo da crise.

    A reconstruo do imago mundi tornasse essencial, no somente

    geografia mas, e principalmente, forneceria a universalidade necessria e suficiente

    para que as outras humanidades permanecessem envolvidas, como esto, em

    alternativas aos discursos totalizantes, garantia aparente de seu novo salto qualitativo.

    Eis uma das principais fontes de reivindicaes e crticas geografia: cobrana e

    urgncia de um lugar onde por os ps, num momento onde "tudo o que slido

    desmancha no ar".

    Percebe-se que nossa crise substancialmente diferente das outrascincias e nosso horizonte terico no nos tem permitido ultrapassar as velhas imagens

    1Os termos "cosmizao", "cosmizar" sero utilizados neste texto no sentido aplicado por Jorge Luiz Barbosa (UFF), em seucurso sobre Mtodos do Pensamento Geogrfico, quando os qualifica como ordenao, ordenar pensamentos sobre uma poca,objetos e espaos.

    2 GOMES, Paulo Cesar C. Geografia e Modernidade. Bertrand Brasil: R.J., 1996.

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    de um novo mundo, melhor dizendo, no temos conseguido representar o novo mundo

    seno com velhas imagens. Seria apenas uma crise de representao?

    Na tentativa de buscar esclarecer o pargrafo anterior que surgem

    alguns questionamentos, como o que ora apresentamos: Como a geografia tem tentadoresponder a essas presses? Como na verdade, est processando a reconstruo da

    imagem do mundo? Como este mundo que a geografia est tentando construir?

    Como a geografia sempre foi a cincia do ordenamento, da organizao

    do caos, apontam-se para ela as grandes expectativas de reconstruo ou ordenao

    da atual imagem do caos e aos gegrafos surge a questo de como faz-lo,

    contemplando as expectativas e a si mesmos. Como recriar o mundo a grande

    questo que se coloca neste fin de sicle.

    Pego de surpresa pela acelerao espao-temporal o gegrafo faz a nica

    coisa que aprendeu a fazer nos seculus et seculores de sua construo e de seu

    modus operandis - descrever o visvel, deixando assim de ameaar o espao de uma

    explicao mais densa que vem sendo construda pelas outras cincias humanas, que

    necessitam dessa base totalizante e organizada para reconstrurem suas teorias.

    A reconstruo do mundo se faz ento com a criao de 'imagens

    luminosas', imagens imediatas e marcadas por novos objetos; o mundo se torna por

    essa perspectiva o reflexo do imediato, fruto da instantaneidade da captao-

    distribuio dos acontecimentos. A transcrio desses novos objetos e dessa imagem

    prima facie que marca a reconstruo do discurso ordenador da geografia, tentativa

    de vencer a velocidade.

    O olhar capturado pelo momento reflete-o como real e a "nova cosmizao

    do mundo" no consegue evidenciar seno, e novamente, o espanto que a imagem

    produz a partir de seus novos objetos e caractersticas. O olhar geogrfico dos

    primrdios deste novo sculo capta o mundo com o mesmo espanto e deslumbre comque Humboldt descreveu o mundo dos trpicos em sua obra Viagens as regies

    equinociais e aprimorou aps no Quadros da Natureza, so olhares semelhantes

    estes, porque marcado pelo brilho das mudanas visuais, pelos novos objetos, pela sua

    quantidade e pela ampliao de horizontes que estes permitiram.

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    O olhar de Humboldt capta detalhes do novo mundo, iluminados que esto

    os objetos pelo sol dos trpicos - cores, sombras e matizes - num jogo de imagens

    que permite visualizar os novos objetos apresentados como definidores daquela

    realidade espacial. As formas-imagens so tomadas pelo contedo.O conjunto de novos objetos, formas, sons, cores, luzes e imagens

    apresentam ao pensador alemo um mundo que deixa de ser o mundo j ordenado e

    concebido do velho continente; o mundo que se apresenta razo aparece como

    catico, instigante e fascinante, sua tarefa ento 'cosmizar' este mundo catico e as

    idias novas derivadas deste contato, orden-lo para que possa permitir o domnio do

    sensvel, a razo ordenando a natureza e as culturas, a razo ordenando as

    diferenas do visvel existente nos trpicos, mas nesse 'mundo de luz', natureza e

    cultura so imagens, 'imagens luminosas'. Cosmos a sntese maior desse processo

    de ordenao da imagem, do olhar, da paisagem e do pensamento sobre o sensvel.

    Buscamos, no momento atual, recriar esta sntese ordenadora, no a

    sntese simplista da somatria, contagem e distribuio dos objetos, mas uma sntese

    que compreenda uma explicao lgica para a aparente irracionalidade do acontecer e

    do aparecer. Enquanto isso no acontece os mapas do mundo continuam sendo

    corrodos e vilipendiados pelo real, a corrida pela atualizao da imagem nos transporta

    para as fontes de informao cotidiana, onde lemos o aqui e o agora - estamos

    sempre na crista da onda, o problema que nunca conseguimos nela mergulhar.

    SANTOS aponta uma leitura para o momento quando nos diz:

    vivemos em um mundo exigente de um discurso, necessrio inteligncia das

    coisas e das aes. um discurso dos objetos, indispensvel ao seu uso, e um

    discurso das aes, indispensvel sua legitimao. Mas ambos esses

    discursos so, frequentemente, to artificiais como as coisas que explicam e to

    enviesados como as aes que ensejam.

    Sem discurso, praticamente no entendemos nada. Como a inovao permanente, todos os dias acordamos um pouco mais ignorantes e indefesos"3.

    3SANTOS, Milton. Tcnica - Espao - Tempo. Globalizao e meio tcnico-cientfico informacional. HUCITEC: S.P.,1994, p. 20.

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    Ao projetarmo-nos neste salto para o futuro criamos mais uma amarra

    com o passado, MOREIRA4 falava "de um salto para o mesmo lugar". Esta a imagem

    que temos oferecido como resposta s presses de ontem e hoje, so imagens

    marcadas pelo acontecer, fruto do 'jornal do dia', carentes de historicidade e de umaleitura poltico-espacial profunda e estrutural.

    A leitura dos fragmentos injeta-nos a sensao de fora explicativa,

    quando se quer assim. De outra forma, o caos se explica por si mesmo e em si mesmo,

    tal lgica explicativa assume a forma do novo e contribui para o ordenamento do

    mundo, criando tambm uma nova imagem da realidade espacial, a de um mundo que

    centra sua imagem-fora no local. Os movimentos locais perdem assim, e por essa

    lgica explicativa sua totalidade, sua conexo orgnica com o mundo, transformam-se

    de fora poltica em localismos e regionalismos, do origem a uma fragmentao que

    despolitiza, uma reao espacial, uma reao poltica que se estabelece e se garante

    espacialmente. Criamos mais uma falsa dualidade - o local versus o global.

    HOBSBAWN reflete com clareza sobre este ponto de vista e apresenta-

    nos a dimenso mundial do lugar, ao analisar as relaes temporais entre passado,

    presente e o futuro que se apontam na realidade do movimento zapatista no Mxico:

    "quando a mudana social acelera ou transforma a sociedade para alm de um

    certo ponto, o passado deve cessar de ser o padro do presente, e pode, nomximo, tornar-se modelo para o mesmo [...]. Isso implica uma transformao

    fundamental do prprio passado. Ele agora se torna, e deve se tornar, uma

    mscara para inovao, pois j no expressa a repetio daquilo que ocorreu

    antes, mas aes que so, por definio, diferentes das anteriores. Mesmo

    quando se tenta realmente retroceder o relgio, isso no restabelece de fato os

    velhos tempos, mas meramente certas partes do sistema formal do passado

    consciente, que agora so funcionalmente diferentes"5.

    A fora do fragmento est no fato deste ser a manifestao especfica da

    totalidade e no uma parte da totalidade. Se incorremos num erro poltico e terico ao

    priorizarmos uma leitura econmica do mundo, apagando ou reduzindo a fora

    explicativa da diferena, incorreremos num erro igual ou maior se tratarmos a diferena

    4MOREIRA, Ruy. O discurso do avesso (para a crtica da Geografia que se ensina). Dois Pontos: R.J., 1987.5 HOBSBAWM, Eric.Sobre Histria. Cia das Letras: S.P., 1998.

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    como um em si. A fora do lugar e de seus movimentos est no seu reconhecimento

    territorial, na sua territorialidade, mas e principalmente na sua capacidade de dialogar

    com o mundo e se entender como uma das mltiplas manifestaes dele.

    Mas voltemos aos eixos de nossa anlise: como este mundo com que ageografia tem nos brindado; salvo excees, ser simplesmente o mundo da imagem e

    da velocidade, o mundo das dicotomias espaciais, ou algo nos tem passado

    despercebido no discurso geogrfico, e ele est sendo mais eficaz do que nunca?

    Vejamos.

    A marca fundamental do momento em que vivemos a velocidade, a

    mutao, a acelerao, somado a esses movimentos temos um intenso processo de

    produo tecnolgica e informacional e a geografia tem captado esses movimentos

    atravs de suas cristalizaes ou pseudo-cristalizaes mais evidentes, quais sejam:

    Primeiro, atravs dos novos objetos e espaos tecnolgicos, que vm sendo criados a

    velocidades avassaladoras, dispensando at, em certos casos, uma assimilao por

    parte da sociedade consumidora dos produtos criados, deixando ou fixando, na

    verdade, uma sensao de volatilidade, essencial para a criao do novo padro de

    consumo que se quer estabelecer. Segundo, marcado pelas permanentes mutaes

    nas conformaes dos Estados-Naes, fruto das dissolvncias ps-guerra fria, e

    tambm pela criao de organizaes e/ou territrios supra-nacionais, fundadores de

    uma nova lgica de organizao e circulao espacial, estas manifestaes criam um

    mapa to instvel quanto o tempo presente, portanto, perdem-se no meio do turbilho

    as cristalizaes territoriais, bases essenciais sobre as quais se estabelecem as lgicas

    geogrficas.

    Estas duas realidades bsicas do espao atual tm permitido uma gama

    de interpretaes que, na geografia, muitas vezes tem se esgotado nelas mesmas, j

    que no aprofundam a questo da funcionalidade dos novos objetos nem a essnciadas mutaes espao-territoriais. As tentativas de explicao tm dado conta da

    aparncia das mutaes cartogrficas ou quando muito de uma leitura simplista e

    economicista que imputa todas as culpas do mundo a "poltica cruel e avassaladora do

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    Santos7; a partir desta idia central, entendemos a acumulao de tempos como a

    acumulao de histrias, acumulao de desejos e sentimentos, de projetos realizados

    e utopias. Assim os objetos produzidos e cristalizados ao espao, frutos do tempo

    produtivo do capital que comea a ser superado e tambm fruto de outros tempos,esto carregados dessas espacialidades transferidas, e ao transferirmos

    espacialidade aos objetos que recebemos ou criamos, transferimos para eles aqueles

    projetos, desejos e sentimentos de que falamos acima, fundem-se no processo de

    produo do espao, objetos - racionalidades - interesses - sentimentos - projetos. Por

    isso falamos que ao produzir espao produz-se sociedade e vice-versa.

    Est claro que as cristalizaes espaciais so muito mais do que meros

    objetos alocados no espao de forma a estabelecer uma funcionalidade unilateral, qual

    seja, a de servir ao projeto exclusivo do capital, j que assumem tambm as

    representaes e expectativas dos mortais comuns, e por isso que uma rua pode ser

    a representao de uma infncia feliz, uma casa pode ser fruto de um projeto de vida,

    uma praa a lembrana do primeiro namoro e assim segue com os objetos menores de

    nosso cotidiano que ganhamos, compramos ou presenteamos. So estas

    transferncias os verdadeiros obstculos flexibilizao, por isso a volatilidade tem que

    se tornar um hbito, o novo hbito e habitat do capital.

    Os prprios objetos criados e cristalizados pelo capital ou por outros

    tempos tornaram-se obstculos aos novos objetos flexveis, preciso, pois, corromp-

    los, usurpar sua capacidade de reter; de reter histrias, sentimentos, projetos e desejos.

    O projeto tem que ser transformado no aqui e agora, a histria vira conjuntura e

    momento, o espao transmuta-se no detalhe, no fragmento, e o desejo um perfume

    que depois de 24 horas se evapora...

    Criamos ento a sensao da fuga constante, j que nada conseguimos

    capturar, vivemos a sensao de estarmos sempre atrasados, pois no temos ocomputador de ltima gerao, no lemos o mais recente livro lanado sobre o tema

    que nos interessa, no temos o mais tecnolgico dos televisores ou aparelho de som,

    7SANTOS, Milton.Pensando o espao do homem. HUCITEC: S.P., 1986

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    estamos atrasados para o mundo, e esse discurso se faz na economia e na poltica, o

    old worldque precisa ser reordenado para receber o new world.

    As mutaes no mundo do trabalho, no processo de produo, nas

    regulamentaes para as unidades federativas e para o prprio Estado, as amplasreformas do aparelho estatal, todos esses movimentos decorrem da nova lgica que se

    quer impor, o slido se transforma a uma velocidade avassaladora e nos tornamos

    espectadores da reconstruo do mundo, e os movimentos da classe trabalhadora

    transformam-se em reao, j que os objetos aos poucos vo deixando de reagir, e

    assim acontece porque os objetos que continham so substitudos por objetos contidos,

    novos objetos desprovidos de sonhos e projetos dos homens.

    Mas a pergunta que surge : no poderiam os homens preencher

    novamente estes objetos?

    por isso que o momento atual evita as cristalizaes, por isso a

    flexibilizao a ordem do momento, economias flexveis, indstrias flexveis,

    empregos flexveis, so as formas do momento, a expresso mxima do meio

    tcnico-cientfico-informacional de Milton Santos. Ento, a grande flexibilizao que se

    processa a flexibilizao das gentes, flexibilizao da subjetividade, flexibilizao

    dos homens em seus projetos, desejos e objetos, somente assim o capital pode

    corromper definitivamente a atual ordem espacial.

    Nesse sentido, a clssica leitura econmica e a funcional leitura espacial

    no tm sido suficientes para explicar as novas dinmicas do mundo das mercadorias,

    porque no estamos falando simplesmente de mercadorias e objetos espaciais, mas de

    subjetividades incorporadas a estes, de relaes de trocas subjetivas criadas a partir da

    assimilao dos objetos pelo mundo. Para alm do valor de uso preciso tambm

    apagar o valor simblico que aos objetos e lugares so assimilados.

    Interconexes, redes, circuitos, cadeias, fluxos, termos que se apresentamnaturalmente mente, quando se procura analisar as modalidades novas do

    espao moderno; traduzem a relao fundamental da mobilidade, da qual

    procedem as tendncias onipresena e os sistemas 'fora do cho'. As

    singulares posies no espao concreto tm uma importncia meramente

    secundria, o ambiente real no representa seno uma 'baixa prioridade'.

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    pois, segundo uma lgica circular que se organiza a atividade econmica e a

    produo cultural, a vida cotidiana e as estruturas edificadas8 (CHESNEAUX,

    1995: 20)

    Aqui, mais uma vez, a geografia mostra sua eficcia de ocultao, j que o

    mundo que nos tem apresentado o das lureas da revoluo tecnolgica, visto que os

    gegrafos adoram novidades; ou quando muito, depois de detectar as transformaes e

    ressaltar a velocidade com que ocorrem, descobre-se o neoliberalismo como o 'grande

    irmo', de Orwell, sem no entanto, explicar como a velocidade do processo introjeta no

    corpo social o mundo da dissoluo permanente, entropia necessria nova ordem. As

    alternativas a essa leitura tm-se dado no sentido da apologia do fragmento, como j

    ressaltamos anteriormente, sem atentar que a nova dinmica de dissolvncia criada

    no atinge somente os espaos, mas, e principalmente, as gentes, que esto em todos

    os lugares, que, portanto, tendem a ser assimiladas em suas diferenas mesmo que

    nunca saiam de seus lugares e culturas; para isto basta observar a apologia da

    diferena que vem aparecendo cada vez mais nos comerciais e propagandas das

    grandes marcas multinacionais, onde toda diferena se faz subsumida na legitimao

    de um suposto congraamento global da espcie humana, argumento que permitiria

    superar as diferenas tnicas, religiosas, sociais, econmicas, e claro, e

    fundamentalmente, as diferenas de mercados consumidores.Por isso a geografia no entra em crise e quando entra gera falsas crises

    ou falsos dilemas, como o mundo versus lugar, cotidiano versus histria, fragmentao

    versus globalizao, entre outros nossos conhecidos.

    Entramos em discusses profundas que envolvem outros conhecimentos

    sempre pela porta dos fundos, e reforamos uma idia que nos tem sido muito cara, a

    idia de sntese, por isso outras cincias nos buscam para que processemos a nova

    sntese do mundo, nosso eterno papel, pois sem ela como podero pensar esse mundo

    que se apresenta. Sabem que temos os instrumentos, mais que suficientes para a

    construo do novo imago mundi, mas sabem tambm que poderamos, se tivssemos

    clareza disso, oferecer alm de uma imagem ordenada, oferecer tambm uma autntica

    8 CHESNEAUX, Jean.Modernidade-Mundo. Vozes: Petrpolis, 1995.

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    explicao sobre as mutaes espaciais, que superasse os dilemas, e uma das bases

    dessa explicao estaria na idia de espacialidades transferidas e de flexibilizao

    das 'gentes'(flexibilizao da subjetividade), que apresentamos nesse ensaio como

    contribuio resignificao de alguns contedos que se tm apresentado ao debateda geografia.

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