Ed Motta na Revista Espresso

2
perfil Entre muitas outras coisas, Ed Motta pode ser considerado um foodie, termo usado atualmente para classificar os aficionados pelos prazeres da gastronomia. Quem se senta à mesa com ele, além de nunca comer e beber de forma medíocre, pode desfrutar de suas originais associações com a cultura. “Tal chef é o Miles Davis da cozinha francesa.” Ou então, “Esse Magret de Pato com batatas é o Steely Dan da coisa.” A comida, a música e o cinema se fundem a todo instante na percepção aguçada desse artista e colecionador quase patológico que um dia já foi conhecido como o sobrinho de Tim Maia. EU NÃO NASCI PRA TRABALHO Ed poderia até dizer a seu modo que em se tratando de apren- dizado musical ele não é exatamente um Cordon Bleu, ou seja, não tem formação acadêmica. Como na maioria dos assuntos que domina, ele também se considera um autodidata na música. Diz que aprende tudo observando e perguntando. Aos sete anos já tocava violão e apesar de sua mãe ser irmã de Tim Maia, ele não sofreu influência direta dos pais para seguir a carreira do tio. Na sua música é possível reconhecer a forte pegada da cha- mada black music dos anos 1970, desde que ele surgiu na cena carioca em 1988 liderando a banda Conexão Japeri. Uma salada de soul, funk e pop-rock que ganhou o Brasil com os hits Manuel e Vamos Dançar. Embora a atmosfera setentista povoe a sua mente até hoje, ele evoluiu como instrumentista e compositor, absor- veu novas influências, principalmente o jazz, estudou piano e se tornou arranjador e produtor. Posteriormente, na carreira solo, tocou ao lado de vários artistas e grupos nacionais e internacio- nais como o Incognito, um dos ícones do chamado acid jazz, o gênero musical inglês surgido na década de 90, que mistura elementos da soul music com a sofisticação do jazz. Com eles, gravou disco e o apresentou no Japão, em 2002. UM BOM PRATO É MÚSICA PARA OS OUVIDOS Criar trilhas sonoras para filmes e desenhos animados é outra atividade que ele gosta bastante. Trabalhou com Daniel Filho em A Partilha, Bruno Barreto no filme Caixa 2 e Sandra Werneck no Pe- queno Dicionário Amoroso. Fez Brasil Animado, com Mariana Caltabiano, ED MOTTA VIVE CERCADO POR MILHARES DE DISCOS DE VINIL, QUADRINHOS, FILMES EM BRANCO E PRETO E FITAS VHS. NOTÓRIO ENÓFILO, AGORA ELE ESTÁ DESPERTANDO PARA UMA NOVA PAIXÃO: O CAFÉ um ninja do café? TEXTO PAULO PEDROSO FOTOGRAFIA JORGE BISPO Ed e uma de suas paixões: a coleção com mais de 30 mil discos de vinil. 62 ESPRESSO ESPRESSO 63

Transcript of Ed Motta na Revista Espresso

perfil

Entre muitas outras coisas, Ed Motta pode ser considerado um foodie, termo usado atualmente para classificar os aficionados pelos prazeres da gastronomia. Quem se senta à mesa com ele, além de nunca comer e beber de forma medíocre, pode desfrutar de suas originais associações com a cultura. “Tal chef é o Miles Davis da cozinha francesa.” Ou então, “Esse Magret de Pato com batatas é o Steely Dan da coisa.” A comida, a música e o cinema se fundem a todo instante na percepção aguçada desse artista e colecionador quase patológico que um dia já foi conhecido como o sobrinho de Tim Maia.

EU NÃO NASCI PRA TRABALHOEd poderia até dizer a seu modo que em se tratando de apren-dizado musical ele não é exatamente um Cordon Bleu, ou seja, não tem formação acadêmica. Como na maioria dos assuntos que domina, ele também se considera um autodidata na música. Diz que aprende tudo observando e perguntando. Aos sete anos já tocava violão e apesar de sua mãe ser irmã de Tim Maia, ele não sofreu influência direta dos pais para seguir a carreira do tio.

Na sua música é possível reconhecer a forte pegada da cha-mada black music dos anos 1970, desde que ele surgiu na cena carioca em 1988 liderando a banda Conexão Japeri. Uma salada de soul, funk e pop-rock que ganhou o Brasil com os hits Manuel e Vamos Dançar. Embora a atmosfera setentista povoe a sua mente até hoje, ele evoluiu como instrumentista e compositor, absor-veu novas influências, principalmente o jazz, estudou piano e se tornou arranjador e produtor. Posteriormente, na carreira solo, tocou ao lado de vários artistas e grupos nacionais e internacio-nais como o Incognito, um dos ícones do chamado acid jazz, o gênero musical inglês surgido na década de 90, que mistura elementos da soul music com a sofisticação do jazz. Com eles, gravou disco e o apresentou no Japão, em 2002.

UM BOM PRATO É MÚSICA PARA OS OUVIDOSCriar trilhas sonoras para filmes e desenhos animados é outra atividade que ele gosta bastante. Trabalhou com Daniel Filho em A Partilha, Bruno Barreto no filme Caixa 2 e Sandra Werneck no Pe-queno Dicionário Amoroso. Fez Brasil Animado, com Mariana Caltabiano,

Ed Motta vivE cErcado por MilharEs

dE discos dE vinil, quadrinhos, filMEs

EM branco E prEto E fitas vhs. notório

Enófilo, agora ElE Está dEspErtando

para uMa nova paixão: o café

um ninja do café?

TEXTO paulo pedroso FOTOGRAFIA jorge bispo

Ed e uma de suas paixões: a coleção com mais de 30 mil discos de vinil.

62 espresso espresso 63

“Passei a gostarde café por influência da minha mulher, mas só tomo quando bebo vinho.”

desculpa e tenta manter a civilidade. Até com os chatos que insistem numa velha comparação. “Você é o Ed Motta? Seu tio era sensacional!”

A bem da verdade, os frequentadores das mídias sociais que acompanham o artista deveriam agradecê-lo pelo aumen-to da sua cultura musical. Diariamente ele posta verdadeiras raridades na rede. São pérolas dos mais variados gêneros que vão desde trilhas de séries de TV vintage e filmes europeus, até o jazz contemporâneo passando por muita soul music, pop japonês e MPB.

CONSUMINDO CAPITALEd Motta tem se tornado cada vez mais conhecido pelas suas paixões. Coisa que leva muito a sério. Ele apresenta um programa sobre o universo do vinil na Rádio Eldorado, o Empoeirado, que pode ser ouvido no site da emissora. Além disso, mantém um blog sempre atualizado, onde comenta vinhos e gastronomia; e, por fim, escreve eventuais colunas em jornais e revistas. Cada vez mais, ele desperta a curiosidade dos entrevistadores pelas suas manias e interesses. Recentemente, até declarou por aí de forma bem humorada que prefere ficar em casa degustando uma bela taça de vinho e ouvindo os ninjas tocarem do que ele mesmo se apresentar. A propósito, ninja é o termo que ele mais gosta de usar quando se refere aos craques. Seja na música ou em qualquer outro assunto do seu interesse.

Mas, por enquanto, seus admiradores não têm com o que se preocupar. Pois, a menos que esteja milionário, precisará seguir a sua carreira gravando, compondo e fazendo shows. Afinal, é preciso muito dinheiro para sustentar suas brincadeiras de gen-te grande. Torcemos para que o café entre de vez nessa lista.˙

e participou da trilha das animações da Disney, Tarzan e A Nova Onda do Imperador. E, recentemente, ele organizou uma seleção musical não para algum filme ou desenho, mas para uma situação bastante real e prazerosa da vida: comer – e mais – num dos melhores restaurantes franceses de São Paulo (SP).

Quem se senta para almoçar ou jantar no Bistrô Le Marais, pode desfrutar de músicas escolhidas a dedo por Ed Motta na sua coleção de 30 mil discos de vinil. São oito horas de raridades francesas da década de 60 nas vozes de gente como Michel Legrand, Borin Vian e Serge Gainsbourg, além de outros artistas, cuja trajetória mu-sical de algum modo tem relação com a França. O próprio Ed Motta, quando está em São Paulo, costuma passar por lá. Supomos que ele faça uma checagem regular para ver se os clássicos da gastronomia francesa ainda estão à altura de sua elegante trilha. De preferência acompanhados por um bom Borgonha, que é o seu vinho preferido.

A CULPA É DA EDNAFoi a esposa quem levou e continua levando o nosso amigo para esse verdadeiro caminho da perdição. Ao seu lado, ele aprendeu a ler histórias em quadrinhos, iniciou-se no mundo do vinho, e agora está bebendo café. Casados há mais de 20 anos, conheceram-se num show dele quando ela tentou, sem sucesso, entrevistá-lo para um trabalho de faculdade. Depois de um tempo, numa outra apresentação de Ed, um amigo em comum a levou até o camarim e, desde então, o cantor e ela não se separaram mais. A curitibana Edna Lopes é quadrinista, escritora e web designer. Desde o início do relacionamento ela cuida de toda a parte visual do trabalho de Ed Motta. Sobre a nova paixão que o casal divide, ele diz: “Passei a gostar de café por influência da minha mulher, que também introduziu o vinho na minha vida.” Quanto ao consumo, ele é cuidadoso, “Eu gosto de beber café somente quando bebo vinho, porque costuma me deixar muito agi-tado se não for nessas circunstâncias.”

Estudioso compulsivo dos assuntos que gosta, ele sabe que esse é mais um universo fascinante para uma mente curiosa. “Meu conhecimento sobre cafés ainda é pequeno. Sei que é um mundo complexo como o chá, com milhares de nuances, levando anos e anos para uma percepção mais aguçada.” Ed diz, também, que está começando a tomar mais a bebida em casa depois que adquiriu uma máquina de espresso, e tem provado alguns grãos artesanais e orgânicos. Por fim, revela: “Tenho muita vontade de me aprofundar no conhecimento sobre cafés. Fico feliz que exista uma publicação como esta sobre o assunto, já que o Brasil produz tantos cafés de alto padrão.”

PÉ NA JACAEd Motta costuma falar o que pensa sem a intermediação de assessores de imagem. Ele é cáustico em algumas opiniões, e certos críticos musicais, em especial, são o alvo predileto de suas farpas. Já se viu envolvido em enrascadas, principalmente por comentários considerados por ele como inofensivos, mas que se amplificaram nas mídias sociais. Eventualmente ele se

Além da música, Ed Motta se encanta com a gastronomia,

principalmente a francesa.

64 espresso espresso 65