Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do...

16
Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice Barreto Dalvan Silva Ermelinda de Almeida Juareis Mendes Helena Rodriguez Lourdes Ferraz Luiz Silveira Noeli Rocha Sinésio Brandão

Transcript of Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do...

Page 1: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

Alexandre Rosalino

Ana Camelo

Bárbara Deister

Berenice Barreto

Dalvan Silva

Ermelinda de Almeida

Juareis Mendes

Helena Rodriguez

Lourdes Ferraz

Luiz Silveira

Noeli Rocha

Sinésio Brandão

Page 2: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

6 de novembro a 16 de dezembro de 2015

De segunda a sexta, das 9h às 20h

Departamento Cultural - DECULT

Galeria Candido Portinari - UERJ

Rua São Francisco Xavier, 524 - Maracanã - Rio de Janeiro

Page 3: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

4 55

A Galeria Candido Portinari é espaço privilegiado de difusão

das artes reconhecendo – nas mais variadas linguagens – valores

que distinguem cada uma delas como instância legitimada e

legitimadora de arte.

Nesse sentido, constitui-se em importante instrumento de

democratização das práticas institucionais que, sem criar

hierarquizações entre saberes e fazeres distintos, oferece

oportunidades iguais àqueles que têm nas artes matéria-prima

de expressão, projetos, anseios, verdades.

Por meio dessa galeria, a UERJ dá visibilidade a artistas de

diversos campos, ao abrir espaço para a exposição de conceitos

como: erudito, popular, contemporâneo, moderno, expressões

individuais e coletivas. Linguagens como: desenho, pintura,

escultura, instalação, vídeo e performance que proporcionam

ao público multiplicidade de gestos, olhares, percepções.

São oportunidades que, se por um lado únicas, por outro se

constituem, no conjunto, em uma mesma totalidade, pois se

relacionam num mesmo contexto, se comunicam, influenciam,

renovam, dinamizam no diálogo, na troca de experiências.

CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ/REDE SIRIUS/NPROTEC

R585 Rio naif / curadoria Valéria Aquino. - Rio de Janeiro : UERJ,

DECULT, Galeria Cândido Portinari, 2015. 28 p. ISBN 978-85-85954-62-8 Catálogo da exposição realizada no período de 06 de

novembro a 16 de dezembro de 2015. 1. Primitivismo na arte - Exposições. I. Aquino, Valéria.

II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Departamento Cultural.

CDU 069.9:7.036

Page 4: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

6 7

do Departamento de Alfândega de Paris e se dedicava à pin-tura nos fins de semana. A palavra então começa a ser empre-gada para designar seu tipo de arte e com o tempo passa a in-corporar o vocabulário de artistas, críticos, pesquisadores, etc. Considerado o pai do naif, Rousseau era autodidata, ou seja, não havia passado por um estudo formal, não compartilhando do conhecimento técnico e acadêmico. Essas características supracitadas foram inclusive, muito utilizadas, como referên-cias seminais na apreensão desse estilo artístico. Seus traba-lhos retratavam paisagens e pessoas que na maioria dos casos faziam parte do seu cotidiano. Tinha também uma predileção pela natureza, por passeios regulares ao jardim botânico e ao zoológico de Paris, que serviam como inspiração para compo-sição de suas pinturas, sempre repletas de plantas e folhagens abundantes que construíam uma espécie de selva fictícia.

Embora Rousseau só tenha recebido algum reconheci-mento no fim da vida, sempre circulou entre a vanguarda parisiense do final do século XIX e início do século XX, tendo entre seus conhecidos, artistas como Guillaume Apollinaire, Pablo Picasso, Gauguin, Mallarmé e Robert Delaunay.

A exposição Rio Naif traz doze artistas que retratam e vi-vem a cidade do Rio de Janeiro em sua beleza e dinâmica. Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando através da arte, todo o carinho e admiração pelos seus 450 anos.

A arte naif pode ser compreendida como uma manifes-tação estética específica que dialoga diretamente com o universo simbólico da arte popular. Contudo, no âmbito das conceituações antropológicas, possui algumas características ambíguas que a torna uma categoria distinta, à parte.

Na terminologia francesa, naif significa ingênuo por natu-reza, simples por inexperiência, bem como carrega também o sentido de credulidade e candura excessivas. Provém do latim nativus, significando natural, tendo como sinônimos a inocên-cia e a pureza. Embora sua forma feminina seja naive, no Brasil consagrou-se o uso no masculino para designar os dois gêne-ros, sendo usado apenas para se referir ao estilo.

O termo ingressa gradualmente no campo artístico a partir do final do século XIX, como um qualificativo para aqueles que utilizam a pintura como uma forma de expressão, sem no en-tanto, terem passado por uma formação erudita. Nesse período, o naif enquanto adjetivo dizia respeito tanto ao artista, que era entendido como dotado de um olhar ingênuo, crédulo, quanto à obra, caracterizada por não obedecer aos cânones estéticos do “mundo da arte”1 ao mesmo tempo em que expressava plastica-mente a ingenuidade e a espontaneidade do autor.

A primeira alusão que temos da categoria remete direta-mente ao francês Henri Rousseau (1844-1910), que era fiscal

RIO NAIF

Valéria Aquino

1. A noção de “mundo da arte” compreende uma organização social, onde uma

rede de pessoas coopera na produção de uma forma artística ao mesmo tempo

em que concebe e formula representações a respeito do que é considerado como

arte e busca caminhos para sua legitimação. A arte é, portanto, entendida como

um produto social, fruto de redes de relações de pessoas que atuam em conjunto

e desenvolve um quadro de referência que envolve diferentes formas de ação

coletiva, mediadas por convenções e representações já aceitas ou recentemente

desenvolvidas e sempre negociadas (Becker, 1977; 2010).

MOTO RIO Juareis Mendes acrílico sobre tela 40 cm x 40 cm 2015

Page 5: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

8 9

ISTO É RIO DE JANEIROErmelinda de Almeidaacrílico sobre tela 50 cm x 40 cm2015

A arte naif é também denominada como arte ingênua, arte espontânea ou arte primitiva. Embora tais nomenclaturas não sejam capazes de qualificar integralmente essa manifestação da cultura visual, entendê-las ao menos nos permite descorti-nar um universo permeado de significados que se encontram muitas vezes deslocados temporalmente, mas que apesar dis-so, influem diretamente na atribuição de valor quando nos de-paramos com as respectivas obras e artistas.

O surgimento do estilo, em meados do século XIX, na Europa, ocorre em diálogo com grandes mudanças econômicas, políticas, sociais, culturais e artísticas que foram se intensificando principal-mente a partir do século XVI. No campo da cultura, por exemplo, podemos identificar amplo interesse pelas sociedades considera-das primitivas, consideradas naquele momento como represen-tativas de um primeiro estágio do desenvolvimento da cultura ocidental, em uma perspectiva claramente evolucionista.

Enquanto categoria artística pode ser compreendida como expressiva de uma visão que o mundo da arte possuía por um lado, sobre uma determinada produção estética e por outro, sobre seu produtor. Ambos, produtor e produção, eram inter-pretados ainda no século XIX, pela perspectiva do primitivismo, entendido como “uma complexa rede de interesses (isto é, “dis-cursos”) sociológicos, ideológicos, estéticos, científicos, antro-pológicos, políticos e legais que são introduzidos numa cultura e a determinam”. (Perry, 1998, p. 04).

Em linhas gerais, o “primitivo” era “visto como livre dos grilhões que aprisionavam o homem civilizado e capaz de

DO NAIF À CONSTRUÇÃO

DE UM ESTILO ARTÍSTICO

expressar seus impulsos instintivos diretamente na arte” (Firth apud Prince, 2000, p. 56). Tal aspecto seja na arte ou na cultura, está diretamente relacionado às perspectivas evolucionistas de interpretação do mundo que classificavam a humanidade como pertencente aos diferentes estágios, onde o “primitivo” seria o primeiro e o “civilizado”, o último.

Dessa forma, no que diz respeito ao caráter “primitivo” as-sociado à arte, buscou-se construir uma conotação positiva correlacionando-o à ideia de espontaneidade, pureza incons-ciente, inocência e liberdade expressiva em oposição aos câ-nones acadêmicos, vistos como as amarras que moldavam o trabalho do artista “civilizado”.

Por outro lado, essa perspectiva foi responsável por co-locar todas as manifestações que compartilhavam dessa semântica, em um lugar hierarquicamente desvalorizado, visto que passaram a ser interpretadas como manifestações “menos evoluídas”, “atrasadas”, “incivilizadas” (Cf. Goldstein, 2008; Perry, 1998). Trata-se de uma formulação que oscila entre um valor pejorativo e outro positivo, ambos estereo-tipados, que expressam acima de tudo uma relação e uma subordinação. (Andriolo, 2006).

A nomenclatura capaz de contextualizar o momento histó-rico e cultural do surgimento da arte naif e que dialoga direta-mente com a conotação evolucionista é a de “primitivos mo-dernos”, ou “neo-primitivos”, também utilizadas para se referir aos artistas naifs (Klintowitz, 1985). Tratava-se da imagem do outro, baseada na ideia de “pureza” da “vida primitiva”,

Page 6: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

10 11

associando as sociedades simples aos “pensamentos e ex-pressões mais puros” (Perry, 1998, p. 06). Nota-se que todas elas (arte ingênua, primitiva, espontânea) presumem a existência, por oposição, de uma arte produzida de forma “consciente”, “não-ingênua” e porque não dizer, “civilizada”. Esse contexto irá marcar e direcionar a recepção e percepção dessa produção e de seu produtor no mundo da arte.

Apesar dessas especificidades, o reconhecimento de artistas naifs passa a constituir um mercado, ou seja, um domínio de interesse. (Waldeck, 2010). Segundo Perry (1998) o termo passa a ser utilizado por críticos de arte tanto de forma pejorativa, quanto como uma maneira de destacar a qualidade inovadora da obra.

A revolução estética iniciada no início do século XX com as van-guardas modernistas, principalmente pelo surrealismo e cubismo, que rompe com as regras renascentistas, tem como uma de suas características a utilização de elementos associados à pintura naif, como por exemplo, o uso arbitrário da cor, a bidimensionalidade e a desproporção. Foram pintores como Miró, Chagall e Klee, que de alguma maneira integraram a respectiva linguagem à corrente da arte moderna. Ao mesmo tempo, artistas como Paul Gauguin, Pablo Picasso e Robert Delaunay, se posicionaram de forma re-ceptiva diante do que percebiam como expressão da liberdade, dotada de força criadora espontânea justamente por não obede-cer aos cânones acadêmicos. (Waldeck, 2010).

No Brasil, o estilo começa a ganhar evidência a partir da década de 1920, influenciado em certa medida pelo movi-mento modernista brasileiro, que buscava uma arte com iden-tificação cultural e desvinculada de influências européias. Mas é apenas a partir de 1940, que os naifs começaram a ganhar maior projeção. Flávio de Aquino aponta que:

As solicitações sensoriais criadas por um país tropical e por seu folclore, ligadas à liberdade gerada pela arte moderna, fize-

ram surgir nos campos e nas cidades milhares de ingênuos – a maioria sem qualquer expressão. Sobram poucos, uns trinta, cujas qualidades vão além do simples colorismo bruto e das in-correções anatômicas para chegarem à arte propriamente dita. (Aquino, 1978, p. 15).

Entre os artistas em destaque estão: Heitor dos Prazeres (1898-1966), José Bernardo Cardoso Jr., “Cardosinho” (1861-1947), Chico da Silva (1910-1985), Maria Auxiliadora (1935-1974), Anto-nio Poteiro (1925-2010) e Waldomiro de Deus.

Embora no campo da arte naif a pintura tenha grande destaque, o estilo abrange também esculturas, trabalhos em cerâmica, tapeçaria, bricolage, entre outras manifestações. Howard Becker (2010) ao tratar do quesito diversidade de lin-guagens, ressalta que existem tipos de obras que são:

(..) mais difíceis de descrever, precisamente porque é impos-

sível reportá-las a critérios em vigor fora do mundo estritamente pessoal de seu autor. Este trabalha sozinho. (...) Tem a liberdade de ignorar as habituais classificações, encontra-se livre de fazer coisas que não correspondam a nenhum género inventariado e que não sejam representativas de nenhuma categoria. As obras existem, e é tudo. A única forma de as descrever consiste em enu-merar as suas particularidades. (Becker, 2010, p. 220)2 .

Atualmente, entendemos que a categoria abrange uma variedade de produções, cada uma com suas especificidades, formas, gêneros, temáticas e técnicas, nos levando a relativizar os critérios outrora utilizados nessa classificação.

Assim, não se pode mais afirmar a existência de princípios rígidos capazes de definir de forma sucinta o que é a arte naif hoje. Talvez o único consenso ainda seja aquele apontado por Becker, ao afirmar que “os artistas naifs elaboram um estilo

eminentemente pessoal e criam formas e gêneros inéditos, porque não adquiriram os hábitos de pensamento que os ar-tistas profissionais interiorizaram automaticamente durante a formação”. (Becker, 2010, p. 224).

Mas trata-se, no entanto, de uma distinção inicial que indi-ca apenas o contexto de surgimento do artista e obra, ambos desvinculados e despreocupados com as regras formais aca-dêmicas. O que não significa dizer que estes nunca poderão passar por algum tipo de aprendizado acadêmico, sob o risco de serem desqualificados como naifs. O estudo acadêmico, re-lativamente democratizado, se comparado ao início do século XX, é atualmente compreendido como uma das formas de co-nhecimento e por isso mesmo, uma possibilidade de saber em meio a diversos outros.

Nesse sentido, podemos considerar a arte naif como um estilo artístico não formalizado, tendo como característica a grande diversidade e liberdade plástica, sem o compromisso com as estéticas legitimadas pelo mundo da arte. É justamen-te esta postura descompromissada com os cânones, que pos-sibilita o vasto coeficiente de liberdade criativa.

OUTEIRO DA GLÓRIANoeli Rocha

óleo sobre tela 30 cm x 50 cm

2015

2. Cf. Catálagos da Bienal Naif do Brasil.

Page 7: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

12 13

balhos mais representativos destaca-se uma série sobre fu-tebol, onde transparece uma preferência temática que não é apenas pessoal, mas familiar. Assim como muitos artistas que iniciaram a produção livre de direcionamentos formais, com o passar do tempo sente a necessidade de aprimorar os conhecimentos técnicos, o que a motivou a realizar cur-sos e oficinas de pintura, ao mesmo tempo em que possibi-litou uma expansão do campo temático. (Costa, 1999).

Berenice Barreto, ou Berenic, é cearense da cidade do Crato. Chegou ao Rio de Janeiro em 1981, já trazendo na ba-gagem a experiência de artista naif. Autodidata, realiza expo-sições desde 1977. Nos últimos anos tem explorado a temática da cultura indígena e da diversidade amazônica onde fica ex-plícito o cuidado e estudo aplicado ao uso das cores. Com uma expressividade criativa e pictórica únicas, sempre lançando mão de flores e folhagens, a artista consegue criar paisagens exuberantes e harmônicas ao retratar a cidade do Rio de Janei-ro. Alguns elementos de suas obras nos remetem às florestas fantásticas de Henri Rousseau, reafirmando o estilo naif.

Nascido em 1966, no bairro de Marechal Hermes, Rio de Ja-neiro, Dalvan Silva, teve o primeiro contato com a pintura e a escultura a partir de amigos. Mas foi apenas quando conheceu a Arte Naif, por intermédio de Lucien Finkelstein, fundador do Museu Internacional de Arte Naif do Brasil, para quem seu pai trabalhava na fabricação de porta-joias, que Dalvan despertou o real interesse pela pintura, vendo nesse estilo uma motiva-ção para iniciar a produção artística. Com o tempo, conquistou seu merecido espaço, participando de inúmeras exposições nacionais e internacionais. Nos últimos anos, Dalvan tem tam-bém experimentado o diálogo com o cinema, produzindo ro-teiros e dirigindo produções.

OS ARTISTAS

A carioca Ana Camelo teve seu primeiro contato com a pintura ainda na adolescência por intermédio de uma profes-sora de artes no colégio em que estudava. Apesar do gosto pelas artes ter se manifestado tão cedo, a vida de Ana tomou outro rumo e ela se tornou professora de matemática. Ape-nas aos 51 anos de idade a artista retomou a prática com as telas e pincéis. Algo que marca uma nova fase da vida, pois passa a produzir intensamente obras que materializam sua memória, momentos vividos, coisas e lugares conhecidos. Em entrevista a Janine Ojeda, Ana Camelo define a forma como encara sua produção: “apesar de não ter muita noção do que eu estava realizando e saber que o meu trabalho fu-gia das tão estudadas aulas de perspectiva e cálculos mate-máticos, a minha intuição dizia que eu tinha justamente que fugir da proporção e da exatidão já tão conhecidas na minha vida. Na verdade, era o momento da criação que se transfor-mava num momento de sonho, sempre com uma ideia em mente: “pintar e expressar”.

A artista Bárbara Deister é carioca, nascida no Rio Com-prido. Sua produção possui referências predominantemen-te urbanas, fruto tanto de suas vivências individuais e cole-tivas, quanto de seu imaginário. Muitos trabalhos remetem a cenas e lugares cotidianos, mas podem também ter como inspiração livros, filmes, jornais e revistas, explicitando a li-gação direta entre obra e vida. Bárbara inicia seu trabalho artístico por intermédio do irmão, que na década de 1980 adquiria também as primeiras noções de pintura. Começa pintando cartões natalinos, mas só após adquirir domínio das cores e formas, adota a tela como suporte. Entre os tra-

A exposição tem como proposta trazer um pouco da diversi-dade de produções e trajetórias pessoais que abarcam o mundo naif. Tendo como tema as comemorações dos 450 anos do Rio de Janeiro, a mostra reúne artistas que falam não apenas da cidade, mas também da relação que estes estabelecem com o espaço, construindo identidades tanto urbanas como individuais.

Todos os participantes são cariocas, seja de nascimento, ou de coração, posto que o Rio surge não apenas como local de morada, mas como fonte de inspiração para o trabalho e para e vida. Tal fato demonstra a capacidade aglutinadora da cida-de, que ao agregar um pouquinho de cada parte do país, se faz única e maravilhosa.

Entre os artistas estão Alexandre Rosalino, que nascido em Belo Horizonte, traz em suas obras grande diversidade de referências regionais e populares. Iniciou o trabalho de-senhando e pintando histórias da própria família, que eram transmitidas oralmente pelo pai. Ao dar forma à elas, cria um registro pictórico que se expande acompanhando o percur-so da vida cotidiana do seu criador. Assim, sua obra pode ser entendida como uma das formas utilizadas no processo de compreensão da própria realidade, pois, ao mesmo tempo em que se expressa, sofre intervenção, uma vez que esta é modificada no momento em que o trabalho ganha visibilida-de. Pode-se dizer que A. Rosalino é um artista que transita em diversos âmbitos do mundo da arte e tal movimentação se dá propositalmente. Com o objetivo de aprimorar seu trabalho, o artista buscou também uma formação acadêmica em artes plásticas, que possibilitou o desenvolvimento ainda maior da linguagem naif. (Baía, 1999).

Ermelinda de Almeida nasceu em Fortaleza. Antes de che-gar ao Rio de Janeiro aos 17 anos de idade, morou por três anos em São Paulo. Sem boas lembranças da vida no Ceará, trouxe na bagagem a habilidade como costureira, atividade desempe-nhada durante grande parte da vida. O primeiro contato com a pintura se deu em 1994, aos 47 anos de idade. Incentivada por uma amiga, durante um momento de dificuldades e desilusões, Ermelinda começou a frequentar aulas de pintura com o profes-sor Tancredo Araújo, no Sesc. Aquilo que começava como uma espécie de passa tempo ou terapia provocou uma reviravolta em sua vida. A partir de então, a “Ermelinda artista” se constituiu. Seu trabalho aborda diversos temas ligados às festividades po-pulares, e, parte de sua produção é voltada para a composição de santos. Geralmente feitos sob encomenda, embora deman-dem grande estudo iconográfico, não deixam de carregar ele-mentos que marcam a produção da artista. Além do fundo azul, predominante em muitos trabalhos, o apreço pelos detalhes multicoloridos e a utilização de cores puras se tornaram referên-cias estilísticas recorrentes em seus trabalhos. (Waldeck, 2010).

Juareis Mendes, natural do Maranhão, chegou ao Rio de Ja-neiro em 1945, começando a desenhar apenas em 1979. Com de-senhos que tem como ponto de partida números e letras, iniciou o trabalho artístico com uma proposta pedagógica de alfabetiza-ção. Com o tempo as composições ganharam histórias e músicas, passando a ser classificadas pelo próprio artista como uma técni-ca de “desenho cantado”. Para além do caráter pedagógico, a obra de Juareis, que brinca com símbolos morfográficos, é dotada de uma plasticidade e criatividade únicas, que condensam um olhar inventivo e original sobre a própria realidade. (Lima, 1986).

Helena Rodrigues chegou ao Rio de Janeiro com um ano de idade. Nascida em Salvador, em 1947, é baiana apenas

Page 8: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

14 15

nos registros. Cresceu em uma família que apreciava artes, frequentou a Escola Nacional de Música por vários anos, mas assim como a mãe e o irmão, desenvolveu o gosto pela pintura. Embora Helena Rodrigues tenha feito da música sua área profis-sional, a artista também atua como musicoterapeuta, além de ter sido professora de piano e flauta. Com incentivo do irmão, que é artista plástico e museólogo, Helena começou a expor seus trabalhos com ótima recepção tanto no Brasil quanto no exterior. Com temas que vão desde o cotidiano e espaços da cidade do Rio de Janeiro às festividades populares, a artista faz da arte sua companheira. “Nunca estou sozinha e ao mesmo tempo livre. Pinto o que quero a qualquer hora”.

Lourdes Ferraz, nascida em Recife, veio jovem para o Rio de Janeiro. Seu primeiro contato com a pintura se deu colorin-do fotografias feitas pelo pai, que era retratista. Mas este foi apenas o primeiro estímulo. No Rio de Janeiro, Lourdes adquiriu telas, tintas e pincéis e passou a dar forma e cor às suas memó-rias de maneira livre, com destaque para vivências na cultura popular e para as paisagens da cidade.

No caso específico de Luiz Silveira, pode-se afirmar que se trata de um dos representantes da escultura naif. Nascido no Rio de Janeiro, iniciou o trabalho artístico em 2008. A motivação foi uma réplica do bonde de Santa Teresa que havia ganhado, decidindo colocá-lo em movimento. Com o objetivo cumprido, resolveu construir também os Arcos da Lapa, depois as ruas, posteriormente toda a paisagem, não apenas da região boê-mia, como também, toda a cidade. O artista, que curiosamen-te ainda trabalha como mecânico, possui grande habilidade manual, denotando sua criatividade artesanal. Todas as obras produzidas, além de possuírem história que as contextualizam no ambiente urbano, vêm passando por modificações sensí-

veis nos últimos anos. De acordo com ele, trata-se do impacto das reformas urbanas que a cidade do Rio de Janeiro tem passado, logo, se a cidade muda, as obras acompanham essa dinâmica. Como um talentoso bricoleur, Luiz materializa seu amor declara-do pela cidade ao vivê-la e reinventá-la no seu cotidiano.

Noeli Rocha, moradora de Mesquita, começou a pintar de forma totalmente autodidata, sua única preocupação, como ela mesma diz, era se expressar. Com incentivo do falecido ma-rido começou a produzir telas onde retrata festividades e dan-ças da cultura popular brasileira, mas também memórias fami-liares, histórias que cresceu ouvindo dos pais e avós, além do próprio cotidiano. É com essa atitude, de quem quer expressar pelo pincel o modo de ver e interpretar o Rio de Janeiro, que a artista nos traz o seu olhar sobre a cidade.

Sinésio Brandão é baiano, nascido em Salvador, em 1935. Chegou ao Rio de Janeiro em 1950. Aos 15 anos iniciou o trabalho como pintor de cenários das emissoras de televisão, onde apren-deu as primeiras noções de pintura e desenho. Foi no ambiente televisivo, onde permaneceu por aproximadamente seis anos, que Sinésio inicia sua produção artística. Na década de 1970, pas-sa a se dedicar exclusivamente à pintura, adotando desde o iní-cio as favelas cariocas como uma de suas principais temáticas. As telas são dotadas de colorido intenso, representando tanto uma sociabilidade que alude às favelas do início do século XX, quan-to o trabalho e cotidiano das classes populares. Trata-se de um olhar que condensa a memória de uma realidade experimentada. Embora possuam uma expressão afetuosa em função do uso das cores, na tentativa de embelezar aquela representação, as obras trazem à tona a dura realidade da vida nas favelas. “Tinha a vonta-de de tornar a pobreza uma coisa linda de se ver, então comecei a colorir os barracos, de todas as cores”. (Costa, 2002, p. 11).

Sinésio, à medida que conquistava espaço e reconhecimen-to nas galerias, foi desenvolvendo técnicas a partir de cursos de pintura, o que possibilitou expandir seu campo de expressão, seja a partir do uso da perspectiva ou do conhecimento de no-vos materiais e matérias primas.

Valéria AquinoProfessora Adjunta do Instituto de Artes e

Coordenadora do Núcleo de Cultura Popular

BIBLIOGRAFIA

ANDRIOLO, Arley. A questão da alteridade no “primitivismo artístico”.II Encontro de História da Arte, IFCH-Unicamp. Campinas, SP, 2006. AQUINO, Flávio de. Aspectos da pintura primitiva brasileira.Rio de Janeiro: Editora Spala,1978. BAÍA, César. Imagens universais de A. Rosalino.Rio de Janeiro: Funarte, CNFCP, 1999. BECKER, Howard. Mundos da Arte.Lisboa: Livros Horizonte, 2010. BECKER, Howard. Uma teoria da ação coletiva.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977. COSTA, Carla. Favelas: pinturas de Sinésio Brandão.Rio de Janeiro: Funarte, CNFCP 2002. GOLDSTEIN, Ilana. Reflexões sobre a arte “primitiva”: o caso do Musée Branly.Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 14, n. 29, p.279-314, jan./jun. 2008. KLINTOWITZ, Jacob. Arte ingênua brasileira.São Paulo: Banco Cidade de São Paulo, 1985. LIMA, Ricardo. Inúmeros: desenhos e pinturas de Juareis Mendes.Pesquisa e texto de Ricardo Lima. Rio de Janeiro: Fundação Nacional de Arte, 1986. LIRISMO: pinturas de Bárbara Deister. Pesquisa e texto de Carla Costa.Rio de Janeiro: Funarte, CNFCP, 1999. PERRY, Gill. O Primitivismo e o Moderno. In: HARRISON, C.; FRASCINA, F.; PERRY, G.Primitivismo, Cubismo, Abstração: começo do século XX. São Paulo: Cosac &Naif, 1998. PRINCE, Sally. Arte primitiva em centros civilizados.Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2000. WALDECK, Guacira. Pinturas de Ermelinda. Pesquisa e texto de Guacira Waldeck.Rio de Janeiro: IPHAN, CNFPC, 2010.

CARNAVALBárbara Deister óleo sobre tela 24 cm x 30 cm 2015

Page 9: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

16 17

BORBOLETAS NA LAGOAacrílico sobre tela 40 cm x 100 cm2015

Alexandre

Rosalino

Page 10: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

18 19

Ana Camelo Bárbara Deister

QUATRO CANTOSacrílico sobre tela 100 cm x 100 cm2012

RIOóleo sobre tela 35 cm x 27 cm2015

18

Page 11: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

20 21

Berenice Barreto Dalvan Silva

REGATA DE VERÃOacrílico sobre tela 50 cm x 70 cm2008

VISTA DE BOTAFOGOacrílico sobre eucatex40 cm x 60 cm2002

21

Page 12: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

22 23

Ermelinda de Almeida Juareis Mendes

O CRISTO REDENTORacrílico sobre tela 41 cm x 33 cm2012

CARNAVALacrílico sobre tela 40 cm x 40 cm2015

23

Page 13: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

24 25

Lourdes FerrazHelena Rodriguez

LAPA FERVENDOacrílico sobre tela 90 cm x 70 cm2007

CARNAVAL NA PRAIAóleo sobre tela 70 cm x 50 cm2003

24

Page 14: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

26 27

Luiz Silveira

ROCINHAmaquete de sucata 230 cm x 110 cm2012

26

Page 15: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

28 29

Sinésio BrandãoNoeli Rocha

LAPA ROMÂNTICAóleo sobre tela 46 cm x 38 cm2015

29

COISAS DO RIO DE JANEIROtécnica mista80 cm x 102 cm2007

Page 16: Alexandre Rosalino Ana Camelo Bárbara Deister Berenice ... · Vindos de diferentes regiões do Brasil, fizeram da metrópole carioca local de moradia e inspiração, expressando

ReitorRicardo Vieiralves de Castro

Vice-ReitorPaulo Roberto Volpato Dias

Sub-Reitora de Extensão e CulturaRegina Lúcia Monteiro Henriques

Diretor do Departamento CulturalRicardo Gomes Lima

Coordenadora de ExposiçõesCáscia Frade

Comunicação SocialJoyce SouzaJulianna PaesRosana Rocha

Projeto GráficoAlexandre MachadoAna Cristina Almeida

Revisão de TextoRosana Rocha

Organização e Projeto ExpositivoCarolina GuarilhaChristian PancioneLeandro AlmeidaRejane ManhãesRoberto Reis

BolsistasCaroline RangelJéssica BarretoLetícia MoraesLuan FernandesLucas Bentin Mariana PereiraMarina MendesOlívia da SilvaRicardo Fonseca

Equipe Técnico-AdministrativaAndré CarvalhoHeloísa BarbozaRenato Cascardo

CuradoriaValéria Aquino

FotografiasMario Tadeu da Conceição

Realização Impressão

AgradecimentosCentro Nacional de Folclore e Cultura Popular / IPHAN / MinC

Alexandre Rosalino

Ana Camelo

Bárbara Deister

Berenice Barreto

Dalvan Silva

Ermelinda de Almeida

Juareis Mendes

Helena Rodriguez

Lourdes Ferraz

Luiz Silveira

Noeli Rocha

Sinésio Brandão