Guia Teorico e Pratico de Medidas Socioeducativas ILANUD
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GUIA TERICO E PRTICO DE MEDIDAS
SOCIOEDUCATIVAS
ILANUD - Instituto Latino Americano das Naes Unidas para Preveno do Delito
e Tratamento do Delinquente - Brasil
UNICEF - Fundo das Naes Unidas para a Infncia
2004
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2
GUIA TERICO E PRTICO DE MEDIDAS
SOCIOEDUCATIVAS
CRDITOS
Coordenao e Organizao
Karyna Batista Sposato
Pesquisadores
Aline Yamamoto
Laura Davis Mattar
Raquel Lordello Coimbra
Joo Pedro Pereira Brando
Assistentes de Pesquisa
Fabio Vicente Vetritti Filho
Thiago Monteiro Pereira
Otvio Dias de Souza Ferreira
Tamara Amoroso Gonalves
Colaboraram na Pesquisa
Juliana Cardoso Benedito
Leonardo Cavalini
Diagramao
Erika Alessandra B. Waldmann
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SUMRIO Apresentao 5 PARTE 1 - POLTICA DE EXECUO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS 10
1.1. A POLTICA DE ATENDIMENTO AO ADOLESCENTE 10
1.2. ORIENTAES GERAIS PARA AS POLTICAS SOCIOEDUCATIVAS 14
1.2.1. Municipalizao e Descentralizao Poltico-administrativa 15
1.2.2. Conselhos e Fundos de Direitos da Criana e do Adolescente 23
1.2.3. Integrao Operacional 26
1.2.4. Participao e Controle Social 28
1.3. TEMAS EMERGENTES 32
1.3.1. Incompletude Institucional 33
1.3.2. Plano Individualizado de Atendimento 34
1.3.3. Progressividade e Regimes das Medidas Socioeducativas 37
1.3.4. Sade Mental e Medidas Socioeducativas 42
1.3.4.1. Os profissionais 44
1.3.4.2. A medida protetiva de tratamento 49
1.3.4.3. A famlia 50
1.3.4.4. A formulao das polticas pblicas e a fiscalizao de sua execuo 51
1.4. POLTICA ESTADUAL 53
1.4.1. Princpios Gerais 53
1.4.2. Princpios Especficos 55
1.4.3. Medidas em Regime Fechado 57
1.4.3.1. Internao 58
1.4.3.1.1. Atividades Externas 62
1.4.3.1.2. Gesto Compartilhada, Participao Social e Controle Externo 67
1.4.3.1.3. Estrutura Fsica da Unidade de Internao 71
1.4.3.1.4. Sanes Disciplinares 78
1.4.3.1.5. Direitos Sexuais 86
1.4.3.1.6. Direitos Reprodutivos 91
1.4.3.1.7. Tratamento especfico aos Portadores de Distrbios Mentais e aos Dependentes 94
Qumicos
1.4.3.1.8. Atendimento a Egressos 99
1.4.3.1.9. Internao Provisria 106
1.4.3.2. Semiliberdade 107
-
4
1.4.3.2.1. Internao e Semiliberdade: Semelhanas e Diferenas 110
1.4.3.2.2. A classificao da semiliberdade como regime e o sistema de Substituio de 114
Medidas do ECA
1.4.3.2.3. Parmetros na Execuo da Medida 117
1.4.3.2.4. Estrutura Fsica da Casa de Semiliberdade 121
1.4.3.2.5. Falta de Operacionalizao da Medida 123
1.5. POLTICA MUNICIPAL 124
1.5.1. Princpios Gerais 125
1.5.2. Princpios Especficos 126
1.5.3. Medidas em Meio Aberto 128
1.5.3.1. Liberdade Assistida 131
1.5.3.1.1. Atendimento Indidvidual, em Grupo e Familiar e o Papel do Orientador 133
1.5.3.1.2. Escolarizao 140
1.5.3.1.3. Insero no Mercado de Trabalho e Profissionalizao 143
1.5.3.1.4. Acompanhamento Familiar 147
1.5.3.1.5. Convivncia Social e Comunitria 151
1.5.3.2. Prestao de Servios Comunidade 155
1.5.3.2.1. O Papel do Orientador 163
1.5.3.2.2. Contribuio para Profissionalizao 165
1.5.3.2.3. Benefcio para a Comunidade e para o Adolescente 166
1.6. Medidas sem regime 167
1.6.1. Advertncia 168
1.6.2. Obrigao de Reparar o Dano 172
1.6.2.1. A mediao como estmulo para a aplicao da medida de reparao do dano 177
PARTE 2 MAPEAMENTO DOS ESTADOS E REGIES
2.1. APRESENTAO 180
2.2. Descrio dos Estados 181
2.3. Quadro sobre Internao e Semiliberdade 238
PARTE 3 PROJETOS E EXPERINCIAS IDENTIFICADOS 240
PARTE 4 NDICE
4.1. ndice Remissivo 259
4.2. Bibliografia 264
PARTE 5 ANEXOS (somente em arquivo digital)
5.1. Resolues
5.2. Legislao
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5
APRESENTAO
O GUIA TERICO E PRTICO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ambiciona ser uma contribuio consolidao de novos paradigmas de ao no mbito das polticas
pblicas estaduais e municipais de execuo de medidas destinadas a
adolescentes em conflito com a lei.
Nesta direo, o Guia organiza-se em cinco (05) partes. A primeira parte
corresponde a mais terica sem, contudo, deixar de apresentar experincias
concretas de execuo de medidas socioeducativas. Ao discutir poltica de
execuo de medidas socioeducativas, trata-se, conseqentemente, da
distribuio de competncias e dos papis de cada ente poltico. Sabe-se que a
organizao das polticas voltadas infncia e juventude norteada por
princpios, que incidem tambm sobre os programas socioeducativos. Falamos de
municipalizao, descentralizao, integrao operacional, dentre outros aspectos
que devem ser observados na operacionalizao das polticas socioeducativas.
Abordamos ainda temas emergentes que, no nosso entendimento tm sido
negligenciados pela execuo das medidas socioeducativas. Questes relativas
integrao das polticas setoriais aos programas socioeducativos, a elaborao de
planos individualizados de atendimento e a ateno s necessidades de sade
dos jovens so aspectos que no podem deixar de ser contemplados na
formulao de novos parmetros.
A discusso sobre cada modalidade de medida socioeducativa tambm adquire
especial importncia nesta primeira parte, tendo em vista que suas especificidades
quanto aos regimes de execuo, durao e finalidades refletem na delimitao de
seus programas, e mais do que isso na identificao dos responsveis.
Procuramos discutir cada medida socioeducativa a partir de exigncias prticas,
ou seja, atravs da escolha de critrios previamente definidos. A
operacionalizao dos programas socioeducativos requer uma anlise mais
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emprica do que terica, sem perder de vista, claro, elementos conceituais, que
como vimos, alteram significativamente a execuo dos programas.
Deste modo, selecionamos alguns critrios para cada modalidade de medida
socioeducativa, que no nosso entender so fundamentais para o alcance de suas
finalidades. Em seguida buscamos identificar em programas j existentes pelo
pas a aplicao prtica do critrio escolhido. Esta metodologia de anlise
permitiu-nos aferir a exeqibilidade ou no das diretrizes socioeducativas
recomendadas. A correspondncia entre os critrios elencados e a experincia
observada indica que, no caso concreto, um aspecto positivo pde ser
identificado. importante sublinhar que as experincias mencionadas neste Guia
preenchem um ou mais requisitos, mas no podem ser consideradas experincias
positivas e exemplares em sua plenitude. Muitas delas, sabidamente possuem
falhas e problemas de execuo, mas puderam ser destacadas ao menos pela
observncia de um dos critrios que elegemos. Outra observao importante
refere-se ao fato de que muitas delas no foram visitadas pessoalmente por
pesquisadores do Instituto. A maior parte das informaes obtidas foram resultado
de pesquisas na Internet e da informao institucional que recebemos via correio.
Com relao medida de internao, pinamos experincias que se destacam
quanto incompletude institucional (levando-se em conta especialmente a
utilizao de recursos comunitrios e de polticas inter-setoriais, a realizao de
atividades externas, a existncia de mecanismos de participao da sociedade
civil na gesto, e de instrumentos de controle externo). A estrutura das unidades
de internao tambm foi eleita como critrio juntamente com a questo da
disciplina. Sobre este aspecto estivemos interessados em identificar unidades com
regras claras e previamente conhecidas pelos adolescentes, evitando-se assim
arbitrariedades e a imposio de sanes disciplinares que afrontem a legalidade.
Por fim, a existncia de programas de atendimento a egressos da internao e
aspectos relacionados sade dos jovens internados tambm foram objeto de
discusso dos programas socioeducativos de privao de liberdade. A ateno s
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7
necessidades especiais de sade dos jovens um tema de extrema atualidade
seja em razo da condio peculiar de desenvolvimento dos internados, onde se
destaca o sadio desenvolvimento da sexualidade, seja porque questes como a
presena de distrbios mentais e drogadio so bastante recorrentes, exigindo
que a poltica socioeducativa esteja efetivamente integrada s demais polticas
dirigidas juventude.
Para a medida de semiliberdade, reunimos experincias que se destacam pela
utilizao de mecanismos de co-gesto e tambm pela estrutura fsica da casa de
semiliberdade. Infelizmente ela dentre as medidas socioeducativas a de menor
implementao e a que menos possui uma construo terica e doutrinria. Alm
de pouca definio legal no Estatuto da Criana e do Adolescente, a medida
encontra ainda outros entraves para sua efetiva operacionalizao. Distores nos
programas de execuo fazem da medida de semiliberdade um arremedo da
internao ou at mesmo da medida protetiva de abrigo, nos casos de
adolescentes sem qualquer respaldo familiar ou comunitrio. Como podemos
observar no mapeamento por estados (na segunda parte do Guia) numericamente
a semiliberdade pouco utilizada, sendo que em determinados estados da
federao sequer considerada como uma via socioeducativa.
J com relao medida de liberdade assistida, elegemos como critrios a
qualidade das atividades oferecidas nos diferentes programas, sempre tendo em
vista a escolarizao e a profissionalizao como seus eixos bsicos.
Especificidades relativas ao atendimento tambm devem ser consideradas para a
organizao dos programas socioeducativos de liberdade assistida que no
podem excluir os atendimentos individuais, em grupo e familiares. O papel do
orientador, sua capacitao tcnica e seu vnculo com o programa correspondeu a
outro critrio de anlise.
A Escolarizao e o acompanhamento escolar juntamente com a insero no
mercado de trabalho e a profissionalizao do adolescente em cumprimento da
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medida socioeducativa so os principais objetivos que a liberdade assistida deve
perseguir. Tudo isso sem perder de vista que por se tratar de medida executada
em meio aberto deve valer-se de recursos comunitrios que favoream a
convivncia social e comunitria e a descoberta de novas possibilidades para o
adolescente .
Finalmente, a prestao de servios comunidade, de forma anloga liberdade
assistida, executada em meio aberto, o que implica a organizao de programas
de execuo no mbito dos municpios. Para esta modalidade de medida
socioeducativa foram observados critrios quanto ao papel do orientador, a
verificao do efetivo benefcio trazido comunidade pelo servio prestado, e da
contribuio das atividades desenvolvidas para a profissionalizao do
adolescente. Discute-se tambm a prioridade da participao familiar no programa
socioeducativo e a importncia de no haver a explorao lucrativa do trabalho do
socioeducando.
Por sua vez, as medidas socioeducativas de advertncia e obrigao de reparar o
dano foram abordadas apenas conceitualmente, pois no possuem programas de
execuo.
A segunda parte do Guia traz um mapeamento da execuo das medidas
socioeducativas de acordo com a regio e Estados. Neste item, descrevemos, a
partir de informaes coletadas junto s autoridades estaduais responsveis,
como cada medida vem sendo executada e de que modo. Neste ponto,
importante ressaltar o perodo compreendido entre os meses de setembro de 2003
e fevereiro de 2004, momento no qual foram coletadas tais informaes. O
objetivo central ampliar o conhecimento e a informao sobre as polticas
pblicas de atendimento socioeducativo desenvolvidas no Brasil, especialmente
no que se refere a:
- perfil da Secretaria estadual e rgo responsvel pela execuo das
medidas socioeducativas;
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- nmero e capacidade de unidades de internao e semiliberdade ativas,
para ambos os sexos;
- nmero de adolescentes inseridos em cada uma das medidas
socioeducativas;
- descrio da atuao das Secretarias do Governo envolvidas na execuo
das medidas;
- parcerias com a sociedade civil;
- nvel da municipalizao das medidas em meio aberto;
- existncia de programa(s) de atendimento ao egresso;
- existncia de programa(s) de gerao de renda;
- descrio das diretrizes utilizadas para execuo das medidas.
So apresentados tambm dados sobre a execuo das medidas privativas de
liberdade - internao e semiliberdade - no mbito dos Estados da Federao,
com informaes sobre nmero de adolescentes em cumprimento das respectivas
medidas e capacidade das unidades de internao e casas de semiliberdade.
A terceira parte do GUIA corresponde informao institucional de todos os
projetos e experincias mencionados na ilustrao dos critrios. A idia central
funcionar como um facilitador na identificao de projetos, programas ou
entidades que se destaquem na implementao de quaisquer dos critrios
escolhidos. As experincias so apresentadas tendo por referencial o critrio que
melhor espelharam em sua prtica institucional, bem como divididas conforme a
medida socioeducativa que operam.
A quarta parte do GUIA equivale a um ndice remissivo. Para tanto selecionamos
os temas de maior relevo para a discusso sobre polticas socioeducativas e
procuramos organiz-los de acordo com sua definio e alcance. Mais do que um
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mero ndice, esta ferramenta foi concebida como instrumento que facilite a
correlao dos temas discutidos neste Guia.
Finalmente, organizamos as principais resolues do Conselho Nacional dos
Direitos da Criana e do Adolescente (CONANDA) que versam sobre as medidas
socioeducativas e seus respectivos programas de execuo. E para finalizar esta
etapa, esto presentes tambm trechos da legislao domstica pertinentes ao
tema e os principais documentos internacionais que compem a normativa
internacional dos direitos da criana e do adolescente. Juntamente, a bibliografia
utilizada e citada est organizada na quinta e ltima parte do Guia, e assim como
todo o contedo produzido tem por escopo ampliar o conhecimento, difundi-lo e
consolid-lo.
Boa Consulta!
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PARTE 1 - POLTICA DE EXECUO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
1.1. A POLTICA DE ATENDIMENTO AO ADOLESCENTE
Tratar de medidas socioeducativas implica discutir poltica1. E mais do que isso,
aprofundar acerca do que pode se constituir um conjunto de aes dirigidas
adolescncia, com todas as demandas e especificidades que esta etapa da vida
humana possui.
No entanto, a poltica socioeducativa tem um componente ainda mais especfico e
peculiar, pois corresponde ao conjunto de aes que so realizadas no mbito do
poder pblico a partir da ocorrncia de um acontecimento delituoso, que teve o
adolescente como seu protagonista.
Significa reconhecer que as medidas socioeducativas e seus respectivos
programas de execuo tm incidncia, durao e lugar limitados, no se
estendendo para todo adolescente, nem tampouco por toda a fase da
adolescncia no caso daqueles que infringiram a lei.
Tendo isto como ponto de partida, resta mais claro que a poltica socioeducativa
apenas uma fatia dentre as demais aes polticas voltadas para a juventude em
nosso pas. Sua importncia evidenciada pela sua finalidade e natureza,
tambm limitadas e restritas.
Em outras palavras, discutir poltica socioeducativa significa falar sobre o sistema
de responsabilidade juvenil existente no Direito Brasileiro. No s, refere-se
tambm aos mecanismos de controle social que incidem diretamente sobre os
jovens e, por fim, s aes de cunho preventivo que podem diminuir a
1 O termo poltica foi usado durante sculos para designar obras dedicadas ao estudo daquela esfera de atividades humanas que se refere de algum modo s coisas do Estado, in Poltica. BOBBIO, Norberto. Dicionrio de Poltica. 4 ed. Braslia: Editora Universidade de Braslia, 1992.
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vulnerabilidade de muitos adolescentes ou a excluso social a que esto
expostos.
preciso, portanto, compreender que a medida socioeducativa a resposta
sancionatria do Estado quando o autor de um delito adolescente. Neste
sentido, a medida socioeducativa sano jurdico-penal, que cumpre tal qual a
pena criminal o papel de controle social, procurando evitar a prtica de novos atos
infracionais por adolescentes e ao mesmo tempo diminuir a vulnerabildade do
prprio adolescente infrator ao sistema tradicional de controle2. Isto ocorre por
intermdio dos programas socioeducativos que atravs da oferta de um conjunto
de servios e polticas sociais devem favorecer alternativas de reinsero social.
Fala-se em favorecimento porque as medidas socioeducativas, como dito, no
esgotam as polticas que se destinam aos adolescentes. Ao contrrio, reduzem-se
aos casos de envolvimento com a prtica de delitos.
bem verdade, contudo, que o adolescente infrator corresponde a uma categoria
jurdica delimitada, mas enquanto categoria sociolgica ele nada difere de grande
parte da populao brasileira que tem seus direitos fundamentais violados. Isto
significa que o adolescente enquanto infrator ser alvo de um conjunto de aes
preventivas e inclusivas e, enquanto sujeito de direitos que , ser titular de todas
as polticas pblicas sociais e de proteo, voltadas aos adolescentes em geral.
Este um aspecto fundamental para desenhar uma poltica de atendimento ao
adolescente. Implica compreender que as medidas socioeducativas so
subsidirias s demais polticas previstas no Estatuto da Criana e do
Adolescente. Deve-se sempre ter presente que as polticas pblicas destinadas
infncia e adolescncia podem ser agrupadas em trs segmentos distintos:
2 Sobre o tema dissertao de mestrado O Direito Penal Juvenil no Estatuto da Criana e do Adolescente, p. 106, Karyna Batista Sposato, Faculdade de Direito da USP, 2003.
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1. Polticas Sociais Bsicas, definidas no artigo 4 do ECA (sade,
alimentao, habitao, educao, esporte, lazer, profissionalizao e
cultura);
2. Polticas de Proteo Especial, conforme os artigos 101, 129, 23 -
pargrafo nico e artigo 34 do ECA (orientao, apoio e acompanhamento
temporrios, regresso escolar, apoio scio-familiar e manuteno de
vnculo, necessidades especiais de sade, atendimento a vtimas de maus
tratos, tratamento de drogadio, renda mnima familiar, guarda subsidiada
e abrigo);
3. Polticas Socioeducativas (objeto central deste Guia), descritas a partir do
artigo 112 do Estatuto (Prestao de Servios Comunidade, Liberdade
Assistida, Semiliberdade e Internao) 3.
Desta classificao emerge a concepo de um atendimento integrado e inter-
setorial, sem perder de vista que a poltica socioeducativa tem incidncia restrita e
fragmentria. Somente a combinao das trs modalidades de polticas realiza a
proteo integral em cada caso concreto4.
No campo das medidas socioeducativas e seus respectivos programas de
execuo, cabe observar com preciso os objetivos que se pretende atingir na
direo de prevenir outros atos infracionais e minimizar a excluso e a
estigmatizao. Para que tais objetivos sejam alcanados, torna-se indispensvel
a implementao do chamado Sistema de Garantia de Direitos5, que a
traduo, na prtica, daquilo que recomenda o artigo 86 do Estatuto da Criana e
do Adolescente:
3 As medidas socioeducativas de advertncia e obrigao de reparar o dano no so executadas por intermdio de programas estruturados e por isso no constam neste rol de polticas socioeducativas. 4 A proteo integral pode ser exemplificada pela imposio de medida socioeducativa cumulada com medida de proteo. Nesta hiptese, a finalidade preventiva atingida mediante a resposta estatal adequada, ao mesmo tempo em que as necessidades do jovem so atendidas. 5 O Sistema de Garantia de Direitos apia-se em trs eixos: Promoo, Defesa e Controle Social.
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A poltica de atendimento dos direitos da criana e do adolescente far-
se- atravs de um conjunto articulado de aes governamentais e no-
governamentais, da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municpios..
o que se procura demonstrar a partir da discusso detalhada de cada medida
socioeducativa, de distintas possibilidades de execuo, respeitando-se as
competncias de cada ente poltico e as diretrizes legais da poltica de
atendimento6 . So elas:
1. MUNICIPALIZAO do atendimento;
2. Criao de CONSELHOS Municipais, Estaduais e Nacional dos Direitos da
Criana e do Adolescente, conselhos deliberativos e controladores das
aes em todos os nveis, assegurando a participao popular paritria, por
meio de organizaes representativas, segundo leis federal, estaduais e
municipais;
3. Criao e manuteno de programas especficos7, observando a
DESCENTRALIZAO POLTICO-ADMINISTRATIVA;
4. Manuteno de FUNDOS Nacional, estaduais e municipais vinculados aos
respectivos conselhos dos direitos da criana e do adolescente;
5. INTEGRAO OPERACIONAL de rgos do JUDICIRIO, MINISTRIO
PBLICO, DEFENSORIA, SEGURANA PBLICA E ASSISTNCIA
SOCIAL, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilizao
do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato
infracional;
6. mobilizao da opinio pblica no sentido da indispensvel
PARTICIPAO DOS DIVERSOS SEGMENTOS DA SOCIEDADE.
6 As diretrizes legais constam do artigo 88 do Estatuto da Criana e do Adolescente.
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1.2. ORIENTAES GERAIS PARA AS POLTICAS SOCIOEDUCATIVAS
O Estatuto da Criana e do Adolescente indica como devem se organizar as aes
polticas dirigidas aos jovens. A lei bastante clara ao definir que a poltica deve
ser construda com a participao popular, por meio dos Conselhos
representativos e mediante a utilizao dos Fundos da criana e do adolescente.
As diretrizes legais constantes do artigo 88, do Estatuto, tm natureza poltico-
administrativa, na medida em que so orientaes acerca dos passos que devem
ser adotados pela administrao pblica8 e pela sociedade civil organizada para a
construo do Sistema de Garantia de Direitos.
Embora as polticas socioeducativas, por terem finalidade preventiva e natureza
sancionatria, tenham um lugar limitado no Sistema de Garantia de Direitos, seus
programas devero observar as mesmas regras gerais aplicveis s demais
polticas, alm de outras, especficas aos seus objetivos.
1.2.1. Municipalizao e Descentralizao Poltico-administrativa
A municipalizao do atendimento a primeira diretriz no campo das medidas
socioeducativas. Ela gera efeitos diretos sobre os programas de liberdade
assistida e prestao de servios comunidade9 - medidas no-detentivas que
no implicam a conteno do adolescente -, e efeitos indiretos sobre as demais
medidas socioeducativas.
7 Por programas especficos devemos entender tratar-se dos programas de proteo e programas socioeducativos. 8 Administrao Pblica o conjunto de meios institucionais, materiais, financeiros e humanos preordenados execuo das decises polticas. SILVA, Jos Afonso da. "Curso de Direito Constitucional Positivo". 9 ed. So Paulo: Malheiros, 9 H uma compreenso dominante de que somente as medidas socioeducativas executadas em meio aberto podem ser operacionalizadas na esfera municipal. As demais medidas que se executam em regime fechado so de competncia exclusiva dos Estados, em razo do artigo 125 do Estatuto da Criana e do Adolescente. Este artigo estabelece como DEVER DO ESTADO, o zelo pela INTEGRIDADE FSICA E MENTAL DOS INTERNOS, cabendo-lhes adotar as medidas adequadas de conteno e segurana. Isto significa que, havendo regime de privao de liberdade, ainda que mitigada na semiliberdade, a participao dos Municpios dever ser complementar a uma poltica estruturada no nvel estadual.
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Para elucidar esta equao de fundamental importncia reconhecer que a
municipalizao, enquanto princpio norteador da organizao das polticas de
ateno ao adolescente, exige que todas as aes, sem distino, sejam elas de
cunho social bsico, de proteo especial ou mesmo de natureza socioeducativa,
estejam articuladas no mbito municipal. Esta articulao pressupe a existncia
de uma rede de servios, em que a responsabilidade compartilhada pelos
diferentes entes polticos. H uma definio inicial de competncias exclusivas,
seguida de um rol de competncias concorrentes que no s podem como devem
ser compartilhadas pelos estados, municpios e a Unio.
Deve-se tambm ter presente que a repartio de competncias preconizada pelo
Estatuto da Criana e do Adolescente nada mais do que a transposio das
recomendaes constitucionais para o campo da infncia e juventude.
Municipalizao modalidade de descentralizao e, portanto, corresponde a um
conceito de administrao pblica. Neste contexto, interfere tanto no conjunto da
organizao dos rgos a servio do poder poltico como tambm nas operaes
ou atividades administrativas.
Descentralizao significa a distribuio de competncias de uma para outra
pessoa, fsica ou jurdica10. Competncia, por sua vez, a faculdade juridicamente
atribuda a uma entidade, ou a um rgo ou agente do Poder Pblico para emitir
decises. Competncias so, desta forma, as diversas modalidades de poder de
que se servem os rgos ou entidades estatais para realizar suas funes11. A
distribuio, ou seja, a transferncia deste poder pode ser de natureza poltica ou
administrativa, ou ainda combinar estas duas formas.
Quando se fala em descentralizao poltica est-se diante de uma situao em
que o ente descentralizado exerce atribuies prprias que no decorrem do ente
central. Por descentralizao administrativa entende-se uma transferncia de
atribuies mais restrita, uma vez que no so prprias do ente descentralizado,
10 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. "Direito Administrativo". 15 ed, So Paulo: Atlas, 2003.
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mas sim poderes cujo valor jurdico emprestado pelo ente central. Exemplos
disso so as autarquias ou fundaes governamentais que exercem servios
pblicos em nome do Poder Pblico.
A municipalizao, neste contexto, consiste em modalidade de descentralizao
que conjuga as duas feies: poltica e administrativa.
O que melhor exemplifica tal situao a prpria autonomia municipal conferida
aos municpios, no artigo 34, inciso VII da Constituio Federal. Esta autonomia
desdobra-se em aspectos polticos, referentes auto-organizao normativa e ao
autogoverno; aspectos administrativos, voltados organizao e execuo de
servios pblicos; e, por fim, aspectos financeiros, como a capacidade de
arrecadao de tributos e sua destinao. Resta evidente, pois, que os municpios
possuem competncias prprias e, por essa razo, insubordinadas Unio e aos
estados.
Os programas socioeducativos em meio aberto so a expresso perfeita da
combinao destas duas formas de descentralizao (poltica e administrativa), j
que cabem aos municpios a formulao e a execuo das medidas de liberdade
assistida e prestao de servios comunidade. O fundamento para esta opo
poltica reside no reconhecimento de que no mbito local e comunitrio que
esto mais presentes as possibilidades de reinsero social dos jovens. Vale
dizer, contudo, que no se excluem as competncias concorrentes da Unio e dos
Estados para a execuo destes programas socioeducativos.
A repartio de competncias, prevista na Constituio Federal brasileira,
configura-se em um sistema complexo de equilbrio federativo. Este sistema
enumera os poderes da Unio (artigo 21 e 22), deixando poderes remanescentes
para os Estados (artigo 25, pargrafo 1) e poderes definidos para os municpios
11 SILVA, Jos Afonso da. "Curso de Direito Constitucional Positivo" . 9 ed. So Paulo: Malheiros.
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18
(artigo 30)12. O equilbrio tambm garantido pela existncia de reas comuns em
que se prevem atuaes paralelas da Unio, estados e municpios (artigo 23)
como, por exemplo, aquelas voltadas ao combate s causas da pobreza e os
fatores de marginalizao e a promoo da integrao social dos setores
desfavorecidos (inciso X do mesmo artigo). Importante mencionar que a proteo
da infncia e juventude uma das competncias concorrentes entre Unio,
estados, Distrito Federal e municpios, constante no artigo 24, inciso XV, da
Constituio Federal.
Estas consideraes esclarecem o alcance das diretrizes do Estatuto quanto
municipalizao do atendimento e descentralizao poltico-administrativa para
a criao e manuteno de programas especficos. Isto corresponde, na prtica, a
uma definio precisa das reas de atuao dos diferentes nveis de governo,
associada participao da sociedade civil na gesto pblica.
por esta razo que o tema da municipalizao do atendimento pressupe
conhecer as competncias exclusivas dos Estados e tambm as reas de atuao
paralela da Unio, estados e municpios. De outro lado, igualmente importante,
est a participao dos conselhos deliberativos e paritrios atravs dos quais se
efetiva a formulao e controle das polticas pblicas de atendimento dos direitos
da criana e do adolescente pela sociedade civil.
O Sistema de Garantia dos Direitos da Criana e do Adolescente tem tambm
como parmetro a regra do artigo 204 da Constituio Federal de 198813:
12 De acordo com a Constituio Federal, de competncia dos municpios legislar sobre assuntos de interesse local, incluindo legislao tributria e financeira, legislar supletivamente sobre educao, cultura, ensino e sade no que tange prestao desses servios no mbito local. 13 Sobre as polticas dirigidas infncia e juventude, vale dizer, novamente, que a mesma Constituio as estabeleceu como prioritrias adotando a Doutrina da Proteo Integral, em seu artigo 227, na mesma linha dos pactos internacionais como a Conveno Internacional sobre os Direitos da Criana e as Regras Mnimas das Naes Unidas para a Administrao da Justia da Infncia e da Juventude Regras de Beijing. O Estado se compromete, atravs de norma constitucional, a assegurar criana e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, colocando-os a salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso.
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19
Art. 204 As aes governamentais na rea da assistncia social
sero realizadas com recursos do oramento da seguridade social,
previstos no art. 195, alm de outras fontes, e organizadas com base
nas seguintes diretrizes:
I descentralizao poltico-administrativa, cabendo a coordenao e as normas gerais esfera federal e a coordenao e a execuo dos
respectivos programas s esferas estadual e municipal, bem como a
entidades beneficentes e de assistncia social;
II participao da populao, por meio de organizaes representativas, na formulao das polticas e no controle das aes em
todos os nveis.
Para esmiuar seus efeitos sobre as polticas socioeducativas necessrio ainda
trazer discusso o que estabelece o artigo 87 do Estatuto da Criana e do
Adolescente:
So linhas de ao da poltica de atendimento:
I- Polticas sociais bsicas;
II- Polticas e programas de assistncia social, em carter supletivo,
para aqueles que deles necessitem;
III- Servios especiais de preveno e atendimento mdico e
psicossocial s vtimas de negligncia, maus tratos, explorao, abuso,
crueldade e opresso;
IV- Servio de identificao e localizao de pai, responsvel, crianas e
adolescentes desaparecidos;
V- Proteo jurdico-social por entidades de defesa dos direitos da
criana e do adolescente.
As polticas pblicas voltadas para as crianas e adolescentes podem ser
classificadas em: Polticas Sociais Bsicas Estruturais, Polticas Sociais Bsicas
de Assistncia Social e Polticas de Garantias de Direitos. Aquelas Sociais
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Bsicas Estruturais destinam-se a todas as crianas e adolescentes sem distino
e independentemente de sua condio. Sade, Educao, Transporte e Habitao
so bons exemplos.
J as Sociais Bsicas de Assistncia Social direcionam-se a grupos de crianas e
adolescentes em estado de carncia e vulnerabilidade social. Por fim, a terceira
categoria de polticas pblicas voltada a crianas e adolescentes em situao de
ameaa ou violao de direitos, seja em razo da omisso de adultos, seja em
razo de sua prpria conduta, como ocorre com os adolescentes autores de ato
infracional.
Tudo isso para dizer que a transferncia de competncias socioeducativas para os
municpios e mesmo para as entidades no-governamentais exige a
descentralizao dos recursos financeiros necessrios implementao da rede
integrada de ateno criana e ao adolescente, mediante a cooperao tcnico-
financeira dos estados e da Unio.
De outra parte, as competncias exclusivas dos estados federados concentram-se
na execuo das medidas socioeducativas em meio fechado a semiliberdade e a
internao -, ou, ainda, pode-se dizer para a execuo das medidas institucionais,
que se realizam mediante certa conteno da liberdade individual do adolescente.
No se afastam, todavia, da responsabilidade dos estados, a coordenao e o
estabelecimento de normas gerais e a assistncia tcnica e financeira para a
execuo das medidas socioeducativas em meio aberto.
Evidencia-se desta forma que as polticas socioeducativas, como parte integrante
de uma poltica de atendimento abrangente infncia e juventude, devem
necessariamente fazer parte da agenda poltica de todos os entes polticos, e no
somente do municpio.
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21
A autonomia municipal, sem dvida, possui uma importante interface com as
polticas socioeducativas. Do ponto de vista normativo, as polticas municipais de
ateno infncia e juventude so de responsabilidade dos Conselhos Municipais
de Direitos (CMDCAs). No que se refere organizao e execuo de servios
pblicos, cabe ao municpio executar, a partir de uma poltica inter-secretarial, os
programas em meio aberto. Por fim, consoante mandamento constitucional, a
destinao de recursos na rea da infncia e juventude prioritria, ou seja, tem
preferncia sobre as demais.
Entretanto, vale repetir, a proteo da infncia e juventude de competncia
concorrente da Unio e dos estados, especialmente do ponto de vista legislativo.
A Constituio Federal prev que no mbito da legislao concorrente, a
competncia da Unio limitar-se- a estabelecer normas gerais, sendo que sua
competncia para legislar normas gerais no exclui a competncia suplementar
dos estados14.
Podemos indicar a ttulo de concluso que as diretrizes poltico-administrativas
constantes da Constituio Federal e do prprio texto do Estatuto da Criana e do
Adolescente formatam um sistema de cooperao e distribuio de competncias
entre Unio, estados e municpios, estendendo-se, em alguns casos, a
organizaes no-governamentais e sociedade civil organizada.
Isto porque s h descentralizao poltica quando os entes descentralizados
possuem capacidade legislativa, como ocorre com estados e municpios. Quando
os entes descentralizados so entidades, criadas pelo Estado ou por particulares,
com personalidade jurdica de direito privado ou pblico, s h descentralizao
administrativa.
A regra da municipalizao pressupe a organizao dos servios na base
municipal de forma interligada e integrada, sem eliminar dos Estados e em
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determinadas reas tambm da Unio, a tarefa de coordenao geral. As medidas
em meio aberto, de responsabilidade dos municpios, devem contar com servios
da rede estadual e apoio tcnico-financeiro da Unio quando necessrio. Do
mesmo modo, os programas socioeducativos executados em meio fechado,
competncia precpua dos Estados, podem valer-se de equipamentos e
programas municipais, e serem supervisionados pela Unio.
Segue abaixo quadro demonstrativo ideal das atribuies dos rgos e esferas do
Poder Pblico com referncia s medidas socioeducativas:
Medidas Socioeducativas Unio
Estados
Municpios
Advertncia
Obrigao de Reparar o Dano
Legisla e Normatiza
(destaque s Resolues do
CONANDA)
Legisla supletivamente, Normatiza (destaque s Resolues dos Conselhos Estaduais) e executa
por meio do Poder Judicirio
Normatiza
(destaque s Resolues dos
Conselhos Municipais)
Prestao de Servios
Comunidade
Legisla supletivamente, Normatiza (destaque s Resolues dos Conselhos Estaduais); Executa
subsidiariamente ao Municpio; e Fiscaliza por meio do Poder
Judicirio
Normatiza (destaque s
Resolues dos Conselhos Municipais) Financia e Executa,
podendo haver participao da
ONGs
Liberdade Assistida
Legisla, Normatiza
(destaque s Resolues do CONANDA) e
Financia
Legisla supletivamente, Normatiza (destaque s Resolues dos Conselhos Estaduais); Executa
subsidiariamente ao Municpio; e Fiscaliza por meio do Poder
Judicirio
Normatiza
(destaque s Resolues dos
Conselhos Municipais) Financia e Executa,
podendo haver participao da
ONGs
14 Dispe ainda o pargrafo 3 do artigo 24 que diante da inexistncia de lei federal sobre normas gerais, os Estados exercero a competncia legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
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Semiliberdade
Legisla supletivamente, Normatiza (destaque s Resolues dos Conselhos Estaduais); Executa
e Fiscaliza atravs do Poder Judicirio
Normatiza
(destaque s Resolues dos
Conselhos Municipais) e
Executa em co-gesto com o
Estado
Internao
Legisla supletivamente, Normatiza (destaque s Resolues dos Conselhos Estaduais); Executa
e Fiscaliza atravs do Poder Judicirio
Normatiza
(destaque s Resolues dos
Conselhos Municipais) e
Executa em co-gesto com o
Estado
1.2.2. Conselhos e Fundos de Direitos da Criana e do Adolescente
As regras e diretrizes acerca da distribuio de competncias e forma de
organizao das polticas de ateno infncia e juventude configuram o que se
convencionou chamar de poltica de atendimento. Os Poderes Executivos federal,
estaduais e municipais, tal qual demonstramos, desempenham o papel central.
De modo geral, o Estatuto da Criana e do Adolescente segue o modelo
constitucional; a inovao, contudo, est na criao de rgos especficos do
poder pblico, quais sejam, os Conselhos de Defesa dos Direitos da Criana e do
Adolescente e os Conselhos Tutelares, ambos entidades estatais. Podem tambm
ser definidos como rgos de governo, na medida em que so vinculados ao
Poder Executivo, no tm personalidade prpria, estando integrados ou Unio
Federal (Conselho Nacional / CONANDA), aos Estados (Conselhos Estaduais), ou
aos municpios (Conselhos Municipais e Conselhos Tutelares).
O artigo 204, inciso II da Constituio Federal, e o artigo 88, inciso II do Estatuto
da Criana e do Adolescente, ambos discutidos anteriormente, conferem aos
Conselhos a tarefa de deliberao e controle em condies de igualdade em
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relao aos governantes. Da a expresso paritrios, pois so conselhos
compostos por membros do governo e da sociedade, iguais em nmero e em
poder de deliberao.
Na condio de rgos deliberativos, os Conselhos decidem, mas no possuem a
primazia na formulao de polticas, haja vista que outros rgos de governo
podem adotar suas prprias polticas. Deste modo, ganha especial importncia a
funo de controle atravs da qual os Conselhos apreciam e fiscalizam as aes
executadas pelo poder pblico e pela sociedade civil, na hiptese de
descentralizao administrativa.
A apreciao pressupe que todas as polticas sejam submetidas ao crivo dos
Conselhos, do contrrio restam eivadas de ilegalidade, contrariando o Estatuto e a
Constituio. A fiscalizao d-se pelo exame de contas pblicas e inspeo
sobre as polticas de governo em todos os aspectos (financeiros, administrativos e
pedaggicos). Os Conselhos podem formar comisses que visitem os
equipamentos sociais pblicos, em qualquer horrio.
importante frisar que as decises dos Conselhos somente tm validade dentro
do Poder Executivo ao qual esto vinculados, no havendo qualquer ingerncia
nos Poderes Judicirio e Legislativo, nem tampouco entre uma esfera e outra. O
Conselho Estadual, por exemplo, delibera, formula e controla somente as polticas
estaduais de atendimento infncia e juventude. A exceo a tal regra somente
admitida no que se refere s resolues do CONANDA, que tm aplicabilidade em
todo o territrio nacional e nas hipteses de atuao paralela entre estados e
municpios.
Ainda no mbito da formulao e controle, cabe aos Conselhos manter e gerir os
Fundos Pblicos da criana e do adolescente.
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Fundos pblicos so recursos vinculados por lei ao financiamento de
determinadas atividades de interesse social15. De acordo com o artigo 71 da Lei
4.320/64, os fundos pblicos especiais, como o caso dos Fundos da criana e
do adolescente, so produto de receitas especificadas que, por lei, se vinculam
realizao de determinados objetivos ou servios, facultada a adoo de normas
peculiares de aplicao.
A manuteno e a boa utilizao dos recursos dos Fundos so essenciais para a
viabilizao das polticas, programas e aes voltadas para o atendimento dos
direitos de crianas e adolescentes, e por isso inserem-se dentre as atribuies e
competncias dos Conselhos.
Os Conselhos devem fixar critrios e deliberar sobre a destinao dos recursos do
Fundo e o Administrador, representando o Poder Executivo, deve tomar as
providncias para a liberao do capital e o controle dos recursos.
Finalmente, quanto composio, no h nos Conselhos representao pessoal.
Todo conselheiro representa uma instituio e tendo em vista a natureza de sua
funo como de interesse pblico relevante, no receber remunerao alguma,
nos termos do artigo 89 do Estatuto da Criana e do Adolescente:
A funo de membro do Conselho Nacional e dos conselheiros
estaduais e municipais dos direitos da criana e do adolescente
considerada de interesse pblico relevante e no ser remunerada.
Para a criao dos Conselhos de Direitos necessrio que os Poderes Executivos
elaborem projeto de lei e encaminhem ao Legislativo para aprovao. A omisso
dos Poderes Executivos d ensejo instaurao de inqurito civil por iniciativa do
Ministrio Pblico.
15 CENDHEC -Centro Dom Helder Cmara de Estudos e Ao Social. "Sistema de Garantia de Direitos Um caminho para a proteo integral". Recife, 1999.
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Vale mencionar tambm os Conselhos Tutelares, cuja previso legal encontra-se
nos artigos 131 a 140 do Estatuto, com atribuio bastante diversa dos Conselhos
de Direitos, que se incumbem principalmente das medidas de proteo. So
rgos autnomos e no jurisdicionais, com independncia de seus atos e
deliberaes, dotados de autonomia administrativa, financeira e tcnica. De
acordo com o que dispe o ECA, os Conselhos Tutelares possuem um poder de
exigir legalmente a realizao de uma srie de servios de atendimento a crianas
e adolescentes.
Situados no mbito municipal, os Conselhos Tutelares desempenham um papel
significativo acerca das medidas socioeducativas, quando sua execuo se d de
forma contrria lei, denotando aes ou omisses do Estado ou da sociedade
que ameaam ou violam direitos dos adolescentes. Por esta razo, a relao entre
os Conselhos de Direitos e os Conselhos Tutelares dever ser de reciprocidade e
tambm de cooperao para a observncia das recomendaes do Estatuto.
1.2.3. Integrao Operacional
O Estatuto da Criana e do Adolescente tambm indica como diretriz da poltica
de atendimento a integrao operacional de rgos do Judicirio, Ministrio
Pblico, Defensoria, Segurana Pblica e Assistncia Social em um mesmo local,
para a agilizao do atendimento inicial de adolescente acusado da autoria de ato
infracional.
Esta integrao operacional tem por escopo garantir que os procedimentos de
apurao do ato infracional imputado ao adolescente sejam geis, uma vez que
podem representar uma forma de restrio de sua liberdade, na hiptese da
decretao da internao provisria. Tem tambm como objetivo que a sentena
aplicada guarde uma relao de causalidade com o fato, ou seja, a aplicao da
medida socioeducativa no deve se dar muito tempo aps o ato infracional, o que
fragiliza o alcance de suas finalidades.
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Outro aspecto a ser observado refere-se efetiva execuo da medida logo aps
a deciso do juiz. Quando h grande lapso de tempo entre a prolao da
sentena, momento em que se define a medida socioeducativa a ser cumprida, e
o incio de seu cumprimento, perde-se de vista a finalidade preventiva da medida
que se prolonga no tempo como mera retribuio e segregao do adolescente. O
que se pretende evitar so situaes como aquelas em que o jovem comete o ato,
sentenciado, por exemplo, com uma medida em meio aberto e o incio de seu
cumprimento chega a tardar dois anos.
Nesta hiptese a medida perde seu carter educativo-ressocializante e passa a ter
um carter meramente repressor e punitivo, haja vista que a resposta estatal deve
ser imediata para aquele que cometeu um delito, condio para que seu contedo
estratgico pedaggico produza efeitos em relao ao jovem e ao mesmo tempo
no seja reforado o sentimento de impunidade na sociedade.
A observncia desta diretriz pode ser oportunizada pela criao de centros
integrados de atendimento ao adolescente infrator. Nestes centros ou ncleos
necessrio que se faam presentes todas as instituies pblicas que interagem
para a apurao do ato infracional e a imposio de uma medida socioeducativa.
No mbito da segurana pblica devem ser organizados servios especializados,
tais como reparties ou delegacias de polcia especializadas. Da mesma forma, a
capacitao de policiais sobre as regras do Estatuto faz-se fundamental16.
Devemos destacar ainda a importncia da Defensoria Pblica especializada que
deve zelar pelo respeito s garantias jurdico-processuais dos adolescentes
acusados. Observncia dos prazos legais, produo de provas e indcios
16 A regra do artigo 178 da lei deve ser conhecida e observada pelas autoridades policiais: O adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional no poder ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veculo policial, em condies atentatrias sua dignidade, ou que impliquem risco sua integridade fsica ou mental, sob pena de responsabilidade.
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suficientes da autoria e materialidade do ato infracional so condies necessrias
para a legalidade dos procedimentos17.
Mais do que isso, o processo de apurao do ato infracional e de imposio das
medidas socioeducativas converte-se na primeira interveno do Estado sobre a
vida do adolescente. Se for eivado de ilegalidade e arbitrariedade, desde logo
inviabiliza qualquer interveno posterior eficaz. Por outro lado, se as regras do
devido processo legal obtiverem obedincia estrita, abrem-se possibilidades para
um atendimento multidisciplinar afinado proteo integral preconizada pelo
Estatuto.
1.2.4. Participao e Controle Social
O tema da participao social no campo dos direitos da criana e do adolescente
remonta a prpria formulao do Estatuto. Assim no poderia ser diferente: o ECA
incorporou em seus dispositivos a noo de controle e participao social na
realizao de seus mandamentos e diretrizes legais.
Como j discutido, a Constituio Federal, apenas dois anos mais velha que o
Estatuto, contm em seu corpo alguns dispositivos norteadores sobre as
responsabilidades em relao criana e ao adolescente18 e sobre as polticas de
assistncia social governamentais19. O ECA tornou mais concreta a maneira pela
qual essas responsabilidades so divididas entre famlia, sociedade e Estado, e
criou instituies, como por exemplo os Conselhos de Direitos e Tutelares, para
que a interao entre esses trs elementos pudesse se realizar satisfatoriamente.
17 Na redao do artigo 110 fica estabelecido que nenhum adolescente ser privado de liberdade sem o devido processo legal. 18 Ver art. 227 da Constituio Federal 19 Art. 204. As aes governamentais na rea da assistncia social sero realizadas com recursos do oramento da seguridade social, previstos no art. 195, alm de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: (...) II participao da populao, por meio de organizaes representativas, na formulao das polticas e no controle das aes em todos os nveis.
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H ainda muitos obstculos, que precisam ser superados, para que a sociedade
aproxime-se da questo do adolescente em conflito com lei submetido a uma
resposta socioeducativa. O controle e a participao social so muito mais do que
exigncia da lei; representam, acima de tudo, condio essencial para que a
aplicao do Estatuto da Criana e do Adolescente traduza o interesse coletivo.
Assim estaremos permitindo a constituio de novos paradigmas de atendimento
socioeducativo, respeitando-se simultaneamente o interesse social e os direitos
humanos de adolescentes em conflito com a lei.
Podemos dizer que o controle e a participao social na elaborao e execuo
de polticas pblicas para medidas socioeducativas encontra obstculos em trs
diferentes mbitos: primeiro no que se refere aos mecanismos disponveis para
participao; segundo no tocante conscincia da populao e a sua disposio
para participar; e, por fim, no que diz respeito aos dispositivos legais que regulam
a interferncia e a interveno da populao na definio e realizao dessas
polticas.
Por se tratar de polticas pblicas para adolescentes que praticaram ato
infracional, as possveis dificuldades, elencadas acima, aumentam em razo do
preconceito que atinge esses jovens. Ainda muito presente na sociedade
brasileira a imagem do jovem em conflito com a lei como um ser humano inferior,
ao qual no cabe qualquer direito, mas to somente um tratamento rigoroso. Essa
imagem depreciada do adolescente infrator afasta os cidados de uma
participao contnua na conduo das polticas pblicas, desde a sua elaborao
at o momento de sua avaliao, permitindo-se, assim, que a administrao
pblica e as entidades no-governamentais responsveis pela execuo das
medidas socioeducativas realizem-nas a seu critrio e convenincia, na maioria
das vezes desarticuladamente e sem contar com utilizao dos recursos
comunitrios. A ausncia da sociedade civil no cotidiano dessas entidades
inadmissvel, pois seus administradores esto lidando com interesses pblicos e,
no mais das vezes, com recursos pblicos.
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O controle e participao social na administrao pblica tm que ser estimulados
com o enfrentamento da descrena generalizada na participao, da recusa em
participar e da impossibilidade de que isso ocorra. Os administradores pblicos
devem esquivar-se do sentimento de apropriao da coisa pblica e encarar a
presena propositiva e reivindicativa da sociedade como elemento de legitimao
de suas aes e decises.
A presena da sociedade na elaborao e na realizao das polticas pblicas,
seja atravs dos Conselhos de Direitos, seja por meio de espaos de gesto
compartilhada, oportunidade para o aperfeioamento das prticas institucionais
e das metodologias. Para isso devem ser criadas rotinas peridicas de avaliao
dos instrumentos de participao, contando com a presena de todos os
envolvidos, a quem devero ser, tambm, disponibilizados meios para
apresentao de crticas, sugestes, denncias e reclamaes.
Outro requisito essencial a capacitao dos atores sociais. Em muitos casos, as
ouvidorias, conselhos de comunidade ou os conselhos das entidades de
atendimento e das secretarias responsveis por essa modalidade de poltica
pblica so compostos por notveis ou indicados polticos que desconhecem as
questes relacionadas infncia e adolescncia, fragilizando o controle social da
poltica referida.
Alm disso, importante que os responsveis, por representarem a sociedade nos
conselhos, ouvidorias ou mesmo aqueles que componham as corregedorias, bem
como os profissionais que faro o contato direto com a populao, sejam
continuamente estimulados a conhecer melhor o Estatuto, as mudanas de lei e
toda a normativa infra-legal (resolues dos Conselhos de Direitos).
Por fim, os mecanismos e instrumentos de participao popular devem estar
devidamente regulados, com os procedimentos definidos, estabelecendo
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31
responsabilidades e atribuies sem prejuzo de outras determinaes que se
fizerem necessrias. Essa normatizao contribui com a racionalidade e
segurana dos meios de controle e participao social.
Nesta direo, a legislao determina que a fiscalizao das entidades
governamentais e no-governamentais que trabalham com orientao e apoio
scio-familiar, apoio socioeducativo em meio aberto, liberdade assistida,
semiliberdade e internao seja feita pelo Judicirio, Ministrio Pblico e
Conselhos Tutelares. Paralelamente fiscalizao, as entidades de atendimento
socioeducativo esto sujeitas a uma srie de sanes administrativas, sem
prejuzo daquelas cabveis aos seus funcionrios e dirigentes, bem como da
responsabilizao civil e criminal a que estes estiverem sujeitos.
Outras obrigaes dessas entidades so a de prestar contas e de apresentar os
planos de aplicao de recursos ao Estado ou ao Municpio, conforme a origem da
dotao oramentria. Qualquer rgo ou instituio, pblica ou privada, que
utilizar, gerenciar ou administrar dinheiros, bens e valores pblicos municipais,
estaduais ou federais dever publicizar suas contas de maneira clara e simples
para que os cidados possam acompanhar a execuo dos programas
socioeducativos, comprovar sua legalidade e avaliar os gastos, bem como seus
resultados, exercendo, deste modo, efetivo controle sobre a administrao de
recursos pblicos.
Sobre este aspecto pertinente retomar o papel dos Conselhos de Direitos na
gesto dos Fundos Pblicos da Infncia e Juventude. De acordo com o artigo 260,
pargrafo 2 do Estatuto da Criana e do Adolescente:
Os Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional dos Direitos da Criana
e do Adolescente fixaro critrios de utilizao, atravs de planos de
aplicao das doaes subsidiadas e demais receitas, aplicando
necessariamente percentual para incentivo ao acolhimento sob a forma
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de guarda, de criana ou adolescente, rfo ou abandonado, na forma
do disposto no artigo 227, pargrafo 3, VI da Constituio Federal.
Pode-se inferir, portanto, que o atual Sistema de Garantia de Direitos desenhado
em nossa legislao apresenta inmeros dispositivos que definem os moldes
pelos quais se realizaro as atividades de controle social e de participao
popular. A utilizao, administrao ou gerenciamento de recursos pblicos deve
se dar conforme a lei e como um verdadeiro exerccio de democracia participativa.
Por isso, no basta que a lei determine a criao de mecanismos e instrumentos
de controle e participao sem que os administradores pblicos proporcionem
condies materiais de efetivao dos comandos legais. A presena da sociedade
na gesto de bens e interesses pblicos deve contar com meios de controle e
participao amplamente divulgados, freqentemente avaliados e remodelados de
acordo com as necessidades de usurios e funcionrios, acessveis, de fcil
compreenso e utilizao, operacionalizados por profissionais preparados e em
constante aprimoramento e, por fim, regularizados por regras claras, definidas e
de conhecimento de todos. Dessa maneira, os diversos segmentos da sociedade
tero a possibilidade de interferir e intervir na elaborao, execuo e avaliao
das polticas pblicas para as medidas socioeducativas.
1.3. TEMAS EMERGENTES Esta parte do Guia destina-se a apontar temas que nos parecem de relevncia
especfica para a elaborao e execuo das polticas socioeducativas. Temas
que quer pelo seu alcance a todas as modalidades de medidas, quer pela sua
ainda baixa aplicabilidade interferem diretamente na precria qualidade e
insucesso dos programas socioeducativos.
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33
Partimos do eixo definido pelo princpio da incompletude institucional para discutir
aspectos que no podem deixar de ser atendidos nas distintas polticas de
execuo de medidas socioeducativas.
1.3.1. Incompletude Institucional
O princpio da incompletude institucional revela a lgica presente no Estatuto da
Criana e do Adolescente quanto a concepo de um conjunto articulado de aes
governamentais e no governamentais para a organizao das polticas de
ateno infncia e juventude20.
Disso decorre que todas as polticas devem ser executadas de forma integrada.
As polticas de execuo de medidas socioeducativas situam-se no Sistema
Tercirio de Garantias21, representando uma interveno restrita para os
adolescentes envolvidos com a prtica de infraes penais. Sua operao, no
entanto, no pode se dar de forma isolada, pois a proteo integral para ser
atendida impe o oferecimento de servios e aes de natureza social e protetiva.
A incompletude institucional exige que os programas socioeducativos contem com
a participao de polticas setoriais, evitando, deste modo, que suas entidades de
execuo, sejam para as medidas em meio aberto, sejam para as medidas
privativas da liberdade no se configurem como instituies totais. No se espera
que os programas socioeducativos respondam por todas as necessidades de
atendimento de um adolescente. Tais necessidades ho de ser contempladas
mediante a articulao entre polticas de educao, sade, trabalho, cultura,
esporte, segurana pblica e justia. E no que diz respeito s medidas de privao
de liberdade tambm se faz necessria a presena de projetos arquitetnicos e
obras.
20 Artigo 86 do Estatuto da Criana e do Adolescente. 21 O Sistema de Garantias de Direitos, como visto anteriormente, pode ser compreendido em trs partes. O Sistema Primrio corresponde s polticas sociais, o Secundrio s medidas de proteo.
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Para melhor visualizar o sentido da incompletude institucional para os programas
socioeducativos, apresentamos um diagrama exemplificativo:
1.3.2. Plano Individualizado de Atendimento Como decorrncia dos princpios do Estatuto da Criana e do Adolescente para a
organizao e execuo das polticas socioeducativas, em especial a
incompletude institucional. E considerando ainda que todas as aes dirigidas
infncia e adolescncia devem pautar-se pelo reconhecimento de sua condio de
pessoas em desenvolvimento resta como obrigao inafastvel para os
Educao Formal
Sistema de
Justia
Sade
Esporte e
Cultura
SeguranaPblica
Projetos arquitetnicos
e Obras
Programas Socioeducativos
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executores de medidas socioeducativas, a elaborao de Planos Individualizados
de Atendimento.
Significa em primeiro lugar que uma vez inserido em um programa socioeducativo,
o adolescente deve ser avaliado para a identificao de suas potencialidades,
interesses e necessidades.
Se verdade que a discusso acerca dos planos de atendimento situa-se mais no
campo das metodologias e prticas pedaggicas adotadas pelas instituies, de
outro lado, evidente que sua efetiva realizao depende da articulao dos
programas s demais polticas pblicas.
O Plano Individualizado de Atendimento deve consistir no estabelecimento de
metas objetivas a serem alcanadas pelo adolescente e pelo programa no curso
da medida socioeducativa. Funciona ainda como um contrato de adeso atravs
do qual o jovem se responsabiliza pelo cumprimento de suas obrigaes, sabendo
desde logo as regras que dever cumprir. No mesmo sentido, vincula aos
educadores, tcnicos e executores de medidas a atuarem junto a outras instncias
do poder pblico e mesmo entidades no-governamentais para o oferecimento
dos servios que o caso concreto demanda. Exemplificativamente podemos
indicar as situaes individuais de drogadio, distrbios psicolgicos ou mesmo
carncias materiais e necessidades especiais de aprendizagem escolar.
Alm disso, o Plano Individualizado de Atendimento o instrumento que possibilita
a avaliao objetiva sobre o cumprimento da medida, evitando que sejam
considerados apenas aspectos subjetivos no momento de sua reavaliao.
As medidas socioeducativas privativas de liberdade - semiliberdade e internao
no comportam prazo determinado, devendo sua manuteno ser reavaliada no
mximo a cada 6 meses, de acordo com o que dispe os artigos 120 e 121 do
Estatuto da Criana e do Adolescente. Para os programas de execuo de tais
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medidas, os Planos Individualizados de Atendimento passam, portanto a
desempenhar uma funo de extrema importncia inclusive para o Poder
Judicirio que poder avaliar a necessidade ou no de manuteno da sentena
com base em informaes e dados objetivos, afastando-se, assim, apenas a
percepo pessoal dos tcnicos sobre a personalidade do adolescente. Alis,
bastante comum que os relatrios de acompanhamento elaborados pelas equipes
de atendimento ao jovem pautem-se quase exclusivamente na avaliao do
comportamento, em aspectos pessoais do jovem e muitas vezes na gravidade da
infrao, que segundo a lei j foi objeto de discusso na imposio da sentena.
Tambm com relao s medidas executadas em meio aberto, os Planos
Individualizados de Atendimento so essenciais para o cumprimento da regra do
artigo 113 do Eca, que se remete aos artigos 99 e 100 respectivamente:
As medidas previstas neste Captulo podero ser aplicadas
isoladamente ou cumulativamente, bem como substitudas a qualquer
tempo.
Na aplicao das medidas levar-se-o em conta as necessidades
pedaggicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos
vnculos familiares e comunitrios.
A possibilidade de substituio das medidas a qualquer tempo tema que ser
melhor debatido ao tratarmos da progressividade das medidas socioeducativas.
Contudo, podemos perceber que sua operacionalizao no pode prescindir da
avaliao com base em critrios objetivos e claros. So os Planos Individualizados
de Atendimento que permitem aferir se o adolescente atendeu satisfatoriamente
s obrigaes originalmente impostas, estando ou no apto a ser progredido para
medida menos severa, ou at mesmo completamente desobrigado do
cumprimento de qualquer outra medida.
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Por fim, os Planos Individualizados de Atendimento, uma vez elaborados pelas
equipes de atendimento e compartilhados com os adolescentes e seus familiares
so estrategicamente importantes para participao das famlias que, conhecendo
os objetivos que a medida almeja atingir, exercem papel fundamental para o
sucesso da interveno socioeducativa.
Para as medidas no privativas da liberdade, a colaborao das famlias e
responsveis mostra-se como condio necessria, j que o cumprimento de
horrios, datas de comparecimento, freqncia escolar e cursos
profissionalizantes fazem parte da execuo das medidas e devem receber o
apoio e incentivo necessrios no seio familiar.
1.3.3. Progressividade e Regimes das Medidas Socioeducativas
largamente admitida, tanto na doutrina22 quanto na jurisprudncia23, a noo de
progressividade das medidas socioeducativas, acolhendo-se, portanto, a
possibilidade de substituio de uma dada medida por outra menos severa. O
prprio Estatuto da Criana e do Adolescente, embora no se refira
expressamente progresso de medida, d margem adoo desse expediente
em duas de suas disposies. A primeira delas consta do artigo 113, o qual, ao
fazer referncia ao artigo 99, prev a possibilidade de substituio das medidas
socioeducativas24. A outra disposio, por sua vez, insere-se no artigo 120, o qual
coloca a medida de semiliberdade como forma de transio para o meio aberto25.
22 Vide Anteprojeto de Lei de Diretrizes Socioeducativas elaborado pela Associao Brasileira de Magistrados e Promotores da Infncia e da Juventude (ABMP), o qual prev: Art.43 A Execuo das medidas socioeducativas rege-se pelo princpio da progressividade, visando a garantir ao socioeducando, na medida de deus mritos, a evoluo de uma medida socioeducativa mais gravosa para outra mais branda 23 Vide deciso do STJ, que entende a progressividade como decorrncia imediata dos preceitos contidos no ECA: CRIMINAL. HC. ECA. SUSPENSO DE PROGRESSO DE MEDIDA SCIO-EDUCATIVA. DECISO COM FUNDAMENTAO DEFICIENTE. AFRONTA AO OBJETIVO DO SISTEMA. ORDEM CONCEDIDA. I- Deficientemente fundamentada a deciso do Desembargador do Tribunal "a quo", que concedeu efeito suspensivo a agravo de instrumento ministerial, para impedir progresso de medida scio-educativa - deferida pelo Julgador de 1 grau motivadamente e com base em laudos tcnicos, reconhece-se a ocorrncia de constrangimento ilegal. II- O sistema implantado pelo ECA visa reintegrao do menor ao convvio social, sendo que a progresso da sua natureza, sendo descabida a sua sustao se no demonstrado risco de leso irreparvel. III- Ordem concedida para que o paciente aguarde em liberdade assistida o julgamento do recurso ministerial. 24 Art. 113 Aplica-se a este captulo [das medidas scio-educativas] o disposto nos arts.99 e 100
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Entretanto, no obstante o reconhecimento do carter progressivo da medida
socioeducativa, a progresso, na prtica, no se d a partir dos mesmos preceitos
e das mesmas garantias que determinam a progresso de regime prevista na Lei
de Execuo Penal (lei 7.210784), para os adultos. Isso ocorre, provavelmente,
porque reconhecer o benefcio da progresso significa, em ltima anlise,
reconhecer tambm o carter punitivo-retributivo da medida socioeducativa
afinal, fosse a medida dotada de cunho puramente educativo, a concesso da
progresso, um benefcio de natureza eminentemente penal, no teria sentido.
Talvez, justamente por no se admitir que o sistema de justia da criana e do
adolescente apresente, sim, destacado carter penal, que se hesite em
transladar as disposies atinentes progresso de regime dos adultos, ainda que
ela se revista em determinados aspectos de maiores garantias.
Dessa maneira, a progresso de medida socioeducativa, tal como realizada
atualmente, encontra-se eivada de distores no que toca aos direitos e garantias
dos adolescentes em conflito com a lei.
A mais patente distoro ocorre no momento da concesso da progresso. No
sistema adulto, a mudana para o regime semi-aberto se d no decorrer do
cumprimento da pena, e no depois de o quantum fixado na sentena j ter sido
integralmente cumprido em regime fechado. Em outras palavras, seria absurdo
esperar que um adulto cuja pena foi fixada pelo juiz em, por exemplo, dez anos, s
depois desse perodo obtivesse o benefcio da progresso; isso representaria uma
evidente perpetuao da pena. No sistema juvenil, no entanto, tal absurdo ocorre
diuturnamente. A medida socioeducativa de internao no comporta prazo
determinado, mas sua durao mxima de trs anos. H casos em que, mesmo
tendo cumprido esses trs anos em regime fechado, a autoridade judicial
determina a continuidade da punio, agora em medida de semiliberdade ou de
Art. 99 As medidas previstas neste captulo podero ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substitudas a qualquer tempo
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liberdade assistida. Seria o mesmo que esperar um condenado adulto cumprir a
pena mxima prevista pela Constituio, ou seja, trinta anos, para s depois
coloc-lo em regime semi-aberto. Contudo, tal distoro chancelada pelo prprio
ECA.26
Admitindo-se a progressividade das medidas socioeducativas, portanto, por uma
questo de ao menos isonomia em relao ao sistema adulto, deve a progresso
ocorrer at o prazo mximo de trs anos. Depois desse lapso, o adolescente deve
ser liberado sem qualquer vinculao remanescente.
Do contrrio, o sistema juvenil afigurar-se- como mais gravoso, o que seria
inconcebvel. Se garantias e benefcios jurdico-penais so assegurados ao adulto
em cumprimento de pena, maiores razes jurdicas e ticas existem para que
sejam estendidos ao adolescente, igualmente em cumprimento de sano jurdico-
penal.
Essa exigncia torna-se imperativa diante de uma comparao mais
pormenorizada com o sistema penal adulto, de modo que se mantenha a
proporcionalidade entre os dois sistemas. Suponhamos que um ru adulto tenha
sido condenado a seis anos de priso em virtude da prtica de roubo; segundo os
requisitos da LEP, ele poder progredir de regime depois de cumprido um sexto
da pena, isto , um ano, ou mesmo comear a cumpri-la j no regime semi-aberto.
Um adolescente que, porventura, tenha cometido o mesmo crime, poder cumprir
trs anos em regime totalmente fechado e, depois desse prazo mximo, ainda ter
de cumprir tempo adicional em medida de semiliberdade ou liberdade assistida.
Ao passo que, para que um adulto cumpra assim como um adolescente trs
anos de sua pena em regime fechado, deve ter sido condenado a, pelo menos,
dezoito anos de priso.
25 O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o incio, ou como forma de transio para o meio aberto, possibilitada a realizao de atividades externas, independentemente de autorizao judicial 26 Art.121. 3. Em nenhuma hiptese o perodo mximo de internao exceder trs anos. 4. Atingido o limite estabelecido no pargrafo anterior, o adolescente dever ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida
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Outro aspecto a ser discutido refere-se a no seqncia obrigatria entre as
medidas socioeducativas. No Sistema Prisional Progressivo dos adultos h uma
diminuio da intensidade da pena, conforme a conduta e o comportamento do
recluso. Esta lgica tem por fundamento oferecer uma diminuio gradual do nus
da pena e estimular a boa conduta. Desenvolve-se atravs de uma comunicao
entre os diferentes regimes penitencirios. como se houvessem canais de
ligao entre os regimes de cumprimento de pena, permitindo avanos e recuos
comandados pelo juiz.
importante sublinhar que depois de estabelecido pelo juiz da condenao, o
regime pode se alterar aos cuidados do juiz da execuo, quando ocorrer a
progresso ou mesmo a regresso de regime.
No sistema penal tradicional, so admitidos trs tipos de regime para a execuo
de penas privativas da liberdade27. O fechado correspondente a estabelecimento
de segurana mxima ou mdia; o semi-aberto, a colnia agrcola, industrial, ou
estabelecimento similar; e o regime aberto, que se realiza em Casa do Albergado
ou estabelecimento adequado;
O juiz define o regime com base na quantidade de pena imposta28. Como o
sistema de responsabilizao de adolescentes no se utiliza do recurso de
determinao temporal das medidas, ou seja, as medidas no comportam prazos
pr-definidos na sentena, e sua durao depende diretamente da conduta do
jovem no curso da execuo, temos aqui a primeira diferenciao entre um
sistema e outro.
Enquanto no sistema penal tradicional a quantidade da pena que determina o
regime inicial de cumprimento, no sistema juvenil o que determina o regime a
modalidade de medida a ser cumprida, independentemente de sua durao. Desta
27 Artigo 33, pargrafo 1 do Cdigo Penal.
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forma, as medidas de internao e semiliberdade so executadas em regime
fechado, e as medidas de liberdade assistida e prestao de servios
comunidade em regime aberto.
A progresso e a regresso no sistema do Estatuto da Criana e do Adolescente
so regidas pela regra da substituio das medidas a qualquer tempo. Neste caso,
da medida de internao pode haver progresso tanto para a medida de
semiliberdade quanto para a medida de liberdade assistida. A progresso no ,
portanto, obrigatoriamente seqencial, como ocorre no sistema progressivo
adulto29.
Por outro lado, no sendo seqencial a substituio de medidas no sistema juvenil
permite que um adolescente em cumprimento de medida em regime aberto possa
regredir para o meio fechado, recebendo inclusive a medida mais severa que a
medida de internao, sem transitar pela medida de semiliberdade que seria
intermediria.
Se do ponto de vista da progresso a regra do Estatuto da Criana e do
Adolescente denota ser mais benfica, pois dispensa a passagem obrigatria da
medida de internao para a semiliberdade e desta para outra em regime aberto,
no que se refere regresso o sistema d margem a incertezas.
Evidencia-se portanto, a necessidade de maior e mais detalhada regulamentao
acerca da possibilidade de substituio das medidas socioeducativas a qualquer
tempo. Tanto do ponto de vista das regras para a regresso e progresso, j que
interferem diretamente na liberdade do adolescente, quanto no que diz respeito
durao das medidas e a contagem de tempo de um regime para outro.
Alm disso, para que a substituio da medida alcance suas finalidades quanto ao
atendimento das necessidades pedaggicas do adolescente e o fortalecimento de
28 Conforme o pargrafo 2 do artigo 33 , o juiz ao fixar o regime inicial de pena deve atender dois tipos de requisitos: 1. Quantidade de pena imposta; 2) em certas situaes qualificao subjetiva do condenado.
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seus vnculos familiares e comunitrios imprescindvel que haja uma
comunicao e intercmbio de informaes e dados entre os programas de
execuo das medidas. So necessrios mecanismos de registros e transferncia
de dados para que sejam preservadas as informaes do adolescente, suas
avaliaes anteriores e para que o processo de execuo das medidas se realize
de forma continuada e integrada. Do contrrio, os prejuzos so graves para o
adolescente e tambm para os recursos pblicos. Duplicam-se avaliaes,
registros e o atendimento acaba sendo fragmentado.
Por fim, tem-se a questo da progressividade das medidas socioeducativas como
estrategicamente importante ressocializao do adolescente. O desafio que se
coloca est na sua devida regulamentao, atentando-se sempre para a
proporcionalidade analgica que o sistema juvenil deve guardar em relao ao
sistema tradicional, sob o risco de se tornar o sistema juvenil descriteriosamente
mais rigoroso.
Em realidade, preciso atentar para o fato de que o princpio do respeito
condio peculiar de pessoa em desenvolvimento, assegurado tanto na
Constituio Federal30 quanto no Estatuto da Criana e do Adolescente31, exige
que o tratamento conferido ao adolescente seja mais do que equivalente quele
destinado ao adulto, isto , exige que tal tratamento seja ainda mais benigno.
1.3.4. Sade Mental e Medidas Socioeducativas Outro tema de relevncia crucial para elaborao e execuo de polticas
pblicas para medidas socioeducativas concerne aos transtornos mentais e o uso
e abuso de drogas, que afetam parcela da populao juvenil envolvida na prtica
de atos infracionais.
29 Sobre o tema ver a discusso da medida de semiliberdade p.107. 30 Art. 227. 3 O direito proteo especial abranger os seguintes aspectos: V - obedincia aos princpios de brevidade, excepcionalidade e respeito condio peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicao de qualquer medida privativa da liberdade
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A medida socioeducativa no pode ser utilizada com o objetivo de tratar o
adolescente autor de ato infracional portador de transtorno mental e/ou que use e
abuse de drogas. O Estatuto da Criana e do Adolescente prev medidas de
natureza protetiva para tal finalidade. Portanto, se o jovem apresenta desequilbrio
em sua sade mental e praticou um delito, ele poder ser inserido em uma medida
socioeducativa e/ou uma protetiva. Sua condio pessoal e familiar ser levada
em considerao para chegar-se a uma definio a respeito da(s) medida(s) mais
apropriada(s).
O adolescente pode praticar o ato infracional:
- para obter a droga;
- por estar sob efeito da droga;
- e ser portador de transtorno mental;
- e adquirir o transtorno mental durante a medida socioeducativa.
O consumo de drogas no produz o dependente qumico nem o autor de ato
infracional, de modo que o foco da interveno deve ser o padro de interao do
usurio/dependente com a droga e as conseqncias provocadas por seu
consumo. H casos em que os problemas do uso e abuso de drogas podero ser
resolvidos com a execuo de uma medida protetiva, sem que se necessite da
medida socioeducativa (que somente pode ser aplicada observado o devido
processo legal quanto comprovao de autoria e materialidade de um ato
infracional praticado). Sendo assim, o simples afastamento do jovem da droga, via
internao, no resolve os problemas relacionados ao seu uso e abuso.
Com relao ao transtorno mental, dependendo de sua gravidade nenhuma
medida socioeducativa dever ser determinada, com tanto que em razo dele o
31 Art. 121 A internao constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princpios de brevidade, excepcionalidade e respeito condio peculiar de pessoa em desenvolvimento
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jovem no tenha condies para compreender que seu ato uma infrao ou de
adequ-lo segundo essa compreenso.
Mesmo que no recomendem o mesmo tratamento, os cuidados que se devem
dispensar aos jovens que so portadores de transtornos mentais e queles que
apresentam problemas no uso e abuso de drogas devero seguir diretrizes
bsicas comuns em ambos os casos. A compatibilidade entre a execuo da
medida socioeducativa e o tratamento oferecido ao adolescente deve contemplar
as peculiaridades da dependncia qumica e as do transtorno mental,
considerando-se a vinculao de cada um com o ato infracional. Somente dessa
maneira, estaremos respeitando as individualidades e a condio peculiar de
pessoa em desenvolvimento dos adolescentes em conflito com a lei. Sempre que
estivermos diante de um adolescente infrator com distrbios mentais, relacionados
s drogas ou no, ou de um jovem com problemas no uso e abuso de drogas no
portador de transtornos mentais, necessrio ponderar sobre a necessidade e
utilidade da interveno socioeducativa, e quando essa for aplicada quais
aspectos especficos devem caracteriz-la.
1.3.4.1. Os Profissionais
Um dos elementos importantes no atendimento socioeducativo o corpo tcnico
que colocar em prtica o que foi definido pelas polticas pblicas. Os profissionais
que atendem o socioeducando, na medida socioeducativa ou na protetiva, devem
desvencilhar-se dos preconceitos que cercam o adolescente em conflito com a lei,
minimizando seus efeitos atravs da busca por espaos de valorizao do
adolescente, em relao a si mesmo e em relao aos outros, com o objetivo de
impedir que a imagem negativa do autor de infracional, usurio/dependente de
drogas e/ou portador de transtorno mental, ou ainda ambos, sejam empecilhos a
sua reorientao e reabilitao social. Enquanto o adolescente for alvo de uma
imagem negativa ser muito difcil obter a sua completa reabilitao e insero
social, porque ele no ter motivaes para tanto nem ter receptividade por parte
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da comunidade em que vive. O mesmo vale para os jovens infratores portadores
de transtorno mental, tambm discriminados em funo de sua condio psquica
e pelo fato de terem praticado um delito.
Os profissionais de sade que atendero o jovem, os responsveis pela
interveno socioeducativa devero ser preparados para tanto, atravs de cursos,
palestras, discusses em equipe, supervises tcnicas etc. Nesse sentido, os
gestores das polticas pblicas devero proporcionar a aproximao entre as
entidades de atendimento e a universidade. Esses profissionais devero ser
treinados para o trabalho com adolescentes em conflito com a lei. O treinamento
inicial, que deve ser realizado antes de o profissional interagir com o jovem, no
elimina a necessidade de constante aperfeioamento do corpo profissional.
Para a definio de quais profissionais trabalharo com os adolescentes infratores
consumidores de drogas e/ou portadores de transtornos mentais dever levar-se
em considerao o interesse pessoal e as aptides. Com uma equipe profissional
de pessoas interessadas e aptas para trabalhar com esse grupo juvenil especfico
haver menos insatisfao em relao ao trabalho e melhores resultados. Essa
equipe deve realizar um trabalho pedaggico, cultural, profissionalizante,
recreativo e esportivo especfico e diferenciado para os adolescentes autores de
ato infracional que apresentem algum desequilbrio em sua sade mental.
Com a formao de uma equipe de socioeducadores devidamente qualificados, os
transtornos mentais podem ser mais rapidamente detectados e tratados. Ainda
assim, continua importante a execuo do tratamento e acompanhamento do
doente mental por uma entidade especializada. Em hiptese alguma, os
profissionais da medida socioeducativa, devem prescrever medicamentos ou
ministr-los, mesmo quando necessrios, exceto quando forem profissionais
habilitados para tanto. Tais atribuies competem ao profissional da rea de
sade devidamente habilitado e cadastrado em sua entidade de classe (Conselho
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Regional/Federal de Medicina, Conselho Regional/Federal de Enfermagem,
Conselho Regional/Federal de Psiquiatria etc.).
No compete, tambm, aos profissionais que acompanham o adolescente com
problemas de sade mental durante a medida socioeducativa, decidir sobre sua
incluso em um tratamento, essa uma deciso exclusiva do adolescente e de
sua famlia ou da autoridade judicial, sempre amparada em um parecer do
profissional competente (mdico, psiquiatra ou psiclogo). Para maior
confiabilidade do diagnstico, os laudos mdicos devem ser realizados por
profissionais de sade no vinculados entidade responsvel pela medida
socioeducativa. Os jovens, respeitando-se a idia de incompletude institucional e
de articulao dos diversos rgos do governo, devem ser atendidos pelo Sistema
nico de Sade como qualquer outro usurio. O adolescente sujeito de direitos
e como qualquer outro cidado deve ter seu direito sade efetivado atravs do
sistema de sade existente nos Estados e municpios.
A efetividade da interveno sobre os problemas de sade mental e os derivados
do consumo de drogas est relacionada maneira pela q